01/11/2021

Quando se trata de educação, onde colocar o seu dinheiro?

Há ensino sem aprendizagem?

A partir desta questão é possível iniciar uma reflexão sobre o caminho que a educação no Brasil está trilhando.

Aonde vamos chegar com o ensino plataforma?

Sem dúvida, a inovação e a tecnologia são fundamentais para ajudar as instituições e seus estudantes, para apoiar a aprendizagem, para otimizar os processos. No entanto, não podem ser utilizadas apenas como facilitadoras para a obtenção de títulos vazios, papéis sem significado, em branco, para a obtenção de certificações que não garantam uma formação integral adequada para atuação da pessoa no mercado de trabalho, com o desenvolvimento de competências que resultam em habilidades técnicas e relacionais.

O discurso que é utilizado nas comunicações com o mercado trata, sem nenhuma cerimônia, de um “sistema faculdade”, de Startups que prometem oferecer “soluções” tecnológicas para a formação do aluno no ensino de graduação e pós-graduação; de junções entre Instituições de Educação Superior e empresas de telefonia para constituição de joint-ventures na área da educação.

A partir daí, trata-se de um “ecossistema” de educação de “qualidade” com cursos livre de capacitação, em plataforma digital, com promessa de educação continuada e empregabilidade.

Na base da questão está o objetivo principal de se alcançar a tão desejada “escala” na área da educação, ofertando trilhas personalizadas para expansão do “ecossistema”.

Ofertar ensino escalável é possível. No entanto, escalar a aprendizagem é possível? Considerando que se trata da formação das pessoas e que depende da individualidade de cada uma, esta é uma questão que eu não saberia responder.

E o que é uma educação de qualidade? Quem mediu esta qualidade? Quem garante esta medida sem a participação da aprendizagem nesta equação?

Estas são questões que devem estar presentes nas mentes iludidas dos que compram promessas milagrosas que buscam facilitar a formação, algo que sabemos que não é fácil. Aprender é difícil sempre. Demanda esforço, dedicação, disciplina e outras posturas necessárias para a garantia de um resultado, no mínimo, satisfatório.

 

A garantia da qualidade sempre foi uma grande preocupação no âmbito da educação em todo o mundo. Este é o “primeiro e fundamental compromisso das universidades” (Dias Sobrinho e Goergen, 2006, xl, tradução da autora).

No entanto, definir qualidade é uma tarefa complexa. Quando essa definição se relaciona com a educação superior, a complexidade aumenta, somando-se à complexidade do próprio momento por que passa a educação superior no mundo, em função das mudanças relacionadas à globalização, às tecnologias da informação e comunicação, ao maior interesse pela educação superior e a outros tantos fatores que geram uma grande discussão em torno do papel da universidade e de sua identidade.

A qualidade significa coisas diferentes para pessoas diferentes. No processo educativo, há uma variedade de envolvidos, como estudantes, empregadores, docentes, corpo técnico-administrativo, o próprio governo, agências de financiamento, órgãos acreditadores e avaliadores. Sendo assim, a qualidade, sendo relativa ao usuário do termo e às circunstâncias em que ele é usado, vai significar coisas diferentes para pessoas diferentes. Cada envolvido terá uma perspectiva distinta de qualidade e, também, diversas perspectivas em momentos diferentes. Por esta razão, é bastante difícil definir quais fatores seriam determinantes para garantir a qualidade na educação superior.

O entendimento sobre o que significa qualidade é, muitas vezes, intuitivo. Percebe-se a qualidade, embora não se consiga defini-la. É um conceito escorregadio, fácil de perceber, mas difícil de definir. Como um termo relacionado a valor, é ligada ao que é bom e ao que vale a pena.

Porém, sabe-se que a qualidade vista como capaz de transformar a vida da pessoa, está enraizada na noção de mudança qualitativa, uma mudança da forma. Esta transformação garantida por um processo educativo ocorre em um processo dialético, e não de forma unilateral.

Uma educação de qualidade é aquela que vai mudar o estudante, engrandecendo-o, operando nele uma mudança. Esta é uma abordagem de aprimoramento.

Não há uma definição que possa ser considerada correta ou definitiva. No entanto, especialmente em se tratando de educação, o fato de não se ter a definição do termo não elimina a responsabilidade de buscar a avaliação da qualidade. Na compreensão da dificuldade da definição, pode-se encontrar um caminho para a definição dos padrões mínimos aplicáveis em cada caso, para cada tipo de instituição e para cada sociedade.

Desta forma, é necessário que estes estudantes que buscam esta formação num “sistema faculdade”, mesmo pagando por uma mensalidade pequena, busquem, antes de sua entrada, a definição dos critérios que fazem com que esta seja uma decisão valiosa para ele. A instituição que oferta deve garantir esta “qualidade” que promete e definir claramente que qualidade é esta. Tem qualidade por qual razão? Tem professores qualificados e titulados ou um “educador digital”? Tem atendimentos individualizados ou respostas padrão em que as dúvidas devem se ajustar? Tem tratamento personalizado ou atende-se ao grupo como se fosse uma unidade? Tem infraestrutura para resolução de problemas? O que garante a formação? O que garante que o estudante aprendeu o suficiente? Tem sistema de avaliação da aprendizagem? Tem interação para compreensão dos conteúdos ou apenas tutoriais e materiais bem ilustrados com estímulos neurosensoriais? E o desenvolvimento da capacidade analítica, que todo profissional precisa ter, como será garantido? Deve-se buscar a resposta para todas estas questões.

Assim como não compramos um smartphone sem analisar o que ele nos oferece, não devemos também entrar para uma plataforma de aprendizagem sem verificar o que esta nos oferecerá. O resultado de aprendizagem e transformação acontecer de fato e valer a pena, ou teremos apenas “jogado dinheiro fora”.

Com estes cursos oferecidos na plataforma, teremos aprendido o suficiente para enfrentar uma demanda do mercado de trabalho? Teremos certificados de valor para o mercado? Teremos uma formação capaz de transformar de forma qualitativa nossa vida profissional? Teremos efetivamente aprendido? Terá valido a pena o investimento, mesmo que pequeno? Enfim, a aprendizagem ocorreu, ou apenas o ensino?

O que sobrará para a educação se retirarem dela tudo o que a torna tão especial, como os pais, os professores e os valores?

Sobrará o lucro para poucos e a certeza de uma educação debilitada.

Pensem nisso pois trata-se de colocar o seu suado dinheiro no lugar certo.

 

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