23/05/2019

A relação entre redes organizacionais e capital social

A relação entre redes organizacionais e capital social

Antonio Gil da Costa Júnior[1]

Resumo

As relações e estruturas sociais têm sido enfatizadas como importantes fatores para o desenvolvimento local e para a construção de ambientes sustentáveis. Neste contexto destaca-se o capital social caracterizado como as atribuições de uma organização, como a confiança, normas e redes, que facilitam ações coordenadas e melhoram a eficiência da sociedade. Seu papel essencial funciona como um potencializador da capacidade individual e coletiva mediante as práticas colaborativas, e que, a exemplo das outras formas de capital, é igualmente produtivo, viabilizando a realização de objetivos que seriam inalcançáveis sem a sua existência.

Palavras-chave: Redes organizacionais. Capital Social.

1 Introdução

Devido às transformações estratégicas e estruturais decorrentes dos novos padrões de competitividade das organizações, o tema redes organizacionais tem recebido destaque nas produções científicas e acadêmicas em administração.

De forma geral as redes são compostas de atores diversos que interagem entre si de maneira sistemática, compartilhando, em menor ou maior grau, certos valores comuns e implementando, conjuntamente, estratégias de interesse coletivo, visando algum ganho socioeconômico. Elementos de uma rede organizacional como coerência e conectividade, cooperação, interdependência, autonomia, confiança, interatividade, colaboração, objetivos e valores compartilhados, cultura, comunhão, comunicação, associação, articulação, normas e benefícios coletivos, representam também elementos importantes do capital social.

2 Redes Organizacionais

2.1 O conceito de redes

O conceito de rede é complexo e multidimensional, sendo discutido sob diversas perspectivas e por diferentes autores. De forma geral, o termo rede designa uma forma particular de associação, que reúne atores diversos que interagem entre si de maneira sistemática, compartilhando, em menor ou maior grau, certos valores comuns e implementando, conjuntamente, estratégias de interesse coletivo, visando algum ganho socioeconômico - para empresas, setores e comunidades (VALE, AMÂNCIO e LIMA, 2006). Esses atores sociais podem ser indivíduos, grupos de indivíduos, departamentos, organizações ou grupos de organizações.

A despeito de haver uma heterogeneidade conceitual, alguns aspectos são comuns em redes: coerência e conectividade, cooperação, interdependência, autonomia, confiança, interatividade, colaboração, objetivos e valores compartilhados, cultura, comunhão, comunicação, associação, articulação, normas e benefícios coletivos (BALESTRIN E VERSCHOORE, 2008; CAMARINHA-MATTOS e AFSARMANESH, 2004, 2006; CASTELLS, 2000; FUKUYAMA, 2000; MARCON e MOINET, 2001; VALLEJOS, 2005).

Autores como Granovetter (1973) e Powell e Smith-Doerr (1994) introduziram o elemento de laços no estudo de redes. Nesse sentido:

uma rede é composta por um conjunto de relações ou laços entre atores (indivíduos ou organizações). Um laço entre atores tem conteúdo (o tipo de relação) e forma (força e intensidade) da relação. O conteúdo da relação pode incluir informação e fluxo de recursos, conselho ou amizade [...] de fato, qualquer tipo de relação social pode ser definida como um laço. Portanto, organizações estão tipicamente inseridas em redes múltiplas e mesmo sobrepostas (POWELL e SMITH-DOERR, 1994, p. 378).

Assim, os indivíduos ou organizações formam um conjunto de nós ou atores ligados por relações sociais ou laços de tipos específicos. Esse laço ou relação entre dois atores tem força e conteúdo. O conteúdo inclui informação, conselho ou amizade, interesses compartilhados ou pertencimentos, e tipicamente, algum nível de confiança (GRANOVETTER et al. 1998). Para o referido autor, laços mais fracos (indiretos) entre os atores tendem a formar pontes que ligam os indivíduos a outros círculos sociais, e conseqüentemente, as informações lá disponíveis. Informações que podem não estar disponíveis no próprio círculo do indivíduo, que é formado por laços fortes.

A ideia de laços influenciou consideravelmente a teoria das organizações. Na literatura tradicional, as organizações são vistas como entidades autônomas inseridas em um ambiente específico. Essa abordagem gerou diversos estudos desde a teoria clássica da administração até as pesquisas em estratégia empresarial, onde a interdependência competitiva passou a ser considerada e deveria ser incorporada ao posicionamento estratégico da empresa. Nesse contexto existe uma ênfase na capacidade interna das organizações ante as demandas do ambiente. Essa abordagem difere das propostas mais recentes, condizentes com um novo ambiente em que as organizações buscam ativamente uma crescente inserção em redes, e seus desempenhos são mais bem entendidos e avaliados no contexto de uma rede de relações.

Salanick (1995) em seus estudos na busca de uma teoria das redes no contexto organizacional, pondera que “a análise de redes corrige uma tendência na teoria das organizações de se preocupar com as árvores ao invés da floresta” (p. 12). No entanto, este autor salienta que essa mudança de perspectiva acarreta riscos, ao considerar como um dado da realidade a presença de interações entre os atores, sem buscar uma melhor compreensão de como ela é gerada ou qual a sua natureza. Desta forma, para Vale, Amâncio e Lima (2006) seria necessário o desenvolvimento de uma abordagem capaz de captar a evolução da lógica da árvore para o complexo da floresta. Para muitos autores o desenvolvimento dessa abordagem passa pelo estudo do capital social, que será discutido posteriormente neste artigo.

