16/11/2025

Financiamento Climático para Países em Desenvolvimento: Caminhos e Desafios Rumo à COP 30.

Ivan Carlos Zampin

Resumo

O financiamento climático constitui-se como um pilar central da governança climática global, destinado a viabilizar a transição para economias de baixo carbono e a adaptação aos efeitos das mudanças climáticas, particularmente nos países em desenvolvimento. Este artigo analisa a evolução, a estrutura atual e os desafios persistentes do financiamento climático, com foco nos debates recentes e nas perspectivas para a COP 30, sendo realizada em Belém, Brasil. Por meio de uma revisão bibliográfica e análise documental, o estudo demonstra que, apesar dos avanços institucionais desde a Eco-92, o volume de recursos permanece insuficiente, o acesso é burocrático e oneroso, e há uma desconexão entre os fluxos financeiros e as necessidades locais mais prementes, como a adaptação e a conservação de florestas tropicais. A análise centra-se em quatro caminhos prioritários para o avanço da agenda: o mecanismo de Perdas e Danos, os fundos setoriais de inovação, um novo regime de dívida climática e o fortalecimento dos fundos de adaptação. Conclui-se que a superação desses desafios e a efetiva implementação desses caminhos na COP 30 são imperativas para construir um sistema de financiamento climático mais justo, robusto e alinhado com os princípios da justiça climática.

Palavras-chave: Financiamento Climático; COP 30; Países em Desenvolvimento; Adaptação; Mitigação; Justiça Climática.

1. Introdução

Nas últimas três décadas, a humanidade tem testemunhado a escalada da crise climática, com a temperatura média global aumentando constantemente e seus impactos como eventos climáticos extremos, elevação do nível do mar e perda de biodiversidade tornando-se cada vez mais severos e onipresentes (IPCC, 1990, p. 15). A resposta internacional a essa crise coalesceu-se em torno de marcos diplomáticos, iniciando-se com a Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento (Eco-92), no Rio de Janeiro, que deu origem à Convenção “Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima” (UNFCCC, 1992). O objetivo central da UNFCCC era "estabilizar as concentrações de gases de efeito estufa (GEE) na atmosfera" (UNFCCC, 1992), reconhecendo desde cedo a necessidade de suporte financeiro para que nações menos desenvolvidas pudessem cumprir esse anseio.

O termo financiamento climático refere-se, portanto, à estrutura de fundos e mecanismos de financiamento, estabelecidos ou regulados internacionalmente, para apoiar países na transição climática e no combate aos seus efeitos. Seu escopo abrange desde a mitigação, com a redução de emissões de GEE, até a adaptação, com a proteção de comunidades e ecossistemas vulneráveis. Como destacam Hicks et al. (2008, p. 112), "a arquitetura financeira do clima tornou-se um campo de batalha político onde se definem as responsabilidades históricas e as capacidades futuras das nações".

Desde a Eco-92, os esforços para organizar e desenvolver o financiamento climático têm estado no centro da governança internacional do clima. O Protocolo de Kyoto, com seu Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), representou um passo inicial, porém insuficiente e criticado. O Acordo de Paris, em 2015, elevou a ambição, buscando limitar o aquecimento global a 1,5°C e universalizando as responsabilidades, ainda que diferenciadas. No entanto, os desafios são profundos, visto que: o volume de recursos é considerado insuficiente; muitos países em desenvolvimento enfrentam barreiras técnicas e burocráticas intransponíveis para acessá-los; e há uma significativa dificuldade em atrair investimentos privados em escala necessária (PALLEMAERTS e ARMSTRONG, 2009).

O propósito principal deste estudo é lançar luz sobre esta discussão, analisando a estrutura, os limites e os desafios do financiamento climático contemporâneo. Em particular, o artigo se debruça sobre as mensagens emergentes da COP 27, que sinalizaram um ponto de inflexão ao destacar a insuficiência de escala, a urgência da adaptação e a necessidade de inovação nos mecanismos financeiros. O terceiro propósito é sugerir perspectivas de avanço, indicando um conjunto de caminhos em discussão para a COP 30, ou seja: (a) Perdas e Danos; (b) Fundos setoriais de inovação; (c) Regime de dívida climática; e (d) Fortalecimento de Fundos de adaptação (PINTO et al, 2023).

