22/06/2019

ESTÁGIO SUPERVISIONADO DE TERAPIA OCUPACIONAL EM SAÚDE HOSPITALAR: UMA PRÁTICA COM ADULTO/IDOSO E COM CRIANÇAS PREMATURAS

Maria Laura Brum da Cunha[1]

 

RESUMO: O relato apresenta o conjunto das atividades desenvolvidas no Estágio Supervisionado de Terapia Ocupacional no hospital Santa Casa de Misericórdia de Pelotas- RS. O estágio teve duração de três meses. Os participantes das atividades eram usuários internados no hospital e pacientes do projeto Pró-Crescer. Com relação ao Pró-Crescer, objetivo foi aprimorar a interação social e estimulação do desenvolvimento neuropsicomotor nos bebês.  Porém com público adulto, o objetivo foi identificar as principais alterações na qualidade de vida e no desempenho ocupacional. Percebemos que as maiores queixas foram referentes ao autocuidado e descanso e sono. Em relação à qualidade de vida, as principais alterações percebidas foram domínios da capacidade funcional, limitação por aspectos físicos, estado geral de saúde e dor. Pode-se dizer mesmo que de forma empírica que a hospitalização interfere diretamente na qualidade de vida e no desempenho ocupacional de idosos, e que a intervenção da terapia ocupacional contribuiria para a prevenção e minimização desses impactos no dia a dia de ambos pacientes que fizeram parte do estágio.

Palavras- chave: Terapia Ocupacional, relatório de estágio, vivência, Hospital Santa Casa, Idosos, Bebês prematuros.

 

Introdução

    Ao iniciar o estágio curricular na maioria das vezes nos deparamos com a insegurança e o receio de não conseguirmos desenvolver um bom trabalho dentro do que foi proposto pela coordenação de estágio. Logo vem a dúvida: será que vamos conseguir lembrar-nos de tudo que foi aprendido em sala de aula?! Como seremos recebidos pelos profissionais da unidade que vamos atuar?! Nesse caso será no Hospital Santa Casa de Pelotas, que nos ofertou esse riquíssimo campo de aprendizado e crescimento profissional. Segundo Roesch (1996, p.21)  “o estágio curricular não é simplesmente uma experiência prática vivida pelo aluno, mas uma oportunidade para refletir, sistematizar e testar conhecimentos teóricos e ferramentas técnicas durante o curso de  graduação”. Sem duvida o estágio nos remete a um processo de imersão na realidade, mostrando novos conhecimentos tanto para o estagiário como para equipe que esta envolvida nesse processo, pois tanto aprendemos como ensinamos. O estágio nos dá a oportunidade de podermos lidar com as dificuldades da profissão, identificando tanto os pontos positivos como negativos, procedimento importante para o crescimento profissional do estagiário.

   Além disso, o estágio é um momento de onde se pode aplicar o conteúdo aprendido durante o curso, aperfeiçoando o aprendizado na vivência e no contanto com outros profissionais, desenvolvendo a consciência crítica para o aprimoramento da profissão, o que também favorece o desenvolvimento das relações interpessoais. Conforme, Backer, esse estágio final “é diferente daquele em experiências de outros semestres anteriores como aulas práticas e da supervisão direta do professor”. Backes (1999, p.199); o estágio final é a prova última que o aluno tem que enfrentar, aplicando todo conhecimento recebido durante a graduação. Nesse mesmo sentindo Andrade (1989), diz que o Estágio Curricular, pode ser visto como um recurso pedagógico, que reflete a aplicação do conteúdo teórico, visando, sobretudo, o desenvolvimento de destrezas terapêuticas, sociais e psicológicas obtidas ao longo da graduação. Ambos os autores reforçam a importância do estágio na vida dos graduandos por propiciar uma experiência pré-profissional, oportunizando o processo de intersecção entre a teoria e a prática, afunilando o “vínculo da docência e do serviço, conhecendo a realidade em que está inserido e suas características sociais, econômicas, políticos e culturais” Backes (1999).  Entendemos o estágio curricular como campo pedagógico que nos possibilita os primeiros passos rumo ao exercício da profissão. 

