Fome de Que?
Por Wolmer Ricardo Tavares – Mestre em Educação e Sociedade, Escritor, Palestrante e Docente – www.wolmer.pro.br
A educação tem o poder de libertar as pessoas para se tornarem protagonistas, de transformar um ser ignorante em um cidadão crítico e ativo, a ponto de perceber que o seu entorno não mudará se ele resolver não fazer nada.
O Brasil é um gigante adormecido, preguiçoso e que fica “deitado eternamente em berço esplêndido”, todavia está na hora deste gigante adormecido acordar e olhar para o seu povo que tem fome, mas não é apenas fome de comida, é fome de cultura, de dignidade, de respeito, segurança, moradia e principalmente de amor.
Hodiernamente falta ao brasileiro esperança para dias melhores, pois a fome vista no seu sentido denotativo, representa a ferida aberta e sangrando, já que dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios mostram que a pobreza está aumentando no Brasil e junto com ela, a fome[1].
De acordo com Laís Alegretti da BBC News Brasil em Londres[2], hoje 19 milhões de brasileiros estão em situação de fome, e segundo a pesquisadora, reza na Constituição Federal que alimentação é um direito social do brasileiro, o problema que nossa sociedade encontra-se tão polarizada e alienada que quando se aborda assuntos sociais de responsabilidade do Estado, as pessoas são estigmatizadas como comunistas.
Aqui o termo comunista pode ser muito bem substituído por humanista, apesar da fome ter um viés político ela perpassa pelo humanismo, pelo amor ao próximo e pela empatia.
Carla Rodrigues em seu livro Ética e Cidadania, publicado pela Moderna em 1994, faz uma entrevista com o sociólogo Herbert Souza e este, pontua que se a fome tivesse uma alma, esta seria política.
Segundo o sociólogo a fome é a exclusão da terra, da renda, do emprego, do salário, da educação, da economia, da vida e da cidadania. Pensem, se uma pessoa chega a não ter mais o que comer, é sinal de que tudo isso lhe foi negado.
Trata-se de um cerceamento moderno ou até mesmo exílio, é a morte em vida nas falas do sociólogo, mas obviamente isso se trata de uma visão “comunista”, afinal de contas, o que interessa a dor dos outros na visão dos políticos que se preocupam em comprar mansões e proteger seus entes queridos usando a polícia federal para isso?
Seguindo a linha deste ícone que foi Herbert de Souza, a fome é o atestado da miséria absoluta, é um grito de alerta que ressalta o desastre social e mostra a cara do Brasil ao mundo, um Brasil extremo na miséria com políticos corruptos e enriquecidos.
Demo em eu livro Saber Pensar, publicado pela Cortez em 2000 complementa as falas acima ao elucidar que passar fome é a grande miséria, todavia, a maior miséria é
não saber que, primeiro, fome é inventada e imposta, e, segundo, que para superar a fome não basta receber comida, mas é essencial ter condições de prover o próprio sustento. Com isto, passou-se a considerar ignorância como centro da pobreza: pobre é sobretudo quem não sabe ou é coibido de saber que é pobre (DEMO: 2000, p. 146).
Para o autor, a pobreza não se limita a privação de bens materiais, ela representa a privação de construir as próprias oportunidades.
Desta forma, pode-se através de Harari em seu livro Homo Deus: Uma Breve História do Amanhã, publicado pela Companhia das Letras em 2016, que a fome representa o limite da pobreza biológica, na qual as pessoas sucumbem à desnutrição, resultando na perda da dignidade e até mesmo na morte.
A própria música composta por Sergio Affonso; Marcelo Fromer e Arnaldo Filho em 1987 e cantada pelo grupo de rock Titãs faz uma alusão a miséria e alienação., você tem fome de que? A gente não quer só comida; a gente quer comida, diversão e arte; a gente não quer só comida; a gente quer saída para qualquer parte.
E assim está o povo brasileiro, querendo comida, dignidade, amor e muito mais para uma viver uma vida plena e de sonhos.
Assim sendo, pensar no outro não se trata de ideologia política e socioeconômica, se trata penas de empatia, pois quando a dor do outro não nos afetar, seremos nós que precisaremos de ajuda.