03/04/2018

Revista Íntima e Pessoal No Ambiente de Trabalho

REVISTA ÍNTIMA E PESSOAL NO AMBIENTE DE TRABALHO

Gizelle Patrícia Arantes

RESUMO

A Constituição Federal em seu art. 5º encontram-se elencados as garantias fundamentais dos indivíduos, dispondo que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito à indenização pelo dano material e moral decorrente de sua violação”. Contudo, o presente trabalho vai buscar preservar a dignidade e a intimidade da pessoa do trabalhador em detrimento do poder diretivo do empregador, quando extrapolado. Contudo, deseja propor parâmetros que garantam o pleno exercício do poder de controle das empresas, sem lesar os direitos da personalidade dos trabalhadores.

Palavras-chaves: Direitos Personalíssimos; Poder de Direção do Empregador; Revista Íntima do Empregado; Assédio Moral; Responsabilidade Civil do Empregador.

INTIMATE AND PERSONAL JOURNAL IN THE WORK ENVIRONMENT

ABSTRACT

The Federal Constitution in its art. 5th, the fundamental guarantees of individuals are listed, stating that "privacy, private life, honor and image of persons are inviolable, and the right to compensation for the material and moral damages resulting from their violation is guaranteed." However, the present work will seek to preserve the dignity and intimacy of the worker's person to the detriment of the directive power of the employer, when extrapolated. However, it wishes to propose parameters that guarantee the full exercise of the power of control of the companies, without harming the rights of the personality of the workers.

Keywords: Personal Rights; Power of Direction of the Employer; Intimate Magazine of the Employee; Moral Harassment; Employer's Civil Liability.

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO; 2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA; 3. REVISTA ÍNTIMA; 4. DOS LIMITES DO PODER DE DIREÇÃO; 5. O DEVER DE INDENIZAR; 6. CONCLUSÃO; REFERÊNCIAS.

1. INTRODUÇÃO

O presente trabalho teve por objetivo tratar da responsabilidade do empregador pelos danos causados aos seus empregados em virtude da ocorrência da revista íntima.

Atualmente a competitividade na esfera trabalhista tem ocasionado mais exigências do capital sobre o trabalho. A busca pelo lucro tem levado as empresas a objetivarem somente seus próprios interesses, expondo seus trabalhadores a precárias condições de trabalho. Muitas das vezes não há um limite pré-estabelecido ao poder diretivo dos empregadores, onde tem a função de controle sobre as atividades do empregado, e dentro dessas funções de controle está o de revistá-lo.

É nesse ponto que se pretende discorrer a respeito da moderação e razoabilidade para que não se evidencie uma ofensa ao direito personalíssimo do empregado. Pois com frequência ocorrem situações em que o empregador, fere a intimidade do empregado, com o fim de monitorar suas atividades e proteger seu patrimônio.

Pretende-se, assim, estabelecer critérios que se destinam a garantir o pleno exercício do poder de controle da atividade empresarial, sem, contudo, invadir a esfera da privacidade do empregado ferindo sua dignidade.

2. EVOLUÇÃO HISTÓRICA

A revista íntima é o meio pelo qual o empregador utiliza como forma de proteger seu patrimônio, revistando o empregado. Ela vem de longa data, e era muito utilizada nas empresas de forma desregrada.

Era muito comum as empresas colocarem em seus contratos cláusulas que previam a revista íntima, quando sendo descumpridas, poderia o empregado ser demitido por justa causa.

Em meados do século XX, a revista íntima ganhou força quando a mídia começou a publicar sobre as denuncias de abuso cometido pelos empregadores, ocasionando várias manifestações em todo o país.

Com a publicação da Lei nº 9.799/99, surgiu disposições legais destinadas a corrigir as distorções que afetasse o acesso da mulher ao mercado de trabalho, vedando ao empregador ou preposto a revista íntima nas empregadas ou funcionárias.

Alice Monteiro de Barros (2009) demonstra que a revista íntima não se restringe ao corpo do empregado, podendo também ser infringida na revista a bolsas, sacolas e a espaços particulares.

Devido às decisões dos tribunais a favor dos empregados que tem sua intimidade violada, se diz respeito condenando os empregadores que extrapolam seu poder diretivo, a prática vem sendo combatida com o pagamento de dano moral como forma de amenizar o abalo moral sofrido.          

