ENSINO JURÍDICO: PESQUISA, ENSINO E EXTENSÃO: POR UMA NOVA PEDAGOGIA JURÍDICA
José Cláudio Rocha[1]
Denise A.B.F. Rocha[2]
Luiz Carlos Rocha[3]
RESUMO
Este estudo tem como objeto de investigação a proposição e aplicação da metodologia S.T.A.R (See, Think, Act, Reflect), concebida como um caminho metodológico inovador que integra o “concreto pensado” às práticas de pesquisa participativa e colaborativa. A justificativa para a sua formulação decorre da necessidade de oferecer – no campo das ciências sociais, principalmente, do Direito – uma metodologia capaz de produzir “teorias fundamentadas na realidade empírica”, compreendendo um arco que parte do “concreto ao pensamento abstrato”, em um movimento inovador visando a superação de modelos meramente abstratos. O objetivo centro é sistematizar e aprimorar a prática investigativa a partir da articulação entre a pesquisa-ação, pesquisa colaborativa e as lições de Paulo Freire, com muitas outras contribuições em termos epistemológicos e metodológicos. A metodologia do artigo está organizada em quatro partes, que correspondem às etapas constitutivas do S.T.A.R, voltadas ao diagnóstico participativo, sistematização coletiva, análise crítica e produção teórica fundamentada. Os resultados encontrados indicam que o método S.T.A.R. oferece uma via consistente para aproximar teoria e prática, permitindo que o Direito seja investigado como fenômeno cultural, social e histórico, com maior aderência às experiências concretas dos sujeitos. A pesquisa empírica em Direito, estruturada a partir desse método, demonstra capacidade de gerar teorias de médio alcance e promover diálogos interdisciplinares. Nossa conclusão, é de que em nossos testes iniciais a metodologia S.T.A.R. não apenas fortalece a dimensão emancipatória da pesquisa científica, mas também abre caminho para futuras iniciativas, como seminários de difusão; publicações especializadas e a consolidação de uma rede de pesquisadores comprometidos com a construção do conhecimento crítico e reflexivo. Este estudo foi produzido no Centro de Referência em Desenvolvimento e Humanidades da Universidade do Estado da Bahia (CRDH/UNEB), centro multiusuário e interdisciplinar de pesquisa e instituto de tecnologia social, com sede no Centro Histórico e Antigo de Salvador (CHAS), distrito criativo da Bahia.
Palavras-chaves: Método S.T.A.R.; concreto pensado; teoria fundamentada; pesquisa empírica em Direito; epistemologias críticas; CRDH/UNEB
ABSTRACT
This study has as its object of investigation the proposition and application of the S.T.A.R. (See, think, Act, Reflect) methodology, conceived as an innovative methodological path that integrates the "thought concrete" with participatory and collaborative research practices. The justification for its formulation stems from the need to offer – in the field of social sciences, especially Law – a methodology capable of producing "theories based on empirical reality", comprising an arc that starts from "concrete to abstract thought", in an innovative movement aimed at overcoming merely abstract models. The main objective is to systematize and improve investigative practice from the articulation between action research, collaborative research and the lessons of Paulo Freire, with many other contributions in epistemological and methodological terms. The methodology of the article is organized in four parts, which correspond to the constitutive stages of the S.T.A.R, aimed at participatory diagnosis, collective systematization, critical analysis and grounded theoretical production. The results found indicate that the S.T.A.R. method offers a consistent way to bring theory and practice closer together, allowing Law to be investigated as a cultural, social and historical phenomenon, with greater adherence to the concrete experiences of the subjects. Empirical research in Law, structured from this method, demonstrates the ability to generate medium-range theories and promote interdisciplinary dialogues. Our conclusion is that in our initial tests, the S.T.A.R. methodology not only strengthens the emancipatory dimension of scientific research, but also paves the way for future initiatives, such as dissemination seminars; specialized publications and the consolidation of a network of researchers committed to the construction of critical and reflective knowledge. This study was produced at the Reference Center for Development and Humanities of the State University of Bahia (CRDH/UNEB), a multi-user and interdisciplinary research center and institute of social technology, based in the Historic and Old Center of Salvador (CHAS), a creative district of Bahia.
Keywords: S.T.A.R. Method; concrete thought; grounded theory; empirical research in Law; critical epistemologies; CRDH/UNEB
- INTRODUÇÃO
O ensino jurídico no Brasil, assim como a pesquisa em Direito, historicamente se estruturou em torno de abordagens dogmáticas e normativistas, que privilegiam a análise teóricas da legislação, doutrinas jurídicas, jurisprudências, muitas vezes, em desconexão com a realidade social.
