19/06/2019

Terapia Ocupacional x Unidade Básica de Saúde: Um relato de experiência

 

Maria Laura Brum da Cunha[1]

 

Resumos: O relatório de estágio tem como objetivo relatar a experiência que se teve junto à unidade básica de saúde, mais precisamente quanto à saúde da família. As atividades foram realizadas na UBS do bairro Dunas na cidade de Pelotas,durante três meses. Nesse período foi possível aplicar algumas técnicas aprendidas no curso em Terapia Ocupacional. As vivências experimentadas nesse curto período foram desafiadoras e fundamentais para o aprendizado da profissão. Foram momentos de extrema importância para nosso crescimento enquanto ser humano e principalmente como profissional, porque o estágio nos leva a experiências concretas e nos possibilita aplicar o conhecimento até então aprendido, que sem duvida contribui para auxiliar na contribuição da qualidade de vida das famílias atendidas.

 

Palavras- chave: Terapia Ocupacional, relatório de estagio, vivência, Unidade Básica de Saúde, Saúde familiar

 

INTRODUÇÃO

A inserção na prática sempre nos levar a refletir sobre como e onde vamos aplicar o conhecimento adquirido na academia. Esse processo às vezes requer um levantamento mesmo que breve sobre as áreas que vamos atuar, nesse caso a atenção básica de saúde. Conforme o Ministério da Saúde, a Atenção Básica à saúde (AB) se caracteriza por um conjunto de ações de caráter individual ou coletivo que envolve a promoção da saúde, a prevenção de agravos, o diagnóstico, o tratamento e a reabilitação, constituindo-se como primeiro nível de atenção à saúde no que se refere ao Sistema Único de Saúde (BRASIL, 2009). Que envolve uma clientela que vai da criança ao idoso, nas suas diferentes problemáticas. Portanto compreender os processos que envolvem a vida humana é fundamental para o Terapeuta Ocupacional fazer um bom atendimento, pois envolve o bem estar físico, mental, psicológico e emocional, relacionamentos sociais, como família e amigos. Conhecer a realidade da comunidade e da vida desses sujeitos ajuda a se ter um entendimento mais preciso quanto ao tipo de necessidade desse paciente, bem como a intervenção mais apropriada. Entretanto, vamo-nos dando conta desses processos através dos estágios curricular a qual somo submetidos ao final do curso. Segundo Pinheiro o estagio curricular:

É um processo de aprendizagem indispensável a um profissional que deseja estar preparado para enfrentar os desafios de uma carreira. Está no estágio a oportunidade de assimilar a teoria e a prática, aprender as peculiaridades e "macetes" da profissão, conhecer a realidade do dia-a-dia, no que o acadêmico escolheu para exercer. À medida que o acadêmico tem contato com as tarefas que o estágio lhe proporciona, começa então a assimilar tudo aquilo que tem aprendido e até mesmo aquilo que ainda vai aprender teoricamente. Sabemos que pedagogicamente o aprendizado é muito mais eficaz quando é adquirido por meio da experiência. Temos muito mais retenção ao aprendemos na prática do que ao que aprendemos lendo ou ouvindo. O que fazemos diariamente e com frequência é absorvido com muito mais eficiência (PINHEIRO, 2008 p.1)

 

Concorda-se com Pinheiro, pois nessa experiência, se teve a oportunidade de adquirir conhecimentos e vivências sobre a rede de atenção básica,assunto esse pouco comentado e explorado durante a graduação. Acredita-se que por ser uma área de atuação dos terapeutas ocupacional, o currículo de graduação deveria contemplar uma disciplina que abordasse profundamente o assunto.  O fato de não ter conhecimento suficiente sobre o assunto impactou-me no primeiro momento, por deparar-me com uma realidade totalmente diferente da qual vinha acostumada e familiarizada. Pouco conhecia sobre a Saúde da família[1].

Confesso que tive dificuldade em compreender a atuação da Terapia Ocupacional junto à Rede Básica de Saúde. Por vários momentos questionei a conduta que adotava por não ter um conhecimento preestabelecido sobre as rotinas e dinâmicas a serem executadas junto aos pacientes. O conceito de paciente passou a ser a “família inteira”. A intervenção passou a ser voltada para promoção da Saúde e Prevenção.Entendemos e concordamos com a importância de tratarmos os pacientes preventivamente evitando que as situações tomem uma proporção de internação, porém é preciso que tenhamos mais conhecimento sobre o assunto antes de iniciarmos o estágio curricular.

O campo de estagio foi na UBS do Bairros Dunas, situado na cidade de Pelotas- RS. Ao chegar no local ficamos sabendo, que cada dupla ficou responsável uma  por uma  família. A família sob nossos cuidados é comporta por duas irmãs idosas, que moravam sozinhas. Por ser nossa primeira experiência em cuidados da Saúde Básica em uma UBS, ficamos nos primeiros dias mais voltados nos estudos de com agir nesse campo de ação totalmente novo para nós.

