O Estado e a promiscuidade entre o público e o privado na história da educação brasileira: por Dermeval Saviani

O Estado e a promiscuidade entre o público e o privado na história da educação brasileira: por Dermeval Saviani
Gabriel dos Santos Kehler[1]
Resumo
Esta síntese, sob abordagem histórica, debruça-se na/sobre a discussão suscitada pelo autor Dermeval Saviani, enfatizando especificamente, O Estado e a promiscuidade entre o público e o privado na história da educação brasileira. O mesmo constitui um capítulo, da Obra: “Estado e políticas educacionais na educação Brasileira”, organizada pelo próprio autor (2011).
Palavras- Chave: Estado. Público e Privado. História da Educação Brasileira.
Com a palavra: Dermeval Saviani
Dermeval Saviani é enfático ao demonstrar de forma racional sistemática que historicamente a educação brasileira foi atravessada e ainda é constituída, por relações “promíscuas” entre o público e o privado, sendo que o que vivenciamos hoje seria na realidade, apenas uma sofisticação dessa relação, oriunda de longa data. Destarte, o mesmo destaca seis fases específicas que marcaram essa fusão com o aparato Estatal, tendo como marco, em termos políticos, os “Regimentos” de 1548 (para orientar o governo geral do Brasil de Tomé de Souza). Assim, apresenta-se a sequência historiográfica da movimentação:
1º). Educação Pública Religiosa (1549-1759)
Nessa fase, os jesuítas tinham apoio financeiro do Estado (Coroa portuguesa) e como objetivo central primavam pela doutrinação a conversão dos índios mediante o catolicismo e o ensino da cultura ocidental europeia. Criaram em 1564 o “Estatuto da redízima”, em que 10% dos impostos arrecadados pela Colônia brasileira eram destinados aos colégios jesuíticos. Com essa prosperidade material, passou-se a vivenciar o monopólio do ensino, com uma educação eletista, era uma “educação pública” sob controle de ordem privada.
2º). Educação Pública Estatal Confessional (1759-1827)
Com o forte potencial econômico que vinha sendo constituído pelos jesuítas, começaram a surgir conflitos diretos destes aos interesses do Estado. Deste modo, mais precisamente em 1759, Marquês de Pombal ordena a expulsão dos jesuítas do Brasil e substitui o seu modelo de educação pelas emergentes aulas régias. Assim, a responsabilidade do Estado com o financiamento do ensino era limitada, sendo de responsabilidade do próprio professor prover os custos com materiais e ofertar a sua casa, como local de aula. E mesmo assim, era natural o atraso dos salários dos professores, que às vezes, era transferida a responsabilização aos pais, como provedores ao pagamento dos respectivos salários. Contudo, a religião católica continuou sendo a religião oficial do país, sendo que as rupturas realizadas eram apenas de ordem econômica, acentuando a dualidade dos currículos entre o que era necessário ensinar os trabalhadores braçais, diferentemente do destinado a elite.
3º). Instrução Pública e ensino livre (1827-1890)
Um fator crucial nessa fase é a independência política em 1822, que tem no primeiro reinado a mesma orientação política fundada por Pombal. Ademais, a presença de ideias modernas (educação pública e laica) e o ensino organizado sob aulas régias promulgou a “Lei das escolas de primeiras letras” para ensinar “básico” para toda a população (o que de fato, não foi nacionalmente implementada). Os investimentos eram irrisórios e a mentalidade pedagógica restringia-se a três modelos, sendo: a) tradicionalista; b) liberal; c) científico. E mesmo a mentalidade cientifica limitou-se aos preceitos positivistas, sendo uma limitação à educação pública, surgindo assim o “ensino livre” pela iniciativa privada. Nesse sentido, o Estado ao mesmo tempo em que fez intervenções visando a equacionar a questão da educação pública, incentivou o ensino privado.
4º). Instrução Pública para os filhos das oligarquias (1890-1931)
Fase de certo ufanismo, pois com a Proclamação da República (1889), instaura-se a concepção de um Estado laico, excluindo o ensino religioso nas escolas públicas, assumindo a tarefa de organizar um sistema de difusão do ensino. Este sistema consistia basicamente em: a) organização administrativa e pedagógica, com formulação de diretrizes, normas, inspeção, controle e coordenação de atividades educativas; b) organização das escolas em grupos escolares (séries anuais), corpo de professores relativamente amplo para atender um quadro também amplo de estudantes. Instalam-se também as escolas normais que juntamente a esses grupos escolares mantinham a destinação do devir da escolarização aos filhos da classe dominante. O modelo da “escola americana” passa a ser a orientação para as reformas da instrução pública paulista, em que processo de homogeneização do rendimento escolar, acabava por redefinir os mecanismos de seleção. Assim, as demandas de educação popular ainda não se efetivavam, limitação oriunda da utilização da “máquina pública” aos interessas ‘coronelistas’ privados.
5º). Educação Pública e Industrialismo: o protagonismo das três trindades (1931-1961)
Em 1930 o Brasil vivencia um intenso processo de industrialização e urbanização, em que a monocultura dos barões de café entra em crise (tmb por influência da Queda da Bolsa de 1929). Nesse contexto progressiva é que se desenvolve o “Ideário Escolanovista”, influenciado pelos “Pioneiros da Educação Nova”, como Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira, Lourenço Filho entre outros. Contudo, a Igreja Católica se demonstrou resistente a essa mudanças, pois queria restabelecer o ensino religioso nas escolas. Nessa fase no governo de Getúlio Vargas foram criados os Ministérios da Educação e Saúde. Contudo, essa modernização pode ser considerada como conservadora, pois aos poucos se recolocou o catolicismo no contexto educacional, como forma de sujeitar a população ao Estado.
6º). Educação Pública: dever de todos, direito do Estado? (1961-2007)
Em 1961 é criada a primeira LDB e em 1964 o país sofre o golpe militar, período de ditadura de inúmeras reformas educacionais, principalmente no âmbito da educação superior, como forma de expandir a formação tecnicista em combate a organizações políticas e uma educação mais ampla. Anos depois, já com a Constituição de 1988 o país vivencia um “novo” momento, pois com mundialização do capital financeiro, em 1994 na Era FHC o país passa por intensas privatizações, seja por meio de consultores privados, livros didáticos e o apelo ao voluntariado em detrimento da profissionalização docente. Na transição de projetos governamentais, como no governo Lula se ampliam os mecanismos já propostos na fase anterior, Movimento “Todos pela Educação”, por iniciativa do empresariado Paulista, materializado no Plano de Desenvolvimento da Educação – PDE.
Referências
SAVIANI. Dermeval. O Estado e a promiscuidade entre o público e o privado na história da educação brasileira. In: SAVIANI, Dermeval et al. Estado e políticas educacionais na educação Brasileira. Org. Dermeval Saviani. Vitória, ES. Editora: EduFEs. 2011.
[1] Professor da Universidade Federal do Pampa - Unipampa (Campus- Itaqui/RS). Doutorando do Programa de Pós-Graduação em Educação (PPGE) da Universidade Federal de Pelotas (UFPel). Nível: Doutorado. E-mail: gabkehler@gmail.com