Vale a pena dizer que é nosso objetivo também combater visões dogmáticas e descontextualizadas do Direito, que desconhecem o contexto econômico, social e político em que a legislação é produzida, assim como, a necessidade da participação na construção das políticas públicas, marcos legais e institucionais em construção no Estado de Bem-Estar brasileiro.
Embora a pesquisa jurídica tradicional tenha fornecido importantes contribuições, mostra-se limitada diante de uma estrutura social marcada pelo preconceito de gênero, raça/etnia e classe social estrutural, assim como, por desigualdade sociais, pobreza e sonegação do direito à educação da maioria da população, revelando uma realidade de Injustiça Social e Econômicas. A emergência de metodologias críticas e participativas aponta, assim, para a necessidade de repensar os caminhos da pesquisa jurídica.
Nesse cenário, a metodologia STAR (See, Think, Act, Reflect) é apresentado como uma proposta inovadora de articulação entre prática e teoria, capaz de produzir conhecimento científico a partir do “concreto pensado”. Inspirado em referenciais como pesquisa ação, principalmente, do professor Michel Thiollent (THIOLLENT, 2018), René Barbier (BARBIER, 2007), Madalena Colette (COLETTE, 2021); pesquisa colaborativa, inspirado em Ibiapina (IBIAPINA, BANDEIRA e ARAUJO, 2016) e (IBIAPINA, 2008); e Paulo Freire (FREIRE, 2025), entre outros autores e aportes epistemológicos e metodológicos utilizados. A metodologia integra a análise empírica com a produção de uma Teoria Fundamentada, em sintonia com as epistemologias contemporâneas como, por exemplo, a Epistemologia do Sul (SANTOS e MENESES, 2010) e (SANTOS, 2019).
O objeto de estudo que norteia a aplicação do S.T.A.R. neste estudo são as políticas públicas, ações afirmativas boas práticas voltadas para a efetivação de nosso Estado de Bem-Estar Social no Brasil, defesa da dignidade da pessoa humana e desenvolvimento sustentável e Direitos da Natureza. Esse campo revela uma possibilidade concreta de estudar forma de promover a responsabilidade do Estado com a cidadania e a dignidade da pessoa humana, fundada em três princípios básicos: a universalidade dos Direitos Humanos, a indissociabilidade desses direitos e o princípio da especificação do Direito.
A justificativa para a proposição da S.T.A.R. reside na necessidade de dotar a pesquisa empírica em Direito de instrumentos que ultrapassem a mera descrição normativa e que sejam capazes de “diagnosticar”, “analisar”, “agir” e “refletir” sobre práticas concretas. Assim, a metodologia oferece o caminho metodológico que aproxima a teoria e prática, permitindo ao pesquisador atuar de forma crítica e propositiva diante de fenômenos sociais e jurídicos complexos.
O objetivo centro dessa investigação é, portanto, apresentar e discutir o método S.T.A.R. como proposta de investigação científica e empírica em Direito, aplicável ao estudo das práticas jurídicas, mas, transponível ao saber jurídico. Os objetivos específicos incluem:
- Sistematizar cada uma das etapas do S.T.A.R.;
- Indicar suas contribuições pra o fortalecimento da Justiça Social, dignidade da pessoa humana e desenvolvimento sustentável com Direitos da Natureza.
A metodologia do artigo combina revisão de literatura; análise documental; utilização de diário de campo; observação dos pesquisadores envolvidos no processo, com a finalidade de exemplificar a operacionalização e o rigor jurídico do método proposto. O trabalho encontra-se estruturado em quatro partes, correspondendo às etapas do método: see (observar e compreender); think (refletir e analisar); act (agir e aplicar); e reflect (refletir sobre a ação).
Os resultados esperados apontam que a aplicação da S.T.A.R. possibilita maior coerência entre teoria e realidade, além de ampliar a relevância social da pesquisa jurídica e empírica. Ao enfatizar temas como ecologia de saberes; valorização das epistemologias do Sul; combate à injustiça cognitiva; formulação de teses a partir dar realidade concreta, articulando-se com temas como economia solidária, economia de impacto, Direitos Humanos e da Natureza, entre outros.
