06/04/2017

Gestão Educacional: Uma Contribuição Social

GESTÃO EDUCACIONAL: UMA CONTRIBUIÇAO SOCIAL

 

EDUCATIONAL MANAGEMENT: A SOCIAL CONTRIBUTION

“Ninguna democracia puede ser estable si no cuenta con el

apoyo de ciudadanos educados para ese fin.”

Martha C. Nussbaum

RESUMO

O tema Gestão Educacional tem figurado no cenário das discussões educacionais com maior intensidade nos últimos tempos. Não que o tema tenha necessariamente se isolado por completo das reflexões de grandes pesquisadores e teóricos do campo educacional e até mesmo da área administrativa. No entanto, ganha espaço significativo em razão da percepção mais evidente da importância que as equipes de gestão têm sobre a finalidade e o caráter das instituições de ensino e, também, pela crescente profissionalização que o ofício de gestor tem assumido nestas instituições. A intenção deste artigo é problematizar o tema gestão educacional paralelamente à proposta de uma formação humana voltada a atender princípios democráticos e humanizadores da vida em sociedade.

 

Palavras-chave: Gestão Democrática do Ensino; Política Administrativa; Descentralização.

ABSTRACT

The Educational Management theme has ranked in the sphere of educational discussions with greater intensity in recent times. Not that the subject has completely isolated itself from the reflections of great researchers and theorists of the educational field and even  from the administrative area. However, it gains significant space due to the more evident perception of the importance that management teams have on the purpose and on the character of educational institutions and also by the increasing professionalization that the manager position has taken in these institutions. The intent of this article is to discuss the educational administration theme in parallel with the proposal of a human formation focused on meeting democratic principles of life in society.

Keywords: Democratic Education Management; Administrative Policy; Decentralization.

INTRODUÇÃO

O interesse em explorar o tema gestão educacional se dá pela hipótese de que o desempenho desta função, através do papel dos gestores em suas equipes de gestão, tem forte influência no modelo de educação realizado pelas práticas de ensino-aprendizagem e, consequentemente, na constituição do sujeito social[1]. Se esta hipótese tem veracidade, os gestores educacionais precisam dar atenção especial e prioritária ao objetivo final da instituição para nortear suas tomadas de decisão. De imediato, podemos antecipar que os princípios educacionais devem prevalecer quando os gestores, pela própria autoridade e responsabilidade do cargo, deliberam sobre os rumos da educação. Conjuntamente com estas especulações iniciais, exploraremos um modelo educacional que promova nos alunos atitudes vitais para a vida em democracia, à medida em que apontaremos o papel fundamental que os gestores educacionais têm na definição do lugar da educação institucionalizada.

De certa forma, na argumentação supracitada, definimos de antemão um dos objetivos finais da educação: preparar para a vida em democracia. Faremos uso deste objetivo educacional, sustentado pela filósofa norte-americana Martha Nussbaum, como um critério para julgar a importância do papel do gestor e estabelecermos uma crítica sobre as responsabilidades que a este cabem. Esta “aventura” logo nos apresenta a pergunta: por que a democracia deve ser o objetivo da formação promovida pelas instituições?

Para tratar disso, a argumentação deste ensaio percorrerá o seguinte trajeto: Primeiramente trataremos do problema: por que a educação deve preparar para a democracia? Dessa forma, pretendemos identificar e justificar uma finalidade para a atividade educacional, assim como indicar esta mesma finalidade como um critério em potencial para pensar a função da gestão educacional. Ciente de que o vínculo educação e democracia é um postura costumeira e, de certa forma, prosaico quando questionada a finalidade da educação, pretendemos expandir este mesmo vínculo para pensarmos as responsabilidades dos gestores da educação. Posteriormente, abordaremos o problema: o modelo de ensino vigente atende aos ideais de democracia? E, por último, qual a relevância e os cuidados da gestão educacional para atender aos ideais de democracia? Os dois primeiros problemas serão abordados a partir de interpretações sobre a crítica de Martha Nussbaum aos sistemas educacionais. O terceiro problema revelará um esforço para encontrar um sentido positivo da gestão educacional que beneficie a educação em si mesma e a vida em democracia.

PARADIGMA DO DESENVOLVIMENTO HUMANO

Na tentativa de responder a pergunta “porque a educação deve preparar para a vida em democracia?”, iniciamos com o que Nussbaum acredita ser fundamental, conforme nosso entendimento, para a realização dos seres humanos, a saber, que o desenvolvimento humano pressuponha um sujeito autônomo, capaz de lidar maduramente com sua liberdade. A educação, como segmento de formação humana por excelência tem papel vigoroso nesse processo de “cultivo da humanidade”, como Nussbaum intitula um de seus livros e que, consequentemente, tem um vínculo muito estreito com os critérios de democracia.