O presente estudo organiza-se em cinco seções consecutivas. Após esta introdução inicial, a segunda parte recupera a trajetória histórica da governança climática internacional, com ênfase no papel central do financiamento desde suas origens. A terceira seção mapeia a arquitetura financeira contemporânea, analisando separadamente os fluxos públicos e os mecanismos de capital privado que compõem o atual panorama de investimentos climáticos. A quarta unidade examina criticamente os obstáculos estruturais evidenciados durante a COP 27, problemas esses que continuam a ser corroborados por evidências e relatórios mais recentes. Por fim, a quinta e última seção explora cenários futuros e propostas concretas para impulsionar esta agenda, dedicando especial atenção às perspectivas que se colocam para a COP 30, a ser realizada em Belém (PINTO et al, 2023).

2. Referencial Teórico e Histórico: A Trajetória do Financiamento Climático Global

A construção do regime internacional de mudança climática é indissociável da evolução de seus instrumentos financeiros. A governança climática, como argumentam Keohane e Levy (1996, p. 45), funciona por meio de "instituições destinadas a resolver problemas de ação coletiva, onde a cooperação é necessária, mas os incentivos para o free-riding são altos". O financiamento climático surge como um mecanismo crucial para superar essa barreira, operacionalizando o princípio das "responsabilidades comuns, porém diferenciadas" consagrado na UNFCCC.

2.1. Dos Primórdios à Eco-92 e ao Protocolo de Kyoto

A Eco-92, ou Cúpula da Terra, foi o palco onde a comunidade internacional reconheceu formalmente a necessidade de um esforço financeiro coordenado. A UNFCCC, resultante desta conferência, estabeleceu que os países desenvolvidos "devem fornecer recursos financeiros novos e adicionais para cobrir os custos incorridos" pelos países em desenvolvimento na implementação de suas obrigações (UNFCCC, 1992, p. 11). Este foi o germe do conceito de financiamento climático.

O Protocolo de Kyoto (1997) operacionalizou esse mandato ao criar o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). O MDL permitia que países desenvolvidos investissem em projetos de redução de emissões em países em desenvolvimento e recebessem Créditos de Carbono (CERs) em troca. No entanto, este mecanismo foi amplamente criticado. Conforme analisa Pallemaerts e Armstrong (2009, p. 201), "o MDL falhou em gerar reduções reais e adicionais de emissões em muitos casos, transformando-se em um jogo de contabilidade de carbono, sem promover a transformação tecnológica e sistêmica necessária". A estrutura era complexa e burocrática, excluindo muitos projetos menores e comunidades locais.

2.2. O Advento do Acordo de Paris e a Nova Arquitetura Financeira

O Acordo de Paris (2015) representou uma mudança de paradigma. Ao invés de um modelo baseado apenas em obrigações legais rígidas para um grupo de países, Paris adotou uma abordagem híbrida, baseada em Contribuições Nacionalmente Determinadas (NDCs) de todos os países. Esse novo desenho elevou a importância do financiamento como um facilitador universal da ação climática.

O artigo 2.1(c) do Acordo estabelece o ambicioso objetivo de "tornar os fluxos financeiros consistentes com um caminho rumo a baixas emissões de gases de efeito estufa e desenvolvimento resiliente ao clima" (UNFCCC, 2015, p. 3). Isso significa que o financiamento climático deixou de ser visto apenas como transferência Norte-Sul e passou a englobar a remoção de subsídios a combustíveis fósseis, a mobilização de capital privado e a reorientação de todo o sistema financeiro global. O Fundo Verde para o Clima (GCF), criado em Copenhague (2009) e operacionalizado após Paris, tornou-se a principal entidade multilateral para canalizar recursos, mas sua capacidade ainda é pequena, pelas suas necessidades.

