31/03/2020

Letramento e Alfabetização

Por Wolmer Ricardo Tavares – Mestre em Educação e Sociedade, Escritor, Palestrante e Docente – www.wolmer.pro.br

 

            Muitos são os questionamentos entre alfabetização e letramento, mas para entender os conceitos e diferenças, faz-se necessário elucidar as falas de Romanelli em seu livro História da Educação, publicado pela Vozes em 2003, quando o autor esclarece que até o ano de 1950 o ato de um sujeito estar alfabetizado implicava em uma resposta afirmativa quanto ao questionamento de "saber ler e escrever".

            Segundo o autor, casos que levantassem dúvidas, bastaria que a pessoa inquirida traçasse o seu nome, entretanto, a partir de 1950, as pessoas foram consideradas alfabetizadas e capazes de ler e escrever um simples bilhete, conferindo maior rigor aos dados.

            Assim sendo, é importante ressaltar as diferenças entre educandos alfabetizados e letrados.

            Keiman em Modelos de Letramento e as práticas de alfabetização na escola, publicado pelo Mercado de Letras em 1995 e Soares no livro Letramento: um tema em três gêneros, publicado pela Autêntica em 1998,  convergem ao afirmarem que os alfabetizados adquirem práticas da escrita, codificam os sinais gráficos de seu idioma, e isso implica dizer que eles não se encontram aptos em relação a habilidades de contextualização na leitura e facilidade em explicitar seu raciocínio por meio da escrita.

            O educando alfabetizado não usufrui dos benefícios que uma prática sociocultural pode lhe oferecer com o entendimento de textos mais complexos e a elaboração de frequentes relatórios explicitando de maneira inteligível a defesa de um pensamento crítico.

            Já o letramento, está inserido numa prática cultural e sócio-histórica, e isso agregará suas habilidades cognitivas. Vale afirmar nas falas acima que o cidadão letrado se torna protagonista de seu entorno, desenvolvendo a capacidade de enxergar horizontalmente, perpassando seus limites e fazendo relação com as informações, mesmo não inseridas no texto falado ou escrito, mas consegue vinculá-las em seu entorno sociocultural.

            Pode-se perceber que o letramento favorecerá uma educação crítica e protagônica, levando nossos educandos a um pensar e agir crítico, fomentando suas capacidades de ação a uma melhor contextualização sem se deixar esbarrar na manipulação do sistema.

            Cabe ressaltar  que a humanização e a socialização ocorrerão se nossos educandos estiverem letrados e não apenas alfabetizados, uma vez que o letramento os auxiliará em uma criticidade e em um crescimento; e a alfabetização poderá ocorrer de forma adestradora, manipuladora, por meio de um discurso que poderá tender a uma manipulação consciente, usando de estratégias argumentativas com intenção de convencer o interlocutor, que em nosso caso é o próprio educando.

            Ao inserir um letramento em nossos alunos, iremos corroborar com as ideias de Freire (1996, p.27) quanto ao ensino bancário deformar “a necessária criatividade do educando e do educador”.

            O letramento, se contextualizado em sua vertente sócio-histórica e cultural, deverá levar os educandos a uma percepção de si mesmos, suscitando reações e fugindo do assistencialismo e da massa de manobra.

            Para Freire em seu livro educação e mudança, publicado pela Paz e Terra em 1979, não podemos domesticar nossos educandos, fazendo valer a negação da educação e tomar o sujeito como um simples instrumento; suas ideias convergem com Bakhtin ao dizer que o indivíduo tem que ter um pensamento dialógico e uma comunicação efetiva, utilizando de uma consciência crítica lhe permitindo transformar a realidade e fazer história com sua atividade criadora.

            Segundo pesquisas do Ministério da Educação, no Brasil são 11,3 milhões de analfabetos e este número corresponde a 6,8% da população de 15 anos ou mais, pessoas que não conseguem sequer escrever um bilhete;[1] com isso percebemos que o letramento é um fator importante para o indivíduo ter uma participação mais ativa na sociedade e nela interagir, sendo consequentemente o protagonista de sua própria vida.

            Segundo Bakhtin, na fala expressiva de Bezerra, em sua obra Dialogismo e polifonia em Esaú e Jacó, publicado pela Vozes em 2006, o letramento possibilita ao sujeito um agir interativo, com uma formação subjetiva e uma identidade no plano relacional responsável-responsivo e que utiliza de um dialogismo deixando de ser uma massa de manobra e alavancando o crescimento socioeconômico de seu entorno.

            Goulart em seu artigo Letramento e polifonia: um estudo de aspectos discursivos do processo de alfabetização, publicado pela Rev. Bras. Educação em 2001 esclarece que em termos gerais, o letramento está relacionado ao conjunto de práticas sociais orais e escritas de uma sociedade além da construção de uma identidade e autoria.

            Interessante perceber nas falas de Cerutti-Rizzatti em seu artigo denominado Letramento: uma discussão sobre implicações de fronteiras conceituais, publicado pela Educ. Soc  em 2012, o letramento delineou-se como um conceito intrinsecamente associado à concepção de escrita como prática social e como processo cultural.

            Como pode-se perceber é gritante a diferença entre estar alfabetizado e letrado, pois estar alfabetizado não implica dizer que o educando domina habilidades de leitura e escrita para uma cidadania proativa e crítica nas práticas sociais.

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