Obrigatoriedade
Por Wolmer Ricardo Tavares – Mestre em Educação e Sociedade, Escritor, Palestrante, Articulista, Colunista, Docente, Consultor de Projetos Educacionais e Gestão do Conhecimento na Educação – www.wolmer.pro.br
Interessante perceber a obrigatoriedade das escolas em fazer os alunos cantarem o Hino Nacional e dos gestores em filmar este "momento cívico" e encaminharem as filmagem para o órgão competente. Esta imposição se originou do então Ministro da Educação Ricardo Vélez Rodríguez que recuou destas imposições e se desculpou.
O Hino realmente é importante para desenvolver no aluno o amor pela pátria, o conhecido patriotismo. Não aquele patriotismo mostrado somente em época de copa, mas aquele que se entranha em nosso ser e nos faz ter amor pelo país e a darmos o nosso melhor para o seu progresso.
Apesar do argumento do Ministro que isso era para chegarmos a uma educação de qualidade, cabe aqui alguns questionamentos: o ato de cantar o Hino faz a educação ser melhor e desenvolve o civismo de nossos alunos? Outra pergunta que retrata realmente a realidade de nossa educação: Será que nossos alunos sabem tanto cantar como interpretar as palavras rebuscadas contidas nele?
Quantas são as pessoas que conseguem cantar realmente o hino nacional sem erro algum? Lembrem-se que cantar é diferente de acompanhar! De acordo com uma pesquisa divulgada pelo Portal Terra, 58,4% dos brasileiros não sabem cantar o hino nacional, e isso é um fato.
As pessoas pararam para perceber que em sua letra encontra-se a omissão de muitos governos? Percebamos alguns detalhes: "o sol da Liberdade, em raios fúlgidos"; Quais liberdades? Que fulgor é este? Sem a intenção de sermos irônicos, mas o fulgor da liberdade está para os corruptos, em especial do "lava-jato" e outros escândalos e também para os executivos das empresas que colocam a vida dos funcionários em segundo plano, pois primeiro estará sempre o lucro exacerbado.
"Brasil, um sonho intenso, um raio vívido, De amor e de esperança", realmente esperança é a palavra que os brasileiros acreditam sempre, mas é apenas uma esperança de esperar, aquela mesma contida na caixa de pandora e relatada por Nietzsche e contida em meu livro A Caixa de Pandora por uma Educação Ativa, publicado pela Ícone editora em 2010. Para Nietzsche, quando Pandora não se conteve e abriu a caixa que os deuses haviam dado de presente denominada a caixa da felicidade, ela se chamava felicidade porque todos os males que eram seres vivos com asas estavam ali presos.
Ao abrir tal caixa, todos os males escaparam exceto a esperança, e Pandora fechou a caixa por vontade de Zeus, prendendo a esperança. Uma curiosidade é que a caixa traz o mesmo fascínio de outrora, e faz com que os homens pensem nas maravilhas do tesouro que podem estar contido na tal caixa da felicidade.
Assim, o homem pensa que a esperança é a maior das felicidades, mas para Nietzsche ela e o pior dos males justamente por prolongar o tormento de todos nós, pois ela nos faz esperar, esperar que as coisas melhoram. Nos faz sermos passivos e sem senso crítico.
"E o teu futuro espelha essa grandeza". Será mesmo que o futuro do povo brasileiro espelha tal grandeza, mesmo com esta imposição da reforma previdenciária em que teremos que trabalhar até 65 anos e com 40 anos de contribuição? Porque esta falta de humanidade, palavra usada por nosso presidente em época de campanha e hoje ignorada com a tal reforma?
"Dos filhos deste solo és mãe gentil". Infelizmente nosso país está se transformando em uma madrasta de dar inveja a de Branca de Neve e da Cinderela.
"Se o penhor dessa igualdade". Igualdade é uma palavra que só existe em nosso país nos dicionários. Ela é uma palavra não aplicável, pois estatísticas mostram diferenças gritantes entre negros x brancos, homens x mulheres, pobres x ricos, periferias x centros sem contar com privilégios que uma minoria usufrui que o povo sequer poderá mensurar.
"Mas, se ergues da justiça a clava forte". Realmente a clava é forte apenas para os menos favorecidos, fazendo jus as palavras de Maquiavel quando dizia "aos amigos os favores, aos inimigos a lei" e no Brasil, os rigores da lei.
Observe então que na própria letra do hino deixa muito a desejar, mas isso não o faz menos importante em ser trabalhado com nossos alunos, mas não em só cantá-lo, mas em interpretá-lo e fazer efetivar o que consta nesta letra escrita por Joaquim Osório Duque Estrada (1870 – 1927).
Para tentarmos equacionar realmente a educação de qualidade e aproveitando as imposições, já que a intenção é válida, pois tudo que puxa para uma educação de qualidade terá total apoio dos docentes desde que se defina o que é educação de qualidade e segundo quem.
Ciente que o ministro tem bem definido o que é uma educação de qualidade, tanto que ele é a pessoa que ocupa o posto mais importante da educação, porque não aproveita todo este empoderamento e faça a obrigatoriedade também dos pais em serem mais presentes nas escolas participando efetivamente do processo ensino/aprendizagem de seus filhos, isto porque de acordo com a Agência Brasil, apenas 12% dos pais são comprometidos com a educação dos filhos e que 19% dos pais de estudantes são considerados distantes do ambiente escolar e da própria relação com os filhos[1].
De acordo com a mesma pesquisa, a coordenadora geral de Todos pela Educação, Alejandra Meraz Velasco, salienta que a participação dos pais é fundamental para o desempenho escolar da criança.
Outro item a ser considerado, é infraestrutura das escolas. Deveria ser obrigatório as escolas terem uma estrutura física mínima para educação de qualidade que seria uma sala de multimeios, biblioteca, laboratório de informática sem computadores sucateados e/ou obsoletos, laboratórios (ciências, física, química, dentre outros quando a instituição necessitar) sala recurso, auditório; uma equipe de profissionais sempre capacitados (psicólogos, psicopedagogos, fonoaudiólogos, professores, pedagogos, assistentes sociais, cuidadores, dentre outros que fazem parte de uma instituição educacional),
A obrigatoriedade também está em exigir respeito ao corpo docente tanto por parte dos administradores, quanto dos pais e alunos. Em relação a parte administrativa, existe lugar que a folha de pagamento do professor encontra-se além de defasada, totalmente atrasada, ou seja, o professor já ganha mal e as vezes, nem recebe o seu salário para que possa ter dignidade e andar na rua de cabeça erguida.
São várias coisas que nosso ministro poderia fazer para que realmente a educação dê um bom salto, entretanto, enquanto ele não sair deste país das maravilhas em que atua e perceber a realidade das escolas públicas brasileiras, nossos alunos talvez até decorem o hino, mas sequer saberão interpretá-lo e o penhor dessa igualdade será para muitos o penhor dessa desigualdade.