Apesar das diferenças conceituais acerca do conceito de democracia, podemos afirmar que este demanda consensualmente, no mínimo, três atitudes humanas fundamentais, conforme Nussbaum: atitude crítico-argumentativa; atitude imaginativa e criativa; e atitude de pensar como cidadão do mundo.

Antes de tratar destas três exigências, gostaríamos rapidamente de fazer uma especulação inicial para incitar um aspecto que se considera importante: quem pode participar da democracia? Apesar de sua simplicidade, esta pergunta parece ter relevância, pois desde a origem da democracia na Grécia Antiga haviam-se critérios transparentes para se ser cidadão[2] e, por consequência, para participar da democracia. Hoje não temos critérios tão claros para definirmos a participação dos cidadãos nos rumos da sociedade. Porém, a hipótese é de que esta “triagem” ainda aconteça, mesmo que de forma indireta. Pois, além da possibilidade formal de eleger representantes legais para representar o povo nas tomadas de decisões, ainda assim existe muito espaço para o envolvimento do cidadão observar, analisar, argumentar e se posicionar frente às posturas políticas que deliberam sobre as questões que interferem nos modos de vida. Cidadãos “incapazes” de, além do voto, se envolverem neste outro campo periférico à democracia formal, são implicitamente “anulados” da participação social. Mas, a experiência deste envolvimento parece-nos vital para que a forma democrática de viver nas sociedades atuais ganhe intensidade e força.

Para que esta “exclusão” à democracia não seja reforçada, a educação tem papel capital no desenvolvimento das três atitudes citadas: atitude crítico-argumentativa; atitude imaginativa e criativa; e atitude de pensar como cidadão do mundo. Na sequência tentaremos justificar a importância destas atitudes para a democracia e a função da educação neste processo.

O exercício da democracia não é o caminho mais tranquilo para o cidadão conduzir sua vida, já que dele é cobrado envolvimento efetivo nas atividades sociais. Ou seja, a democracia demanda a compreensão de um modus operandi específico de seus envolvidos. Assim como define o Ph.D em Ciência Política, Prof. Marcello Baquero, “a democracia contemporânea requer uma cidadania ativa que se envolva na arena política via discussões, referendos e plebiscitos, ou seja, por meio de mecanismos formais e informais [...]” (2008, p. 381). Cabe à educação promover as competências que proporcionarão o exercício real dos cidadãos nos espaços de democracia.

A participação social ganha vitalidade na medida em que seus cidadãos desenvolvam um atributo que lhes confere cada vez mais humanidade, o desenvolvimento da capacidade crítico-argumentativa. A verdadeira liberdade, para Nussbaum, não se encontra no domínio de conhecimentos técnicos e nem no domínio dos conhecimentos das ideias dos outros, mas quando o ser humano consegue pensar por si mesmo[3].

Para Nussbaum, o pensamento autônomo encontra bases sólidas nas disciplinas humanísticas, como a Filosofia, Artes, História, Literatura, que são de valor inigualável para a democracia, pois “[...] tanto por el contenido como por el método pedagógico, ayudarán a que los alumnos reflexionen y argumenten por sí mismos, en lugar de someterse a la tradición y a la autoridad”. (2010, p. 76). Aqui há uma indicação valiosa e bem antiga, diga-se de passagem, da importância das instituições educacionais se preocuparem com suas metodologias de ensino. A capacidade argumentativa é resultado de um modo de aprender e de ensinar. Sócrates, enquanto exemplo de postura metodológica, nos apresentou o método maiêutico, que consistia na relação intermitente da pergunta sobre as hipóteses de respostas, o que provocava o aluno a pensar sobre o que dizia, pois a cada pergunta sobre o que era explanado suscitava a reflexão e, assim, se aprofundava significativamente na compreensão sobre determinado conceito. Esse movimento é fundamental para que os alunos não se submetam puramente à tradição e à autoridade.

Este processo, diferentemente da intenção pedagógica que se resume em ensinar um conteúdo, ensinava também uma “forma” de lidar com o conhecimento e com as situações de vida. A postura pedagógica com a qual se ensinava extrapola o ambiente “puramente” educacional e se expande para a vida social. Esse comportamento exploratório, que exige a manifestação do que se pensa e um pensar crítico sobre o que se diz, é força promotora do desenvolvimento humano e da democracia, por consequência.

Esta metodologia que implica no diálogo reconhece a importância da manifestação das ideias e opiniões críticas e “al destacar que cada uno tiene su propia voz, fomentamos al mismo tiempo una cultura de la responsabilidad” (NUSSBAUM, 2010, p. 83). O diálogo requer o comprometimento com o que é manifestado, uma vez que a pergunta promove a necessidade de sustentar argumentativamente suas opiniões. Responsabilidade por suas ideias e por seus atos. É de responsabilidade educacional, se se pretende preparar para a democracia, que as instituições educacionais vejam “[...] cada estudiante como un individuo en pleno desarrollo de sus facultades mentales, de quien se espera un aporte activo y creativo a los debates que puedan surgir en la clase”. (NUSSBAUM, 2010, p.84).