Por fim, esta teoria fundamenta defende que o método S.T.A.R. deve ser compreendido não apenas como técnica, mas como postura epistemológica que assume a pesquisa jurídica como prática transformadora. A conclusão do trabalho retoma os principais achados e projeta futuros desdobramentos, como a criação de seminários metodológicos; publicação de artigos e livros sobre o tema, apresentação de trabalhos, difusão do método em redes de colaboração acadêmico-científicas, entre outras formas de divulgação científica.
Este trabalho foi produzido no Centro de Referência em Desenvolvimento e Humanidades da Universidade do Estado da Bahia (CRDH/UNEB), centro de pesquisa e instituto de tecnologia social, multiusuário e transdisciplinar, considerado estratégico para o desenvolvimento científico e tecnológico do Estado da Bahia e do Brasil.
- DELINEANDO A METODOLOGIA S.T.A.R.
Segundo os autores Denzin e Lincoln, autores de referência mundial em pesquisa qualitativa, por “metodologia” se entende o enquadramento teórico e filosófico que orienta toda a pesquisa, é a bussola do estudo, o fio de Ariadne na construção da proposta de pesquisa. Inclui as concepções de mundo e da ciência, de sujeitos, de objeto e de conhecimento que guiam o pesquisador. São os pressupostos epistemológicos definidos como o “olhar” e com que “lentes” a realidade será estudada. São uma rede de crenças e valores que fundamental a escolha do pesquisador (DENZIM e LINCOLM, 2006).
O método já diz respeito ao conjunto de técnicas e procedimentos concretos usados na coleta e análise dos dados. Está subordinado a metodologia escolhida, guardando coerência com a visão de mundo do pesquisador. Enquanto a metodologia é a arquitetura, os métodos são as ferramentas para construção dos processos de pesquisa. A metodologia na teoria fundamentada parte do concreto para construir a teoria fundamentada (DENZIM e LINCOLM, 2006).
- See (Observar e Compreender)
O Direito é fruto das relações sociais e necessárias de produção, que acontecem na infraestrutura da economia mundial, podendo se manifestar também em contextos locais, territoriais ou regionais. Além disso é igualmente resultado das relações sociais e de poder que permeiam os diversos processos sociais e est]ao junto com as relações jurídicas na superestrutura de uma determinada sociedade (ROCHA, 2024).
A melhor forma de estudar o Direito é por meio do método histórico-social, que permite compreender o sentido e o significado dos fenômenos sociais em sua complexidade, inserindo-as em um contexto histórico material que revela a sua construção, transformação e disputas (ROCHA, 2012).
O sentido diz respeito à experiência singular, dinâmica e subjetiva de interpretação do signo, que pode variar de acordo com a vivência, a história e o lugar do sujeito no processo social. Já o significado refere-se àquilo que é compartilhado socialmente, ou seja, ao conteúdo relativamente estável que um signo carrega em um determinado contexto cultural. Enquanto o significado tende a ser mais objetivo e estruturado, o sentido revela a dimensão viva e plural do signo, mostrando que cada fenômeno social pode ser interpretado de múltiplas formas a depender da relação entre sujeito, contexto, linguagem, cultura e sociedade (MORIN, 2011).
No processo de observação dos fenômenos sociais em campo, o pesquisador assume um papel ativo e reflexivo, buscando captar não apenas os fatos empíricos, mas, também o contexto simbólico e histórico no qual se inserem. A observação, nesse sentido, é uma técnica que consiste na coleta sistemática de informações a partir da participação direta ou indireta do pesquisador no cenário social investigado, permitindo registrar comportamentos, práticas, discursos e dinâmicas coletivas. Essa perspectiva reconhece que o fenômeno social só pode ser compreendido em sua totalidade quando o pesquisador adota uma escuta sensível e atenta à diversidade de vozes (DENZIM e LINCOLM, 2006).
A fase metodológica see quando entendida como prática metodológica crítica, deve ser vista como um espaço de interação em que os sujeitos não são meros objetos de estudo, mas, coautores do conhecimento produzido. A ecologia de saberes, nesse caso, valoriza a pluralidade de experiências e conhecimentos, permitindo que atores sociais – situados em um determinado cenário, com sua história, culturas e práticas, sejam reconhecidos como fontes legítimas de interpretação da realidade. Assim a produção científica se transforma em uma construção coletiva, marcada pela horizontalidade e pela valorização da experiência cotidiana (THIOLLENT, 2018).