Desenvolvimento e organização das atividades

     A partir da exposição anterior quanto à importância do estágio para nosso aperfeiçoamento profissional, passo a relatar como se deu essa experiência em uma unidade hospitalar, campo esse delicado e complexo por tratar pacientes em estado emocional na maioria das vezes bastante fragilizado, sendo essa minha primeira experiência como futura terapeuta dentro do contexto hospitalar. Mesmo sabendo que será um estágio que exigira muito de mim, é uma área da qual tenho prazer em trabalhar, mesmo sabendo que é bastante desafiadora e complexa.

    As primeiras semanas de estágio foram conturbadas por se ter tidos vários contratempos, entre eles o fechamento da maternidade. Espaços esses que seriam nossos campos de atuação no estágio.             A empolgação deu lugar a uma enorme frustração. O que fazer agora? Para onde iriamos? Foi difícil aceitar e compreender que quando se trata de campo de trabalho seguir uma rotina nem sempre é possível dentro do hospital, tudo muda a todo o momento conforme a necessidade e  emergência da situação e da rotatividade de pacientes.   

   Diante dos acontecimentos inerentes a nossa vontade, a coordenação de estágio achou por bem que alterássemos nosso cronograma para outra unidade dentro do hospital.  Assim, acabamos sendo direcionadas para a ala de adultos (unidade São Paulo) intercalando os atendimentos com a ala de pediatria e participando do Projeto Pró-Crescer[2], fazendo o acompanhamento de Prematuros, todas às sextas-feiras.

Na ala da pediatria, realizávamos atendimentos individuais e em grupos. Por vezes atendíamos individualmente os pacientes, outras vezes atuamos conjuntamente, as quatro estagiárias em grupo conforme a demanda dos pacientes.

Nesse espaço foram realizadas atividades de autoexpressão, de interação social, de estimulação do desenvolvimento neuropsicomotor nos com as crianças prematuras do Pró-Crescer, escuta terapêutica com as mães. Procuramos com essas atividades interventivas minimizar os impactos da hospitalização para as crianças e seus familiare. Em alguns momentos sentíamos que não só as crianças precisavam de cuidado, mas as mães também. Nesses casos, realizávamos escuta terapêutica com as mães, procurando amenizar dúvidas e aflições geradas pelas condições da hospitalização.

Fazer parte Projeto Pró-Crescer durante o estágio foi uma experiência encantadora que me fez repensar minhas preferências enquanto futura terapeuta, pois acabei me interessando e gostando bastante da atuação da terapia ocupacional no desenvolvimento infantil, além da experiência e aprendizado adquiridos no projeto.

No entanto na Unidade São Paulo, no primeiro momento foi bastante impactante, devido nosso pouco contato com pacientes hospitalizados, me senti despreparada para trabalhar com adultos e idosos mesmo gostando bastante de atender esses pacientes. Talvez pelo fato de não ter tempo de fazer o processo de observação preparando-me para o estágio com esses pacientes, pois nossos pacientes seriam outros. Acredito que esses fatores me deixaram bastante receosa.

 Entretanto, passado alguns dias com os pacientes da ala de adultos, tudo foi se normalizando e o estágio tornou-se extremamente prazeroso, assim como uma experiência riquíssima para a prática profissional, e o medo deu lugar à satisfação e entusiasmo.

Metodologicamente para melhor dar conta da demanda na ala São Paulo, nos dividimos em duplas para fazer a intervenção com os adultos, e dificilmente foi possível dar o seguimento do atendimento com o mesmo paciente, devido à alta rotatividade da internação. O que nem sempre se torna positivo.  Nesse período de atuação nos deparamos com um caso em específico de saúde mental foi extremamente desafiador e impactante no primeiro momento. Foi necessária muita reflexão e também desconstrução pessoal, porém, conseguimos conduzir o caso de maneira tranquila e realizar uma intervenção positiva para o contexto hospitalar.

