13/07/2018

Debruçada na janela da existência campesina

DEBRUÇADA NA JANELA DA EXISTENCIA CAMPESINA

                                                              Edilma Cotrim da Silva – UNEB

                                                    

  1. Introdução

A proposição desse objeto é instigar e refletir sobre as práticas, os discursos e as legalidades da educação do homem campensino no nordeste brasileiro, ganhando destaque o município  de Guanambi, circunscrito no espaço do Colégio Luis Viana Filho1, ocupando o centro desta cidade. Objetiva se aqui fazer um hiato entre o que foi praticissado, teorizado e legalizado, para tanto foi ouvido atores advindos do campo deste município e que estudaram e/ou estudam nesse colégio.

A janela do Colégio Luiz Viana Filho, vista de fora, foi e ainda é espaço de desejos, perceptíveis  pela quantidade de alunos amontoados pelos passeios que o circundam e pelos ônibus enfileirados  nos horários de entrada e saída do expediente escolar. O que buscam ali? Na janela dessa autora e de muitos que um  entraram e entram  pela fresta da porta há muito mais que o estudar. Na década de setenta, para um campesino, ela propicia o ser gente, ser visível, fazer parte de uma sociedade.

Estar ali era ser feliz.  Como fazer para chegar ali? Essa itinerância é triste. Para estar ali, algo tinha que morrer ou ainda tem que morrer. O cantar dos pássaros, a enxada, o descanso, muitos amigos que não puderam se fazer presentes, portanto se perderam na encruzilhada desse caminho. Em muitos casos há de se optar pela  A escolha de Sofia2. Numa família numerosa decide se quem vai estudar, quem não vai, por que o outro não vai?

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1. Em 1970  criou-se o Colégio Estadual Governador Luís Viana Filho sendo na ocasião o prefeito de Guanambi, Jonas Rodrigues da Silva e o governador Luís Viana Filho que também naquela época tiveram a oportunidade de inaugurar a represa de Ceraíma junto ao Ministro de Minas e Energia da época, Mário Andreazza. Por muitos anos, tal colégio se manteve como exemplo educacional na região.

2. A escolha de Sofia é uma expressão que invoca a imposição de se tomar uma decisão difícil sob pressão e enorme sacrifício pessoal, como a vista no filme homônimo de 1982 que valeu a Meryl Streep o Oscar de melhor atriz. A trama dirigida por Alan J. Pakula, a partir do romance de William Styron, conta a história de Sofia, uma polonesa que, sob acusação de contrabando, é presa com seus dois filhos pequenos, um menino e uma menina, no campo de concentração de Auschwitz durante a II Guerra.

Nesse momento triste há um choro contido, tanto daquele ou daqueles que são escolhidos para contemplar a janela de dentro pra fora, como daquele ou daqueles que ficam excluídos dessa oportunidade cabendo lhe apenas o sentimento do não ser feliz resta tão somente olhar de fora pra dentro.

Nesse espaço ocorreu mais uma escolha, tão injusta quanto a antes relatada, só foram ouvidos os privilegiados e felizes, então o olhar é de dentro para fora.

Já adentrados nesse espaço pergunta se, como manter nele?  Voltemos às perdas. Ou o ônibus para voltar para casa ou o subemprego. Entende se aqui o conceito na sua força do existir e sobreviver. Em troca de um prato de comida e uma cama eu faço qualquer coisa.

Sendo esse universo tão complexo e com tantos atores esse estudo se atem  à meninas campesinas e que se tornam empregadas domésticas na cidade com o fim específico de olhar a janela de dentro pra fora.

 Essas meninas são as que  subverteram  o que estava circunscrito quase como uma sentença.  Poderia dizer que mataram e choraram demais para essa nova existência.

Trazer a tona algo tão invisível é possibilitar reflexões e comparações para outros estudos. A pergunta que ganha destaque nesse momento é: Como foi esse percurso do campo até a escola? Quais os sonhos perdidos? Quais os realizados? Onde ficaram  ou ficam seus desejos?   Onde está o espaço campensino no seu existir dentro da escola?

Nesse sentido esta investigação procura mostrar como a aluna trabalhadora se apropria das funções da escola segundo a sua posição social, Sem perder vistas as questões norteadoras deste trabalho e seu nível sócio-cultural. E nessa perspectiva abre uma porta para pensar a escola levando em conta sua contextualização histórica, social e política. Foge, portanto, da escola geral, universal, o que desponta nesse estudo é uma escola multifacetária, plural, englobando redes de significados nem tão visíveis, nem tão fáceis de explorar.