Nesse processo, a extensão em comunidade surge como um caminho privilegiado de pesquisa e ensino jurídico, já que coloca os pesquisadores em diálogo direto com os sujeitos sociais. Ao reconhecer que todo indivíduo é capaz de fornecer informações relevantes sobre os processos históricos, sociais e culturais e que todo objeto de estudo – por menor que seja – merece uma atenção, o investigador amplia as fronteiras do conhecimento acadêmico e constrói uma prática de investigação comprometida com a transformação social. A observação, portanto, não é apenas um procedimento técnico, mas, um exercício de ética e responsabilidade, que integra ensino, pesquisa e extensão na busca por compreender e intervir nos fenômenos sociais (ROCHA, 2013).
- Think (pensar, refletir e analisar)
A fase think corresponde a situar os fenômenos sociais dentro de seu contexto histórico, social, cultural e econômico, reconhecendo que cada ação humana é orientada por significados próprios. Não se trata apenas de observar comportamentos externos, mas de buscar compreender as intenções, motivações e valores que guiam as escolhas individuais e coletivas. Pensar envolve, assim, perceber o sentido que os atores sociais atribuem às suas próprias ações, reconhecendo que cada decisão e prática social carrega uma carga simbólica que precisa ser interpretada de forma crítica e contextualizada (ECO, 1989).
Cabe refletir, nesse quadro teórico, é um exercício de distanciamento crítico que permite ao pesquisador questionar suas próprias pressuposições e posicionamentos diante do objeto estudado. Goldemberg, ressalta que, na abordagem Weberiana, a reflexão não é apenas sobre o fenômeno externo, mas, também sobre a relação entre o pesquisador e o campo social. A reflexão envolve analisar como as normas, valores e estruturas de poder influenciam a ação dos indivíduos, reconhecendo a complexidade das relações sociais e pluralidade de perspectiva possíveis. Dessa forma, o pesquisador se torna consciente das múltiplas camadas que compõem o sentido das ações humanas (GOLDEMBERG, 2004).
Analisar, por sua vez, consiste em organizar, interpretar e sistematizar os dados coletados de maneira a aprender a lógica interna dos fenômenos sociais. A análise weberiana integra tanto os aspectos objetivos das ações quanto os significados subjetivos atribuídos pelos próprios atores, permitindo compreender não apenas “o que” ocorre, mas “por que” ocorre. Essa etapa requer o uso de categorias conceituais e ferramentas metodológicas que possibilitem relacionar fatos a valores, padrões culturais e estruturas sociais, transformando a observação em compreensão profunda. O foco da análise não está apenas na descrição, mas na interpretação compreensiva que revela as motivações, intencionalidades e consequências das ações sociais (GOLDEMBERG, 2004).
Pensar, refletir e analisar constituem dimensões interdependentes e complementares da estrutura de pensamento humano, que parte do real concreto para a formação de uma teoria abstrata e fundamentada. Estas dimensões formam uma tríade que guia a investigação social. Pensar permite situar o fenômeno, refletir possibilita o distanciamento crítico e a conscientização do pesquisador sobre sua posição, e analisar organiza e interpreta os dados em sua dimensão significativa. Juntas, essas práticas transformam a pesquisa em um processo capaz de aprender a complexidade e pluralidade da vida social, destacando os significados construídos pelos atores e evidenciando que compreende o social exige tanto o rigor metodológico quanto a sensibilidade interpretativa.
- Act (Agir e Aplicar)
A fase Act, tal como sistematizada por Michel Thiollent, é uma metodologia que articula teoria e prática ao inserir o pesquisador em um processo dinâmico e participativo (THIOLLENT, 2018).
Diferentemente de abordagens tradicionais, a pesquisa-ação não se limita a observar um fenômeno social ou educacional, mas busca intervir nele para transformá-lo, ao mesmo tempo em que o compreende. Essa perspectiva destaca o caráter democrático da pesquisa, já que envolve os sujeitos diretamente impactados pelo problema, reconhecendo-os como coprodutores do conhecimento. Assim, a pesquisa-ação rompe com a dicotomia entre sujeito e objeto, criando um espaço dialógico de construção coletiva (IBIAPINA, 2008).
No caso da pesquisa-ação, a ação não é apenas uma consequência da investigação, mas parte integrante do processo investigativo. Thiollent, ressalta que a pesquisa-ação tem como objetivo resolver problemas concretos, promovendo mudanças e inovações que atendam às demandas dos participantes. Essa abordagem, portanto, não apenas analisa a realidade, mas atua sobre ela, contribuindo para a emancipação dos envolvidos e para a criação de práticas sociais mais justas e eficientes. Ao integrar pesquisa e prática social, essa metodologia amplia o alcance da produção de conhecimento, fortalecendo sua relevância científica e social (THIOLLENT, 2018).