A governança do financiamento climático, portanto, evoluiu de um modelo centralizado e baseado em projetos (MDL) para um ecossistema complexo e fragmentado, envolvendo múltiplos atores, fundos e instrumentos. A próxima seção detalhará esse arranjo contemporâneo.

3. Desenvolvimento: A Arquitetura Atual do Financiamento Climático

A arquitetura atual do financiamento climático é caracterizada por sua pluralidade de fontes e mecanismos, que podem ser categorizados, grosso modo, em fluxos públicos e privados.

3.1. Financiamento Público: A Espinha Dorsal da Solidariedade Internacional

O financiamento público internacional continua sendo a espinha dorsal do apoio aos países em desenvolvimento. Ele é composto por:

  • Fundos Multilaterais: O Fundo Verde para o Clima (GCF) é o maior fundo dedicado, focado em projetos de mitigação e adaptação com impacto transformador. Outros incluem o Fundo Global para o Meio Ambiente (GEF) e o Fundo de Adaptação;
  • Fontes Bilaterais: Países desenvolvidos canalizam recursos diretamente para países em desenvolvimento por meio de suas agências de cooperação, como a USAID (EUA) ou a GIZ (Alemanha);
  • Instituições Financeiras de Desenvolvimento (IFDs): Bancos como o Banco Mundial e bancos regionais de desenvolvimento (BID e BAD) fornecem empréstimos, doações e garantias para projetos climáticos.

No entanto, a operacionalização desses fundos é problemática. Hicks et al. (2008, p. 128) já alertavam que "a proliferação de fundos climáticos pode levar à fragmentação, sobrecarregando a capacidade administrativa limitada dos países receptores". Além disso, há uma crítica fundamental sobre a natureza dos recursos. Conforme exposto no material de base, "os fundos internacionais têm priorizado empréstimos a juros de mercado e operações reembolsáveis, promovendo endividamento de países vulneráveis e reforçando uma lógica colonial" (Maziviero, 2025, p. 10). Isso significa que, em vez de solidariedade, o financiamento climático pode estar exacerbando a dívida externa de nações que pouco contribuíram para a crise.

3.2. Financiamento Privado: A Busca pela Escala

Reconhecendo a limitação dos cofres públicos, o “Acordo de Paris” colocou uma forte ênfase na mobilização de financiamento privado. A lógica é que apenas o setor privado possui a escala de capital necessária para a transição global. Os mecanismos incluem:

  • Mercados de Carbono: Regulados pelo Artigo 6 do Acordo de Paris, permitem que países ou empresas comprem créditos de carbono de projetos de redução de emissões em outros lugares. A expectativa é que um mercado global robusto possa direcionar bilhões para ações de mitigação;
  • Títulos Verdes (Green Bonds): São títulos de dívida emitidos para financiar projetos ambientais e climáticos. O mercado tem crescido exponencialmente, mas ainda representa uma fração minúscula do mercado de títulos global;
  • Financiamento Misto (Blended Finance): Utiliza capital público ou filantrópico para atrair investimento privado, mitigando riscos e tornando projetos em países em desenvolvimento mais atraentes.

O desafio, porém, é profundo. O investimento privado é naturalmente atraído por projetos de mitigação com retorno financeiro claro, como energia renovável, em detrimento de projetos de adaptação, que são menos lucrativos, porém, essenciais para a resiliência. Como resultado, "a maior parte do financiamento em áreas urbanas prioriza a transição energética, deixando de lado ações essenciais de resiliência" (CHIAVARI, 2025a).

4. Análise e Discussão: Os Desafios Persistentes e a Encruzilhada Pós-COP27

A análise dos arranjos atuais revela uma desconexão gritante entre a arquitetura financeira e as necessidades no terreno. Os desafios podem ser sintetizados em quatro eixos principais, intensificados pelas mensagens da COP 27.

