Por trás das pixações dos banheiros
O que leva alunos a usarem o banheiro da facul como meio de expressão.
Quem já não usou as pixações das portas do banheiro da facul como passatempo enquanto... bem...você sabe. Há frases, no mínimo, estranhas, não? Algumas podem até passar despercebidas, mas outras, "mais picantes", costumam não só prender a atenção como dar asas à sua imaginação, não é mesmo? Afinal, o que cargas d'água leva os estudantes a usarem as portas dos banheiros da facul como espaço de expressão de sua sexualidade, ideologias políticas, religiosas e declarações de amor? E mais: o que querem dizer seus desenhos? Essas indagações motivaram alunos do curso de Letras da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) a ir atrás destes escritos e traduzir seus significados.
Os autores do trabalho, Fernanda Salomão Vilar, Pedro Henrique Cavano Pereira e Tiago Elídio da Silva explicam que o banheiro é um lugar dedicado ao corpo, em sua mais natural condição. Através da produção de grafitos, serve à comunicação humana como um canal de expressão escrita disponível a todos. E foi justamente isso o que foi visto nos banheiros analisados na pesquisa.
Foram analisados textos presentes em banheiros de vários institutos da Unicamp, entre eles: o IEL (Instituto de Estudos da Linguagem), o IFCH (Instituto de Filosofia e Ciências Humanas), o IA (Instituto de Artes), o IE (Instituto de Economia) e a FE (Faculdade de Educação), além dos banheiros da área de Engenharia da Biblioteca Central. Os estudantes, porém, analisaram principalmente os grafitos das portas dos banheiros do IEL e do IFCH, embora tenham utilizado os outros como forma de comparação.
Os textos de banheiro e seus sentidos
No banheiro circulam livremente expressões da sexualidade, políticas e religiosas. Em todos eles foram encontradas mensagens consideradas obscenas, ligadas ao corpo, tanto sexuais quanto escatológicas. Segundo os estudantes, não há pudores, tudo pode ser dito, e isso ocorre por não haver assinatura. Ao se converter em autor, o sujeito da enunciação sofre um apagamento no discurso, dividindo-se em diversas posições-sujeito; ou seja, o autor é que assume a função social de organizar e assinar uma determinada produção escrita.
Outra constatação foi que na maioria dos grafites, apesar de seu estilo assertivo, escassamente modal, e do aparente distanciamento que confere o anonimato, surgem freqüentemente marcas do emissor, de maneira que este antecipa os sentidos produzidos do lugar do destinatário, assim o texto refere quase totalmente ao enunciador. Isto é: os textos fazem referência a atributos de seu autor. Já o trecho: "engenheiros venham ser nossos escragiários. Assinado: IE" - extraído do banheiro masculino da BAE, de acordo com o estudo dos jovens, por ter assinatura coletiva pode ser interpretado como marca de discurso comum, se não, ao contrário, como meio de ocultação da individualidade produtora do texto, amparada em uma autoria coletiva.
Em sua maioria, os textos que aparecem nos banheiros do IEL são de cunho sexuais e funcionam como anúncio, descrevem os jovens em seu trabalho. Já, no banheiro feminino do IFCH foram encontradas mensagens escatológicas, políticas e de repúdio ao instituto: "Essa porta resume meu nojo pelo IFCH". No masculino existem reflexões como: "Mudar o mundo? Eu? O máximo que posso fazer é estudá-lo um pouco".
Os alunos acreditam que, pelo fato de nossa sociedade considerar tais assuntos tabus, o banheiro funciona como uma válvula de escape, onde ocorre a transgressão, a ruptura, e as pessoas se libertam. Por isso, ele se torna um veículo de expressão pessoal e um mural de garantida audiência. Os grafitos, como são chamados os escritos dos banheiros, são formulados de acordo com padrão escolar, formatado, com linhas imaginárias, onde se nota um começo e um fim. São geralmente em formato retangular, possuem margem e ninguém interfere na mensagem do outro.