26/06/2023

O DIA A DIA DA SALA DE AULA: A importância do registro feito pelo educador

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ALIPIO, Andréia Nunes Pereira.[1]

ARRUDA, Alexssandra Rodrigues de.[2]

MATOS, Ivonete Gonçalves de.[3]

BUENO, Solene Sousa Rodrigues.[4]

ROCHA, Valdinete Ribeiro.[5]


RESUMO

Ensinar não é apenas transferir conhecimentos e conteúdos. Formar também não é apenas uma ação para modelar algo ou alguém. Não há docência sem discência. Ensinar é mais que um verbo. Só existe ensino quando este resulta num aprendizado em que o aprendiz se tornou capaz de recriar ou refazer o que lhe fora ensinado. O começo é repleto de desafios, tanto para o docente quanto para o discente. O professor precisa se fazer entender, perceber qual o caminho mais propício para o aluno avançar, sempre em constante movimento, para acompanhar o aluno, nunca o deixando completamente só. O aluno que não consegue ver mais adiante se assusta com cada passo. Há sempre aqueles que desistem pelo caminho, mas os que vencem cada obstáculo, avançam, chegando a ultrapassar o professor em busca de seus próprios caminhos. Entre o aluno e o primeiro passo dessa trajetória há problemas; alguns visíveis, outros não. Há questões familiares, estruturais, pedagógicas, financeiras, sociais e culturais. Dentro de todo esse contexto, há o caminho da Matemática, que para alguns parece o mais assustador. Ao esbarrar nele, muitos desanimam, fazendo o possível para apenas sobreviverem durante o trajeto. Só não percebem que a Matemática se bifurcará em muitos caminhos pela frente. Tal tríade estabelece-se em um meio e o aluno aprende se adaptando a ele. Este artigo, busca refletir sobre o dia a dia em sala de aula e os desafios que os professores enfrentam cotidianamente.

Palavras-chave: Conhecimento. Docentes. Sala de aula.


INTRODUÇÃO

      As exigências do ensino e da educação são cada vez maiores e mais complexas. A indisciplina, o insucesso escolar e o abandono escolar são problemas que integram o quotidiano dos professores. Ora, como os alunos passam cada vez mais horas na escola, quase que se poderia dizer que habitam na escola, este espaço deveria estar imerso num ambiente de conforto e bem – estar. É aí que escrevem, escutam, refletem, interagem com os seus colegas, aprendem, ou não. Como refere Augustowsky (2005, p.16):

(…) para la enseñanza, habitar significa apropriarse reflexiva y emocionalmente de los espacios y convertir los escenarios que nos prestan las instituciones en «buenos» y –¿por qué no? - «bellos» lugares de trabajo, en sítios adecuados para enseñar y aprender.

 

      Para tanto, consideramos absolutamente necessário melhorar o espaço escola/sala de aula, tornando-o mais acolhedor, mais humano, mais bonito; um espaço que permita a interação e em que seja agradável trabalhar. Não é possível pensar em práticas de ensino que ocorram no vazio, é necessário situá-las no contexto em que se inserem. Quando entramos numa escola e olhamos em redor, não só a entrada, mas também os diversos espaços que a compõem, como as salas de aula, por exemplo, podemos perceber qual a dinâmica que a envolve, que tipos de atividades se desenvolvem, como interagem os diferentes alunos, como se relacionam entre pares e com os adultos, professores, auxiliares e agentes da comunidade escolar.

      Todo o ambiente envolvente nos informa; basta observarmos atentamente a forma como as pessoas se relacionam e como estão organizados os espaços de recreio, o mobiliário e as paredes, ou seja, como está organizado o espaço físico dentro e fora das salas de aula. Estudos como o de Richardson (1997) dão destaque aos escassos recursos que o professor controla, salientando o tempo – gestão e focalização do tempo dos alunos nos assuntos escolares em geral – e o espaço na sala de aula – como movimentar-se nesse espaço, onde colocar os alunos, os materiais e as carteiras e como criar um ambiente adequado à aprendizagem. Fazem, ainda, referência ao fato de estar bastante bem desenvolvida a investigação sobre a gestão do tempo, mas muito pouco se saber ainda sobre a gestão do espaço. A flexibilidade na colocação das carteiras e das mesas e no agrupamento dos alunos assume um papel muito importante quando se considera o uso do espaço na sala de aula, mas é difícil prever quais as implicações destas decisões no comportamento e na aprendizagem dos alunos, uma vez que os dados da investigação são ainda muito reduzidos.