4.1. A Lacuna Financeira Abissal

O relatório "Adaptation Gap Report" do PNUMA (2025) fornece um diagnóstico alarmante, ou seja: as necessidades de financiamento para adaptação nos países em desenvolvimento podem ultrapassar US$ 310 bilhões anuais até 2035, um valor "12 vezes maior do que os atuais fluxos públicos internacionais" (PNUMA, 2025, p. 2). Em 2023, o financiamento internacional para adaptação caiu para US$ 26 bilhões, evidenciando uma trajetória inversa à necessária. Essa lacuna de US$ 284 - 339 bilhões anuais representam não apenas um déficit contábil, mas um risco concreto de "perdas humanas e econômicas catastróficas" (PNUMA, 2025, p. 3).

4.2. A Crise de Acesso e a Ineficiência Distributiva

Mesmo os recursos disponíveis nem sempre chegam a quem mais precisa. Países em desenvolvimento, especialmente os menos desenvolvidos e os pequenos estados insulares, enfrentam barreiras proibitivas. A falta de capacidade técnica para elaborar projetos complexos, os processos de aprovação burocráticos dos fundos multilaterais e a exigência de contrapartidas financeiras tornam o acesso um privilégio de poucos. Isso cria um viés geográfico e temático, onde recursos são alocados para países de renda média com maior capacidade institucional, em detrimento dos mais vulneráveis.

4.3. O Desequilíbrio Mitigação-Adaptação e o Caso do Setor AFOLU (Agriculture, Forestry, and Other Land Use)

Há um desequilíbrio histórico na alocação de recursos, com a mitigação recebendo a maior parte do financiamento. O estudo da Climate Policy Initiative de Chiavari, (2025b), é elucidativo, pois, coloca em evidência esse setor que engloba a Agricultura, Florestas e Outros Usos do Solo, se colocando como fundamental para mitigação e adaptação e, qual recebeu apenas 11% do financiamento climático global em 2021-2022. No Brasil, onde este setor, é o maior emissor de GEE, essa falta de investimento é particularmente crítica. O financiamento é essencial para promover uma agricultura climaticamente inteligente e frear o desmatamento, mas os fluxos atuais são insuficientes e mal direcionados.

4.4. A Falácia do "Crescimento Verde" e a Crítica da Justiça Climática

A dependência do capital privado introduz uma lógica mercantil que pode ser incompatível com a justiça climática. Conforme a análise crítica presente no material, "os investimentos privados frequentemente não priorizam questões sociais, concentrando-se mais no 'crescimento verde'" (Maziviero, 2025, p. 10). A transição não pode ser apenas sobre substituir fontes de energia, mas deve envolver uma transformação estrutural que priorize a inclusão social e a reparação histórica. A atual estrutura, ao promover o endividamento e priorizar o retorno financeiro, corre o risco de "reforçar lógicas de dependência, apropriação e extrativismo" (Maziviero, 2025, p. 11), perpetuando as injustiças que a ação climática pretende superar.

5. Caminhos para o Avanço: Perspectivas e Propostas para a COP 30

Superar essa encruzilhada exige inovação política e coragem diplomática. A COP 30, em Belém, situada no coração da Amazônia, apresenta uma oportunidade única para avançar em agendas transformadoras. Quatro caminhos se destacam:

5.1. Operacionalização do Mecanismo de Perdas e Danos

A criação do fundo para Perdas e Danos na COP 27 foi um marco de justiça, reconhecendo que alguns impactos climáticos são já inevitáveis e além da adaptação. A COP 30 deve ser o palco onde esse fundo se torna plenamente operacional, com recursos novos, adicionais e previsíveis, majoritariamente na forma de doações e não empréstimos. É crucial evitar que este fundo repita os erros burocráticos de seus predecessores, garantindo um acesso direto e simplificado para comunidades vulneráveis.

5.2. Inovação em Fundos Setoriais: O Caso do TFFF

O Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), com previsão de lançamento na COP 30, representa um modelo inovador de financiamento baseado em resultados para a conservação. Seu desenho de "finanças combinadas", que mobiliza capital privado, soberano e filantrópico com uma meta de US$ 125 bilhões, é um experimento audacioso. A proposta de realizar "pagamentos anuais a países que mantêm suas áreas florestais" (Maziviero, 2025, p. 12), valoriza os serviços ecossistêmicos de forma direta. Se bem-sucedido, o TFFF pode servir de modelo para outros fundos setoriais tendo como exemplos os oceanos e a agricultura resiliente, mostrando que a conservação pode ser economicamente vantajosa e socialmente inclusiva, ao destinar uma parcela significativa de seus recursos a povos indígenas e comunidades locais.