 

Para compreendê-la, cabe ir além do que salta aos olhos, requer sensibilidade, boa vontade e desprendimento na busca de ouvir, sentir os atores desse espaço. Não cabe julgar, é preciso entender os motivos que levam a aluna trabalhadora campesina a adotar esse ou aquele comportamento, que na maioria das vezes causam descontentamento para a instituição escolar.

2. Referencias bibliográficas.

Repensar a escola também é uma forma de repensar o mundo, a sociedade e as instituições que a constituem, ao mesmo tempo em que são constituídas. Para tanto se torna necessário contextualizá-la historicamente, socialmente e politicamente.

Revisitando estudiosos sobre Educação campesina no Nordeste  Brasileiro desponta os saberes que  a família os transmitirá, por processo análogo, aos seus filhos, tornados seus aprendizes das lides comuns ao grupo familiar, conforme a idade, o sexo e a natureza da tarefa a ser desempenhada. Esse processo de culturação não é restrito apenas ao treinamento para o domínio das habilidades requeridas pela produção agrícola ou administração doméstica: plantar, colher, limpar a casa; nele são incorporados valores éticos, sociais e religiosos que constituem a identidade comunitária de sua origem. Nitidamente fica claro que há papeis diferenciados para mulheres e homens.

(...) "aspecto interessante que este estudo evidencia é o papel exercido pela família na sua dupla função de unidade produtiva e instituição social, na formação para o trabalho dos novos membros da família. Esse treinamento inicia-se muito cedo, tendo o caráter de aprendizado, também diferenciado por sexos, cabendo ao homem ensinar as tarefas agropecuárias aos meninos e à mulher transmitir os ensinamentos das lidas domésticas às meninas, enquanto ambos encarregam-se da prática dos valores, da ética do trabalho, das normas sociais, em que a obediência ocupa lugar de destaque. " (GATTI et al, 1993. p.58).

O sentido de família aqui pode ser explicado utilizando o tradicionalismo principalmente, ocupando a família,  o espaço campesino no nordeste brasileiro.  Definindo assim : O pai, a mãe e os filhos; todas as pessoas do mesmo sangue, como filhos, irmãos, sobrinhos, que vivem ou não em comum; conjunto de ascendentes, descendentes, colaterais e afins, uma linhagem, a estirpe; instituição social básica que compreende um ou mais homens, vivendo maritalmente com uma ou mais mulheres, os descendentes vivos, e, às vezes, outros parentes ou agregados; em casa, na intimidade; usa-se como adjetivo, no sentido de "honesto", "decente" falando-se sobretudo da mulher (Aurélio, 2010).

Cabe destacar que nas famílias campesinas no nordeste brasileiro é incidente a composição de uma prole mais numerosa que a urbana, nas ultimas décadas estudos apontam para um acelerado processo de redução da população rural brasileira, sobretudo a partir dos anos 60. Entre 1970 e 2010, a participação da população rural caiu de 44% para 15,6%, o que qualifica a velocidade do processo de urbanização no Brasil. Ainda assim, em termos absolutos a população rural brasileira continua expressiva, totalizando 30 milhões de pessoas em 2010, contingente superior ao de praticamente todos os países da América Latina, exceto a Argentina.

O deslocamento da população rural também tende a gerar contornos distintos entre as regiões, os níveis de qualificação, a idade e mesmo em relação à razão de gêneros da população. Por exemplo, em função da etapa de transição demográfica, os jovens são os que mais vêm deixando o meio rural e, entre esses, é preponderante a participação das mulheres (Camararo & Abramovay, 1999). A escolaridade também define as perspectivas de empregos nos setores mais desenvolvidos das áreas urbanas e cumpre um papel importante, tanto na decisão de migrar quanto nas oportunidades criadas e nos resultados da migração dos residentes rurais. Como consequência da migração seletiva nas áreas rurais, com o fluxo predominante de jovens mais escolarizados e do sexo feminino.

As atoras desse estudo se encaixam na perspectiva de ter estudado um pouco mais, nas antigas escolas do campo e continuidade de estudo. Para essa construção escolar é necessário migrar para a cidade. Uma campesina no mundo urbano não tem muitas oportunidades de trabalho. É sabido a ausência de muitas exigências apontadas no seu próprio corpo, também denunciadas nas falas e nos gestos. A porta de emprego mais larga é a de empregada doméstica.

A história e a legislação brasileira claramente traduzem a origem dos empregados domésticos no Brasil: o trabalho escravo exercido pelas "criadas", mulheres negras tiradas de sua terra natal para trabalhar exaustivamente nas casas grandes fazendo o que lhes fosse determinado pelos patrões.