      A principal preocupação dos professores com o espaço é experimentar a reorganização da disposição da sala de aula. A forma como o mobiliário está disposto pode ter influência no tempo de aprendizagem escolar e, consequentemente, na aprendizagem dos alunos. Como já foi referido e será salientado neste estudo, a flexibilidade na colocação das cadeiras e das mesas, bem como no agrupamento dos alunos, é essencial para proporcionar uma aprendizagem cooperativa, o apoio entre pares e a apresentação dos conteúdos a todos os elementos da aula (RICHARDSON, 1997). No seguimento desta linha, apresentamos um apontamento sobre a organização do espaço em sala de aula e as suas implicações na aprendizagem cooperativa.

 

O DIA A DIA DA SALA DE AULA

      Enquanto subo as escadas e me encaminho para uma das seis salas onde estarei hoje, o frio na barriga denuncia que não é um dia comum. Esforço-me para falar, escutar e ser ouvida, afinal todos  estão de máscaras. Uso uma pff21 – equipamento de proteção individual ou EPI que paguei com meu salário, assim como a internet, os equipamentos que adquiri e os consertos que fiz mais de uma vez no notebook para ter condições de trabalhar nos últimos meses. Dei bom dia aos rostos que conheço somente das telas.

      Foi emocionante ir associando aqueles corpos cheios de dignidade às imagens e figuras que usavam como perfil no meet ou whatsapp. Lembrei das incontáveis vezes em que encontrá-los ali, nos quadradinhos da tela do computador, foi o que me resgatou do desânimo e da descrença em sobreviver ao fim do mundo. Diferenças há, mas ao fim, seja pela tela, seja presencial, tudo é sala de aula: espaço de encontro e encantamento, mas também de descontrole e convite ao erro.

      Barulho de ventilador, calor, paredes descascando, carteiras riscadas, lousa, pincel, apagador, lista de chamada. Fui visitada por uma euforia, comparável aos primeiros dias de aula, seja como professora, seja como aluna. Parecia que estava começando tudo de novo e minha cabeça devaneava, falando comigo mesma: “devo ficar encostada na lousa ou andando pela sala? Será que estou suando demais? Desacelera! Tá falando rápido”. Será que um dia a sala de aula vai deixar de ser esse lugar que, apesar de amedrontar, atrai feito canto de sereia?

      À medida que os minutos  - ou horas? - foram passando, o nervosismo cedeu lugar ao reencontro. Foi como se acendesse uma luz aqui dentro, ou um fogo me queimasse, avisando que somente ali a gente sente esse furor. Só a sala de aula tem essa magia difícil de explicar como são difíceis de explicar as coisas míticas: a aula planejada que ganha um rumo próprio, ou inesperado e nos obriga a jogar o planejamento pela janela, a pergunta que empolga ou desconcerta, as conversas e risos nos deixam inseguros, os olhares e balançar de cabeças que confirmam que estamos no rumo certo e as mãos que gesticulam no ar e ganham vida própria, empolgadas com o falar.

      Quase dois anos depois, pisei em uma sala com alunos. O espaço escolar não me era novidade. Tinha vindo a esta, e a outras escolas em que estou lotada mesmo em período de ensino exclusivamente remoto, para pegar atividades impressas respondidas pelos alunos sem condições de acompanhar as aulas remotas, seja por não terem internet de qualidade em casa, ou porque tiveram que trabalhar, cuidar da casa, ou simplesmente não conseguiram se adaptar ao formato. É quase como o café com leite das brincadeiras infantis, uma escola vazia e silenciosa, não vale!

      Na primeira quarentena com mais restrições, postei uma foto em sala de aula, mãos erguidas como quem acredita no que fala e rodeada de estudantes. Escrevi na legenda: “uma saudade” ao que vários colegas responderam concordando. Diversas vezes recebi mensagens dos meus alunos compartilhando que sentiam falta até de acordar cedo, do cheiro da farda lavada na segunda-feira, do gosto da merenda escolar.

