22/06/2005

O gerúndio virou moda

Por Diego Amorin

O uso excessivo de expressões que indicam continuidade divide opiniões de especialistas, que divergem sobre sua correção.

Cada vez mais comum, especialmente entre recepcionistas, secretários e atendentes de telemarketing, o uso do gerúndio tornou-se polêmica nacional. Expressões como “vou estar encaminhando seu pedido” e “vou estar transferindo sua ligação” são muito usadas e especialistas não entram em acordo sobre sua correção ou não. A forma verbal, no entanto, existe e é legítima. O tema foi discutido no seminário E os Falantes Descobriram que o Português é uma Língua de Gerúndios, realizado na tarde de sexta-feira, 17 de junho, pelo Departamento de Lingüística, Línguas Clássicas e Vernácula (LIV) do Instituto de Letras (IL) da Universidade de Brasília (UnB).

A doutora em Lingüística pela Universidade de Paris VII e professora da Universidade Federal do Paraná (UFPR), Odete da Silva Menon, decidiu dedicar-se ao estudo do gerúndio depois que começou a receber, pela Internet, textos com duras críticas ao uso da forma verbal. Um dos argumentos que logo provocou estranhamento na professora foi o de que o gerúndio não existe no português de Portugal. “Basta abrir, atualmente, qualquer obra editada no país para conferir o uso do gerúndio. O gerúndio é uma construção portuguesa que não pode ser desconsiderada”, afirma.

CONTRA O ABUSO – Na Internet, são vários os sites e blogs que condenam o “gerundismo”, expressão surgida para definir a mania de usar o gerúndio. No orkut (portal de relacionamento da rede), diversas comunidades também levantam a bandeira contra o uso excessivo da forma verbal. Mas, para Odete, o gerúndio em si não tem nada a ver com essa discussão. “O que dá a sensação do uso abusivo do gerúndio é o fato de estarmos utilizando mais o tempo futuro”, defende. “É a freqüência do uso que causa estranhamento”, aposta a pesquisadora

A jornalista e escritora Dad Squarisi, por sua vez, acredita que o gerúndio esteja substituindo o futuro. E, segundo ela, existem apenas duas formas de futuro: o futuro simples (por exemplo: “mandarei”) e o composto (“vou mandar”). A forma “vou estar mandando” é equivocada. “A construção virou moda, mas o gerúndio não indica futuro”, diz. Para Dad, a propagação dessas construções se deve a uma tradução malfeita da estrutura do inglês "will be + gerúndio".

ORIGEM – Já Odete não crê que as construções sejam fruto de um decalque do inglês. De acordo com ela, para que a língua inglesa provocasse esse tipo de interferência na língua portuguesa seria necessário que o falante tivesse conhecimento dos dois idiomas. “No nível vocabular, a influência do inglês é comum, mas quando se trata de estruturas sintáticas e morfológicas não é algo tão simples assim. Pode ser apenas uma coincidência”, ressalta.

Independentemente da origem dessas construções, a professora do LIV Enilde Faulstich defende que não há necessidade de utilizá-las, pois são longas e imprecisas. “Quanto mais se coloca um verbo ao lado do outro, mais confusa fica a mensagem”, diz. Para ela, essas expressões se transformaram em uma espécie de código específico da área de recursos humanos das empresas. “O gerúndio dá noção de que a coisa vai ser feita em um futuro próximo, mas, na verdade, quando escutamos essas construções não sabemos quando a ação será realizada nem mesmo quem será o sujeito dela”, explica.

O professor do LIV Marcos Bagno diz que as críticas ao gerúndio são infundadas e que, na maioria das vezes, elas estão relacionadas ao gosto pessoal de quem critica. “As pessoas acusam com explicações tiradas do próprio bolso, sem nenhuma pesquisa prévia ou base teórica”, afirma. O estudante do 6º semestre de Letras Carlos Felipe Wanderley, 23 anos, concorda e considera que, pelo menos na língua falada, o gerúndio não deve ser considerado uma ferramenta condenável.

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