3. REVISTA ÍNTIMA

Revista íntima é o meio que o empregador utiliza para proteger seu patrimônio, revistando os empregados, ferindo assim o direito a intimidade.

Tornou-se muito comum as práticas de revistas efetuadas após a jornada de trabalho do empregado, com a intenção de evitar furtos do patrimônio da empresa.

Sabidamente, as revistas corporais e dos pertences de empregados devem ser procedidas com cuidado e discrição, sob pena de violar a honra, a imagem e a privacidade do trabalhador, produzindo emoções negativas como o constrangimento, a angústia e a vergonha, havendo de se enfatizar que a inviolabilidade é assegurada pelo inciso X, do artigo 5º, da Constituição da Federal, o que enseja a indenização por dano moral prevista no inciso V, do mesmo dispositivo legal invocado.

A partir do momento que a revista íntima é feita com moderação e razoabilidade não se evidencia uma ofensa.

Os direitos fundamentais do empregado, como o direito a intimidade, devem ser respeitados, existindo outros direitos que assegura o empregador a exercer seu direito de propriedade, sem que seja abusivo.

Alice Monteiro de Barros (1998) demonstra que em tempos de avanços tecnológicos, o empregador pode valer-se de outros meios para preservar o seu patrimônio sem que viole a intimidade do empregado, colocando, por exemplo, etiquetas magnéticas em livros, podendo em alguns casos fazer a revista, desde que não seja de modo subjetivo, respeitando sempre os direitos personalíssimos. Esse é o grande desafio do empregador, chegar a esses limites, não ferindo um direito personalíssimo.

Dessa forma, o princípio da proporcionalidade é condição necessária para elaborar uma melhoria no tratamento dos empregados nas empresas, de modo a aplicar a norma de forma adequada ao fim necessário, sem excessos e sem desconsiderar o conjunto dos interesses contrapostos.

A maioria dos doutrinadores defende que a revista pode ser feita, desde que de modo moderado. Mas há aqueles que sustentam a teoria de que qualquer tipo de revista corporal ou em pertences fere a intimidade da pessoa, pois em um momento de avanços tecnológicos, há várias medidas que pode ser feito por vários meios de segurança, como, câmeras, sensores eletrônicos, controle de estoque, implantar GPS, chip, dentre outros, sendo essa a tese defendida pelo presente trabalho.

Mônica Neves (2002) respalda que o direito à intimidade é o bem mais limitado que uma pessoa possa ter, condizendo somente a ela própria ou a quem ela consentir em compartilhar.

4. DOS LIMITES DO PODER DE DIREÇÃO

O empregador tem respaldado pela lei o direito de controlar, organizar e fiscalizar suas atividades econômicas.

Nilson de Oliveira Nascimento (2009) demonstra que poder de organização é o meio que o empregador tem para estruturar as tarefas de cada trabalhador, para que sejam alcançadas as finalidades desejadas pela empresa.

Outra forma de fiscalizar que pode ser exercida pelo empregador são as revistas pessoais.

Sérgio Pinto Martins (2011) afirma que podem ser realizadas as revistas pessoais desde que não sejam abusivas.

Quando os empregados descumprirem obrigações do contrato de trabalho, pode o empregador exercer seu poder disciplinar.

O empregador tem um limite de poder, devendo obedecer a alguns princípios constitucionais.

Assim, entende-se que o empregador pode exercer seu poder de direção elencado na lei, mas com razoabilidade para não extrapolar os direitos dos empregados, que são os direitos da sua personalidade e da dignidade humana.

Em relação as revistas íntimas, deve-se buscar uma adequação entre meios e fins, para que nenhumas das partes envolvidas tenham seus direitos constitucionalmente previstos violados.

Maurício Godinho Delgado arremata o tema, limitando o poder de controle do empregador, com a seguinte afirmação:

Todas essas regras e princípios gerais, portanto, criam uma fronteira básica ao exercício das funções fiscalizatórias e de controle no contexto empregatício, colocando na franca ilegalidade medidas que venham agredir ou cercear a liberdade e dignidade da pessoa que trabalha empregaticiamente no país.

5. O DEVER DE INDENIZAR

Antes a doutrina não era uníssona quanto a possibilidade ou não de reparação do dano moral. Hoje, contudo, a doutrina é unânime ao defender a reparabilidade do dano moral, sob a égide do Estado Democrático de Direito.