Esse procedimento pedagógico de ensino e de aprendizagem – o diálogo - não se limita apenas a se apresentar como estratégica pedagógica, no sentido de uma técnica de ensino, pois transcende a condição operacional e se estabelece como princípio educacional, compreendido numa condição que fundamenta toda a ação pedagógica. Princípio este que incita a reflexão e assume, além de um elemento da educação formal, um promotor do processo de desenvolvimento humano via de exame reflexivo da própria vida. A prática do autoexame é fundamental para a implantação e/ou implementação do exercício democrático. Como infere Dalbosco, “[...] esta necessária solidão sobre seus próprios pensamentos e ações que é tomada por Sócrates como condição da sociabilidade humana e de sua exposição pública de modo transparente e democrático”. (2013, p. 52-53).

Agregada à competência de argumentar e pensar criticamente, a atitude de se compreender como um cidadão do mundo é essencial para que a proposta de democracia se associe à disposição de pensar globalmente, rompendo as barreiras do local que, por vezes, provocam a exclusão, o preconceito, e agravam diferenças que atravancam o pleno desenvolvimento humano.

O encurtamento do pensamento ao se reduzir à cultura, religião, sistema político locais, entre outros aspectos, não condicionam o trabalho cooperativo para superar problemas de diversas origens que assolam a vida humana mundialmente. Cada vez mais temos ferramentas para romper os limites proporcionados pela língua, pelos meios de comunicação, pela distância física, etc... Há uma responsabilidade e um necessário compromisso de que todos os cidadãos possam pensar sobre os problemas globais pelo fato de que nossas ações e nossos modos de vida operam também sobre o modo de vida de outras pessoas, de outras nacionalidades. O consumo, a cultura, a política, as crenças, tudo isso têm implicações na vida de outras grupos sociais.

Compreender-se como cidadão do mundo requer a disposição de pensar problemas que, por vezes, não sentimos suas consequências de forma direta. Quem sabe, este seja um aspecto ainda mais difícil dessa perspectiva de pensamento e comportamento universais. Esse comportamento que exige maturidade intelectual e moral precisa ser desenvolvido, trabalhado, conjuntamente com a capacidade argumentativa e com a capacidade de estabelecer críticas. Aí uma das responsabilidades essenciais da educação que recai novamente sobre a importância das disciplinas humanitárias e da postura metodológica adequada. O método socrático, que implica no desenvolvimento argumentativo de qualidade, encontra apoio significativo nas palavras do filósofo norte-americano John Dewey, pois o exercício da práxis dialógica deve ser realizado sobre problemas e experiências reais. Nas palavras de Nussbaum, para Dewey, “[...] el elemento socrático no se limitaba a las capacidades intelectuales, sino que constituía un aspecto de las actividades prácticas: era toda una postura frente a los problemas de la vida real”. (2010, p. 97).

O desenvolvimento das faculdades mentais por meio da metodologia pedagógica que promove a capacidade crítico-argumentativa ganha um aspecto moral e ético na medida em que se dispõe a pensar problemas realmente humanos, que de fato preocupam a vida das pessoas. Pois bem, problemas humanos, reais, situados entremeio à complexidade das sociedades exigem alternativas de solução criativas, dependentes da capacidade de imaginação projetiva dos seres humanos. Esse aspecto humano se amplia na medida em que essa capacidade for inspirada pela liberdade e condição de questionar, criticar, se preocupar com os problemas seus e dos outros. A condição de alteridade e a capacidade de argumentar, associadas à atitude criativa e imaginativa dão vida à democracia.

A capacidade de colocar-se no lugar do outro, de procurar entendê-lo e pensar criativamente sobre melhores condições de vida, fomenta a boa sociabilidade humana, pois uma democracia calcada sob seres humanos incapazes de compaixão e ética seria ainda mais problemática. As disciplinas humanitárias, novamente, são propulsoras da compreensão e entendimento da formação política e ética, assim como a importância da participação social por meio das narrativas dos romances, das histórias, dos fatos históricos, dos personagens, dos posicionamentos, da dança, da música, etc...

PARADIGMA DO DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO

Resgatamos, de imediato, o problema pressuposto para esta segunda parte: o modelo de ensino vigente atende os ideais de democracia? Assumimos, aqui, a crítica de Nussbaum, a qual infere que quando a educação é dirigida com objetivo final de obtenção de renda, a democracia e o desenvolvimento humano ficam comprometidos. Ela define a crise na educação como uma crise silenciosa, uma espécie de câncer, que age na surdina, sem ser percebida por não ser mensurável, já que “sedientos de dinero, los estados nacionales y sus sistemas de educación están descartando sin advertirlo ciertas aptitudes que son necesarias para mantener viva a la democracia”. (NUSSBAUM, 2010, p. 20).

