15/10/2021

Onde estão os Mestres ?

Há muito tempo, em um país distante, as crianças estudavam filosofia.
Quando o professor entrava na sala, elas se levantavam em sinal de respeito.
Lembro-me ainda, como num sonho: Às vezes, em visita à casa de alguns deles, eu os encontrava envoltos em livros, cercados por intermináveis prateleiras, onde se acumulavam tratados e enciclopédias.

Eram pessoas admiráveis, e eu passava horas ouvindo-os falar sobre as ciências naturais, sobre os movimentos tectônicos que formaram os vales e as montanhas, sobre a escalada do gelo em eras glaciais, sobre o céu, as estrelas e o interminável fogo do centro da Terra.

Para os olhos de uma criança, eles pareciam mesmo seres sobrenaturais. Não existiam os computadores e nem as multimídias. E, sem poder ver imagens em animação, eu as animava em minha mente, livres de sua forma real, mas construídas em sonho - estes, assim como o tempo um multiplicador de espaços, onde sempre navegavam as lembranças dos mestres.

Hoje eu me pergunto: Onde estarão estes mestres ? O que fizemos com eles ? Onde estão as bibliotecas, o respeito, o encantamento, a filosofia ?
O pensar parece esquecido. Tudo vem aos nossos olhos de forma concreta, mesmo que virtual, um mundo terminado, sem interferência do cérebro, este órgão já cansado e preconceituoso, cheio de formas definidas e sem encantamento.

Pouco a pouco nos foi tirada a liberdade de pensar, de imaginar, de criar, livres de angústias e sobressaltos. Em estrondosa velocidade, acumulam-se informações, que não conseguimos mais transformá-las em conhecimento.
Somos seres do adjetivo. Não sabemos mais o valor real das coisas, vivendo numa sociedade consumista, somos obrigados a providências que não nos satisfazem e somos mesmo consumidos por uma espécie de cultura universal, já sem dono e sem controle.

É preciso resgatar os mestres, trazer-lhes de novo a dignidade, dar-lhes a oportunidade de produzir o conhecimento, livres das interferências do dia a dia, para que possam ser serenos, com um pouco de investimento eles podem transformar tudo. E, então, mostrar às nossas crianças o mundo real, se puderem ter a chance de nortear olhares distantes, no brilho das pupilas, na sensação de um afago, nos códigos de giz dos quadros, da vida possível, do amor do mestre em um cumprimento, logo na entrada: que sejam bem-vindos, que sejam felizes, que continuem sonhando.

Isto realmente faria a diferença.

 

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