26/02/2024

Educação e a Erradicação do Apartheid Social

Por Wolmer Ricardo Tavares – Mestre em Educação e Sociedade, Escritor, Palestrante e Docente

Currículo Lattes http://lattes.cnpq.br/9745921265767806

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Apartheid Social está relacionado a exclusão, muito bem descrito por Victória Gearini na Revista Aventuras na História, maio de 2023 com o texto intitulado A Luta Antimanicomial, na qual é ressaltado que a sociedade ainda se encontra enraizada nos sistemas de exclusão.

Partindo desta afirmação, Boaventura Souza Santos esclarece no livro Reconhecer para libertar: os caminhos do cosmopolitanismo multicultural. Introdução: para ampliar o cânone do reconhecimento, da diferença e da igualdade, publicado pela Editora Civilização Brasileira em 2003, que “temos o direito de ser iguais quando nossa diferença nos inferioriza e temos o direito de ser diferentes quando nossa igualdade nos descaracteriza”.

Interessante perceber que nos dois parágrafos acima, um fala faz alusão a exclusão e o outra ao respeito a esta mesma exclusão, isto porque mesmo que a sociedade se esforce para incluir as pessoas que na história brasileira foram vítimas de exclusão e abandonadas nos “manicômios” pelos familiares por não serem vistas como pessoas “normais”, esta mesma sociedade por falta de conhecimento faz imperar o desprezo pelos “diferentes”.

Cabe ressaltar que qualquer sentimento de recusa ao ser humano explicita no indivíduo um certo preconceito, uma soberba e até mesmo um orgulho idiota em se achar superior, fruto de um sentimento eugenista.

Faz-se mister salientar que algumas vezes a repulsão a certos indivíduos ocorre em um simples comentário e em não aceitação de uma especificidade relacionada a pessoa, como se o sujeito que julga tivesse propriedade para anular o laudo de cunho científico dado por um profissional da área, e este mesmo sujeito deixa vir a tona o seu achismo explicando que a pessoa não tem cara de ser PcD, ou seja, Pessoa com Deficiência, que outrora era denominada de PNE – Portador de Necessidades Especiais.

Um bom exemplo a ser usado neste contexto é a banalização de pessoas com TEA – Transtorno do Espectro Autista, já que é comum ouvir estultices até mesmo de educadores afirmando que hoje é moda ser autista.

Esta afirmação apenas ressalta o quão é o seu déficit em história e até mesmo humanização, já que, se a pessoa buscar se informar melhor, ela perceberá que na história brasileira, pessoas com deficiências, eram simplesmente escondidas da sociedade por não fazerem parte do que era visto como “normalidade” e para as famílias com um poder aquisitivo melhor, estas pessoas eram enviadas aos hospícios e deixadas para morrerem por lá.

As informações acima podem ser corroboradas pela psicóloga Hildaléa Dias em sua dissertação intitulada As Políticas Públicas de Assistência à Saúde Mental e o Fim Necessário dos Hospitais Psiquiátricos: Um Olhar Sobre o Centro Hospitalar Psiquiátrico de Barbacena a Partir de uma Trajetória Profissional, apresentada à PPGPSI – JFSJ em 2022.

Em sua obra a psicóloga faz uma excelente narrativa esclarecendo o quão a sociedade era perversa com os seus diferentes, já que na cidade de Barbacena situada em Minas Gerais, o Hospital Psiquiátrico por ser muito grande, era comum uma elevada taxa de mortalidade devido ao número de pacientes, o que tinha como agravante a desassistência que em muitos casos era comparada com à tortura e em concomitância, a omissão da sociedade que era conhecedora porém não se manifestava.

A autora faz alusão as barbáries e aos horrores praticados com os pacientes o que até hoje provoca indignação e reflexão, assim sendo, Hildaléa afirma que os pacientes frequentadores deste hospital sempre foram vítimas “do preconceito e da discriminação da sociedade; da intolerância e do desprezo de suas famílias, da insuficiência da tecnologia médica e dos equívocos dos profissionais, mas sobretudo das políticas públicas do país”.

A tristeza nisso tudo é justamente estas pessoas não terem sequer o apoio dos familiares, mas a sociedade tem buscado reparar tal situação, e as escolas por meio da inclusão tem rompido este apartheid social, embora o preconceito ainda impere em muitos jovens e até mesmo em pessoas que eram para ser mais esclarecidas e empáticas.

Um caso inusitado relacionado a um autista de nível moderado ocorreu em um condomínio em São Paulo no qual este jovem foi proibido de circular pelas áreas comuns do condomínio, isso tudo porque ele tentou tocar no ombro de uma moradora e ela não gostou, a ponto de abrir um Boletim de Ocorrência[1].

Obviamente tem-se muitos outros casos em que a inclusão simplesmente é ignorada pela falta de empatia, humanismo e até mesmo de educação, como no caso de um adolescente autista que foi agredido com tapas e socos em uma escola no Rio de Janeiro[2].

Infelizmente isso não é um fato isolado, basta pesquisarmos casos de agressões com autistas que teremos dezenas de reportagem mostrando que nós como seres humanos temos ainda muito a evoluir, não apenas intelectualmente, mas principalmente, moralmente.

Dito isso, cabe a educação por meio de seu poder transformador, trabalhar em seus alunos o respeito as diferenças, ressaltado as falas do escritor, poeta e compositor Tinho Alves, ao deixar bem claro que “se as feridas do teu próximo não te causam dor, a sua doença é pior do que a dele”, e isso a nosso ver, a sua doença é de fundo moral.

 

[1] https://www.youtube.com/watch?v=iaWNGFZ1oK4

[2] https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/2023/05/12/adolescente-autista-e-agredido-com-tapas-e-socos-dentro-de-escola-do-rio-ataque-foi-filmado-por-colegas-de-turma-e-publicado-nas-redes-sociais.ghtml

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