07/12/2025

Reuniões de Pais na Escola Contemporânea: Desafios, Possibilidades e Reconfiguração das Relações Educacionais.

Por - Ivan Carlos Zampin: Professor Doutor, Pesquisador, Pedagogo, Graduado em Educação Especial, Docente no Ensino Superior e na Educação Básica, Gestor Escolar, Especialista em Gestão Pública, Especialista em Psicopedagogia Institucional.

Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2342324641763252

A escola, enquanto instituição social historicamente construída, acompanha as transformações da sociedade e, portanto, precisa constantemente revisitar suas práticas, especialmente no que diz respeito à relação com as famílias. Como destacam autores como Tardif (2014) e Libâneo (2013), a educação é um processo coletivo, que depende da cooperação entre escola, família e comunidade. Nesse contexto, compreender a dinâmica das reuniões de pais e a baixa participação familiar constitui tarefa essencial para repensar o papel da escola na contemporaneidade e propor estratégias efetivas de diálogo.

É inegável que a configuração familiar passou por profundas mudanças nas últimas décadas. O aumento significativo de mulheres no mercado de trabalho, muitas delas como responsáveis únicas pelo sustento dos filhos, altera horários, rotinas e possibilidades de participação nas atividades escolares. Para além disso, observa-se uma intensificação das jornadas de trabalho, especialmente nas classes populares, o que reduz ainda mais o tempo disponível para acompanhar a vida escolar dos filhos. Essa realidade confirma reflexões de autores como Szklarz (2015), que reforça a necessidade de considerar as condições socioeconômicas das famílias antes de julgá-las por ausência ou desinteresse.

Entretanto, ainda é recorrente que gestores e docentes atribuam a baixa participação dos pais às “falhas” ou à falta de comprometimento familiar. Esse discurso não apenas ignora os condicionantes sociais, mas também desresponsabiliza a escola de rever suas próprias práticas comunicacionais. Como afirma Freire (1996), uma educação dialógica exige abertura, escuta e humildade; portanto, não é possível responsabilizar unilateralmente a família quando a própria instituição, muitas vezes, não se adapta às demandas reais da comunidade que atende.

As reuniões de pais, nesse sentido, tornam-se um espaço simbólico de tensões e desencontros. Muitos pais afirmam não se sentirem acolhidos, não encontrarem informações claras ou, ainda, percebem uma comunicação centrada na cobrança e no apontamento de falhas. As escolas, por sua vez, reclamam da baixa adesão. Surge assim um ciclo de distanciamento que prejudica diretamente o desenvolvimento dos estudantes, uma vez que a literatura educacional é unânime em afirmar que o envolvimento familiar melhora o rendimento escolar e fortalece os vínculos socioafetivos (OLIVEIRA, 2010).

Para romper esse ciclo, é preciso reformular a lógica das reuniões. Uma estratégia fundamental é flexibilizar horários, alternando turnos e datas, ou, conforme sugerem Moran (2012) e Serra (2012), levantar previamente a disponibilidade dos responsáveis. Essa escuta inicial, por si só, já demonstra respeito e favorece a construção de uma relação horizontal. Além disso, a reunião precisa ser objetiva e cumprir o tempo anunciado, respeitando o cotidiano atribulado das famílias.

Outro aspecto crucial é diferenciar momentos coletivos e individuais. Questões gerais devem ser tratadas em grupo, enquanto problemas específicos do aluno pertencem a um espaço de diálogo reservado. Essa postura ética preserva a privacidade das famílias e evita exposições desnecessárias, fortalecendo a confiança.

Sob a perspectiva psicopedagógica, como apontado por Serra (2012), é fundamental reconhecer que os pais também estão em processo de aprendizagem. Muitos verbalizam que “não sabem o que fazer” diante de comportamentos desafiadores ou dificuldades escolares. A escola, longe de julgar ou culpabilizar, deve funcionar como mediadora, orientando, oferecendo materiais, vídeos, sugestões de rotina e exemplos práticos. Trata-se de transformar a reunião em um espaço realmente formativo, e não apenas informativo.

A integração dessas dimensões amplia o sentido da reunião, tornando-a um momento de construção coletiva de saberes. A apresentação de trabalhos dos alunos, por exemplo, favorece o reconhecimento das conquistas das crianças e adolescentes, aproximando emocionalmente as famílias do cotidiano escolar. Ao mesmo tempo, compartilhar previsões das próximas etapas letivas permite que os pais compreendam melhor os processos pedagógicos e participem mais efetivamente.

Outro ponto relevante é abrir espaço para que os responsáveis possam compartilhar suas percepções, experiências e talentos. Quando a escola escuta de fato, descobre habilidades e conhecimentos presentes na comunidade que podem enriquecer projetos e atividades. Essa troca reforça a perspectiva de educação integral e democrática defendida na BNCC, que enfatiza o protagonismo de todos os sujeitos envolvidos no processo formativo (BRASIL, 2017).

Assim, uma reunião de pais bem planejada e acolhedora pode transformar-se em potente instrumento de diálogo e corresponsabilidade. Ao reconhecer que as famílias mudaram, que suas condições são diversas e que seus saberes são válidos, a escola fortalece laços e constrói um projeto educativo mais justo e humano. Em síntese, repensar as reuniões de pais é, acima de tudo, repensar o próprio modelo de escola. Não se trata apenas de comunicar decisões, mas de estabelecer relações de parceria. Mais do que convocar famílias, é preciso construir com elas. A participação familiar não se conquista por cobrança, mas por vínculo, respeito e reconhecimento mútuo. Uma educação verdadeiramente transformadora exige que escola e família desenvolvam, juntas, um diálogo permanente, crítico e solidário, capaz de acompanhar as rápidas mudanças da sociedade contemporânea.

Referências

BRASIL. Base Nacional Comum Curricular. MEC, 2017.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. Paz e Terra, 1996.

LIBÂNEO, J. C. Didática. Cortez, 2013.

MORAN, J. Educação e tecnologias. Papirus, 2012.

OLIVEIRA, Z. M. R. A relação família-escola. Cortez, 2010.

SERRA, A. Psicopedagogia Institucional. 2012.

SZKLARZ, S. Família, trabalho e escola. 2015.

TARDIF, M. Saberes docentes. Vozes, 2014.

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