Os procedimentos com esses pacientes adultos foram mais de escuta terapêutica e intervenções pontuais para melhorar a qualidade de vida no momento de internação hospitalar, buscando amenizar e a dor e tristeza de muitos pacientes que ali se encontravam. Procuramos agir de forma a tornar o ambiente um local mais leve e descontraído, procurando tirar a tensão que por vez se instaurava na ala São Paulo.

Diante da rotatividade de pacientes exigiu da nossa parte atividades rápidas de curta duração, por isso, optamos por tentar realizar algumas ações pontuais dentro dos quartos das unidades que estávamos atendendo de promoção à saúde, como conscientização do setembro amarelo, outubro rosa e novembro azul, através de dinâmicas e interação entre os pacientes. Porém, nem sempre se conseguiu realizar todas as atividades em razão de feriados e outras questões que acabaram fragmentando nosso calendário de estágio, dificultando a organização das mesmas.

Mesmo diante dos percalços do estágio conseguimos promover algumas atividades como a de Halloween, que aconteceu em ambos os espaços: tanto ala São Paulo como na ala da pediatria. Outra atividade festiva bem significante que conseguimos realizar foi no dia da criança, onde contamos com o auxilio da supervisora e do terapeuta ocupacional da instituição para ambas ações. Foi uma experiência extremamente diferente e divertida, e ainda tivemos a oportunidade de acompanhar um pouco do trabalho do terapeuta ocupacional local da Santa Casa, ampliando e expandindo nossa visão da prática profissional.

Análise e reflexões sobre as atividades realizadas

Parando para refletir mais sobre esse processo, percebo que esse estágio foi extremamente diversificado, rico em experiências e em formação pessoal e profissional. Foram experiências intensas, e que farão toda a diferença para as práticas futuras. O estágio no contexto hospitalar foi um dos campos de estágio onde tive mais dificuldade, mas ao mesmo tempo, onde mais tive vontade de conseguir me superar e procurar melhorar cada vez mais. A cada dia era uma nova oportunidade de aprendizado.

Por vários momentos me deparei com dificuldades pessoais e profissionais.   Houve ocasiões diante de algumas situações que levaram a refletir sobre como posicionar-me diante de tais circunstâncias. O que fazer? O que dizer?  Como agir?  Essas respostas à academia não pode nos dar. Somente as teremos no exercício da profissão, através da convivência com profissionais interdisciplinares.  Porém, com o auxilio da supervisora local foi possível, contornar e conduzir essas circunstâncias no decorrer do estágio. Outro fator que muito contribuiu para tirar as dúvidas foi às reuniões em grupo que aconteceram ao longo do semestre, tanto no campo de estágio, como nas supervisões em sala de aula também. Ambos os processos culminaram para o crescimento profissional e pessoal, através de reflexões e discussões sobre os diferentes problemas que foram aparecendo ao do estágio.

Autores como Tetila (1984), Andrade (1989), Bousso (2000), Valsechi (2002)  apontam a relevância do campo de estágio para formação profissional e pessoal. O estágio possibilita ao aluno desenvolve analise crítica e reflexiva sobre sua atuação profissional, na junção do conhecimento teórico e prático, por abranger contextos e realidades muito diversificados, o que nos leva a buscar mais conhecimento a cada nova realidade, gerando assim um novo aprendizado diante das diferentes realidades. 

Entendemos que a responsabilidade da formação profissional não é somente do órgão formador, abrange um universo de profissionais que cruzam nossa caminhada desde os primeiros anos da graduação, que foram nos constituindo enquanto profissionais. Cada um deixou sua marca desde os colegas, os professores, os técnicos, os pacientes, as intuições de estágio e os profissionais que nelas nos ajudaram. Todos de uma forma ou de outra me construíram enquanto futura terapeuta ocupacional. Ninguém mais do que nós mesmos temos que ser responsáveis pelo próprio aprendizado.

Considerações finais

 Fechando mais um ciclo de aprendizado, tenho a convicção que todos contribuíram em algum momento para meu crescimento pessoal e profissional, mas sou a única responsável por continuar a buscando conhecimento para minha auto formação dentro da minha profissão, pois ainda tenho uma vida de aprendizagem pela frente, pois são muitas as perguntas e as dúvidas que ainda estão sem respostas. E não tenho dúvidas que outras tantas ainda surgirão ao logo do exercício da profissão.

