23/12/2006

Israel-Palestina: A estreita linha verde

Por Peter Hirschberg, da IPS

Jerusalém, 22/12/2006 – Ao determinar que todos os mapas das novas edições de livros escolares de Israel incluam a “linha verde” que separa este país da Cisjordânia desde a guerra de 1967, a ministra da Educação, Yuli Tamir, desatou uma tempestade política. Políticos de direita e líderes religiosos ameaçam boicotar esses manuais caso sejam publicados. Mas “não se pode esperar que as crianças compreendam a história se partes dela são eliminadas dos livros”, disse Tamir. A ministra foi uma das fundadoras do Paz Agora, movimento extra-parlamentar que se opôs com força à instalação de assentamentos judeus na Cisjordânia e que apóia a criação de um Estado palestino independente nesse território e em Gaza.

Legisladores de direita que são contra abandonar estas áreas por motivos religiosos ou de segurança acusaram Tamir de tentar “politizar” o sistema educacional e introduzir a “agenda do Paz Agora” no programa escolar. A decisão toca o coração da disputa entre esquerda e direita na sociedade israelense: o futuro dos assentamentos e da Cisjordânia. Muitos israelenses da direita religiosa e a comunidades de colonos atribuem a Israel o direito divino à posse da Cisjordânia. Chamam essa zona por seu nome bíblico – Judéia e Samária – e consideram inaceitável renunciar a ela.

Muitos israelenses, ao contrário dos colonos, estão dispostos a ceder a Cisjordânia, mas a maioria, além disso, acredita que retroceder às fronteiras exatas de 1967 colocaria em risco sua segurança. Para muitos palestinos, a fronteira de 1967 com a Jordânia de então formam a base de sua demanda de um Estado independente na Cisjordânia e em Gaza. Mas nem mesmo do lado árabe há consenso: o Movimento de Resistência Islãmica (Hamas) afirma que o Estado judeu deveria ser desmantelado e que toda a Palestina histórica, incluído o atual território israelense, deveria ser entregue aos palestinos.

Nos mapas que figuram dos livros palestinos tampouco aparece a linha verde, nem sinal algum de Israel. Toda a área geográfica compreendida entre o rio Jordão e o mar Mediterrãneo é apresentada como Palestina. A decisão de Tamir se guia por estudos acadêmicos segundo os quais a linha verde desapareceu dos livros didáticos, os quais, por outro lado, se referem à Cisjordânia como Judéia e Samária, ao uso dos judeus religiosos comprometidos em colonizar a áreas no contexto do processo messiânico.

A chamada “linha verde” foi traçada com essa cor no mapa pelos negociadores que estabeleceram o armistício de 1949, ao fim da guerra entre Israel e seus vizinhos Egito, Síria e Jordânia. Desde a Guerra dos Seis Dias (1967), quando Israel capturou Cisjordânia e Gaza, a fórmula serve como referência à fronteira oficial que separa Israel destas áreas palestinas. Até 1967, a Cisjordânia pertencia à Jordânia, e Gaza ao Egito. Agora, está controlada em parte pelo exército israelense e em parte pela Autoridade Nacional Palestina.

Quanto a Gaza, em agosto de 2005 Israel se retirou completamente e desmantelou todos os assentamentos judeus nesse território. Mas a retirada foi unilateral, sem nenhum acordo com a Palestina, motivo pelo qual tampouco se determinou, então, uma fronteira definitiva reconhecida internacionalmente. Svi Hendel, um legislador religioso contrário ao desmantelamento dos assentamentos e à retirada dos colonos da Cisjordânia, disse à IPS que a ministra Tamir tenta promover nas aulas suas opiniões políticas pessoais. “Se sua intenção é que as crianças aprendam história, onde estavam as fronteiras em 1967, isso é legítimo. Mas ela está fazendo um jogo político, querendo promover a agenda da Paz Agora”, disse Hendel.

A linha verde foi a fronteira “apenas durante 19 anos”, entre 1948 e 1967, afirmou o legislador. “Nos últimos 40 anos não foi. Sua idéia merece desdém. Não creio que a levará adiante”, acrescentou Hendel. Outro parlamentar religioso de linha dura, Yitzhak Levy, acusou Tamir de tentar “ditar um futuro acordo de paz” e, também, de tentar fazer com que os alunos “deixem de lado o compromisso de seus corações e suas almas com a Judéia e a Samária”. Levy, ex-ministro da Educação, disse que enquanto o sistema educacional estava “à beira do colapso”, Tamir “se intrometia na política”.

Um grupo de rabinos proibiu suas congregações e os alunos dos centros de ensino sob suas responsabilidades de usar os novos livros, caso cheguem a ser editados. “A ministra da Educação declarou uma guerra aberta contra o Santíssimo, bendito seja, e contra a Terra de Israel”, afirmaram os rabinos. “A ministra se uniu aos inimigos que lutaram contra o povo de Israel durante gerações”. Ao criticar Yuli Tamir, alguns legisladores recordaram a descrição do falecido chanceler israelense Abba Eban: os limites de 1967 são com “as fronteiras de Auschwitz”. Segundo dizia Eban, regressar a esses limites tornaria Israel indefensável, com os principais centros povoados acessíveis ao inimigo.

O primeiro-ministro, Ehud Olmert, líder do centrista partido Kadima, apoiou Tamir. “Não há nada de errado em marcar a linha verde. Mas, existe uma obrigação de enfatizar que o governo e o consenso público descartam retornar às fronteiras de 1967”, afirmou. O plano de Olmert para outra retirada unilateral, que foi adiada desde a guerra do Líbano em julho e agosto, implica a evacuação de muitos assentamentos judeus na Cisjordânia, mas, também a manutenção dos maiores, a maioria deles perto da linha verde, embora dentro da Cisjordânia.

Por outro lado, parlamentares de esquerda que postulam concessões territoriais como base para um acordo de paz com os palestinos, apoiaram Tamir. Avshalom Vilan, membro do esquerdista partido Meretz, disse que a linha verde nunca foi apagada e que indicá-la é essencial com vistas à paz com a Palestina. Yosi Sarid, ex-ministro da Educação e veterano ativista pela paz, disse que “os estudantes em Israel deveriam saber que as fronteiras oriental e setentrional de Israel não são definitivas e que um dia serão estabelecidas através de negociações”.

Tamir insiste em que sua decisão é “educacional”. Por exemplo, “ensinamos a Resolução 242 da ONU, mas não mostramos aos estudantes a linha verde”, disse. Essa resolução, aprovada pelo Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas no dia 22 de novembro de 1967, exige a retirada das forças armadas israelenses dos territórios ocupados durante a Guerra dos Seis Dias. “Não podemos negar que havia uma fronteira que ainda hoje é debatida”, concluiu. (IPS/Envolverde)

Assine

Assine gratuitamente nossa revista e receba por email as novidades semanais.

×
Assine

Está com alguma dúvida? Quer fazer alguma sugestão para nós? Então, fale conosco pelo formulário abaixo.

×