10/05/2006

Amor em sala de aula é questionável?

Por Lilian Burgardt

Especialistas discutem casos amorosos entre professores e alunos.

Nos dias de hoje, alunos que aparecem de mãos dadas na universidade não assustam ou incomodam mais ninguém. É até comum ver casais passeando e trocando carinhos dentro do campus. Meninos e meninas recém-saídos da adolescência que passam a descobrir juntos o quanto ficar com alguém pode ser bom, divertido, e até saudável. Até aí, nenhuma novidade. A coisa muda de figura quando as mãos que se entrelaçam com as do universitário são as mesmas que manejam o giz em sala de aula.

O relacionamento entre alunos e professores, que desde sempre foi um tabu, continua sendo visto com estranheza. Assim, o tema não é delicado apenas para os enamorados em questão, mas também para as instituições, para o corpo docente e para os demais estudantes que dividem o mesmo espaço de ensino. O pivô das discussões continua sendo a ética, colocada em xeque por aqueles que observam de fora o relacionamento amoroso entre mestre e aluno.

Há quem se posicione a favor deste tipo de relacionamento desde que o mesmo seja de livre e espontânea vontade de ambas as partes, caso não haja impedimentos morais ou legais, e mais: desde que o comportamento dos enamorados seja discreto. Outros, porém, defendem que para se manter a ética da profissão é preciso ter um certo distanciamento dos estudantes. Logo, manter um relacionamento amoroso ou não com o aluno acaba sendo um divisor de águas na vida e na carreira do professor. "A situação é bastante delicada. Acredito que as instituições não devam abrir mão deste distanciamento. O docente deve escolher se prefere manter sua carreira ou investir na relação com o aluno, mas uma das situações deve ser abandonada", afirma a professora de Ética Profissional da PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro) Marcylene de Oliveira Capper.

Segundo a psicóloga e coordenadora do Núcleo de Análise Comportamental da UFPR (Universidade Federal do Paraná), Lidia Weber, esta relação tende a ser sempre complexa, porque o professor está em uma posição hierarquicamente superior à do aluno. Além disso, tem muito mais experiência de vida do que o jovem. "É inevitável questionar até que ponto a relação entre ambos decorre de uma questão de assédio, já que o professor está em uma posição superior e, mesmo que inconsciente, pode se valer disso para despertar o desejo do estudante", explica.

A questão é apenas a ponta de um iceberg, uma vez que, desde crianças, a relação entre aluno e professor também tem um lado afetivo muito forte. Os pequeninos já acabam sendo atraídos não somente pelo conhecimento que o mestre passa em sala de aula, mas também pela simpatia que transmite. E se a beleza física for outro atributo, aumentam, e muito, as chances da "paixão" acontecer. Quem não se lembra de ter nutrido um carinho especial por aquela professora de Ciências, Música ou Educação Artística? A verdade é que este interesse também acontece por parte do professor. "Há pesquisas comprovando que os docentes não só dão mais atenção como têm preferência pelos alunos mais bonitos, em todos os níveis escolares", revela.

Isso mostra o quanto as relações são delicadas. Ao passo que você pode estar admirado com a dedicação do aluno e seu empenho em sala de aula, este sentimento pode estar acompanhado por um interesse inconsciente no estudante. O romance terá mais chances de surgir caso haja afinidade entre os indivíduos e, ainda, se uma das partes estiver carente ou fragilizada. Pesquisas revelam que se um indivíduo sozinho e vulnerável passa a conviver com alguém que lhe desperte admiração, há grandes chances de a paixão acontecer. "Estes são fatores determinantes e importantes de serem observados. Às vezes, as pessoas encaram o amor como uma coisa mágica que simplesmente aconteceu, quando, na verdade, era quase óbvio que o andamento da relação pudesse levar a este resultado", afirma a psicóloga.

É claro que isto não é regra, mas se você já se deparou com algumas destas questões, sabe bem do que estamos falando. E deve imaginar que este tipo de sentimento, se correspondido pelo estudante, pode gerar muitos conflitos. Em boa parte dos casos, a conduta do professor é colocada em discussão e os próprios alunos tendem a rejeitar o relacionamento do mestre com o colega. Ainda que o professor tenha um senso ético e moral muito firme, poderá sofrer muito para seguir adiante.

De acordo com a psicóloga, será, por vezes, inevitável se questionar: "E seu eu der nota dez para ela na prova, vão duvidar de minha avaliação?" Ou ainda: "Até que ponto corro o risco de ser perseguido por conta deste relacionamento?" Para enfrentar as dificuldades, o ideal é que ambos estejam preparados para assumir os riscos do romance, embora a carga maior recaia sobre os ombros do professor. "É dele que será cobrada a ética, a responsabilidade, e a discrição sobre o relacionamento, caso o mesmo se torne público."

A ordem é ser discreto

A discrição parece ser a palavra-chave para o sucesso dos relacionamentos entre alunos e professores, mesmo quando não resultem em casamento. Segundo Lidia, uma de suas ex-alunas quando convidada a ministrar aulas como professora substituta em uma universidade também se apaixonou por um aluno. "Ambos, porém, nunca ficavam juntos dentro do campus ou deixavam transparecer a paixão em relação aos demais", conta. Hoje, o relacionamento acabou de forma bastante tranqüila, sem prejudicar o aluno ou a própria professora.

Na opinião da psicóloga, esta preocupação também deve passar pela cabeça do professor no momento de apostar em um romance com seu aluno. É preciso pesar se há maturidade no relacionamento para que, caso termine, nenhuma das partes seja prejudicada. "O professor pode vir a ser o orientador de sua aluna e terá de deixar as questões pessoais fora da sala de aula. Como sempre foi durante o relacionamento. Machucado com o fim do relacionamento, será possível?", indaga. Para ela, apenas se o professor for capaz de superar este revés e se souber agir com tranqüilidade em relação ao ciúme, a insegurança e a outras emoções que tomam força com o término do romance ele deve se envolver. "O relacionamento pode dar errado. E isso tem que ser previsto para evitar mágoas e richas posteriores", conclui.

Esta matéria é a primeira parte do especial namoro entre professores e alunos. Confira, na próxima terça-feira, no perfil Universitário, a visão dos estudantes sobre este tipo de relacionamento.


Eu apostei na redação

Apesar de todos os riscos, medos e tabus, não é difícil encontrar aqueles que apostaram na relação com seus alunos. Na década de 70, então com 26 anos, o atual professor aposentado Levy Barbosa da Silva aventurou-se em um relacionamento com sua aluna Elisabeth, de apenas 19 anos. O romance deu tão certo que acabou em casamento. Hoje, com 63 anos e a esposa, com 57 anos, ele diz ter muito orgulho da história de amor, construída em cima de muito carinho e, sobretudo, discrição.

"Tudo começou com uma troca de olhares. Em pouco tempo percebemos um clima no ar. Embora ela fosse minha aluna, decidi me aproximar", lembra. Na época, alguns professores ficaram sabendo e outros alunos também, mas o casal não sofreu qualquer tipo de retaliação. "Lógico que a situação sempre foi delicada. Mas sempre fomos muito discretos e, por isso, nunca tivemos problemas por parte dos meus colegas de trabalho ou com os colegas de classe dela", afirma. Quando questionado sobre os motivos que o levaram a apaixonar-se pela aluna, Levy diz carinhosamente: "Ela era uma aluna brilhante e também muito bonita. Não ficava em rodinhas com outras meninas, era tímida e muito meiga. Acho que isto foi o que mais me chamou a atenção."

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