Num primeiro momento alguns doutrinadores negavam o caráter de ressarcibilidade do dano moral, pois defendiam que este era imensurável. Mas aos poucos foi se percebendo que esta premissa não era verdadeira, já que o ressarcimento do dano moral visa a satisfazer o sofrimento pelo qual o indivíduo passou.

De nada adiantaria ser reconhecida a responsabilidade do agente sem que pudesse ser fixada e exigida uma indenização para recompor o dano causado, bem como para atenuar o mal sofrido e dar exemplo aos demais de como não se deve causar prejuízos a outrem.

A indenização não pode ser maior que o dano, pois isto seria o mesmo que enriquecimento sem justa causa, e nem pode ser inferior, visto que isto seria o mesmo que penalizar a vítima por ter sido lesada.

Deve existir uma proporção entre o dano e a indenização, e não entre este e a conduta. Esta deve ser a premissa maior da reparação do dano, porque podem existir casos em que a conduta do agente é leve, mas as consequências são graves.

A regra jurídica nos diz que todo dano deve ser indenizado de forma proporcional ao prejuízo causado. Todavia, se a conduta do agente não foi grave para causar um dano tão grande, o juiz se utilizando do bom-senso pode reduzir o quanto indenizatório.

Assim é o entendimento jurisprudencial do Tribunal Superior do Trabalho:

 

AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. DANO MORAL -REVISTA ÍNTIMA ABUSIVA -EMPREGADO OBRIGADO A PERMANECER NU - QUANTUM INDENIZATÓRIO (R$ 10.000,00) – DESPROPORCIONALIDADE – MAJORAÇÃO (R$50.000,00) Ante a razoabilidade da tese de violação ao artigo 944 do Código Civil, recomendável o processamento do recurso de revista, para exame da matéria veiculada em suas razões. Agravo provido. Seguindo os critérios da razoabilidade e da proporcionalidade, entendo desproporcional o valor arbitrado a título de indenização moral, considerando a extensão do dano sofrido, já que o reclamante era obrigado a permanecer totalmente nu, frente a frente aos seus pares, sempre que necessitasse sair do prédio. Nesse contexto, entendo que o valor de R$ 10.000,00 não é suficiente para atingir a finalidade da indenização por dano moral, de reparar, ou, ao menos, amenizar o dano sofrido, tampouco de desestimular a reclamada a praticar o ato lesivo à honra e à imagem dos seus empregados. Nessa esteira, com o escopo de proporcionar uma reparação moral calcada nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, entendo que o valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais) é inadequado, devendo ser majorado para R$ 50.000,00 (cinquenta mil reais), valor este suficiente para reparar o prejuízo moral sofrido na hipótese vertente, sem que com isso, se vislumbre enriquecimento ilícito do reclamante ou ônus excessivo à reclamada. Recurso de revista conhecido e provido. AGRAVO DE INSTRUMENTO. Encontrado em: 2ª Turma DEJT 04/12/2015 - 4/12/2015 RECURSO DE REVISTARR 1427007820075010073 (TST) Relator: Renato de Lacerda Paiva.

RECURSO DE REVISTA. INDENIZAÇÃO POR DANO MORAL. REVISTAÍNTIMA. CONDUTA CONSTRANGEDORA CONFIGURADA. REEXAME DE FATOS E PROVAS. Trata-se de hipótese na qual a Corte Regional, valorando fatos e provas, firmou convicção acerca da caracterização da responsabilidade civil subjetiva capaz de ensejar a reparação por danos morais, porque demonstrados, na espécie, os três elementos essenciais à configuração da responsabilidade civil subjetiva, a saber: a) o dano suportado pelo reclamante (constrangimento ocasionado por revista íntima); b) o ato ilícito praticado, consistente em negligência ao proceder à revista íntima; c) o nexo causal entre o ato ilícito praticado e o dano sofrido. Para tanto, registrou o Tribunal de origem que o empregado era obrigado a levantar a camisa e a abaixar a calça até os joelhos, na presença de outros empregados, além do responsável pela revista, causando-lhe humilhação e constrangimento. Nessa linha, a argumentação da reclamada de que não restou caracterizado o ato ilícito se reveste de contornos fático-probatórios, cujo reexame é vedado em recurso de revista pela Súmula nº 126 do TST. Recurso de revista de que não se conhece. Encontrado em: 1ª Turma DEJT 26/06/2015 - 26/6/2015 RECURSO DE REVISTARR 2101003920075180008 (TST) Relator: Walmir Oliveira da Costa.