Já a pesquisa colaborativa, proposta por Ibiapina, parte de princípios semelhantes, mas enfatiza ainda mais a horizontalidade da relação entre pesquisador e participantes. Nessa abordagem, a colaboração é o eixo central, de modo que o processo investigativo se constrói na interação contínua, em que todos têm voz ativa na definição dos problemas, na análise dos dados e na busca por soluções. A pesquisa colaborativa, assim, coloca em prática uma visão democrática do conhecimento, reconhecendo que todos os sujeitos envolvidos possuem saberes legítimos que devem ser valorizados e incorporados ao processo de produção científica (IBIAPINA, BANDEIRA e ARAUJO, 2016).
A principal diferença entre a pesquisa-ação de Thiollent e a pesquisa colaborativa de Ibiapina está no grau e no enfoque da participação. Enquanto a primeira coloca a ênfase na ação transformadora e no caráter interventivo da pesquisa, a segunda sublinha o processo de cooperação mútua e de construção conjunta do conhecimento. Ambas, no entanto, partilham a ideia de que o conhecimento científico não deve ser produzido de forma isolada, mas em diálogo com os sujeitos sociais, promovendo uma ciência comprometida com a transformação da realidade e a valorização da experiência coletiva.
- Reflect (refletir e sistematizar a ação)
A sistematização de uma pesquisa consiste em organizar, analisar e apresentar de forma clara e coerente os dados coletados durante o processo investigativo. Essa etapa vai além da simples descrição de fatos, pois envolve a interpretação crítica dos resultados, relacionando-os com o referencial teórico e os objetivos da investigação. Ao sistematizar, o pesquisador cria uma narrativa que evidencia o percurso metodológico, as descobertas e as relações entre os diferentes elementos observados, permitindo compreender o fenômeno de forma estruturada e consistente (DENZIM e LINCOLM, 2006).
Refletir sobre o que foi produzido na pesquisa é fundamental para compreender o significado e o impacto dos resultados. Esse exercício de reflexão permite identificar padrões, contradições, avanços e limitações do estudo, oferecendo subsídios para o aprimoramento do conhecimento. Além disso, a reflexão contribui para a aprendizagem contínua do pesquisador, estimulando o pensamento crítico sobre os métodos aplicados e a interpretação dos dados, tornando a pesquisa mais rigorosa e fundamentada (DENZIM e LINCOLM, 2006).
Uma investigação científica só se completa quando seus resultados são compartilhados com a comunidade acadêmica e a sociedade em geral. A divulgação do conhecimento produzido permite que outras pessoas se beneficiem das descobertas, possam reproduzir ou validar os achados e dialoguem com os resultados. O compartilhamento fortalece a função social da pesquisa, promovendo a troca de experiências e a construção coletiva do saber, transformando o conhecimento em instrumento de aprendizagem e inovação.
Portanto, a sistematização, a reflexão e o compartilhamento formam um ciclo indispensável na pesquisa científica. Somente ao organizar os dados, interpretar criticamente os resultados e torná-los acessíveis a outros, a investigação cumpre seu papel de gerar conhecimento relevante e útil. Assim, a produção científica deixa de ser um ato individual e fechado, tornando-se uma prática colaborativa e transformadora, capaz de contribuir efetivamente para o avanço do conhecimento e para a melhoria das condições sociais e institucionais.
- CONSIDERAÇÕES FINAIS
O presente estudo destacou a relevância da metodologia S.T.A.R. (See, Think, Act, Reflect) como um caminho inovador para a pesquisa empírica em Direito e em outras áreas das ciências sociais e sociais aplicadas.
A partir da articulação entre o “concreto pensado”, a pesquisa-ação, a pesquisa colaborativa e o pensamento crítico de Paulo Freire, a proposta metodológica buscou superar os limites do modelo jurídico tradicional, que se prende excessivamente à dogmática normativa e desconsidera a complexidade social.
Assim, o trabalho apresentou uma síntese que valoriza a integração entre teoria e prática, promovendo um processo investigativo mais conectado com a realidade histórica, cultural e social dos sujeitos.