A proposição de uma educação voltada unicamente a atender as demandas sociais do crescimento econômico comete, preliminarmente, uma distinção nos princípios educacionais que definem “o que ensinar” e “como ensinar”. Temos, dessa proposição, duas conclusões iniciais: a) As disciplinas devem atender às exigências de formação de profissionais. Não necessariamente à formação de profissionais-cidadãos, mas simplesmente de profissionais que precisam ir para o mercado de trabalho e dar conta dos conhecimentos técnicos exigidos pela profissão escolhida. Isso implica que as disciplinas que comporão as grades curriculares tenham valor especificamente instrumental, que atendam ao macro-objetivo de profissionalização; b) Por consequência, a metodologia de ensino também é predefinida por esta proposição, pois o educador pode e deve adotar a postura metodológica que simplesmente explica o conteúdo para um aluno que deve dominá-lo em prol do conhecimento puramente técnico, objetivo, instrumental.

Quando o modelo de proposta educacional não se concentra no indivíduo e suas potencialidades, mas nas carências e demandas econômicas do país, as disciplinas curriculares e as metodologias de ensino não atendem o desenvolvimento humano. Se a nação está bem, pouco importam as desigualdades sociais vividas pelos cidadãos, já que o governo tem foco no conjunto. Portanto, o Paradigma do Desenvolvimento Econômico não promove, necessariamente, qualidade de vida dos cidadãos de forma igualitária, pois “producir crecimiento económico no equivale a producir democracia”. (NUSSBAUM, 2010, p. 36).[4]

Poupar-se da preocupação tanto do desenvolvimento de conteúdos adequados quanto de metodologia apropriada ao desenvolvimento humanístico, implica no abandono de uma educação voltada para o alargamento do pensamento crítico, da autonomia e da capacidade de alteridade do ser humano. Nussbaum destaca que nesse modelo as pessoas não são vistas como dotadas de uma alma, conceito que a autora assume como “[...] las facultades del pensamiento y la imaginación, que nos hacen humanos y que fundan nuestras relaciones como relaciones humanas complejas en lugar de meros vínculos de manipulación y utilización”. (2010, p. 25). O futuro da democracia fica comprometido quando as relações humanas passam a ter fins extremamente práticos, de resultado objetivo, utilitário, consequência de uma formação que deixa de lado e/ou pouco valoriza a riqueza e os benefícios que a educação humanística, calcada em disciplinas como as artes, filosofia, história, podem trazer.

O paradigma do crescimento econômico desconsidera a importância do estudante em conhecer a cultura histórica da humanidade, em especial pelo fato de que, enquanto sujeito, tem faculdades mentais que o condicionam a analisar e a refletir sobre a história, emitindo juízos e fazendo com que o próprio processo metodológico de aprender o constitua enquanto sujeito pensante. Este paradigma, que promove uma elite sabedora e dominadora da competência para os negócios, distancia dos currículos disciplinas artísticas e humanistas, provocadoras e promotoras de diversas competências humanas, como a capacidade de alargar o raciocínio, de estabelecer críticas, de criatividade e imaginação, de construção argumentativa, de sensibilidade com o meio social em que vive, de estabelecer conceitos, ampliar a capacidade de alteridade e compreensão moral, etc... Elementos desvalorizados pela educação para a renda, uma vez que logicamente não servem unicamente para geração de renda no contexto do crescimento econômico. Segundo Martha Nussbaum, ao fazer uso do pensamento de Rabindranath Tagore, famoso pedagogo indiano, infere que

 

[...] el nacionalismo agresivo necesita embotar la consciencia moral y, en consecuencia, necesita personas que no reconozcan lo individual, que hablen una jerga grupal, que se comporten como burócratas dóciles y que también vean el mundo como tales. (2010, p. 46)

 

Assim, o ensino assume uma tendência clara de mercado, e aqui não nos referimos apenas à ação do professor como ato educativo, mas à forma com que as instituições são gestadas e, consequentemente, os caminhos que percorrem a partir das tomadas de decisões de seus dirigentes. As instituições são vistas como forma de gerar lucros por elas mesmas[5], e a melhor gestão é entendida como a que gera mais lucro, assim como a melhor sociedade é entendida como aquela que tem melhor desempenho econômico. Dalbosco critica esta postura ao afirmar que algumas reformas universitárias tendem a “[...] promover uma especialização restrita, a ser alcançada por um tempo de formação cada vez mais reduzido e com baixos custos financeiros”. (2013, p. 40). Essa perspectiva moderna dos sistemas educacionais sustenta, portanto, a tendência mundial em buscar, disseminadamente, o lucro. Tal tendência, decorrente da compreensão do sistema econômico-social vigente, é amparada pela educação formal, de forma consciente ou inconsciente, o que exige da educação princípios que, em sua avaliação, contradizem com conceitos de humanização:

 

Si esta tendencia se prolonga, las naciones de todo el mundo en breve producirán generaciones enteras de máquinas utilitarias, en lugar de ciudadanos cabales con la capacidad de pensar por sí mismos, poseer una mirada crítica sobre las tradiciones y comprender la importancia de los logros y los sufrimientos ajenos. El futuro de la democracia a escala mundial pende de un hilo. (NUSSBAUM, 2010, p. 20)