Não tenho dúvida da relevância do terapeuta ocupacional em espaços hospitalares, mas é necessário que exista mais estudos sobre como melhorar a vida dos pacientes e dos bebês prematuros, na área da terapia ocupacional. O acesso à literatura, por vezes é complicado, pois são poucos os autores brasileiros que pesquisam sobre a área. A literatura de peso vem de fora do Brasil e o difícil acesso a outros idiomas deixa o campo fragilizado, por abranger muitas áreas de atuação precisa-se de material atualizado e de pesquisas que deem suporte teórico para os profissionais da terapia ocupacional. Alimentamo-nos de muitas áreas do conhecimento, mas precisamos ter um aporte teórico mais voltado para as necessidades dos Terapeutas ocupacionais.

Ao concluir mais um estágio, é preciso dizer que por muitas vezes encontramos dificuldades na busca por referencial teórico voltada para áreas especificas da nossa profissão. Muitas das nossas referências vêm de artigos, traduzidos de outros idiomas e nem sempre referenciados adequadamente, o que dificulta usa-los como fonte primária.

No que tange ao estágio posso dizer que trabalhar com adultos, idosos e crianças foram desafiador e ao mesmo tempo extremamente gratificante, talvez com o passar do tempo mude de opinião, mas por agora tenho certeza que desejo a profundar meus conhecimentos dentro dessas áreas de atuação.

E por fim, sou grata a todos que passaram e contribuíram para me deixar um ser profissionalmente muito melhor, experiência que levarei para vida, assim como a lembrança de todos que caminharam mesmo que por pouco tempo ao meu lado nesse processo.

 

Referências bibliográficas

Andrade MN, Araújo LCA, Lins LCS. Estágio curricular: avaliação de experiência. Rev Bras Enferm 1989; 42(1):27-41.

Backes VMS. Estilo de pensamento e práxis na enfermagem: a contribuição do estágio pré-profissional. [tese]. Florianópolis (SC): Universidade Federal de Santa Catarina; 1999.

Bousso RS, Merighi MABM, Rolim MA, Riesco MLG, Angelo M. Estágio Curricular em Enfermagem: transição de identidades. Rev Esc Enferm USP 2000; 34(2):218-25

Tetila ZF. Estágio supervisionado: diagnóstico de proposta de reformulação para os cursos do Centro Universitário de Dourados UFMS. [dissertação]. São Paulo (SP): Pontifíca Universidade Católica de São Paulo; 1984.

ROESCH, Sylvia Maria Azevedo. Projetos de estágio do curso de administração: guia para pesquisas, projetos, estágios e trabalhos de conclusão de curso; Colaboração: Grace Vieira Becker e Maria Ivone de Mello. São Paulo: Atlas, 1996.

Valsecchi EASS, Nogueira MS. Fundamentos de enfermagem: incidentes críticos relacionados à prestação de assistência em estágio supervisionado. Rev Lat Am Enferm 2002; 10(6):819-24.

 


[1] Graduanda do curso de Terapia Ocupacional da UFPEL - e-mail: laurabrum.c@gmail.com

[2]  Pro-Crescer: Programa de acompanhamento do desenvolvimento neuropsicomotor de prematuros. Esse programa tem como finalidade acompanhar o desenvolvimento neuropsicomotor de prematuros nascidos na cidade de Pelotas e região do nascimento aos 7 anos de idade, possibilitando a promoção da saúde e a identificação precoce de possíveis atrasos de desenvolvimento. Sendo um programa de extensão vinculado ao ensino, também será papel do Pro-Crescer proporcionar aos alunos dos cursos da área da saúde da Universidade Federal de Pelotas o aprendizado das praticas clínicas específicas de cada área e da atuação multiprofissional. Maiores informações acessar - https://institucional.ufpel.edu.br/projetos/id/u230

 

 

 

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