14/11/2017

Análise do Discurso de Enaltecimento Feminino Presente em “Moana: Um Mar de Aventuras”

RAISSA MORAES GARCIA DA ROCHA* e NEILTON LIMA

Aluna do Curso de Liciatura em Letras (Português/Inglês) da Faculdade São Miguel  – Recife/PE, Brasil;

Docente da Faculdade São Miguel – Recife/PE.

“Todos os nossos sonhos podem se realizar, se tivermos a coragem de persegui-los. ”(DISNEY, W.)

 

Resumo: A presente pesquisa tem o objetivo de analisar o discurso de enaltecimento da figura feminina presente no filme “Moana: Um mar de aventuras”. Também tem o intuito de ressaltar os momentos em que há a quebra da imagem de princesa tradicional construída ao longo da história dos filmes da Disney e como isso se relaciona com o empoderamento feminino.

Palavras-chave: Discurso; figura feminina; empoderamento; Disney; Moana.

Abstract: The present research aims to analyze the praise discourse of the female figure present in the film "Moana: A Sea of ​​Adventures". It also intend to highlight the moments in which there is the rupture of the image of the traditional princess built throughout the history of Disney movies and how this relates to the feminine empowerment.

Key-words: Discourse; female figure; empowerment; Disney; Moana.

INTRODUÇÃO

            É de conhecimento geral, que ao longo da história a as mulheres foram oprimidas e consideradas o “sexo frágil”. Porém, neste último século, a luta pelos direitos iguais entre os gêneros veio conquistando espaço para que a figura feminina pudesse se desenvolver e ganhar mais força perante à sociedade como pode se observar no seguinte trecho de Schwantes:

“Evidentemente, a representação do feminino é regida por convenções que enfrentaram mudanças significativas ao longo do tempo. Isso se deu conforme as possibilidades socialmente abertas à mulher se foram ampliando em consequência do acesso ao mercado de trabalho e ao ensino superior, e a inserção em uma ordem social mais ampla, como o configurado pela conquista do voto feminino”. (SCHWANTES, 2006)

            De acordo com o trecho citado acima, fica claro que com todas essas mudanças ocorridas, é natural que a imagem feminina se adapte de acordo com a realidade. Então, até mesmo na literatura, a mulher começou a ganhar mais força e uma notoriedade maior. Entretanto, até nos dias atuais, ainda é possível perceber a presença do estereótipo pejorativo onde não há força no sexo feminino, e isto pode ser bastante observado nos filmes de princesas dos estúdios da Walt Disney Pictures, onde as histórias sempre tiveram princesas e príncipes encantados e um final feliz, onde o casal ficaria junto e seriam felizes para sempre. Tudo isso, era sempre considerado normal, pois é muito comum na sociedade patriarcal, que o conceito de final feliz, envolva o casamento, ou pelo menos que haja a sugestão do mesmo. Breder afirma que:

“antes da revolução feminista, a figura masculina era toda a estrutura de que as mulheres poderiam dispor. O casamento ainda era o destino certo para todas as ‘filhas de família’; as mulheres precisavam de um homem que as ‘protegesse’.” (GOMES; 2000, p. 165). Prost acrescenta que: “o casamento marcava a emancipação dos filhos, permitindo-lhes escapar dos pais” (PROST; 2003, p. 79). Não é surpresa então que as princesas de antes da década de 60, como moças de família, necessitem de um homem. ” (BREDER, 2013)

Levando isto em consideração, foi produzido uma imagem de “princesas Disney” que eram sempre belas e delicadas e sempre teriam seus príncipes. Porém, notou-se que tal ideia é bastante prejudicial para as jovens meninas que assistem estes filmes, pois há uma idealização da imagem de princesa que as crianças vão se sentir inclinadas a imitar, como pode ser observado no seguinte trecho:

“As princesas são imagens que meninas e mulheres querem imitar. Além de seu padrão de beleza impossível, suas histórias trazem princípios sobre outros aspectos da vida (aqui divididos em trabalho, família e o príncipe encantado, além de aprofundar melhor a questão da aparência). Alguns desses valores, inevitavelmente, foram mudando ao longo das décadas que separam um filme do outro. Mas muitos detalhes e “lições” permanecem.” (BREDER, 2013)

Tendo isto em mente, o objeto do presente trabalho, é analisar o discurso de enaltecimento feminino presento no filme Moana: Um mar de aventuras, dos estúdios Disney, e como é possível perceber a quebra do padrão de “princesa Disney”, pois a personagem principal, Moana, é retratada de uma forma bastante forte, decidida e independente, o que não era comum nas princesas clássicas. Algo também presente na história, é o fato de que em momento algum há a pressão para que a personagem procure um parceiro, durante todo o filma, não há menção de romance, e o relacionamento de Moana e Maui, o personagem principal masculino, é estritamente de amizade, o que nunca havia ocorrido até o momento nos filmes da franquia.

