Educação e o Caso Érica Cristina Bispo
Por Wolmer Ricardo Tavares – Mestre em Educação e Sociedade, Escritor, Palestrante e Docente – www.wolmer.pro.br
Currículo Lattes http://lattes.cnpq.br/9745921265767806
Uma das funções da educação é instigar o educando a criticidade e ao protagonismo cognoscente para sua própria transformação, e isso ocorrerá por meio do conhecimento e de leis que resguardam seus direitos.
Este texto é para pontuar que o Brasil infelizmente ainda se encontra enraizado ao colonialismo em que as pessoas de raça negra continuam sendo subjugadas e subtraídas de todos os direitos, estigmatizados por uma escravocrata que privilegia os brancos, principalmente da elite e quanto ao negro, lhe subtrai todas as oportunidades, fazendo valer a história de seus ancestrais, ou seja, a herança da escravidão.
Hipocritamente, instituições educacionais que deveriam trabalhar em seu efetivo a luta para qualquer forma de exclusão social e/ou preconceito, é justamente o braço forte desta segmentação.
Podemos perceber que a palavra meritocracia existe apenas nos dicionários da língua portuguesa e não adianta substituir pelo termo “Self-Made Man”, usado para descrever quando uma pessoa alcança o sucesso e diz que tal sucesso foi mérito próprio, isso é, não dependeu de qualquer ajuda externa.
Peguemos como exemplo um caso ocorrido recentemente no Estado do Rio de Janeiro, em quem uma vereadora considerada a parlamentar mais jovem do país que foi convidada a assumir o cargo de subsecretária de Ambiente do Estado.
Vale lembrar que na época que ela foi eleita, ela tinha 18 anos e estava acabando de terminar o segundo grau. Será que o critério de escolha (e não seleção) foi pelo currículo dela ou por ser filha de um deputado estadual do PMB?[1]
Será que uma pessoa preta com mestrado e/ou doutorado nesta área não teria melhores condições de ocupar tal cargo que é de suma importância não apenas para a região, mas para todo o país por se tratar de um tema de grande relevância?
Apesar do país afirmar em sua constituição que todos somos iguais perante a lei e que racismo hoje é visto como crime, as instituições com sua hipocrisia simplesmente cancelam concursos aos quais os pretos passam e que os pretos em sua maioria ocupam terceirizados relacionados a limpeza e higienização da instituição, que é o caso da Universidade de São Paulo (USP) que nos fazem perceber que o preconceito existe onde sequer poderia existir.
No meu livro Educação e a Não Neutralidade, publicado pela Ícone em 2024, é ressaltado que temos que ser intolerantes com os intolerantes e esta intolerância tem que prevalecer com quem pratica a violência física, psicológica e moral.
Deve haver intolerância também com pessoas e/ou instituições homofóbicas, xenofóbicas, misóginas, abusadores de menores, aliciadores de crianças, enfim, essa intolerância deverá reinar em todos as situações em que qualquer tipo de preconceito prevalecer.
A isso é denominado Paradoxo de Popper e segundo o seu raciocínio, a tolerância com os intolerantes faz com que a própria tolerância seja extinta, ou seja, para Popper, corre-se o risco dos intolerantes tomarem o poder e extinguirem toda a tolerância da sociedade.
Temos que ser intolerantes com a USP que usurpou o direito da professora Érica Cristina Bispo poder realizar o seu trabalho, visto que ela se prontificou a fazer todos as avaliações requisitadas alcançando as melhores notas que seus concorrentes e por ser uma pessoa preta, esta mesma instituição por reclamações dos professores brancos que não tiveram competência de tirarem uma nota melhor que a dela, simplesmente anulou o concurso mesmo o Ministério Público reconhecendo não haver irregularidades[2].
É sabido por muitos que em muitas Instituições Federais existe apadrinhamento baseado na hereditariedade simbólica, isto é, as situações são mais favoráveis para quem pertence a elite “pensante”.
Para instituições como a USP, pessoas pretas não têm autoridade intelectual por mais que se provem capazes, assim as portas das oportunidades são fechadas por meio de anulações de concursos.
A nossa sociedade se incomoda em ver o negro tendo autoridade intelectual e isso é histórico, assim aconteceu com um dos maiores escritores que foi Machado de Assis, com uma representação esbranquiçada criada pela elite da época retratando-o como branco para fins sociais e de prestígio e continuará acontecendo só que agora, será por meio de anulação de concurso ou de autocracia.
Quantas Éricas tivemos e/ou teremos em nossa sociedade? O lado bom é que no caso desta professora, ela conseguiu tornar a público o quão hipócrita é a sociedade e os professores que participaram do concurso a denunciaram pelo simples fato de invejar o seu poder cognitivo, que faltou em todos eles.
[1] https://oglobo.globo.com/rio/noticia/2025/10/09/filha-de-deputado-vereadora-mais-jovem-eleita-no-brasil-ganha-cargo-no-governo-do-rio.ghtml
[2] https://oglobo.globo.com/brasil/educacao/noticia/2025/10/16/usp-anula-posse-de-professora-negra-aprovada-em-primeiro-lugar-apos-questionamentos-de-outros-candidatos.ghtml