Reafirmando  Sabóia (2000) que, as atrizes desse estudo são compreendidas  por empregadas domésticas,  aquelas pessoas que exercem funções como: arrumar toda ou parte da moradia; cozinhar ou preparar alimentos; lavar roupa ou louça; passar roupa, utilizando, ou não, aparelhos eletrodomésticos para executar estas tarefas; orientar ou dirigir empregados domésticos na execução das atividades; cuidar de filhos ou outro morador do local, residindo ou não nele, mediante remuneração.

No Brasil do século vinte encontramos na maioria dos lares uma emprega doméstica, Ainda está presente aquelas que apenas trabalham, mas juntam se a essas outras mulheres que são  empregadas domésticas, moram na casa dos empregadores e estudam. A razão de morar é justificada aqui, pela necessidade de frequentarem a escola, sendo campesinas e com pouca renda, faz-se necessário ter casa para morar e ganhar algum dinheiro para a garantia da permanência na escola.

É nesse momento que são feitas as `”escolhas de Sofia”, pela dificuldade de inserção em trabalhos que forneçam moradia, evidencia então o aumento do êxodo rural feminino. Numa família campesina há significados diferentes para cada um. Todos trabalham e ocupam posições diferentes nos espaços do campo. Perder um trabalhador pode comprometer a lide daquela família é necessário escolher quem faz menos falta, ou seja, aquele que pode ser substituído pela sobrecarga de trabalho de outros que não foram escolhidos para estudar.

Estudiosos como Rosemberg, Pinto e Negrão (1982) inquietaram sobre a importância do  aumento do grau da escolarização da mulher no Brasil. De fato nas últimas decas é apontado nos sensos um aumento dessa escolarização.  Atualmente há poucos registros sobre como fizeram as mulheres campesinas para a construção dessa busca. Está visível que há um maior número de mulheres campesinas estudando, outro questionamento se faz presente. Por que?

Ao deparar com a EJA no Colégio Luis Viana Filha, foi constatado que havia uma quantidade expressiva de campesinas inseridas nesse espaço. Agora na condição de cidadã do campo com  a ocupação de empregada doméstica.

Recorrendo a Campoy (2012), notamos que o trabalho doméstico remunerado é hoje, uma das atividades mais desenvolvidas em todo o mundo por mulheres oriundas de países de terceiro mundo. Trata-se de uma temática que envolve questões importantes inerentes à sociedade contemporânea: a localização da mulher no mundo do trabalho, a bipolaridade do trabalho feminino, bem como a divisão do trabalho entre os sexos, classes sociais, nações e etnias. Não obstante, relaciona-se, também, a uma questão pouco discutida e mesmo marginalizada, tanto no ambiente político brasileiro quanto internacional – o que contribui para a manutenção da invisibilidade social desta atividade profissional e, consequentemente, para a violação dos direitos mais elementares de suas integrantes.

A escolha pela mulher se dá nessa fresta do subemprego. Essa modalidade de trabalho é possível trabalhar, comer, dormir e estudar, mesmo em condições exaustivas para o corpo e a mente.

2.1 A EJA no campo

As histórias de escolarização de trabalhadores rurais permitem afirmar que a educação de jovens e adultos no campo se faz com precariedades de toda sorte e, mesmo que  conte com a presença ativa dos trabalhadores rurais, os espaços participativos como associações, sindicatos e especialmente os conselhos não têm sido efetivamente incorporados ao universo desses trabalhadores para a busca de soluções ou para exercer o controle social sobre as políticas e os programas educacionais. A educação de jovens e adultos do campo tanto permanece fora da agenda desses espaços de participação como somente de forma secundária é tratada como questão de Estado.

 Passado séculos, ainda está pautado nas campanhas políticas partidárias slogans que prometem “educação para todos”.   inclusive dos trabalhadores rurais, sujeitos que carregam historicamente a tradição perversa do analfabetismo; e a perversidade é agravada, pois tal situação é tomada quase como um fenômeno natural. Trata-se, no entanto, de uma condição social de homens e mulheres que parecem freqüentemente identificá-la com incapacidades próprias, individuais, e raramente com irresponsabilidade ou inoperância do Estado e de seus governantes na destinação de recursos financeiros e humanos para que o direito à educação seja assegurado; tampouco é vista como conseqüência de fragilidades na organização da sociedade na demanda para tornar efetivo o direito inscrito na Carta Constitucional de 1988.