ANÁLISE DO DISCURSO E A FIGURA FEMININA

            Primeiramente, para poder analisar o discurso de enaltecimento feminino presente no filme, é necessário deixar claro o que de fato é Análise do discurso. Segundo Eni Orlandi:

“A Análise do Discurso, como seu próprio nome indica, se trata da língua, não trata da gramática, embora essas coisas lhe interessem. Ela trata do Discurso. E a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a idéia de curso, de percurso, de correr por, de movimento. O discurso é assim palavra de movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando. “ (ORLANDI, 2012)

            Levando isso em consideração, é possível analisar o discurso feminista presente no filme Moana. Para os que não conhecem a história, a mesma se refere à uma garota, Moana, que será a futura chefe da tribo da ilha de Motonui, que deve seguir numa viagem em busca do semideus do ar e do mar, Maui, para juntos irem até o fim do oceano devolver o coração da Deusa Tefiti e impedir a destruição de todos. Embora o resumo não faça jus à obra, durante toda a história, a personagem principal se mantém forte de corajosa, mesmo sendo apenas uma humana comum, mas isto não a impede de enfrentar piratas pigmeus, monstros e um gigante demônio de Lava já próximo ao fim do filme. E em momento algum na história, há romance entre os personagens principais, apenas a amizade, e isso é bastante positivo, pois quebra com a ideia citada anteriormente de que a “princesa” deve ficar com alguém.

            De acordo com Mangueneau, ““As “idéias” são apresentadas através de uma maneira de dizer que é também uma maneira de ser, associado a representações e normas de disciplina do corpo. “(MANGUENEAU, 2008) então pode-se dizer que, a ideia que foi expressada no filme, foi dita de uma maneira subliminar, pois não só a personagem será a futura chefe da tribo, mas faz por merecer este título quando se arrisca para poder salvar todos da destruição, e mesmo no momento em que a mesma acredita que falhou em sua missão, é dito para ela pelo espírito de sua avó, que não há problema em fracassar, e que está tudo bem se ela decidir voltar para casa, pois a missão foi um fardo muito pesado para apenas uma garota humana, neste momento, pela primeira vez em um filme da Disney, foi explicitado que na vida, haverá momentos de fracasso, e que você não será menos forte ou valente se decidir voltar para casa. Neste momento a personagem decide continuar sua missão, pois ela mesma percebe que não estava pronta para desistir, isto é um exemplo de que mesmo que a personagem seja uma jovem moça, e que o mundo espera que ela não consiga, ela decide continuar a lutar, e esta é uma mensagem muito forte que foi repassada ao público. Mangueneau afirma que “A partir do momento em que se opera na fronteira do dizível e do indizível, é inevitável que a questão da língua torne-se crucial. A Verdade, a Beleza, o Bem etc. não podem se “encarnar” em qualquer idioma. ” (MANGUENEAU, 2008) porém, a mensagem do filme foi repassada de forma bem-sucedida para mais de 50 países.

            A imagem feminina na obra, foi elevada a um outro nível, algo que veio sendo inserido no universo Disney, porém não tão forte como em Moana. Breder cita Simone de Beavour com os seguintes dizeres:

“Foi pelo trabalho que a mulher cobriu em grande parte a distância que a separava do homem; só o trabalho pode assegurar-lhe uma liberdade concreta. Desde que ela deixa de ser uma parasita, o sistema baseado em sua dependência desmorona” (BEAVOUR apud BREDER, 2013).

            Com estas palavras, fica claro que a proposta do filme foi desassociar a necessidade da mulher de ser dependente do homem, e que a figura feminina pode ser representada de forma forte sem perder sua beleza.