 

O desenvolvimento econômico das nações, tornou-se um dos principais, se não o principal motivo da vida humana. Objetivo este que abarca tanto num sentido macro, quando nos referimos à própria nação, como num sentido particular, quando nos referimos aos projeto de vida. Um profissional de sucesso é aquele que tem uma profissão da qual lhe renda bom status financeiro. Assim também com as nações de sucesso. Martha Nussbaum ao questionar o “qué significa[...] el progreso para una nación?” (2010, p. 34), conclui que o desenvolvimento econômico é usado como único critério para definir se uma nação tem ou não progresso, não importando outros valores humanos, como a igualdade social, a tolerância, a liberdade de expressão, a saúde, a educação, etc. Não concluímos que uma nação está em ascensão porque respeita a complexidade da personalidade humana, ou porque há o fortalecimento dos direitos humanos, ou ainda porque há convivência harmoniosa entre grupos étnicos.

Portanto, uma educação que se estrutura para atender as demandas do Paradigma do Desenvolvimento Econômico não concentra suas ações pedagógicas em despertar o interesse do aluno em debater problemas que afetam a vida humana e, muito menos, em buscar alternativas de soluções para estes problemas, pois a preocupação nuclear se dá através da necessidade de dominar conteúdos que possam instrumentalizá-lo para a vida profissional.

GESTÃO EDUCACIONAL E DEMOCRACIA

O conceito de gestão que, assim como tantos outros, não tem uma definição tão trivial quanto nos sugere. O desafio ao lidar com este conceito é não deixá-lo nem tão complexo e nem tão simples, para que não se torne obsoleto. Para conduzir as especulações deste ensaio, faremos uso de uma conceituação de gestão articulada por Heloísa Lück[6]:

 

Uma forma de conceituar gestão é vê-la como um processo de mobilização da competência e da energia de pessoas coletivamente organizadas para que, por sua participação ativa e competente, promovam a realização, o mais plenamente possível, dos objetivos de sua unidade de trabalho, no caso, os objetivos educacionais. (2013, p. 21).

Esse posicionamento da função do gestor como responsável primário por atingir os objetivos educacionais é fundamental para que esta função tenha relevância para a educação. Ora, se tem o gestor essa função, como não considerá-lo como fator substancial para definir que objetivos são estes? Neste contexto propomos pensar as ações da gestão educacional sob os princípios de uma educação para a democracia. Por isso, lançamos mão da hipótese de que quando a metodologia de ensino de um educandário, assim como o desenho curricular é pensado, estudado e planejado, essa demanda se coloca antes mesmo do professor, ainda no campo da gestão educacional, que antecede a ação pedagógica. Dito de outra maneira, pressupomos que a finalidade das práticas de gestão educacional perpassa pelo alcance dos objetivos educacionais.

Quando nos referimos à gestão educacional, revelamos duas áreas do conhecimento que, associadas, devem apresentar ótima sintonia, assim como define Heloísa, para que a qualificação da gestão resulte em qualidade da educação. No entanto, as Instituições de Ensino deparam-se, no que diz respeito à sua gestão, com duas demandas bem notáveis: a) primeiramente uma modernização em suas formas de gestão com vistas a identificarem-se com modelos de empresas que adotam conhecimentos técnicos da área administrativa para que possam se tornar competitivas, aspecto este mais comum às instituições privadas, porém, em menor escala, é possível perceber alguns movimentos nesta direção em instituições públicas; b) uma formatação do modelo de ensino oferecido em sala de aula, sustentado pelas práticas de gestão, com vistas a atender as demandas sociais e econômicas, especialmente na perspectiva de promover um paradigma de crescimento econômico através da formação direcionada para um ideal de aluno capaz de se tornar competitivo no mercado, gerar renda e condições técnicas para o desenvolvimento da nação[7].

As duas demandas supra citadas não são um problema em si mesmas, elas se tornam problemáticas e controversas na medida em que abandonam princípios humanizadores, os quais deveriam ser aportes tanto no modelo de gestão educacional, quanto no modelo de ensino-aprendizagem adotados. A questão que se coloca aqui é que o modelo de ensino das instituições é pré-determinado ou, pelo menos, induzido pelos gestores da instituição. Quando estes gestores estão imersos no mundo empresarial, tomados por valores e princípios meramente gerenciais, com vistas a atenderem as demandas do mercado, perde-se, institucionalmente, o foco nos resultados educacionais ampliados, como o aprendizado do aluno e, consequentemente, a preparação para a vida em democracia. Neste sentido, o posicionamento político-educacional de uma Instituição de Ensino perpassa, antes de mais nada, pela perspectiva administrativa do gestor ou da equipe de gestão desta instituição. Tanto a ação assertiva de conduzir a uma proposta educacional, quanto a ação restritiva ao não se preocupar com o direcionamento do modelo de ensino-aprendizagem, cedendo liberdade aos educadores a determinarem seus princípios metodológicos, tais comportamentos conduzem a um determinado posicionamento político-educacional. Por isso, propomos analisar alguns princípios da gestão educacional à luz do Paradigma do Desenvolvimento Humano apresentado.

