27/05/2025

O ENSINO DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA À LUZ DA ABORDAGEM CTS-A: FUNDAMENTOS, POTENCIALIDADES E DESAFIOS PARA A EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA

O ENSINO DE CIÊNCIAS E BIOLOGIA À LUZ DA ABORDAGEM CTS-A: FUNDAMENTOS, POTENCIALIDADES E DESAFIOS PARA A EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA

Peterson Ayres Cabelleira
Doutor em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde pela Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA).
São Borja, Rio Grande do Sul, Brasil.
E-mail: petersoncabelleira@hotmail.com

Resumo
Este artigo analisa a abordagem Ciência-Tecnologia-Sociedade-Ambiente (CTS-A) como fundamento teórico e metodológico para o ensino de Ciências e Biologia no contexto da educação básica e superior. A partir de uma perspectiva crítica e emancipatória, discute-se como a articulação entre os eixos ciência, tecnologia, sociedade e ambiente pode favorecer a formação de sujeitos conscientes, críticos e comprometidos com a transformação social. São discutidas as bases epistemológicas da abordagem CTS-A, seus desdobramentos no currículo e nas práticas pedagógicas, além de seus limites e desafios diante das atuais demandas educacionais e ambientais.

Palavras-chave: CTS-A; Ensino de Ciências; Ensino de Biologia; Educação Ambiental Crítica; Interdisciplinaridade.

1. Introdução

Nas últimas décadas, o ensino de Ciências e Biologia vem sendo desafiado a repensar seus fundamentos diante de uma sociedade marcada por rápidas transformações tecnocientíficas, crises ambientais e profundas desigualdades sociais. Frente a esse cenário, a abordagem Ciência-Tecnologia-Sociedade-Ambiente (CTS-A) apresenta-se como uma proposta integradora que visa à formação de sujeitos capazes de compreender e intervir de maneira crítica na realidade, superando o modelo conteudista e fragmentado que historicamente marcou o ensino dessas disciplinas (SANTOS; MORTIMER, 2001; AZEVEDO, 2008).

A proposta CTS-A amplia a tradicional abordagem CTS ao incorporar de maneira explícita as questões ambientais e seus determinantes socioeconômicos e culturais, alinhando-se aos princípios da Educação Ambiental Crítica (LOUREIRO, 2012) e da alfabetização científica para a cidadania (CARVALHO, 2012). Este artigo busca, portanto, discutir os fundamentos e as potencialidades do ensino de Ciências e Biologia à luz da abordagem CTS-A, destacando suas contribuições para a construção de uma educação transformadora.

2. Fundamentação teórica da abordagem CTS-A

A origem da abordagem CTS remonta à década de 1970, em um contexto de críticas à ciência positivista e à crescente preocupação com os impactos sociais e éticos da ciência e da tecnologia. Segundo Aikenhead (1994), a proposta CTS surge como uma resposta à necessidade de formar cidadãos capazes de compreender a ciência como empreendimento humano, situado historicamente e com implicações políticas e sociais. No Brasil, autores como Santos e Mortimer (2001) e Auler (2002) foram pioneiros em adaptar e desenvolver essa proposta para o contexto do ensino de Ciências.

Com a intensificação das crises ambientais e a necessidade de pensar a sustentabilidade em termos estruturais, a proposta CTS foi ampliada para CTS-A, incorporando de forma crítica as relações entre ciência, tecnologia, sociedade e ambiente. Nessa perspectiva, o ensino de Ciências e Biologia deve problematizar os modos de produção e consumo, os impactos ambientais das tecnologias e as injustiças socioambientais, promovendo o engajamento dos estudantes em questões reais e relevantes (CARVALHO, 2012).

De acordo com Auler e Delizoicov (2006), a abordagem CTS-A se caracteriza por quatro princípios fundamentais:

  1. Contextualização: os conteúdos científicos são ensinados a partir de situações reais e socialmente relevantes;

  2. Interdisciplinaridade: articulação entre saberes científicos, tecnológicos, sociais e ambientais;

  3. Problematização: estímulo ao pensamento crítico diante das controvérsias sociocientíficas;

  4. Participação cidadã: formação de sujeitos capazes de atuar na transformação da realidade.

3. O ensino de Ciências e Biologia sob a perspectiva CTS-A

Ao se aplicar a abordagem CTS-A ao ensino de Ciências e Biologia, propõe-se uma ruptura com a lógica tradicional do ensino transmissivo. Em vez de se restringir à memorização de conceitos e classificações, o ensino passa a valorizar a investigação, o debate de temas controversos, a análise crítica de tecnologias e suas implicações, bem como a compreensão dos ciclos naturais em articulação com os sistemas socioeconômicos.