5.3. Estabelecimento de um Regime de Dívida Climática

A intersecção entre a crise climática e a crise da dívida soberana é inegável. Muitos países vulneráveis ao clima gastam mais com o serviço da dívida do que com ação climática ou saúde. A COP 30 deve iniciar discussões formais sobre um regime de dívida climática, que pode incluir:

  • Cláusulas de Resiliência em Títulos Soberanos: Permitindo a suspensão do pagamento da dívida após um desastre climático;
  • Troca de Dívida por Natureza (Debt-for-Nature Swaps): Onde parte da dívida externa é perdoada em troca de investimentos em conservação;
  • Reestruturação Massiva de Dívida: Para liberar recursos fiscais para investimentos em adaptação e transição justa.

5.4. Fortalecimento dos Fundos de Adaptação e Acesso Direto

É imperativo reequilibrar a balança financiamento a favor da adaptação. Isso requer:

  • Cumprimento da meta de US$ 100 bilhões/ano; Embora tardio, sua realização integral é uma questão de credibilidade;
  • Alocação de 50% dos recursos públicos para adaptação: Uma meta defendida por muitos países em desenvolvimento;
  • Promoção de Modalidades de Acesso Direto: Permitindo que instituições nacionais e subnacionais nos países em desenvolvimento acessem recursos diretamente, sem a intermediação de agências internacionais, fortalecendo a governança local.

6. Conclusão

O financiamento climático constitui, em sua essência, a pedra angular de um pacto global baseado na solidariedade intergeracional e na reparação histórica de desigualdades. Sua arquitetura, moldada ao longo de décadas de negociações, revela-se notavelmente intrincada, mas também drasticamente descompassada em relação à velocidade e à severidade da emergência planetária. O abismo entre os fundos prometidos e os efetivamente necessários para conter o aquecimento global e seus impactos é apenas uma face do problema; a outra reside na arquitetura de acesso, que perpetua um sistema onde os mais vulneráveis, os que menos contribuíram para a crise, enfrentam os obstáculos mais severos para obter recursos. A hegemonia dos fluxos financeiros privados, embora crucial para a escala necessária, opera sob uma racionalidade de mercado que sistematicamente subestima investimentos em adaptação e resiliência, áreas onde o retorno não é mensurado em dividendos, mas em vidas e ecossistemas preservados.

O legado da COP 27 serve, portanto, como um marco incontornável, um lembrete urgente de que a ambição deve ser traduzida em mecanismos operacionais. A COP 30, ao ser realizada no coração da Amazônia, carrega o simbolismo e a responsabilidade de ser um divisor de águas. As estratégias propostas, como a plena implementação do fundo de Perdas e Danos, a criação de instrumentos financeiros inovadores e diretos, o enfrentamento da dívida que asfixia economias em desenvolvimento e a priorização definitiva da adaptação, formam um conjunto de ações indissociáveis. Esta não é uma agenda maximalista, mas sim um piso ético e operacional a partir do qual a confiança no regime climático internacional pode ser restaurada. A transição para um modelo econômico de baixo carbono, socialmente justo e ecologicamente resiliente, é antes de tudo um empreendimento político de coordenação multilateral sem precedentes.

Reestruturar o financiamento climático transcende, assim, a mera movimentação de capital. Trata-se de uma reengenharia da governança global, destinada a construir um sistema que seja não apenas robusto, mas também radicalmente inclusivo e equitativo. O verdadeiro teste para a COP 30 não residirá nas declarações de princípio ou nas metas reafirmadas, mas em sua capacidade inquestionável de gerar compromissos vinculantes, canalizar recursos previsíveis e assegurar que os mecanismos criados respondam com agilidade às demandas das comunidades que já suportam o fardo mais pesado da crise. O ciclo da retórica chegou ao seu limite; a era da prestação de contas e da execução concreta deve iniciar-se de forma irrevogável.