Gestão Educacional é um assunto que está em discussão há pouco tempo no Brasil quando se discutem os rumos da educação privada e também da educação pública[8]. Nenhuma proposta educacional de qualidade transcende sua descrição em documentos oficiais das instituições, a exemplo de uma Proposta Pedagógica Institucional, se seus gestores não se propõem, efetivamente, a tratar esta proposta como gerencial e fundadora de todas as atividades educacionais e administrativas da instituição.[9] Atividades estas que, apesar de terem suas origens conceituais em áreas distintas, precisam ser pensadas numa relação coerente, uma vez que, nas instituições educacionais, uma implica diretamente na outra. Heloísa Lück, ao apresentar seu livro A Gestão Participativa na Escola, descreve que, ao refletir sobre este tema, espera “[…] contribuir para o estabelecimento de ações de gestão mais consistentes e orientadas para a efetivação de resultados educacionais mais positivos, tendo como foco a aprendizagem dos alunos e sua formação”. (2013, p. 17).

Os fundamentos da gestão educacional demandam cuidados, especialmente pelo fato da educação ser gerenciada cada vez mais por profissionais oriundos de outras áreas, especialmente, das ciências administrativas. Na medida em que as Instituições de Ensino começam a ser tratadas como empresas, estas adotam princípios gerenciais e instrumentais que, por vezes, não levam em consideração a natureza e a especificidade da educação. Pelo fato de tratar da formação humana e, por consequência da formação do cidadão, a gestão educacional não pode se constituir como um fim em si mesma, mas como meio para ampliar a qualidade desta formação. E, é justamente neste aspecto que o questionamento sobre as competências da gestão educacional, poderia nos conduzir a verificar se a gestão pode ou não contribuir tanto para uma Educação para a Renda, sustentando o Paradigma do Desenvolvimento Econômico, quanto para uma Educação para a Democracia Social sustentando o Paradigma do Desenvolvimento Humano.[10]

A relação entre gestão e educação, que normalmente é conflituosa, agrava-se quando os objetivos econômico-administrativos da instituição e da nação são assumidos pelos gestores como prioritários frente aos objetivos educacionais. Esta sobreposição aumenta a tensão já existente entre gestão educacional e a proposta político-pedagógica das instituições, provocando o detrimento da constituição e promoção das competências humanas.

 

Distraídos por la búsqueda de la riqueza, nos inclinamos cada vez más por esperar de nuestras escuelas que formen personas aptas para generar renta en lugar de ciudadanos reflexivos. Bajo la presión de reducir los gastos, recortamos precisamente esas partes de todo emprendimiento educativo que resultan fundamentales para conservar la salud de nuestra sociedad. (NUSSBAUM, 2010, p. 187).

 

Ainda assim, entende-se que os gestores precisam se ocupar com a sustentabilidade e promoção da instituição. Nussbaum aponta, inclusive, que a educação voltada a atender a capacidade humana e suas competências individuais agregaria ao próprio desenvolvimento econômico, como por exemplo, a capacidade de inovação dos profissionais:

[...] en el mundo empresarial es importante la innovación, y existen motivos más que suficientes para suponer que la educación humanística fortalece las capacidades de la imaginación y la independencia de criterio, que son fundamentales para una cultura innovadora. (2010, p. 82).

Temos, portanto, uma demanda vigente da realidade das Instituições de Ensino que cada vez mais assumem posturas com identidades bem empresariais, o que resulta em consequências acadêmico-pedagógicas, não somente na própria sala de aula, mas também em outras instâncias de ensino, como na pesquisa e extensão[11]. Tais percepções mais palpáveis e figurativas das Instituições de Ensino têm implicações conceituais e formativas de um ideal de cidadão e de um ideal de sociedade que, especificamente, é o objetivo último a ser refletido quando nos propomos pesquisar sobre gestão educacional e suas finalidades e consequências para garantir um processo de ensino e aprendizagem com vistas a atender uma perspectiva democrática de vida social e constituição das relações humanas.

Uma outra dimensão interessante a ser destacada é que o processo de gestão, por si só, já é um movimento que implica ações educativas, formativas. Primeiramente porque, mesmo que se queira, não é possível pensar em processos de gestão sem a ação humana e sem relações humanas, pois exige-se, necessariamente, o envolvimento coletivo de pessoas para que estes processos de gestão possam existir e, mais ainda, em segundo lugar, porque precisa-se de profissionais que trabalhem de forma cooperativa, fazendo uso de suas potencialidades, de suas energias. A grande maioria das instituições educacionais comportam não apenas um gestor(a), mas uma equipe de gestão que, apesar de ter um líder, envolve diversas pessoas, com responsabilidades e competências diferenciadas. A compreensão de gestão parte do pressuposto de que seu êxito é resultado de uma ação construtiva e coletiva, assim como define Lück, a gestão como mobilização das energias e competências das pessoas.

