O uso da tecnologia na educação infantil: desafios e oportunidades

Denilsa Vicente da Silva Araujo
Licenciatura em Pedagogia. Especialista em Psicopedagogia e Educação Infantil. Primavera do Leste, MT.
Elizandra Bravo
Licenciatura em Pedagogia. Especialista em Docencia da Educação Infantil e dos Anos Iniciais. Primavera do Leste, MT.
Raquel Bernardo Costa
Licenciatura em Pedagogia. Especialista em Psicopedagogia e Educação Infantil. Primavera do Leste, MT.
Cirlei Alves Borges
Licenciatura plena em Pedagogia. Especialista em Contação de Historia e Musicalização na Educação Infantil. Primavera do Leste, MT.
Maria Regina Gomes Moreira Duque
Licenciatura plena em Pedagogia. Especialista em Autismo. Primavera do Leste, MT.
O avanço das tecnologias digitais nas últimas décadas transformou significativamente as práticas pedagógicas em todos os níveis de ensino, inclusive na educação infantil. Tablets, computadores, aplicativos educativos e recursos de realidade aumentada e virtual têm sido incorporados aos ambientes escolares, proporcionando novas formas de interação, aprendizagem e desenvolvimento das crianças. No entanto, o uso da tecnologia nesse segmento da educação suscita tanto oportunidades quanto desafios que precisam ser cuidadosamente considerados por educadores, famílias e formuladores de políticas públicas.
Um dos principais benefícios do uso da tecnologia na educação infantil é a ampliação das possibilidades de aprendizagem. De acordo com Papert (1980), pioneiro no uso da tecnologia na educação, ambientes digitais podem estimular o pensamento criativo, a resolução de problemas e o desenvolvimento cognitivo, desde que utilizados de forma adequada. Softwares educativos e jogos interativos, por exemplo, podem favorecer o desenvolvimento de habilidades importantes como alfabetização, raciocínio lógico e coordenação motora.
Além disso, a tecnologia pode proporcionar personalização do ensino, adaptando o ritmo e o nível de dificuldade das atividades às necessidades individuais das crianças (Almeida & Valente, 2011). Isso é especialmente importante na educação infantil, onde as diferenças no desenvolvimento cognitivo e emocional são marcantes. Plataformas digitais podem oferecer feedbacks imediatos e variados estímulos sensoriais, contribuindo para manter o interesse e a motivação das crianças.
Outro aspecto positivo é a possibilidade de ampliação do repertório cultural e social das crianças. Através da internet e de recursos multimídia, é possível explorar conteúdos diversos, conhecer culturas, histórias e ambientes distantes, estimulando a curiosidade e a construção de uma visão de mundo mais ampla e crítica (Morán, 2015).
Além disso, em contextos de ensino remoto ou híbrido, como ocorreu durante a pandemia de COVID-19, a tecnologia desempenhou papel fundamental para manter o vínculo educacional e afetivo entre professores e alunos, demonstrando sua importância como ferramenta de continuidade pedagógica em situações emergenciais (UNESCO, 2020).
Apesar dos benefícios, o uso da tecnologia na educação infantil envolve importantes desafios. O primeiro deles diz respeito à adequação do conteúdo. A oferta de aplicativos e jogos educativos é vasta, mas nem todos são desenvolvidos com critérios pedagógicos adequados. Muitos produtos priorizam o entretenimento em detrimento do conteúdo educativo, podendo induzir a um consumo passivo e acrítico da informação (Barreto & Valente, 2014).
Outro desafio relevante refere-se ao excesso de exposição às telas. A Organização Mundial da Saúde (OMS, 2019) recomenda que crianças de 2 a 5 anos não ultrapassem uma hora diária de tempo de tela, sempre com supervisão de um adulto. Estudos indicam que a exposição excessiva pode prejudicar o desenvolvimento da linguagem, a qualidade do sono, e aumentar o risco de obesidade infantil (Christakis, 2019). Assim, o uso da tecnologia na educação infantil precisa ser equilibrado, com critérios que priorizem a saúde física e emocional da criança.