Mas aos pouco observando a rotina dos demais colegas da UBS, fui compreendendo epercebendo que estamos falando do tratamento/intervenção inter e multidisciplinar tão falado durante o curso que agora se mostra na prática. Porém ainda nos faltava meios tanto teóricos como prático para dar conta desse novo desafio que foi trabalhar junto a UBS.  Pois tudo por ali era desconhecido,até mesmo a equipe com quem iríamos trabalhar.

Entretanto, a coordenação do estagio assim como a equipe nós deixou bem a vontade para conduzir as atividades que iríamos utilizar na intervenção com a família que ficou sob nossa responsabilidade. Conforme Alarcão, “é no estágio que se aprende a fazer. Através do fazer o estagiário ganhará uma certa autonomia”(ALARCÃO, 2005, p.373-382). Fato de não estamos tão familiarizados com a temática do estágio, precisamos ir atrás de novos conteúdos e informações para poder acompanhar a equipe e dar nossa contribuição.

Nesse processo é importante comentar que enfrentamos outro desafio, que foi trabalhar em equipe. A princípio não foi nada fácil trabalhar com profissionais de varias áreas, se pode perceber o quanto e complexo olhar a mesma situação sobre diferentes perspectivas. Porém sabemos da importância do olhar interdisciplinar para melhor diagnosticar uma situação que precisa ser melhorada.  Para Alarcão,

 O campo de estágio propiciará experiências novas e novos ensinamentos. O contato entre o estagiário e os profissionais o ensinará a lidar com situações do dia a dia de forma interdisciplinar e isso o ajudará a desenvolver o trabalho em equipe, sabendo a importância de cada profissional (ALARCÃO, 2005 p. 373-382 ).

Sem dúvida a convivência com outros profissionais da saúde foi enriquecedora.  Fomos convidados pela equipe do UBS, a participar da reunião dos grupos, e assim tivemos a possibilidade de compartilhar espaços de atuação com enfermeiros, médicos, assistentes sociais entre outros profissionais, e conseguimos contribuir nesses grupos, levando um pouco da visão da terapia ocupacional para os mesmos, e consequentemente, aprendemos muito sobre a atuação dos demais profissionais e a importância dos terapeutas ocupacionais nesse processo.

Esse estágio foi muito desafiador, pois tivemos que (re) construí nosso olhar sobre o campo de atuação da Terapia Ocupacional. Num contexto completamente diferente da visão que se tinha de atuação, foi preciso mudar olhar, vencer preconceitos já estabelecido e consolidado durante o curso. Conforme o tempo foi passando, fui entendo que esse é apenas o começo nessa área que tem muitas coisas ainda a ser conhecidas e aprendidas. As Unidades Básicas de Saúde, não são minha área de atuação predileta, por isso se tornou mais difícil por conta da resistência para desconstruir conceitos de intervenção terapêutica por mim cristalizado.

Porém, o tempo passou e o estagio acabou, para minha surpresa mudei, cresci, amadureci enquanto ser humano e profissional. O que no começo parecia tão surreal acabou se tornando gratificante e importante para entender que sempre podemos aprender mais e nunca devemos-nos fechar para o novo, pois é sempre tempo de mudar velhos conceitos e opiniões.

Trabalhar com pessoas mais velhas, nos mostrou outro universo de possibilidades. A vivência prática com adulto e idoso além de prazerosa foi também de grande aprendizado. Foi muito interessante poder aplicar alguns dos testes que aprendi em sala de aula, assim como utilizar instrumentos de avaliação específicos em pacientes de verdade, pois a compreensão desses testes e instrumentos ficou mais clara no momento de visualizar como é feito o processo pessoalmente. Gostei muito de poder vivenciar essa prática, em parte por ser um estágio com adultos/ idosos, que sempre foi a área que mais me identifiquei ao longo do curso, mas também pela diversidade do trabalho realizado: tivemos a oportunidade de fazer oficinas, grupos de vivências , muitas conversas acolhedoras tanto para mim como para eles. Não imaginava tantas possibilidades de atuação assim. Essa foi uma das partes que considero mais importantes pra nós;uma melhor percepção, e mais clara, da atuação da terapia ocupacional em UBS e sua importância em tantos campos de atuação.

Análise e reflexiva sobre as atividades realizadas

Depois de terminado o estágio, parei para refletir sobre a vivência desse processo e na importância dela para minha formação. No inicio do estágio tive receio de não dar conta do estágio por ter pouco conhecimento sobre a unidade básica de saúde; reconheço que nunca procurei entender e estudar mais a fundo sobre a importância da atenção básica, até chegar ao campo de estagio.

            Em meio ao estágio tivemos algumas situações que dificultaram o andamento do processo. Acredita-se que o modo como os estágios curriculares são organizados na graduação por ciclos de vida (infância e adolescência e adulto/idoso), acabam gerando uma visão fragmentada do todo. Pois quando atuamos na rede de saúde básica estávamos lidando com famílias inteiras, e não somente pessoas isoladas.