“Ao representar a figura feminina, constrói-se, projeta-se e estabiliza-se a identidade social, em processos definidos histórica e culturalmente. As práticas sociais de representação vigentes de uma certa época se cristalizam em formas textuais. É possível associar as representações às ordens de discurso a que estão genealogicamente relacionadas e, também, a outros discursos que circulam na sociedade. As práticas discursivas, além de sua dimensão constitutiva na construção social da realidade, constituem também ação social. ” (TEIXEIRA, 2009)

            De acordo com Teixeira, na citação acima, não é impossível irromper com os padrões sociais, e pode-se afirmar que o filme teve sucesso em quebrar com os padrões que estavam engessados pela sociedade, sem comprometer o sucesso do mesmo.

“A cultura infantil, em suas diversas manifestações, tem sido pródiga em criar um mundo dividido, no qual há o campo das meninas, onde reinaria uma calmaria absoluta, uma passividade na construção de corpos e condutas vinculados àquilo que Connell (2005) chama de feminilidade almejada; e o campo dos meninos, de lado oposto e antagônico, no qual imperaria a violência, a brutalidade, na busca de atitudes corporais que denotariam o que o autor denomina de masculinidade hegemônica. ” (KNIJNIK, 2009)

            Como afirma Knijnik, a cultura infantil sempre foi segregada, onde o universo feminino era cheio de coisas delicadas e bonitas e o universo masculino era cheio de aventuras, violência e força, porém a obra analisada muda isso de forma bastante natural sem prejudicar a imagem dos personagens principais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

De acordo com Breder, “os filmes de princesa também permitem observar a evolução do papel das mulheres. Da donzela resgatada por um príncipe idealizado à aventureira que não quer se casar. Da dona de casa à dona de seu próprio restaurante. Da moça que vai ao baile até a moça que vai à guerra. “ (BREDER, 2013) e isto fica muito claro quando observamos o discurso demonstrado no filme Moana, pois a quebra do padrão “princesa indefesa” foi definitiva quando a personagem passa por toda a trajetória de forma firme e determinada à cumprir seu objetivo, sem se deixar intimidar pelas adversidades. O discurso de enaltecimento da figura feminina no filme é bem estruturado, sem perder a feminilidade da personagem, e associando força e liderança à imagem da mulher.

            E quando Orlandi afirma que “As palavras falam com outras palavras. Toda palavra é sempre parte de um discurso. E todo discurso se delineia na relação com outros: dizeres presentes e dizeres que se alojam na memória. ” (ORLANDI, 2012) pode-se dizer que é possível que o discurso desenvolvido na obra poderá ficar alojado na memória de uma forma permanente e positiva.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

BREDER, Fernanda Cabanez. Feminismo e príncipes encantados: a representação feminina nos filmes de princesa da Disney. Orientador: Cristiane Costa. Rio de Janeiro, 2013. Monografia de Graduação em Jornalismo. Escola de Comunicação, Universidade Federal do Rio de Janeiro.

FOSSATTI, Carolina Lanner. Cinema de animação e as princesas: Uma análise das categorias de gênero. Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 2009.

KNIJNIK, J. D. Muito além dos estereótipos: teatro, gênero e Direitos Humanos na cultura infantil. Brasília: Presidência da República, Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, 2009.

MAIGUENEAU, Dominique. Cenas de enunciação. São Paulo: Parábola, 2008.

MOANA – Um Mar de Aventuras (Moana). Direção: MUSKER, John; CLEMENTS, Ron. Produção: Osnat Shurer. Estados Unidos: Walt Disney Pictures, 2016. 1 DVD (113 minutos), NTSC, Color.

MATTOS, Mariana Brasil de. “Quando a imagem de quem sou vai se revelar?”: Estrutura social e individualidade nas Princesas da Disney. Revista Habitus: Revista da Graduação em Ciências Sociais do IFCS/UFRJ, Rio de Janeiro, v. 13, n. 2 , p.111-112, 27 de março. 2016. Semestral. Disponível em: <www.habitus.ifcs.ufrj.br>. Acesso em: 04 de junho de 2017.

ORLANDI, Enio Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. São Paulo: Pontes Editores, 2012.

SCHWANTES, C. Dilemas da representação feminina. Vol. 6. Brasília: OPSIS, 2006.

TEIXEIRA, N.C.R.B. Entre o ser e o estar: o feminino no discurso literário. n.25 p.81-102. Guarapuava: UNICENTRO, 2009.

WALT DISNEY. Disponível em:<www.frasesfamosas.com.br/frases-de/walt-disney/>. Acesso em: 04 de junho de 2017.

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