Atendendo às demandas educacionais, o Estado vem ofertando, nos dez últimos anos, programas de alfabetização e de ensino fundamental e médio para a população jovem e adulta do campo que não se escolarizou quando criança. Tal oferta, de modo geral, parece anunciar um novo tempo, prometer vida mais farta, apontar perspectivas profissionais, especialmente aos jovens. A discrepância entre o discurso e a realidade prática, porém, propõe questões que merecem ser investigadas.

 Como afirmar que o direito à educação está sendo instituído e afirmado no mundo rural se o que se observa, à primeira vista, são precariedades de toda sorte, revelando uma “presença” estatal deficitária, uma quase ausência e em destaque, no município de Guanambi foi feito a nucleação3. Circunscrevendo assim o direito do campesino frequentar à escola ou como passageiros da noite4 , ou se tornar empregada doméstica. Então fica com a exclusão pedagógica promovida pelo estado. Amparado em Arroyo 2017 é possível afirmar “...que as crianças , os adolescentes e jovens-adultos são outros debatendo-se com suas famílias por um sobreviver provisório”.

Há tensões, conflitos nos seios familiares na busca por essa escola, tão desejada, tão sonhada. São feitas escolhas e colhidas muitas perdas para chegar até ela. É necessário retormar a dimensão da educação como um direito constitucional e como direito a ter direitos, situa-se como uma dimensão que se retoma com o Estado, com a política e, portanto, com a sociedade e suas características particulares.

Estaticamente o professor desenvolve seus trabalhos, respeitando as regras que o currículo lhe confere como corretas e não as atividades práticas, as condições históricas, sociais das pessoas que compõem o fazer escolar.

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3. Passageiros da Noite do trabalho para o EJA Itinerários pelo direito a uma vida justa. Miguel Arroyo 2017

4. O processo de nucleação corresponde à desativação da escola, por um período de 5 anos, e ao posterior fechamento. A nucleação, na primeira fase do ensino fundamental, se configura como o deslocamento de crianças e jovens das redes municipais e estaduais de ensino das escolas rurais, localizadas em comunidades que apresentam baixo número de matrículas ou caracterizadas como isoladas, devido à precária infraestrutura em relação às escolas de comunidades vizinhas melhores aparelhadas. Na segunda fase do ensino fundamental, o processo se assemelha. Porém os alunos são deslocados para as escolas localizadas na cidade. Destaca-se que muitos estados vêm reorganizando suas respectivas redes escolares em um provável processo de nucleação escolar que centralizaria as escolas em áreas urbanas, criando uma concentração educacional urbana. É nesse espaço que aumentam os passageiros da noite.

Separa-se aqui a consciência da ação, ou seja, se o aluno é obrigado a se encaixar em uma educação programada para um outro tipo de sujeito, ele é obrigado a negar a sua história. Deixa, portanto, de ser capaz de atuar no seu meio. Ao negar a realidade do aluno trabalhador rural, a escola está tirando a sua capacidade dinâmica de interpretar o mundo, desenvolver potencialidades e impulsionar processos voltados para a mudança social.

O aluno trabalhador rural é visto como o aluno urbano. Suas adversidades são ignoradas. A escola, ao agir assim, deliberadamente está desconstruindo o cidadão rural e transformando-o em um sujeito que não se completa no universo urbano nem tampouco no rural, reafirmando o que dizem:

O modo da escola rural operar impede o efetivo cumprimento daquilo que dela se poderia esperar: fornece a duras penas, tão somente fragmentos de conhecimentos que não podem ser úteis nem para a vida do campo, nem para um possível projeto de vida urbana. (GATTI et al. p. 87):

A maioria dos adolescentes não encontra tempo suficiente para se prepararem para as provas escolares. Alguns chegam atrasados, faltam e até dormem na sala de aula. Há prejuízo da vida escolar, com baixa no rendimento devido ao cansaço advindos dos horários inadequados do trabalho. E, mais, esse rendimento escolar fica abaixo da média quando comparado aos índices dos demais alunos.

3...Considerações Finais

Na realização desta pesquisa, consegui identificar, na representação dos alunos trabalhadores rurais, o desejo de aprenderem a 1er e escrever fundamentados em funções já instituídas pela escola, como: ter um trabalho melhor, ter autonomia como sujeito capaz de decifrar o código da leitura e da escrita, ter a sua imagem desvinculada de um preconceito dispensado pelos letrados àqueles que não o são.

