Projetos Pedagógicos como Caminho para uma Aprendizagem Ativa e Emancipatória.
Por - Ivan Carlos Zampin: Professor Doutor, Pesquisador, Pedagogo, Graduado em Educação Especial, Docente no Ensino Superior e na Educação Básica, Gestor Escolar, Especialista em Gestão Pública, Especialista em Psicopedagogia Institucional.
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/2342324641763252
O trabalho por meio de projetos consolidou-se como uma das metodologias mais potentes para a superação de práticas tradicionais e transmissivas no ambiente escolar. Desde os escritos de John Dewey, no início do século XX, a educação baseada na experiência e na investigação tem sido compreendida como condição fundamental para formação de sujeitos críticos e participativos (DEWEY, 1959). Nesse sentido, a pedagogia de projetos não se limita a uma técnica de organização curricular, mas expressa uma concepção de ensino que valoriza a autonomia, a pesquisa e a construção coletiva do conhecimento. Em um cenário educacional marcado por desafios de engajamento, fragmentação curricular e dificuldades de aprendizagem, a adoção de projetos emerge como alternativa coerente com uma escola democrática e dialógica.
Os estudos contemporâneos reforçam que a maior contribuição dessa abordagem está na possibilidade de integrar áreas diversas, ultrapassando a compartimentação disciplinar que ainda persiste em muitos sistemas educacionais (HERNÁNDEZ; VENTURA, 1998). Ao mobilizar saberes variados, os projetos permitem contextualizar conteúdos, aproximando-os das experiências reais dos estudantes. Tal integração proporciona vivências mais significativas, pois rompe com a lógica de memorização isolada e favorece o desenvolvimento de competências complexas, como resolução de problemas, análise crítica e criação de soluções inovadoras.
Outro elemento central é a autonomia intelectual que se constrói quando os estudantes participam ativamente da definição dos problemas a serem investigados. Conforme ressalta Serra (2012), projetos que não emergem da escuta do grupo tendem a não produzir sentido, podendo transformar-se em atividades artificiais que apenas simulam participação. Ao contrário, quando os temas são escolhidos a partir de inquietações reais dos alunos, a aprendizagem se torna processo vivo, motivado por interesses concretos e pela busca de explicações que ultrapassam o nível superficial das tarefas escolares.
A pesquisa, componente essencial dos projetos, costuma ser uma fragilidade recorrente no cotidiano escolar. Muitas práticas se limitam à coleta de informações prontas, frequentemente retiradas da internet, sem análise, síntese ou problematização. A metodologia de projetos, porém, exige que os estudantes aprendam a investigar de modo crítico, ou seja, formular perguntas, levantar hipóteses, selecionar fontes, registrar dados, compará-los e interpretá-los. Essa postura investigativa aproxima a escola da função que Freire (1996) atribui ao ato de estudar, ou seja, transformar a curiosidade ingênua em curiosidade epistemológica. Assim, a pesquisa escolar deixa de ser uma formalidade e torna-se uma ferramenta emancipadora.
O papel do professor nesse processo também precisa ser ressignificado. Não cabe ao docente determinar unilateralmente o tema, tampouco conduzir o projeto como se fosse um roteiro fechado. Sua função é mediar o percurso, ajudar o grupo a formular problemas, orientar os caminhos investigativos, incentivar a colaboração e promover reflexões sobre as descobertas. Essa mediação exige sensibilidade epistemológica e ética, pois envolve equilibrar liberdade e orientação, respeitando a autoria dos alunos sem abrir mão da qualidade acadêmica. Nessa perspectiva, o professor, enquanto mediador, assume papel semelhante ao que Vygotsky (2007) descreve como organizador dos contextos socioculturais de aprendizagem.
A etapa final dos projetos, ou seja, a apresentação dos resultados, constitui momento pedagógico de grande relevância. Ela representa não apenas o encerramento da pesquisa, mas a oportunidade de compartilhar aprendizagens, comunicar descobertas e enfrentar questionamentos do público. Ao apresentar seus trabalhos, os estudantes exercitam argumentação, síntese, responsabilidade coletiva e oralidade, habilidades essenciais para a vida acadêmica e social. A avaliação, portanto, adquire caráter processual e formativo. Não se restringe ao produto final, mas abrange a trajetória de investigação, a colaboração, o desenvolvimento intelectual e o engajamento do grupo ao longo do percurso.
Do ponto de vista psicopedagógico, o trabalho com projetos favorece a aprendizagem significativa porque permite que cada aluno mobilize seu estilo cognitivo e suas potencialidades (FERNÁNDEZ, 1994). Ao trabalhar em equipe e vivenciar desafios compartilhados, abre-se espaço para o desenvolvimento da autoestima, da percepção de competência e da cooperação, aspectos fundamentais na prevenção de dificuldades escolares. Além disso, projetos bem estruturados criam ambientes inclusivos, pois possibilitam que estudantes com ritmos e habilidades distintas participem de modo ativo e produtivo.
Adotar a metodologia de projetos exige compromisso institucional. A escola precisa investir em formação docente contínua, reorganizar tempos e espaços, e desenvolver práticas avaliativas coerentes com a proposta. Uma instituição que valoriza apenas conteúdos fragmentados e provas classificatórias tende a inviabilizar a profundidade investigativa que os projetos requerem. Nesse sentido, Serra (2012) alerta que projetos não podem ser reduzidos a tarefas pontuais ou eventos decorativos, devem, portanto, ser concebidos como prática sistemática que integra currículo, ensino e avaliação.
Deste modo, trabalhar por meio de projetos não é mera escolha metodológica, mas uma postura político-pedagógica alinhada a uma educação crítica, emancipadora e centrada no sujeito. Ao promover autonomia, investigação, interdisciplinaridade e participação, a pedagogia de projetos contribui para superar modelos escolares obsoletos e fortalece o papel da escola como espaço de produção cultural e transformação social. Em um mundo complexo e dinâmico, aprender investigando não é apenas uma necessidade, mas um imperativo ético para formar cidadãos capazes de compreender, questionar e reinventar a realidade.
Referências
DEWEY, J. Experiência e Educação. São Paulo: Nacional, 1959.
FERNÁNDEZ, A. A inteligência aprisionada. Porto Alegre: Artes Médicas, 1994.
FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
HERNÁNDEZ, F.; VENTURA, M. A organização do currículo por projetos de trabalho. Porto Alegre: Artmed, 1998.
SERRA, A. B. Psicopedagogia Institucional: reflexões e práticas. São Paulo: Ática, 2012.
VIGOTSKY, L. S..A formação social da mente: o desenvolvimento dos processos psicológicos superiores. 7. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007.