      As instituições de ensino, mais do que lugares do saber formal, são espaços de sociabilidade, vivência coletiva, lugar de afetos, mas não cabe aqui a romantização deste retorno, embora não há como negligenciar que ele me revirou. Ao mesmo tempo que sinto falta do chão da escola, percebo o quanto estamos cansados, ansiosos, com medo e de certa forma, confusos.

      A sala de aula é um dos lugares onde me reconheço, me perco e volto a me achar. No entanto, uma sensação de insegurança paira no ar: tantas escolas não possuem condições de seguir os decretos e oferecer as condições sanitárias adequadas. Alunos e funcionários muitas vezes usam máscaras precárias e por vezes mal colocadas, as rupturas que as sucessivas adaptações requerem, causam prejuízo pedagógico evidente e uma sensação de “se vira”.

      O tempo em que permaneceram fechadas enquanto bares, restaurantes e shoppings mantiveram-se abertos, diz muito da desimportância que nossa sociedade dá as escolas públicas. Relembro aqui que os particulares reabriram com mais antecedência. Em algum momento voltaríamos, é certo, mas qual o preço deste retorno? Pagaremos com o aumento de casos, uma nova onda, ou mesmo com a vida?

      Quando digo que o mundo acabou não estou sendo apocalíptica ou muito menos fatalista. O mundo a que me refiro não é esse físico, até porque não é minha intenção reproduzir cenários que os filmes de ficção científica criam tão bem, falo do mundo social que construímos nas últimas décadas, com contribuições desiguais a depender dos lugares sociais a qual estamos vinculados. Acho que é tempo, mais do que antes, de ficarmos atentos a como a nossa sociabilidade vai funcionar daqui em diante. Será que haverá uma reviravolta no sentimento de coletividade? A crise vai ser tão forte que seremos capazes de repensar o mundo do trabalho, o papel da escola e nossas relações de afeto? Baiana System já cantou: “Tô preparando um bote/ talvez você nem me note/ amigo o nome disso é boicote.” O isolamento pareceu contar algo sobre estar junto. Saberemos ouvir?

 

AVALIAÇÃO CONTÍNUA E PROCESSUAL – O registro como elemento central

      O termo avaliação nos remete automaticamente ao processo de ensino e aprendizagem porque se constituem em articulações indissociáveis e inquietantes na práxis pedagógica dos docentes. Embora a pedagogia contemporânea defenda uma concepção de avaliação escolar como instrumento de emancipação, no cotidiano escolar prevalece ainda nas práticas avaliativas, uma ênfase nas notas obtidas pelos alunos e não na sua aprendizagem.

      O uso dos resultados das avaliações encerra-se na obtenção e registro de símbolo do valor mensurável da aprendizagem do aluno. Estes símbolos podem ser conceitos ou notas que expressam o valor atribuído pelo professor, supostamente, referente ao aprendizado do aluno, encerrando-se aí o ato de avaliar que, o valor concedido pelo professor ao aprendido pelo aluno, é registrado e, definitivamente, o aluno permanecerá nesta situação, o que equivale a ele estar determinantemente classificado.

      Tal momento de avaliar a aprendizagem do aluno não deve ser o ponto de chegada, mas uma oportunidade de parar e observar se a caminhada está ocorrendo com a qualidade previamente estabelecida para esse processo de ensino e aprendizagem para retomar a prática pedagógica de forma mais adequada, uma vez que o objeto da ação avaliativa, no caso a aprendizagem, é dinâmico, e, com a função classificatória, a avaliação não auxilia o avanço e o crescimento para a autonomia.

      A discussão sobre a avaliação escolar está diretamente vinculada ao processo de ensino e aprendizagem, ou seja, à prática pedagógica do professor. Porém, muitos educadores percebem o processo em questão de modo dicotomizado: o professor ensina e o aluno aprende. No entanto, a avaliação deve ter como objetivo a qualidade da prática pedagógica do professor. A mesma é condição necessária para a construção da aprendizagem bem-sucedida do aluno e não para classificar ou discriminar, mas um parâmetro para a práxis educativa.

