01/06/2020

Selo não Racista

Por Wolmer Ricardo Tavares – Mestre em Educação e Sociedade, Escritor, Palestrante e Docente– www.wolmer.pro.br

 

            É triste ver um negro defendendo o selo não racista e afirmar que nosso país não tem ideias e atitudes racistas.

            Temos duas possíveis respostas a isso, ou ele é a Alice no seu país das maravilhas ou é uma pessoa totalmente alienada e que está no atual cargo como uma vaquinha de presépio e está pensando apenas no seu pagamento no final do mês a ponto de esquecer de sua origem e da triste história de seu povo, que tanto fez pelo nosso Brasil.

            Obviamente a primeira hipótese está descartada, e com certeza este cidadão ignora totalmente a história e o sofrimento de seu povo, que com sangue, humilhações e até mesmo mortes absurdas, fizeram o Brasil ser o que é.

            Percebam a incoerência dos fatos e a falta de nexo em tal atitude. Uma instituição denominada Fundação dos Palmares, um dos nomes mais icônicos que representou a resistência negra à escravidão, e o líder desta instituição afirma que não existe racismo no Brasil e que isso é apenas uma acusação injusta e criminosa ocasionada por uma esquerda vitimista.

            Tudo em nosso país beira a uma milícia ideológica, na qual defensores querem impor uma verdade que nunca existiu e os fatos verdadeiros são manipulados para que haja uma desconstrução dos mesmos através de fake news com o intuito de que estes caiam em descréditos.

            Não é relevante aqui citar nomes, mas observe que as falas de nossos representantes políticos já demonstram se fazemos ou não parte de um país racista.

            “Não tenho nenhum tipo de preconceito. Na minha secretaria, vou atender negros e gays como se fosse qualquer pessoa normal”. Esta fala foi de alguém que representava a Comissão de Direitos Humanos e Minorias.

            “os negros já estão quase brancos, estão saindo com loira, estão comendo em restaurantes…”, esta foi dita por um vereador do PMDB na câmara do Rio Grande (RS).

            "Meu filho não se casaria com uma negra, porque foi bem educado". Esta foi dita por um Deputado Federal do PP em tal época, hoje ele não é mais deputado federal e a sua última fala foi relacionada a uma comunidade quilombola,  e dizia "O afro descendente nem pra procriador serve mais".

            Esta fala é de uma pessoa que no mínimo deveria defender a igualdade e também e equidade, no entanto ele destila intolerâncias e ódio, a ponto de falar "odeio o termo 'povos indígenas', odeio esse termo. Odeio. O 'povo cigano'. Só tem um povo nesse país. Quer, quer. Não quer, sai de ré".

            Obviamente se o leitor pesquisar falas racistas, irá encontrar muitas outras e isso só reforça que realmente não somos nenhuma Alice e tampouco vivemos no país das maravilhas, todavia, vale lembrar que racismo não se limita apenas a cor da pele ou seja, maior quantidade de melanina, mas a raça, negra ou indígena.

            Para quem não sabe, em uma palestra ministrada por mim e intitulada Lei nº 10.693/03 e o Racismo no Brasil, ressalto uma pesquisa realizada pelo Banco Mundial, em que relata que o Brasil ocupa a 141ª colocação no ranking da igualdade , e está na frente de apenas 13 países.

            Já que nosso país não é racista, como explicar a diferença entre a renda média dos brancos e a renda média dos pretos e pardos é 73,9%[1], ou seja, enquanto uma pessoa branca ocupa um cargo com um salário de R$ 2.796, a mesma função ocupada por um negro ou pardo corresponderá a um salário de R$ 1.608[2], o que reforça a porcentagem acima.

            Por exemplo, você sabia que homicídio de negras é 71% superior à de mulheres brancas e que o homicídio de negros é de duas vezes e meio superior à de não negro? Observe que a população brasileira foi 43,1% classificada como branca.

            Outra curiosidade interessante é que segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral "dentre as 1.626 vagas para deputados distritais, estaduais, federais e senador, apenas 65 foram preenchidas por candidatos que se autodeclaram pretos nas eleições 2018". Eles correspondem apenas  4% dos eleitos neste ano[3].

            Nosso país foi o último da América a acabar com a escravidão e isso foi em 1988, entretanto podemos perceber um ranço de alguns "brancos" quanto a isso.

            É sabido que a discriminação, seja ela racial ou não, demora séculos para ser destruída, e para isso, precisamos da educação, pois segundo Souza, em seu  Introdução a Sociologia da Educação, publicado pela  Autêntica em 2007, uma das mais nobres tarefas da educação está em difundir que não há mais espaço para nenhum tipo de discriminação, como dizia Gabriel Pensador em sua música Racismo é Burrice: "[...] A raiz do meu país era multirracial, Tinha índio, branco, amarelo, preto, Nascemos da mistura, então por que o preconceito? [...]"

            Dito isso, cabe-nos perceber que o Brasil não deixará de ser racista negando ser e nem tampouco distribuindo selos não racistas e jogando culpa em uma esquerda vitimista.

            O Brasil deixará de ser racista por meio de uma educação de qualidade, por uma igualdade nos direitos e uma equidade nas oportunidades, bem como colocando políticos que não tenham pensamentos racistas e tampouco falas infelizes, pois estas falas não precisam de mais nada para demonstrar o quanto é vil este político.

            Para lutar contra o racismo ou por uma minoria qualquer, não precisa fazer parte dela, como por exemplo, não precisa ser negro para lutar contra racismo e tampouco ser homossexual para lutar contra homofobia, basta ser humano.

 

[1] Para mais informações vide https://www.nexojornal.com.br/expresso/2019/11/13/A-desigualdade-racial-do-mercado-de-trabalho-em-6-gr%C3%A1ficos

[2] Para mais informações vide https://www.huffpostbrasil.com/entry/racismo-brasil_br_5dcc3441e4b0a794d1f95417

[3] Para mais informações vide https://g1.globo.com/politica/eleicoes/2018/eleicao-em-numeros/noticia/2018/10/09/apenas-4-dos-candidatos-eleitos-para-cargos-de-senador-e-deputado-estadual-e-federal-sao-pretos.ghtml

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