O modelo de gestão educacional contribui para a formação de pessoas que constroem concepções de mundo a partir do modo como gerenciam e de como são gerenciadas durante as atividades voltadas para resultados por meio dos processos e das relações interpessoais. Conforme Heloísa Lück, o mais importante no processo de democratização das ações de gestão é:

 

[...] o processo educacional e o ambiente escolar serem marcados pela mais alta qualidade, a fim de que todos os que buscam educação desenvolvam os conhecimentos, as habilidades e as atitudes necessários para que possam participar, de modo efetivo e consciente, da construção do tecido da sociedade, com qualidade de vida e desenvolvendo condições para o exercício da cidadania. (2013, p. 26-27)

 

Em suma, a gestão pode trazer benefícios à formação dos cidadãos de forma mais alargada na medida em que o gestor considerar os seguintes aspectos: a) apropriar-se de conhecimentos acerca dos conceitos de educação e de gestão para poder pensar a relação entre essas áreas do conhecimento: clareza conceitual sobre a função do gestor da educação é vital para que a educação não fique subordinada às finalidades da gestão; b) ter clareza da finalidade da educação: a formação humana perpassa pelo desenvolvimento de princípios macros – como respeito, alteridade, responsabilidade, participação – os quais são e devem ser o sentido do ato educacional, não permitindo que estes princípios sejam corrompidos ou subdesenvolvidos em razão das necessidades sociais, da lógica de mercado...; c) mobilizar o corpo docente para atender os objetivos educacionais: a formação humana é o objetivo da educação e está no papel do gestor a possibilidade de mobilizar os educadores para desenvolverem a proposta pedagógica da instituição.

Associados a estas três conclusões genéricas sobre a competência dos gestores, podemos complementar, de forma mais diretiva, quatro derivativos fundamentais da teoria de Nussbaum, se queremos que a educação forme cidadãos capazes para viver em democracia: a) que os gestores trabalhem para que as propostas educacionais promovidas pelas instituições não sejam calcadas em princípios econômicos, sedimentando o modelo de educação para a renda. Para isso, o modelo de educação para a democracia requer que a formação aconteça via disciplinas que promovam o cultivo da imaginação e da criatividade, características vitais para a implantação e implementação da democracia; requer método de ensino que prime pela capacitação argumentativa do educando, para que este possa dominar a arte de participar, envolver-se, empenhar-se em aprender, construir e expor seus pensamentos de forma clara, lógica e coerente; requer um cidadão capaz de se preocupar, de se envolver e de buscar alternativas para problemas humanos, problemas que se encontram além de sua própria nacionalidade e que exigem um pensamento de cidadão do mundo; b) que o comportamento do próprio gestor, enquanto um cidadão que pensa a formação de cidadãos, leve em consideração alguns aspectos constituidores do ato de gestar, o qual também se constitui como um ato educativo: atitude de alteridade, para reconhecer os outros cidadãos como pessoas de direito, que merecem respeito pela sua individualidade; atitude de imaginação, para se dispor a pensar uma gama de situações complexas que afetam a vida humana; atitude de conceber a sua nação como integrante de um todo maior, que precisa ser pensado na medida em que tomar decisões enquanto gestor.

REFERÊNCIAS

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NUSSBAUM, Martha C. Fronteiras da Justiça: deficiência, nacionalidade, pertencimento à espécie. Tradução de Susana de Castro. São Paulo: Martins Fontes, 2013.

PARO, Vitor Henrique. Administração Escolar: introdução crítica. 17. ed. rev. e ampl.. São Paulo, SP: Cortez, 2012.

PARO, Vitor Henrique. Gestão escolar, democracia e qualidade do ensino. 1. ed. São Paulo: Ática, 2007.

SCHWARTZMAN, Simon. A Universidade primeira do Brasil: entre intelligentsia, padrão internacional e inclusão social. Estudos Avançados: revista do Instituto de Estudos Avançados da Universidade de São Paulo, São Paulo, n. 56, p. 161-189, 2006.

UMPIERES, Rodrigo Tolotti. As 6 aquisições que tornaram a Kroton a maior empresa de educação do mundo. Disponível em: < http://www.infomoney.com.br/kroton/noticia/2742805/aquisicoes-que-tornaram-kroton-maior-empresa-educacao-mundo>. Acesso em: 02/03/2015.

[1] Problema semelhante mobilizou uma pesquisa realizada pelo Dr. Fernando Luiz Abrucio, Professor Doutor Adjunto da Fundação Getúlio Vargas, sobre os impactos da gestão na qualidade do ensino, que tens seus resultados publicados no artigo “Gestão escolar e qualidade”.