      No trabalho pedagógico proposto pela pedagogia histórico-crítica, a avaliação da aprendizagem do conteúdo deve ser a expressão prática de que o aluno se apropriou de um conhecimento que se tornou um novo instrumento de compreensão da realidade e de transformação social. Deste modo, revela o autor que “a responsabilidade do professor aumentou, assim como a do aluno. Ambos são co-autores do processo ensino-aprendizagem”.

      A avaliação da aprendizagem na concepção dialética do conhecimento, é a manifestação de quanto o aluno se apropriou das soluções para a resolução dos problemas e das questões levantadas, ou seja, do conhecimento adquirido. O autor explica que na referida concepção dialética, a proposta pedagógica tem como primeiro passo, ver a prática social dos sujeitos da educação, a tomada de consciência sobre esta prática, levando professores e alunos a teorizar sobre a realidade.

      Isto possibilita passar do senso comum para os conhecimentos científicos e retornar à prática social de origem com uma perspectiva transformadora desta realidade. Sendo assim, com o conhecimento teórico adquirido, o aluno vai atuar sobre seu meio social com um entendimento mais crítico, elaborado e consistente. Os novos desafios do mundo contemporâneo exigem inovações didático pedagógicas que possam contribuir para que a escola cumpra com seus objetivos de ensino e aprendizagem proporcionando um espaço repleto de possibilidades.

      Sendo a avaliação uma das etapas da atividade escolar, é necessário que esteja sintonizada com a finalidade do processo ensino e aprendizagem e como possibilidade de perceber nos sujeitos escolares suas fragilidades, seus avanços e desta forma, mediar o processo de apropriação do conhecimento e consequentemente, com a função social da escola que é a de promover o acesso aos conhecimentos socialmente produzidos pela humanidade a fim de possibilitar ao aluno condições de emancipação humana.

      Deste modo, a educação ofertada pela instituição escolar deve possibilitar o processo dialético de trabalho pedagógico para formar alunos autônomos em sua aprendizagem e em seu desenvolvimento humano, produtores de conhecimento crítico e significativo, conscientes e compromissados com a melhoria do seu meio social. O processo de avaliação da aprendizagem deve ser praticado com esta perspectiva dialética do conhecimento, mas os critérios e procedimentos de avaliação muitas vezes não condizem com a realidade vivida pelo aluno no processo de construção do conhecimento, levando-o ao fracasso escolar.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

      O registro representa muito mais que um roteiro de aula ou uma enumeração de atividades desenvolvidas com a turma. Escrever sobre a prática faz pensar e refletir sobre cada decisão que foi ou será tomada, permitindo aprimorar o trabalho diário e adequá-lo com frequência às necessidades dos alunos. Desta forma, o presente trabalho tem como tema “A Importância do Registro Escrito para a Prática Pedagógica do Educador”. Para atender a essa proposta partimos das questões: de que maneira o registro das práticas e o planejamento vêm sendo construídos no cotidiano do trabalho pedagógico? E como essas escritas contribuem para a melhoria da prática pedagógica? Esta prática da escrita é importante como registro vivo dos processos interativos desencadeados no espaço escolar.

 

[1] Servidora da Secretaria Municipal de Educação de Primavera do Leste – MT. Licenciada em Pedagogia. Especialista em Psicopedagogia Institucional, Educação Infantil e Letramento.

[2] Servidora da Secretaria Municipal de Educação de Primavera do Leste – MT. Licenciada em Pedagogia. Especialista em Psicopedagogia Clínica e Institucional.

[3] Servidora da Secretaria Municipal de Educação de Primavera do Leste – MT. Licenciada em Pedagogia. Especialista em Psicopedagogia e Educação Infantil.

[4] Servidora da Secretaria Municipal de Educação de Primavera do Leste – MT. Licenciada em Pedagogia. Especialista em Educação Infantil, Letramento Perspectivas de Trabalho em Creches e Escolas.

[5] Servidora da Secretaria Municipal de Educação de Primavera do Leste – MT. Licenciada em História. Especialista em Psicopedagogia Institucional.

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