18/12/2016

DO RELACIONAMENTO E DO AMOR EM SALA DE AULA.

Dênio Mágno da Cunha*

               Ainda impactado pelas palavras do professor Jorge Olinto Bento[i] sobre o papel do professor; lendo “A arte de amar – mindfulness Essentials” do monge budista vietnamita Thich Nhat Hanh, encontrei uma frase que talvez (dentre tantas) expresse a definição da arte de ser professor. Diz Thich Nhat Hahn: “Um verdadeiro parceiro ou amigo é alguém que nos encoraja a olhar para dentro de nós mesmos, para assim procurarmos a beleza do amor que estamos buscando”[ii].

               A partir desta frase surgem inúmeras indagações. O professor é um parceiro ou amigo de seu aluno? Sim, deveria. Mas, a resposta é não, não é por pura falta de condições físicas. Em salas com um grande número de alunos é impossível manter uma relação de proximidade. Casos de escolas de sucesso, modelos de aprendizagem e inovação, mostram que o número de alunos é reduzido. Os alunos não são alunos, são aprendizes; o relacionamento professor-aluno passa a ser de tutor-aprendiz. Isto faz uma diferença muito grande. De uma realidade formada por anônimos para outra formada por sujeitos – orientadores e orientados. Por isso, é bom as instituições de ensino repensarem seus modelos de formação em massa, se desejarem verdadeiramente formarem com qualidade.

               A qualidade do relacionamento entre professor e aluno, faz toda diferença em inúmeros aspectos, incluindo entre eles na motivação, na diferença avaliativa, na busca por desempenhos superior, na adequação da formação entre outros. Gestores escolares pensem nisso antes de saírem desesperados em busca de tecnologias que possibilitem a qualidade da aprendizagem em massa. Não há como comparar o trabalho do mestre e do aprendiz com o trabalho do professor e seus muitos alunos. Reduzam a expectativa para não enlouquecerem diante do desapontamento e do sucesso relativo.

               O professor deve encorajar o aluno a olhar dentro de si ou deve focar exclusivamente no conteúdo externo? Difícil responder, mas seria desejável que o professor pudesse conduzir o aluno a sempre se auto avaliar, vendo/revendo objetivos, aspirações, necessidades pessoais. Uma pessoa (aluno, no caso) que tenha a auto avaliação evoluída, madura, saberá demandar adequadamente pelo conhecimento necessário, desejado. Há modelos de ensino que pregam essa autonomia. Mas sem o espaço para o autoconhecimento a autonomia não se fará plena.  E qual o papel do professor?

               O professor deve ser o contraponto do diálogo interno mantido pelo aluno. A experiência do professor será útil ao aluno na superação de suas dificuldades e ao ajuda-lo no ato de traçar a rota de sua evolução (espiritual e intelectual).  O aluno não deveria nunca ser abandonado a sua própria sorte. É comum, professores entenderem autonomia como sua libertação do dever se ensinar, o que obviamente é um erro, dos maiores.

               Existe uma relação de amor entre professor e aluno? Sim, taxativamente, enfaticamente. Imaginemos o contrário. Não sei em que lugar, mas já ouvi dizer de escolas em que o aluno vê no professor um adversário, um chato a lhe exigir aprendizagem e desempenho. Nesse mesmo lugar, o professor vê o aluno como um chato que fica fazendo perguntas, lamuriando notas, um desocupado que corre atrás de um diploma. De modo que a sala de aula é formada por pessoas que preferiam estar a milhas de distância de onde estão. Essa relação não possibilita, de modo algum, a aprendizagem. É uma relação de origem conflituosa, ampliadora de distâncias, totalmente sem amor. Séculos de experiência em educação nos mostram que essa relação de conflito só proporciona bons resultados em uma mínima parte dos alunos, não em sua maioria. Justamente a uma minoria que soube perceber a relação amorosa existente na relação ensino-aprendizagem. A história da educação nos indica: significativos resultados em educação são consequências de um ensino interessado, parceiro, amigo, amoroso.

               Alguns leitores pensarão que o amor é sinônimo (exclusivamente) de suavidade, concordância, passividade. Esquecem-se das correções feitas por mães e pais, às vezes doloridas e, nem por isso, vazias de amor. Como aqui não se está falando das inúmeras formas de amor, atem-se a dizer que o amor (de modo geral e na educação) é exigente, compassivo e centrado no outro, de modo que a alegria de um é a felicidade do outro. No ensino, amar significa o estabelecimento de uma relação compromissada com o sucesso do outro; aluno e professor, importam-se e compreendem-se de forma mútua e, num ambiente de confiança abrem espaço para a crítica, para a avaliação, em busca de um objetivo comum: a aprendizagem. Já dizia Guimarães Rosa: “mestre não é quem ensina, mas quem, de repente, aprende”.

               Mas sobre quais condições isso é possível? Uma professora, Fernanda Wasner, orientava seus professores a estabelecerem no primeiro dia de aula aquilo que ela denominava de “combinados” (quem nunca ouviu falar dessa prática?). Esse é o primeiro passo, decisivo na construção do ambiente em sala de aula. O depois é consequência da transparência e concordância com que se constrói esse momento. Que sejam três, ou cinco, ou dez estes combinados, o importante é serem fruto de um entendimento entre professor e aluno sobre os objetivos, caminhos e comportamentos acordados. Nessa hora, deve-se abrir o diálogo, não ditar regras, mas antes de tudo estabelecer uma relação amorosa, frente a frente, olho no olho. Simples assim.

              

* Dênio Mágno da Cunha, Doutor em Educação pela Universidade de Sorocaba, professor em Carta Consulta e Una.

 


[ii] NHÂT-HANH, THICH. A Arte de amar. Rio de Janeiro: Agir, 2015. 

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