[2] Eram considerados cidadãos e, portanto, aptos para participar dos debates na Ágora, onde aconteciam os debates e decisões políticas, apenas os homens brancos e estrangeiros com muitas posses. Não eram considerados cidadãos e, portanto, não podiam participar da democracia grega, as mulheres, crianças e negros. Em meados do século V a.C. o termo demokratia começou a ser usado pelos Gregos. De forma rápida, a raiz do termo se divide em “demo” que significa povo e, “kratia” que significa governo. O “governo do povo” portanto. E hoje, quem é o “demo” que constitui a democracia? Esta é a pergunta que pode, inicialmente, provocar as especulações deste ensaio.

[3] É importante registrar que não é intenção afirmar que os conhecimentos técnicos e os saberes construídos nas diferentes áreas do conhecimento não têm relevância para a formação. Nussbaum aponta, inclusive, que a educação voltada a atender a capacidade humana e suas competências individuais agregaria ao próprio desenvolvimento econômico das sociedades vigentes, como por exemplo, a capacidade de inovação dos profissionais: “[...] en el mundo empresarial es importante la innovación, y existen motivos más que suficientes para suponer que la educación humanística fortalece las capacidades de la imaginación y la independencia de criterio, que son fundamentales para una cultura innovadora.” (2010, p. 82)

 

[4] Martha Nussbaum escreve suas obras com referência ao ensino superior dos Estados Unidos e da Índia, em especial. No entanto, pressupõe que suas críticas e inferências apontam a realidade e caminhos para a educação superior de uma formal universal. Existem alguns artigos e pesquisas que demonstram tal realidade também em instituições brasileiras, como o artigo escrito pelo sociólogo Simon Schwartzman (citado nas referências bibliográficas) sobre o contexto político em que a Universidade de São Paulo – USP foi criada, explicitando os motivos veementes de seu surgimento, especialmente o objetivo de criar uma elite intelectualmente dominadora, que colabora para compreender a expansão do pensamento de Nussbaum também para a realidade das Universidades brasileiras.

[5] No caso específico das instituições privadas.

[6] Doutora em Educação pela Universidade Columbia/EUA e pós-doutora em Pesquisa e Ensino Superior pela Universidade George Washington/EUA.

[7] Uma situação que ilustra significativamente esta situação são as orientações do Banco Mundial às mudanças necessárias ao ensino superior, indicadas no documento La enseñanza superior: las lecciones derivadas de la experiencia, em 1995, as quais definem que a educação brasileira deveria promover mudanças estratégicas para atender rapidamente às demandas no mercado de trabalho. Isto é, uma instituição privada, oriunda da área econômica, que direciona o rumo da educação brasileira e, por consequência, o modelo de ensino que deve ser oferecido. Logicamente, não há nenhuma ingenuidade intelectual no sentido de pensar que as instituições educacionais são ou serão totalmente autônomas, independentes de qualquer cultura, política, diretriz, etc... Mas, pensar a possibilidade das instituições de ensino manterem alguns valores e princípios educacionais, e neste caso também gerenciais, para poder propor e/ou, pelo menos, discutir uma proposta educacional que não tenha seus fundamentos necessariamente nas questões econômicas.

[8] Vitor Henrique Paro, Heloísa Lück e José Carlos Libâneo são alguns teóricos que se propuseram a refletir sobre gestão educacional numa perspectiva preocupada a atender princípios e valores educacionais/formativos. Há mais tempo podemos nos referir a José Querino Ribeiro, nas décadas de 30 e 40. Apesar disso, em comparação com outras temáticas da educação este é um assunto com menor número de referências bibliográficas.

[9] Em termos prático-operacionais, o gestor educacional é o responsável pelas decisões administrativas da instituição, as quais implicam absolutamente sempre na demonstração de um modelo de gestão, mesmo que esse modelo se construa somente na experiência das ações tomadas pelo(s) gestor(es).

[10] Ambas nomenclaturas e definições são oriundas das obras de Martha Nussbaum.

[11] Para ilustrar esta situação, temos atualmente um exemplo paradigmático, na fusão entre duas Instituições de Ensino do País, a Kroton e a Anhanguera, que juntas tornaram-se a maior Instituição de Ensino do mundo, com mais de 1 milhão de alunos e faturamento anual acima de 4 bilhões de reais. No entanto, antes da fusão, a Kroton já havia realizado mais 5 aquisições, fazendo disparar o valor das ações da instituição. Podemos notar aqui, claramente, que as instituições de ensino nunca foram tratadas nesta ótica, de captação e fomento de receitas econômicas de forma tão acirrada e naturalmente transparente. Numa das entrevistas, citadas nas referências bibliográficas, realizada pelo jornalista André Jankavski, para a Revista “Isto É”, o presidente da Kroton, Rodrigo Galindo, deixa claro que o objetivo das Instituições de Ensino Privadas é a formação de mão-de-obra e não a pesquisa e extensão.

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