A Biologia, por exemplo, pode ser ensinada a partir de temas como transgênicos, bioética, pandemias, mudanças climáticas, perda da biodiversidade e segurança alimentar. Tais temas permitem explorar conteúdos biológicos tradicionais (genética, ecologia, microbiologia) de forma integrada com aspectos sociais, econômicos e ambientais, promovendo aprendizagens significativas (SASSERON; CARVALHO, 2008).

Além disso, o ensino por projetos, as metodologias ativas e as práticas interdisciplinares tornam-se estratégias metodológicas coerentes com a abordagem CTS-A, pois favorecem a autonomia intelectual dos estudantes e a construção coletiva do conhecimento (MORAN, 2015).

4. Limites e desafios da abordagem CTS-A

Apesar de seu potencial transformador, a implementação da abordagem CTS-A enfrenta diversos desafios. Entre os principais, destacam-se:

  • A formação docente ainda pautada em modelos tradicionais, com pouco espaço para reflexão crítica e interdisciplinaridade (TARDIF, 2002);

  • A estrutura curricular engessada, que dificulta a integração entre as disciplinas e o trabalho com temas complexos e transversais;

  • A carência de materiais didáticos contextualizados, que abordem as relações CTS-A de forma acessível e crítica;

  • As tensões entre interesses econômicos e educativos, que muitas vezes desestimulam práticas pedagógicas voltadas à formação cidadã e crítica.

Superar tais desafios requer investimentos em políticas públicas que valorizem a formação continuada de professores, a autonomia pedagógica das escolas e a articulação entre os diferentes níveis de ensino e áreas do conhecimento.

5. Considerações finais

A abordagem CTS-A representa uma contribuição significativa para o ensino de Ciências e Biologia ao propor uma educação que articula o conhecimento científico com os problemas concretos da sociedade e do ambiente. Ao promover a contextualização, a problematização e a participação cidadã, essa perspectiva pedagógica favorece uma formação crítica, ética e comprometida com a transformação social.

Tornar efetiva essa abordagem exige um esforço coletivo de professores, pesquisadores, gestores e formuladores de políticas, que devem reconhecer a centralidade da educação científica na construção de uma sociedade mais justa, democrática e sustentável.

Referências

AIKENHEAD, G. S. What is STS Science Teaching? In: SOLOMON, J.; AIKENHEAD, G. S. (org.). STS Education: International perspectives on reform. New York: Teachers College Press, 1994. p. 47–59.

AULER, D. A. O enfoque CTS e a interdisciplinaridade no contexto da formação de professores de Ciências. Ciência & Educação, v. 8, n. 2, p. 203–223, 2002.

AULER, D.; DELIZOICOV, D. Educação CTS: compromisso com a cidadania. In: SANTOS, W. L. P. dos; MORTIMER, E. F. (org.). Ensino de Ciências: fundamentos e métodos. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. p. 179–198.

AZEVEDO, F. S. de. Abordagem CTS: possibilidades e desafios para o ensino de ciências. Ciência & Ensino, v. 3, p. 1-14, 2008.

CARVALHO, A. M. P. de (org.). A formação de professores de Ciências: desafios e alternativas. São Paulo: Cortez, 2012.

LOUREIRO, C. F. B. Educação Ambiental Crítica: contribuições à construção de uma pedagogia da Terra. São Paulo: Cortez, 2012.

MORAN, J. M. Metodologias ativas para uma educação inovadora. São Paulo: Papirus, 2015.

SANTOS, W. L. P. dos; MORTIMER, E. F. Alfabetização científica no ensino de ciências: elementos para uma política pública educacional. Ciência & Educação, v. 7, n. 2, p. 125-136, 2001.

SASSERON, L. H.; CARVALHO, A. M. P. Alfabetização científica no ensino fundamental: estruturas e dimensões para um ensino por investigação. Investigações em Ensino de Ciências, v. 13, n. 2, p. 333-352, 2008.

TARDIF, M. Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.

 

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