Além desses parecem ainda outro sentido para a escola que foge ao instituído e que anima os alunos trabalhadores rurais a frequentarem a escola que é fazer parte de um grupo privilegiado aos olhos do coletivo, acham que a escola os faz mais educados, mais cidadãos, melhora a autoestima. Há um brilho no olhar que revela o orgulho de estar num grupo que para eles é o mais forte, o que tem maior destaque naquele espaço.

Há uma acomodação presente na aceitação do papel da escola. Sua condição física e pedagógica parece não representar muita coisa. A escola não revela eficácia e eficiência nos ensinamentos, politicamente pouco convincente, perde constantemente grande parte para a evasão. Dentre os que permanecem, boa parte fica repetindo consecutivas vezes a mesma série até que, um dia, também desiste. É presente nos seus discursos a vontade de ir para a cidade procurar uma escola melhor, que seja capaz de lhes conferir uma profissão.

Contraditoriamente ao proposto pela escola, que é inserção social, habilitação profissional, preparação plena do ser humano para o exercício da cidadania, encontramos uma escola que, em nenhum momento e sob nenhum aspecto, intenciona a fixação do campesino à terra, no seu nível mais baixo ela fornece uma educação elementar para o trabalhador rural, e este a utiliza em pequenas aplicações no cotidiano que em nada contribuem para melhorar suas condições de existência no contexto rural.

Ao que parece, a escola desenvolve muito bem o papel de estimular os ânimos e auxiliar a saída do jovem rural para as cidades em busca de trabalho. Consequentemente pela ausência de conhecimentos, esse trabalho se configurará em subempregos. A exemplo os que já foram citados pelos atores desta pesquisa.

A escola, que deveria assumir a posição de mantenedora de referenciais para a vida, cabe agora o tributo de fomentar o desencontro do homem camponês com a sua realidade, o tributo da massificação, da circulação instantânea e pasteurização de significados, desejos e modelos. É na própria prática cotidiana, nas lutas pelo poder no interior das sociedades, na ação dos homens, enfim, que tais referenciais vão se estabelecendo e solidificando, instituindo e sendo instituídos.

Não podemos negar o carisma ou magia que a escola desperta. Para os alunos trabalhadores rurais aprender a ler e escrever com a ajuda de outros é muito diferente do que se dá com aqueles que passam pelo banco da escola em busca do mesmo resultado. Para o homem do campo “Ter escola é muito importante”, isso faz uma grande diferença e se torna um divisor entre o homem “bronco”, “ignorante” (definição dada por eles para aqueles que nunca frequentaram a escola) e o letrado, ou seja, aquele que frequentou um ou dois anos uma escola.

Não adiantam propostas de mudanças isoladas para a escola do campo. Para viabilização de uma intervenção, torna-se necessária a adesão popular local em projetos políticos pedagógicos cuja consistência seja comprovada pelos atores envolvidos no contexto.  Ouso dizer que, diante do exposto, a escola é um espaço privilegiado, pois no seu chão é possível estabelecer um campo de lutas, porém é urgente a necessidade de reconstruir-se.

Como um grande cenário onde se expõem expectativas, desejos e fantasias, a escola precisa rever-se, enfrentando os conflitos de todas as ordens: formação de professor, currículos e programas vazios, o desafio da mídia televisiva impregnando de discurso alienante a mente de cada ator escolar, processos e formas de avaliação, realidades mutantes, fracasso escolar. Alguns desses problemas tornam-se verdadeiros estigmas, atributos extremamente depreciativos, que tornam a escola desacreditada.

 

4. Bibliografia

Aurélio 2010

CAMARARO, A. A. & ABRAMOVAY, R., 1999. Êxodo rural, envelhecimento e masculinização no Brasil: panorama dos últimos 50 anos. Texto para Discussão n. 621, IPEA, p. 23.

CAMPOY, Beatriz Rigoleto. O trabalho doméstico remunerado no Brasil: desigualdade, direitos e saúde. 2012. 127 f. Dissertação (Mestrado em Sociologia). Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Coimbra, 2012.

GATTI, Angelina B., DAVIS, Cláudia, ALENCAR, José F. et al. Coordenada por Jackques Therrien, & Maria Nobre Damasceno Escola e educação no campo. Campinas. Papirus, 1993.

MEIHY, José Carlos S. Bom. Manual de História Oral. São Paulo: Edições Loyola, 1996. 80 p.

 https://oglobo.globo.com/sociedade/educacao/analfabetismo-atinge-40-dos-jovens-trabalhadores-rurais-no-brasil-2974193#ixzz5JdWyK6yG. Acessado em 27/06/2018.

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