O dever de indenizar um ato ilícito deve ser exercido para que o empregador compense o ofendido pelo ato faltoso e com essa sanção não volte a infringir novamente os direitos personalíssimos dos trabalhadores. Pesando sempre a necessidade do empregado e as condições financeiras da empresa, para que não seja o valor irrisório e nem cause enriquecimento ilícito, sendo esse o entendimento dos doutrinadores (SANTOS, 1997) e (MARIA HELENA DINIZ, 2008).

 

6. CONCLUSÃO

 

Diante do exposto, a Constituição Federal busca garantir ao trabalhador, um ambiente de trabalho digno e que seja respeitado enquanto ser humano, garantindo a integridade física e mental.

De um lado o empregador pode se sentir no direito de realizar a revista íntima para fiscalizar o patrimônio da empresa, mas do outro lado o empregado tem o direito de privacidade garantido pela Constituição Federal. É nessa balança que a Justiça do Trabalho tem sido desafiada a conciliar o equilíbrio dos limites.

A revista íntima é um dos meios usados para que o empregador proteja seu patrimônio de futuros furtos. Sendo que, essa prática é desnecessária e abusiva, pois em tempos modernos outros meios bastante eficazes cumprem o controle da atividade do trabalhador, como por exemplo, câmeras, sensores, dentre outros.

O empregador não pode fazer com que o trabalhador se submeta a atos abusivos que fira sua intimidade para preservar o seu patrimônio, pois todo o risco da empresa não pode ser transferido para o empregado. O controle deve ser rigoroso em relação aos empregadores, para que fiquem receosos em fazer alguma conduta imoral.

Muitos trabalhadores, com medo de perderem seus empregos, não denunciam a atitude abusiva cometida dentro da empresa, assim, à fiscalização seria o melhor meio para que trabalhadores tenham seus direitos fundamentais garantidos.

Contudo, aquele que infringir direitos fundamentais, deverá ressarcir o empregado, pagando uma indenização pelos danos morais causados ao empregado. Dessa forma, será compensado o dano na proporção da gravidade da ofensa cometida.

Portanto deve se investir em uma rigorosa fiscalização e penalizar quem cometer esses danos, para que os trabalhadores que são a parte hipossuficiente tenha um equilíbrio em relação ao empregador. Assim, a indenização em relação ao dano moral causado, surge para evitar essas condutas abusivas.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

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BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Disponível em: < http://tst.jusbrasil.com.br/jurisprudencia/263984647/recurso-de-revista-rr-1427007820075010073> Acesso em: 27 jul. 2016.

DELGADO, Maurício Godinho. Temas de Direito e Processo do Trabalho. Publicado pela AMATRA III, Livraria Del Rey, 1996.

DINIZ, Maria Helena. Dicionário Jurídico. vol. 2. 3.ed. rev. atual. e aum. São Paulo: Saraiva, 2008, p. 366.

Lei nº 9.799 de 26 de maio de 1999. Insere na Consolidação das Leis do Trabalho regras sobre o acesso da mulher ao mercado de trabalho e dá outras providências. Diário Oficial da República Federativa do Brasil. Brasília, DF, 26 de maio de 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9799.htm. Acesso em: 15 jul. 2016.

LEITE, CARLOS HENRIQUE BEZERRA. CLT Organizada Saraiva. São Paulo: Saraiva, 2015. ISBN 978-85-02-62324-8.

MARTINS, Sergio Pinto. Direito do Trabalho. 12. ed. São Paulo: Atlas, 2011.

NASCIMENTO, Nilson de Oliveira. Manual do Poder Diretivo. São Paulo: LTr, 2009.

SANTOS, Antonio Jeová. Dano moral indenizável. São Paulo: Lejus, 1997, p. 58.

SILVA, Mônica Neves Aguiar da. Honra, Imagem, Vida Privada e Intimidade, em colisão com outros Direitos. Rio de Janeiro: Renovar, 2002. p. 95.

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