O papel do professor também é um aspecto crítico nesse contexto. A formação docente muitas vezes não contempla, de maneira suficiente, as competências necessárias para o uso pedagógico das tecnologias digitais na educação infantil (Almeida & Valente, 2011). Sem a devida capacitação, há o risco de que a tecnologia seja utilizada de forma superficial ou ineficaz, não explorando seu potencial transformador.
Outro desafio diz respeito à desigualdade de acesso. Em muitos contextos, sobretudo em países em desenvolvimento, o acesso a dispositivos digitais e à internet ainda é precário ou inexistente, o que agrava as desigualdades educacionais (UNESCO, 2021). Assim, a inserção da tecnologia na educação infantil deve ser acompanhada de políticas públicas que promovam a inclusão digital e garantam o direito de todas as crianças a uma educação de qualidade.
Um aspecto central para potencializar as oportunidades e minimizar os riscos do uso da tecnologia na educação infantil é a mediação pedagógica. A tecnologia, por si só, não garante aprendizagem ou desenvolvimento; ela precisa ser integrada de maneira planejada ao projeto pedagógico, respeitando as especificidades da infância, como o brincar, a experimentação e a socialização.
De acordo com Piaget (1971), o desenvolvimento infantil ocorre por meio da interação ativa com o meio. Assim, a tecnologia deve ser um recurso que amplia as possibilidades dessa interação, e não um substituto das experiências concretas. Por exemplo, o uso de aplicativos que estimulem a resolução de problemas pode ser associado a atividades práticas e lúdicas, promovendo uma aprendizagem mais significativa.
A participação das famílias também é fundamental nesse processo. A escola precisa estabelecer um diálogo com os responsáveis, orientando sobre o uso seguro, equilibrado e pedagógico da tecnologia em casa, reforçando a importância de outras atividades fundamentais para o desenvolvimento infantil, como o brincar livre, a leitura e a convivência familiar.
Considerações finais
O uso da tecnologia na educação infantil apresenta um panorama complexo, que envolve potenciais significativos de inovação pedagógica, mas também riscos que não podem ser negligenciados. O caminho para uma inserção positiva das tecnologias digitais na educação das crianças pequenas passa pela formação qualificada dos professores, pelo desenvolvimento de conteúdos pedagógicos adequados, pelo estabelecimento de limites saudáveis de uso e pela garantia do acesso universal às tecnologias.
Como destaca Morán (2015), a tecnologia é uma poderosa aliada da educação, mas sua eficácia depende da intencionalidade pedagógica com que é utilizada. Na educação infantil, essa intencionalidade deve estar alinhada aos princípios do desenvolvimento integral da criança, garantindo que as experiências digitais complementem e enriqueçam as vivências presenciais, favorecendo uma formação mais completa, crítica e cidadã.
Referências
- Almeida, M. E. B., & Valente, J. A. (2011). Tecnologia e formação de professores. São Paulo: Papirus.
- Barreto, E. S. S., & Valente, J. A. (2014). Educação a distância: possibilidades e desafios. Campinas: Papirus.
- Christakis, D. A. (2019). The challenges of defining and studying “digital addiction” in children. JAMA, 321(23), 2277-2278.
- Morán, J. M. (2015). Metodologias ativas para uma educação inovadora. Campinas: Papirus.
- Organização Mundial da Saúde (OMS). (2019). Diretrizes sobre atividade física, comportamento sedentário e sono para crianças menores de 5 anos.
- Papert, S. (1980). Mindstorms: Children, Computers, and Powerful Ideas. New York: Basic Books.
- Piaget, J. (1971). A psicologia da criança. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil.
- UNESCO. (2020). Education in a post-COVID world: Nine ideas for public action.
- UNESCO. (2021). Global Education Monitoring Report 2021.