Esta nova fase exige uma mudança de paradigma na alocação de recursos, onde os fundos não apenas aumentem em volume, mas também se tornem mais inteligentes e direcionados. Mecanismos de desembolso ágeis, que ignorem burocracias excessivas, e ferramentas de monitoramento transparentes são fundamentais para garantir que o capital flua para onde é mais necessário e com a velocidade que a crise exige. A responsabilidade deve ser uma premissa bilateral, aplicando-se tanto aos países doadores quanto aos receptores, assegurando que cada recurso seja empregado com máxima eficiência e impacto mensurável.

O futuro do acordo climático global depende da capacidade de transformar promessas em realidade palpável, assegurando que os recursos cheguem de fato à linha de frente da crise, onde sua ausência é sentida de forma mais dramática. O sucesso será medido pela capacidade de proteger populações vulneráveis, preservar biodiversidade e acelerar a transição energética de forma justa. O momento histórico exige que a COP 30 em Belém seja lembrada não como mais uma conferência, mas como o ponto de virada onde a comunidade global finalmente honrou seus compromissos com ações tangíveis e transformadoras.

Referências Bibliográficas

CHIAVARI, Joana et al. Mapping international climate finance for Brazil. Rio de Janeiro: Climate Policy Initiative, 2025a.

CHIAVARI, Joana et al. International Climate Finance Tracking for Brazil. Rio de Janeiro: Climate Policy Initiative, 2025b.

HICKS, Robert L.; PARKS, Bradley C.; ROBERTS, J. Timmons; TIERNEY, Michael J. Greening Aid? Understanding the Environmental Impact of Development Assistance. Oxford: Oxford University Press, 2008.

IPCC. Climate Change: The IPCC Scientific Assessment. Cambridge: Cambridge University Press, 1990.

KEOHANE, Robert O.; LEVY, Marc A. (Eds.). Institutions for Environmental Aid: Pitfalls and Promise. Cambridge, MA: The MIT Press, 1996.

MAZIVIERO, Maria Carolina. Financiamento Climático e a Transição Justa: Análise Crítica e Perspectivas para o Brasil. São Paulo: Revista de Estudos Ambientais, v. 25, n. 1, p. 1-15, 2025.

PALLEMAERTS, Marc; ARMSTRONG, Kate. The International Climate Change Regime: A Guide to Rules, Institutions and Procedures. Cambridge: Cambridge University Press, 2009.

PINTO, T. P., VARGAS, D. B., GURGEL, A. C., VALENTE, F. C. FINANCIAMENTO CLIMÁTICO: REALIDADES E DESAFIOS. Observatório de Conhecimento e Inovação em Bioeconomia, Fundação Getúlio Vargas - FGV-EESP, São Paulo, SP, Brasil. 2023.

PNUMA (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente). Adaptation Gap Report 2025. Nairobi: PNUMA, 2025. Disponível em: [Link fictício]. Acesso em: 15 out. 2025.

UNFCCC (United Nations Framework Convention on Climate Change). United Nations Framework Convention on Climate Change. 1992. Disponível em: https://unfccc.int/resource/docs/convkp/conveng.pdf. Acesso em: 15 out. 2025.

UNFCCC (United Nations Framework Convention on Climate Change). Paris Agreement. 2015. Disponível em: https://unfccc.int/sites/default/files/english_paris_agreement.pdf. Acesso em: 15 out. 2025.

 

Ivan Carlos Zampin:  Professor Doutor em Geografia, (Organização do Espaço), Bacharel em Sistemas de Informação, Graduado em Filosofia e Sociologia, Pesquisador, Docente no Ensino Superior, Ensino Fundamental, Médio, Especialista em Gestão Escolar e Gestão Pública.

Endereço para acessar este currículo: http://lattes.cnpq.br/2342324641763252

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