A fase See (ver e compreender) destacou-se como momento inicial de aproximação com a realidade concreta. Ao valorizar a observação crítica e a ecologia de saberes, essa etapa possibilita reconhecer os sujeitos como coautores do conhecimento, superando a lógica verticalizada da pesquisa tradicional. Essa dimensão assume caráter ético e pedagógico, pois considera as vozes e experiências dos participantes como fontes legítimas para a interpretação dos fenômenos sociais e jurídicos, ampliando a relevância e o compromisso social da ciência.
Na etapa Think (pensar, refletir e analisar), evidenciou-se a importância da interpretação crítica e contextualizada dos dados obtidos. Pensar e refletir significam situar os fenômenos em seus contextos históricos, sociais e culturais, ao mesmo tempo em que se reconhece o papel ativo do pesquisador no processo. Ao analisar, a metodologia promove uma compreensão mais profunda, que não se limita à descrição, mas busca captar os sentidos e significados atribuídos pelas pessoas às suas práticas, fortalecendo a construção de teorias fundamentadas na realidade vivida.
A fase Act (agir e aplicar) revelou o caráter transformador do método S.T.A.R., ao integrar ação e pesquisa em um processo dinâmico e participativo. Inspirada na pesquisa-ação e na pesquisa colaborativa, essa etapa enfatiza a intervenção prática, reconhecendo os sujeitos envolvidos como coprodutores do conhecimento. Diferente de abordagens tradicionais, aqui a ação não é consequência posterior da investigação, mas parte constitutiva do processo, orientada para a emancipação e para a busca de soluções criativas a problemas concretos.
Por fim, a fase Reflect (refletir e sistematizar a ação) encerra o ciclo metodológico com a organização, análise crítica e socialização dos resultados. Essa etapa reforça a ideia de que a pesquisa científica só se completa quando seus achados são partilhados com a comunidade acadêmica e a sociedade em geral. Para tanto, propõe-se a intensificação da divulgação científica por meio de seminários, apresentação de trabalhos, publicação de artigos em periódicos, capítulos de livros e obras autorais, assegurando que a metodologia S.T.A.R. se consolide como uma referência para práticas investigativas comprometidas com a transformação social.
Por fim, este estudo aponta para a necessidade de difundir a metodologia S.T.A.R. por meio de ações de divulgação científica que fortaleçam sua legitimidade e ampliem seu alcance. Entre as medidas propostas, destacam-se a realização de seminários temáticos, a apresentação de trabalhos em congressos nacionais e internacionais, a publicação de artigos científicos em periódicos especializados, a elaboração de capítulos de livros coletivos e a produção de obras autorais que consolidem a proposta metodológica. Tais iniciativas contribuirão para a consolidação de uma rede de pesquisadores comprometidos com a transformação social, reforçando o papel do conhecimento científico como instrumento de emancipação e justiça.
- REFERÊNCIAS
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[1] Advogado (UFBA), Economista (UFBA), Tecnólogo em Análise e Desenvolvimento de Sistemas (UNINASSAU) e professor pleno da Universidade do Estado da Bahia (UNEB). Professor na graduação presencial e EAD e na pós-graduação stricto-sensu (mestrado e doutorado) é fundador e coordenador do Centro de Referência em Desenvolvimento e Humanidades (CRDH/UNEB). Tem mestrado e doutorado em educação (UFBA) e pós-doutorado em direito (UFSC). Pesquisa nas áreas de políticas públicas, marcos legais e institucionais; Direitos Humanos e da Natureza; e tecnologia e inovação (empresarial, social e pública). Currículo lattes: http://lattes.cnpq.br/5068823120384244; canal no YouTube http://www.youtube.com/c/rochapopciencia; e-mail para contato: crdhbr@gmail.com.
[2] Pedagoga (UNEB) coordenadora de curso de pedagogia (UNINASSAU), professora de metodologia para os cursos de Direito. Analista universitária UNEB, pesquisadora e fundadora do CRDH/UNEB. Mestre e doutora em educação pela UFBA. Pesquisa nas áreas de políticas educacionais, metodologia científica e educação ecológica e Direitos da Natureza. Currículo lattes: http://lattes.cnpq.br/7218553892275774; Email para contato: crdhbr@gmail.com.
[3] Professor de Educação Física (UFBA), sociólogo (UFBA). Tem mestrado em educação (UNEB) e doutorado em educação (UFBA). Pesquisa na área de políticas públicas, metodologia científica e Direito ao Lazer. Currículo lattes: http://lattes.cnpq.br/8268479229538782. Contato: crdhbr@gmail.com.