22/10/2017

Resenha: Os sofrimentos do jovem Werther

RESENHA: GOETHE, J. W. Os sofrimentos do jovem Werther. Porto Alegre: L&PM. 2016, 192p.

Mateus Morel Fonseca[1]

Mara Lucia Teixeira Brum[2]

           

Em sua primeira carta, Werther conta a seu amigo Guilherme que está partindo, indo à busca de uma herança que está em posse de sua tia. Herança, a qual teria sido motivadora de um desentendimento entre sua mãe e sua tia. Ainda conta uma história de amor interrompida entre ele e uma jovem chamada Leonor, que faleceu, o que lhe causa muita aflição. Na mesma carta, se mostra entusiasmado com as mudanças em sua vida, tanto externas quanto internas, sendo que afirma “nunca mais haverei de, como sempre fiz, beber até a última gota os males que o destino nos reserva”(p15). Mostra-se extasiado com a paisagem e com seus novos hábitos, seu amor pela natureza é demonstrado pelas diversas descrições de paisagens carregadas de adjetivos positivos, sua satisfação com a vida é evidente.  Repentinamente conhece Carlota, pois a caminho de uma festa oferece a esta, carona em sua carruagem a pedido de seu par de danças. Carlota era prometida a Alberto. Werther havia sido alertado sobre o compromisso de Carlota, entretanto, quase que instantaneamente criou um sentimento muito forte pela moça. Ele encontra muitos interesses em comum com ela, incluindo literatura, e enaltece suas qualidades durante o resto do livro.  O personagem desenvolve um carinho especial por Carlota, a ponto de ser devoto a esta. Ele conhece a família dela, incluindo seus irmãos, os quais são criados por ela, já que sua mãe em leito de morte pediu a esta que cuidasse de seus irmãos como se fossem filhos. Logo, também se envolve emocionalmente com as crianças, passando a visita-los com grande frequência. Alberto, o homem ao qual Carlota estava prometida, regressa. Apesar do ciúme, Werther se controla, visto que não há nada que possa ser feito para desfazer esse compromisso selado no leito de morte da mãe de Carlota. Torna-se amigo de Alberto e os três passam dias e noites conversando e passeando com grande harmonia.  Werther confessa que Alberto é um homem bom e honrado; entretanto, eles começam a divergir, dito que são de certa forma opostos, Alberto leva a vida de forma mais prática e objetiva e Werther tende a ser passional, problematizador e entusiasmado. Não obstante, Werther começa a compreender a intensidade de seus sentimentos por Carlota e começa a sofrer por não conseguir amá-la da maneira como idealizava. Resolve partir, aceita um emprego junto ao embaixador e muda-se novamente. Por algum período foca em seu trabalho, se mantém ocupado e distancia-se de seus sofrimentos. Porém, durante um evento da aristocracia, o dono, relutantemente, pede que ele se retire, porque, as outras pessoas estavam se ofendendo com sua presença. Ele ficou imerso em sua frustração e raiva, mas, quando descobriu que toda cidade falava de sua “insolência” resolveu pedir a demissão e tornou para o lugar onde estava anteriormente, junto de Carlota. Ficou cada vez mais evidente seu sofrimento psíquico, sua frustação romântica era o centro de sua vida, o amor não correspondido de Carlota ocupava todo seu tempo. Seguia a visitando como sempre, Carlota já havia se casado com Alberto, e ela via-se sufocada por Werther e em um dia disse que este deveria tornar suas visitas mais esparsas, ele ficou extremamente ofendido. Já estava há muito desgostoso com a vida, sem motivos para vivê-la e sempre fitou a ideia do suicídio, desta forma tomou sua decisão; escreveu sua última carta de despedida e a meia noite suicidou-se com a arma que havia solicitado em empréstimo com Alberto. Ao terminar o livro retornei à primeira carta, a fim de relembrar como tudo havia acontecido, no exato momento que li metade da primeira carta pela segunda vez me deparei com um insight, por muitos motivos e que me levaram a muitas reflexões a cerca da vida de Werther e de nossa realidade. O personagem comenta estar indo para outra cidade a fim de fugir de lembranças (romance interrompido pela morte de Leonor) e sentimentos que ele não conseguia suportar. Esta fuga, a princípio me pareceu irrelevante e até mesmo saudável, entretanto, ao lermos com atenção as paginas subsequentes observamos uma repetição de comportamentos. Podemos citar sua fuga dos sentimentos não recíprocos por Carlota, em que Werther não consegue lidar com o relacionamento dela com Alberto e busca num emprego junto ao embaixador uma forma de não enfrentamento da realidade, ainda quando foi humilhado e tornou-se alvo de comentários maldizentes na cidade, abdicou de seu emprego, fugindo novamente de seu protagonismo em sua própria vida e fugiu novamente, dando as costas a uma oportunidade valiosa de desenvolvimento intrapessoal. Na página 77 elucida esse seu desassossego dizendo a Guilherme: “esse desejo de mudar de situação não virá de uma inquietação íntima e inoportuna que há de me perseguir por toda parte?”.  Ao longo do livro Werther afirma que Carlota demonstra também sentir-se envolvida por sentimentos amorosos mais profundos que amizade, chega a nomear certas ações como insinuantes de uma dita afeição romântica, entretanto, o personagem se encontra em um estágio bastante alarmante de sofrimento psíquico (incluindo pensamentos suicidas, obsessão por Carlota, acometido por uma tristeza permanente, talvez até mesmo uma possível depressão) o que nos leva a indagar se ainda se encontrava em contato com a realidade ou se já estava imerso em sua subjetividade e em seu alterado estado mental culminando em uma realidade psíquica demasiado oposta a o que realmente estaria acontecendo. Particularmente, me chamou atenção uma frase dita por Carlota: “‘Eu era’, prosseguiu ela, ‘uma das mais medrosas. Mas, afetando coragem para a dar aos outros, fiz-me eu mesma corajosa’”. Vemos nela uma grande resiliência frente às dificuldades da vida, pela morte de sua mãe e pela perseguição de Werther. Ainda é evidente sua capacidade de enfrentamento dos obstáculos. Não obstante, chega-me a mente uma ideia, ou melhor, uma hipótese, visto que Carlota mostra-se capaz de enfrentar tantos empecilhos e Werther esquiva-se dos próprios infortúnios, podemos avaliar que este encontra nela peças fundamentais da personalidade, as quais, não possui.  Existe uma projeção nessa relação, o que de certa forma o prende a presença classificada por ele como “perfeita”, “ideal”.  Outras características de sua fala são o egoísmo e egocentrismo, pois, considera-se o mais miserável dos homens, coloca suas dores acima de tudo e se intitula um mártir. O que talvez tenha contribuído para condicionar seu pensamento em torno desta ideia central de ser seu destino o maior dos sofrimentos e tenha culminado com o suicídio, considerado por este um ato de fervorosa paixão.

             

 


[1] Graduando do curso de Psicologia pela Universidade Federal do Rio Grande- FURG. mateusmorelf@gmail.com

[2] Doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Educação da FaE/UFPel, Mestre em educação –UFPEL (2014); Especialista em Psicopedagogia Institucional pela UCB (2005) Especialista em Educação Infantil pela UCB (2004). Graduada em Pedagogia – FURG (1998), professora pesquisadora curso de Pedagogia EAD/UFPel ./ Pedagoga – Universidade Federal do Rio Grande – FURG . e-mail: marabrum@gmail.com

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