26/12/2017

O JUIZO MORAL DA CRIANÇA: NA OBRA DE JEAN PIAGET

Por Ivan Carlos Zampin – Professor Doutor, Docente no Ensino Superior, Ensino Fundamental, Médio e Gestor Escolar.

            Em seu livro “O Juízo Moral da Criança”, 1994, Jean Piaget faz correspondência aos estágios do desenvolvimento moral a um acréscimo qualitativo em relação ao estágio anterior, como um processo a níveis mais ordenados do conhecimento moral. Esses fatores são densamente influenciados ao ambiente vivenciado pelo indivíduo no decorrer de sua vida, auxiliando-o no desenvolvimento afetivo, intelectual e social, num processo de construção do seu próprio conhecimento.

Piaget vai defender, e provar, é que, longe de a moralidade infantil resumir-se a uma interiorização passiva de valores, dos princípios e das regras, ela é o produto de construções endógenas, ou seja, o produto de uma atividade da criança que, em contato com o meio social, re-significa os valores, os princípios e as regras que lhe são apresentadas. Tal re-significação possui características que dependem de estruturas mentais já construídas (DE LA TAILLE, 2006, p. 96).

 

            A fase em que se individualiza a anomia distingue-se por ser formada por crianças ainda pequenas, iniciando-se a partir do seu nascimento até mais ou menos 5 anos de idade, com foco na fase em que a consciência da criança é desprovida de regras. Nesta etapa, o “egocentrismo” infantil também faz parte do processo de desenvolvimento. As regras então são obedecidas por força do hábito. As crianças não conseguem nessa etapa de vida separar o certo do errado e agem em benefício as suas próprias necessidades. Retratando este enfoque, Piaget (1999, p.20) constata que:

No ponto de partida da evolução mental, não existe, certamente, nenhuma diferenciação entre o eu e o mundo exterior, isto é, as impressões vividas e percebidas não são relacionadas nem à consciência pessoal sentida como “eu”, nem a objetos concebidos como exteriores [...].

 

            Vagarosamente, a criança percebe que há coisas que não pode fazer, acontecendo a descentração e o amadurecimento em relação aos acontecimentos e ações, transformando a anomia em heteronomia. A fase heterônoma tem como principal feição, a obediência em respeito à autoridade, destacando o adulto e sua maneira de impor as regras e o estabelecimento de normas. Nesta etapa, não há consciência e nem mesmo reflexão sobre os seus próprios atos. Na ausência da autoridade, pode ocasionar a indisciplina novamente. Esta fase também é chamada como “a moral da obediência”.

            Nesse sentido, Vinha (2000), ressalta que a moral heterônoma é resultado da coação do adulto sobre a criança, ocorrendo então o respeito unilateral. Seguindo as regras por medo de punição ou de perder o amor pela autoridade. Com os relacionamentos e interações, o sujeito se desenvolve e tende a resultar em uma consciência um pouco mais autônoma.

            Para De La Taille (1992) a criança heterônoma não assimilou ainda o sentido da existência de regras: não as concebe como necessárias para regular e harmonizar as ações de um grupo de jogadores e por isso não as segue à risca; e justamente por não as conceber desta forma, atribui-lhes uma origem universalmente estranha, às atividades e aos membros do grupo.

            Na última fase do desenvolvimento moral, chamada de autonomia, que tem seu início ente os 9 e 10 anos de idade, o individuo alcança a consciência moral, autenticando suas ações e sentimentos de acordo com princípios éticos e morais, interiorizando e matutando sobre o que foi recebido dos adultos. Entendendo então as consequências de seus atos.

Em contraponto à heteronomia há a autonomia. Nela, os atores levam em consideração a influência de suas ações sobre outras pessoas que serão afetadas por seus atos (MAGALHÃES, 2005, p.05).

 

            De La Taille (2006), retrata que somente é moral quem de fato o quer. Para de fato, ser uma ação moral, o sujeito deve agir corretamente pelo que sabe e quer de fato fazer acontecer. A observação relatada pelas pesquisas realizadas por Piaget (1999) destaca o comportamento das crianças no decorrer de jogos nas categorias com regras e coletivos, diagnosticando que o sujeito participa de todo o processo, com papel ativo na própria construção de valores e normas de conduta.

            Segundo De La Taille (1992) a educação moral não deve se restringir a uma aula específica, mas estar interligada durante toda a rotina escolar. E declara que o desenvolvimento moral da criança depende de todos: adultos, pais, e também dos professores envolvidos durante a ação.

            As regras garantem a harmonia do ambiente social. E o respeito a cada uma delas se dá a partir do momento em que o sujeito entende seus princípios. A partir das relações e ações entre adultos e crianças e as interações entre pares é que brotam questões que norteiam o trabalho com regras, colaborando com o processo do desenvolvimento moral.

            Dentre os conceitos abrangentes, Piaget (1994) descreve que as crianças têm influências dos adultos diretamente desde pequenas, sendo, portanto estimuladas por convívio a várias disciplinas, não possuindo entendimento a respeito das regras, necessitando assim, do ponto de vista e das ideias e referências do adulto em questão.

            De acordo com Piaget (1977) a fonte da moralidade infantil é dupla. De um lado, estão as normas dos adultos, as quais a criança acaba cumprindo por respeito à autoridade e não por compreendê-las. Com o tempo, essas normas são ajuizadas, evidenciando-se a dúvida. De outro lado, as crianças agem utilizando-se de regras a fim de resolver seus próprios conflitos, com os iguais, por meio da interação.

            Vinha (2000, p.38), esclarece que: “A ação humana é orientada por valores e princípios que representam um julgamento. O desenvolvimento dos sentimentos, crenças, valores e princípios é o que chamamos de desenvolvimento moral”. O ser humano é de fato vinculado a regras estabelecidas, valores que correspondem ao bem viver. A conceitualização de moralidade, pelas ações do sujeito e também sobre a maneira de julgamento que estabelece está relacionada às suas próprias ações e as ações das outras pessoas, onde o ponto principal é a reflexão.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

LA TAILLE, Yves de. Desenvolvimento do juízo moral e afetividade na teoria de Jean Piaget. In: LA TAILLE, Yves de; OLIVEIRA, Marta Kohl de; DANTAS, Heloysa. (Org.). Piaget, Vygotsky, Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo: Summus, 1992.

LA TAILLE, Yves. Entrevista com Yves de La Taille. Cadernos de Pesquisa, n. 114, p. 89-119, novembro, 2001.

MAGALHÃES, Josiane. Estudo sobre a fidelidade à palavra empenhada: a constituição moral de crianças e adolescentes da rede pública e privada de ensino fundamental na cidade de Cáceres MT. Maringá/PR, dez.de2004 Disponível em:

http://www.urutagua.uem.br/008/08edu_magalhaes.htm .  Acesso em 25 dez. 17

PIAGET, Jean. O juízo moral na criança. São Paulo: Summus, 1994.

 ____________. O julgamento moral na criança. São Paulo: Mestre Jon, 1977.

____________. Seis estudos da psicologia. 24. ed., Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999.

____________. Para onde vai a educação? 18. ed., Rio de Janeiro: José Olympio, 2007.

VINHA, T. P.O educador e a moralidade infantil:uma visão construtivista. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2000.

Assine

Assine gratuitamente nossa revista e receba por email as novidades semanais.

×
Assine

Está com alguma dúvida? Quer fazer alguma sugestão para nós? Então, fale conosco pelo formulário abaixo.

×