Entendemos que é de suma importância tirar do papel e trazer para prática o que aponta as diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS), estabelecido pela constituição de 1988 que diz que devemos realizar um “atendimento integral, priorizando as atividades preventivas. Nesse mesmo sentido a lei orgânica da saúde (Lei 8080 de 19 de setembro de 1990), aponta a integralidade assistencial como conjunto articulado e contínuo das ações e serviços preventivos e curativos, individuais e coletivos em todos os níveis de complexidade do sistema. No entanto não se trabalha em sala de aula essas questões que mais tarde vão aparecer no estágio. Há de se repensar essas integralidade desde a formação.

Alguns imprevistos acabaram reduzindo os horários de atendimentos, prejudicando tempo dos encontros, pois em um campo onde é de extrema importância o vínculo, tanto com pacientes quanto com a equipe, essa ausência e interrupção acabaram dificultando o andamento das atividades propostas para o estágio.

Além disso, percebemos que o tempo de estágio não é suficiente para atuação em uma unidade básica de saúde, pois envolve o mapeamento do entorno[2]dos assistidos, as questões sociais, os hábitos dos moradores dessa região, e as possibilidade e limites que essas pessoas enfrentam. A partir desse levantamento que vamos traçar os planos e ações para o atendimento das pessoas atendidas na UBS. Diante dessas constatações entendemos que o estágio em Saúde Básica, precisa ser desenvolvido num espaço maior de tempo. Fica claro nesse processo a importância de se passar as orientações e informação para a comunidade de forma correta, pois realmente nem sempre a demanda está “pronta”, e pode ser evitada futuramente, a prevenção é a melhor forma de ajudar os pacientes, pois se bem feita ajuda a melhorar a qualidade de vidas dessas pessoas.

A inserção proporcionou aprendermos um pouco sobre a intervenção na comunidade, conseguimos superar mais essa proposta do estágio, mesmo diante de alguns imprevisto e dificuldades, foi um estágio bastante positivo e agregador tanto na vida profissional quanto na pessoal.  A cada estágio, vamo-nos dando conta de quanto é importante a função de um terapeuta ocupacional, pois o campo de atuação é vasto e quanto mais envolvo-me  com os ofícios da profissão mais aprendendo é percebo o quanto e importante o estágio em diferentes ambientes.

Considerações finais

Após esses três meses de estágio, fica evidente o quanto o terapeuta ocupacional contribuiu para melhorar a qualidade de vida dos usuários do sistema básico de saúde, colhendo informações junto aos pacientes; observando atitudes e comportamentos nas atividades de apoio grupal e apontando pontos fracos e fortes que devem ser reforçados. Nosso trabalho busca compreender as relações dos usuários das USB com família, comunidade e consigo mesmo através de um olhar integral (paciente, família e comunidade), contribuindo para o desenvolvimento humano e comunitário no que tange a assistência básica, favorecendo a efetivação das ações das UBS. Por fim, entende-se que o Terapeuta ocupacional exerce ações positivas na prevenção e promoção da saúde das pessoas nas Unidades Básicas de Saúde. O estágio permitiu perceber que é possível atuar como terapeuta ocupacional no âmbito do serviço público, sendo que esse nos leva ao aperfeiçoamento pessoal e profissional na assistência à Saúde, na Educação e na Assistência Social.

 

Referencial teórico

ALARCAO, I. ; RUA, M. Interdisciplinaridade, estágios clínicos e desenvolvimento de competências. Texto & contexto enfermagem, v.14, n.3, p. 373-382, jul./set., 2005.

BRASIL. Ministério da Saúde. O SUS de A a Z: garantindo saúde nos municípios. Brasília, 2009

BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal; 1988.

BRASIL. Diário Oficial da União. Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990. Dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras providências. Diário Oficial da União. 19 Set 1990.

FERREIRA, Kely Fernanda Leite.  A contribuição de um estudante de pedagogia na construção de painéis sensoriais. Monografia apresentada ao Centro Universitário Católico Salesiano Auxilium – Uni SALESIANO, Lins-SP, para graduação em Pedagogia, 2017.

PINHEIRO, A. M. A importância do estágio, 2008. Disponível em: <http://www.artigonal.com/recursos-humanos-artigos/a-importancia-do-estagio-403435.html>. Acesso em: 17 jun. de 2019.

 

[1]Saúde da família seguindo os eixospropostos pelo Ministério da Saúde envolve: saúde do idoso; criança e adolescente, saúde da mulher, da gestante, saúde do homem, dentre outras.

[2] O entorno se refere, a fazer a construção do mapeamento do bairro, mapeando lugares, espaços de convivência, possibilidades ofertadas à comunidade. Diz respeito a tudo que de uma forma ou de outras faz parte da vida dos assistidos nas UBS. 


[1]Graduanda do curso de Terapia Ocupacional da UFPEL - e-mail: laurabrum.c@gmail.com

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