08/04/2021

Escola Prussiana

Por Wolmer Ricardo Tavares – Mestre em Educação e Sociedade, Escritor, Palestrante e Docente – www.wolmer.pro.br

 

Para muitos, a palavra crise não passa de uma oportunidade. Dito isso, a crise na educação causada por esta pandemia é o momento ideal para pensar em possibilidades de melhorar e até mesmo rever o sistema educacional, começando pela seguinte pergunta: Por que as salas tem suas carteiras todas enfileiradas?

Obviamente muitos responderão que é para caberem mais alunos nas salas, o que não deixa de ser uma resposta interessante, porém não inteligente e nem crítica.

Fico me perguntando como um professor de história ou até mesmo historiador poderia fazer apologia a atual conjuntura política sendo que esta mesma fomenta o ódio, a intolerância de todos os tipos e principalmente a tortura?

Que parte de história ele deixou de ter em seu currículo para o fazer ter o discernimento dos fatos e de suas conseqüências?

A disciplina de história, assim como sociologia e filosofia são disciplinas que instiga o cidadão a um pensar, fazendo-o contestar as instituições e buscar razões para o que está ocorrendo.

Todo professor de uma das disciplinas citadas acima e que se preze, não pode acatar e até mesmo ecoar estultices ditas e feitas pela atual política que encontra-se despida da ética e do humanismo.

O educador tem que ser um contestador das instituições, e não uma pessoa passiva e alienada como muitas por aí, desta forma, façamos um questionamento do porquê as salas de aulas estarem todas enfileiradas. Busquemos respostas nas pesquisas e na história e por que não, com nossos professores historiadores?

Não precisamos ter licenciatura nesta área para fomentar a criticidade e também a historicidade de nossos costumes e influências das instituições.

Observe que a escola prussiana nos remete a uma organização, ordenação, disciplina, controle e consequentemtente normatização, ou seja, é uma forma de corte e controle da sociedade e teve sua origem no século XVII na Prússia como ressaltado por Martins e Gomes no artigo Educação católica versus educação de Estado: a crítica do catolicismo ao modelo de educação prussiano, publicado pela Kiri-kerê: Pesquisa em Ensino, n. 3, novembro 2017.

Para os autores a Prússia foi a pioneira da escola pública, estatal e obrigatória, e apesar deste modelo ter sido criado no século XVII, é comum as escolas modernas ainda adotarem este modelo prussiano de escolarização, substituindo a responsabilidade da Igreja pelo Estado

Para Lívia Martins, o modelo prussiano foi aplicado na França no início do século XIX[1]  com o intuito de conter as revoluções que eram comuns na época. Este modelo herdou algumas características do sistema Espartano que focava disciplina e obediência, tudo baseado em um regime autoritário o que sobressaltava uma forte divisão de classes e castas além de uma xenofobia e um nacionalismo exacerbado.

Observe que nesta época também rezava que crianças eram meros instrumentos de manipulação de forma a aumentar o contingente para o mercado de trabalho que estava em pleno vapor com a segunda Revolução Industrial, que foi o auge da ciência e da produção em massa que teve como fomentadora a energia elétrica.

Note que nosso sistema educacional se baseia em um modelo que estava em vigor há quatro séculos atrás e que muitos países já aboliram tal modelo, entretanto o nosso sistema continua fazendo uso da escola prussiana e condenando nossos alunos a um processo de domesticação subalterna por meio do instrucionismo.

Em 2014, um projeto de extensão da Universidade de Brasília buscou desenvolver um trabalho voltado para educação, política, democracia, cidadania, representação, participação, cultura, comunidade e igualdade, e com isso, prepararam um documentário intitulado Educação Proibida, o que corrobora com o texto acima, questionando assim  a escolarização moderna, que está voltada para produção, obediência e competição.

Interessante perceber que este trabalho faz uma proposta de um novo modelo educativo, humanizado, criativo e libertador, entretanto, alguns professores que ousaram usar tal modelo foram discriminados por não usarem o modelo prussiano tão obsoleto porém efetivo para criação de uma massa de manobra, o que é conveniente para o sistema por imposição de uma concepção política.

O modelo prussiano é tão eficiente em relação a manipulação e alienação que Lima e Neves no artigo Fundamentos da educação escolar do Brasil contemporâneo[2], esclarecem que este modelo, conhecido também como tendência prussiana ou passiva, é um modelo que fortalece o Estado, já que manifestações via prussianas são vistas como revoluções passivas.

O fato é que nós educadores temos que aproveitar a oportunidade das aulas remotas para quando retornamos as aulas presenciais, revermos o melhor modelo escolar, já que o prussiano busca, conforme as falas de Lima e Neves, reforçar o velho Estado que fomenta o clientelismo, populismo e a tutela militar.

Que nós educadores possamos dar ressonância as falas de Lívia Martins quando esclarece em bom tom que "não queremos ensinadores, queremos educadores"! Assim sendo, que sejamos todos educadores levando a criticidade e o protagonismo cognoscente a nossos educandos de forma a transformar a nossa nação.

 

[1] Para mais informações vide https://politicanaescola.wordpress.com/2014/07/03/a-educacao-proibida/

[2] LIMA, J.C.F., and NEVES, L.M.W., org. Fundamentos da educação escolar do Brasil contemporâneo [online]. Rio de Janeiro: Editora FIOCRUZ, 2006, 320 p. ISBN: 978-85-7541-612-9. Available from: doi: 10.7476/9788575416129. Also available in ePUB from: http://books.scielo.org/id/j5cv4/pdf/lima-9788575416129.pdf

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