2.2 Tipologia de redes

            Não existe uma tipologia comum e padrão para redes organizacionais. Pesquisas em estratégia empresarial utilizam classificações como simétricas e assimétricas (Grondori e Soda, 1995); top-down e flexíveis (Casarotto e Pires, 1998); estrutura modular, virtual e livre (Wood Jr. e Zuffo, 1998); estratégica, linear e dinâmica (Corrêa, 1999); Cluster (Porter, 1998); virtual, institucional e funcional (Bremer, 1996); etc. (a propósito desse assunto, ver Olave e Neto, 2005). O quadro 1 abaixo procura resumir a tipologia tradicional de redes organizacionais.

Autor

Tipologia

Grandori e Soda (1995)

Redes sociais: simétricas e assimétricas

Redes burocráticas: simétricas e assimétricas

Redes proprietárias: simétricas e assimétricas

Casarotto e Pires (1998)

Redes top-down: subcontratação, terceirização, parcerias

Redes flexíveis: consórcios

Wood Jr. e Zuffo (1998)

Estrutura modular: cadeia de valor e terceirização das atividades de suporte

Estrutura Virtual: liga temporariamente rede de fornecedores

Estrutura livre: de barreiras, define funções, papéis, tarefas

Corrêa (1999) e Verri (2000)

Rede estratégica: desenvolve-se a partir de uma empresa que controla todas as atividades

Rede Linear: cadeia de valor (participação são elos)

Rede dinâmica: relacionamento intenso e variável das empresas entre si

Porter (1998)

Cluster: concentração setorial e geográfica de empresas. Caracterizado pelo ganho de eficiência coletiva.

Bremer (1996) e Goldman et al. (1995)

Empresa virtual: pontos de vista institucional e funcional

Institucional: combinação das melhores competências essenciais de empresas legalmente independentes

Funcional: concentração em competências essenciais coordenadas através de uma base de tecnologia de informação

Quadro 1 – Tipologia das redes organizacionais

Fonte: Olave e Neto, 2005

            Basicamente estas conceituações de tipos de redes procuram defini-la como um conjunto de organizações ou de indivíduos engajados, reciprocamente, em transações recorrentes, reguladas segundo uma lógica de coordenação que extrapola o caráter estrito seja do mercado, seja da hierarquia.

Outra nomenclatura, denominada rede de cooperação, é utilizada para abordar o tema redes no contexto organizacional. Para Balestrin e Verschoore (2008, p. 79), as redes de cooperação são definidas como “organizações compostas por um grupo de empresas formalmente relacionadas, com objetivos comuns, prazo de existência ilimitado e escopo múltiplo de atuação”. Os mesmos autores descrevem que o propósito central destas estruturas é reunir atributos que permitem uma adaptação ao ambiente competitivo dentro de uma estrutura dinâmica sustentada por ações uniformizadas, mas descentralizadas, e que possibilitem ganhos de escala com a união, mas não deixem as organizações envolvidas perderem a flexibilidade (FACCIN, GENARI e DORION, 2009).

O que garante essa coesão em um grupo social é a colaboração, que conforme Camarinha-Matos e Afsarmanesh (2006), trata-se de um processo em que entidades compartilham informações, recursos e responsabilidades para planejar conjuntamente, implementar e avaliar um programa de atividades a fim de atingir um objetivo comum. Pode ser visto como um processo de criação compartilhada, onde cada um reforça as capacidades dos outros.

A colaboração implica em partilhar os riscos, recursos, responsabilidades e recompensas, dando a impressão para os observadores externos de que aquele grupo possui uma identidade comum. Além disso, envolve engajamento mútuo dos participantes para solucionar um problema em conjunto, o que implica a confiança mútua e, portanto, leva tempo, esforço e dedicação (CAMARINHA-MATOS e AFSARMANESH, 2006).

            Nesse sentido, à medida que uma organização avança em direção a uma maior interação com outras, ela também amplia sua participação em novas redes ou em redes mais abrangentes e ampliando também o estoque de capital social do território onde elas se localizam, o que repercute no próprio processo de desenvolvimento local.

3 Capital social

3.1 O conceito de capital social

Capital Social se tornou um conceito recorrente nas ciências sociais, abrangendo áreas vitais de pesquisa na administração (Adler e Kwon, 2002; Anderson e Miller, 2002), economia (Dasgupta, 2000; Sobel, 2002), ciências políticas (Woolcock, 1998; Fukuyama, 2001) e sociologia (Coleman, 1990; Portes, 1998). Destacam-se também os estudos em desenvolvimento de comunidades (Falk e Kilpatrick, 2000; DeFillippis, 2001), pesquisas quantitativas (Narayan e Pritchett, 2000; RIGO e Oliveira, 2008) e estudos de caso históricos (Svendsen e Svendsen, 2000; Baldi e Vieira, 2006).

            Para Vale, Amâncio e Lima (2006) o estoque de capital social existente, ou seja, o conjunto de valores comuns compartilhados, fundamental para o surgimento de empreendimentos sociais baseados na cooperação vem sendo considerado essencial para a geração de riqueza e a consolidação do desenvolvimento, ao lado de capital físico (recursos naturais e equipamentos produtivos) e de capital humano (habilidades e conhecimentos adquiridos).

A definição de capital social é historicamente referida a “participação comunitária” (Hanifan, 1916) ou mais recentemente como “engajamento do cidadão” ou simplesmente “civismo” (Putnam, Leonardi e Nanetti, 1993), descrito como “as características da rede social, normas, confiança, solidariedade e reciprocidade que influencia seus participantes a agirem em conjunto de forma mais eficiente em busca de objetivos coletivos” (PUTNAM, 2000; RIGO E OLIVEIRA, 2008).

Os estudos sobre capital social ganharam grande impulso com a publicação dos trabalhos de Putnam (1993) que identifica, no que então designou por capital social, o elemento fundamental que permitiu um padrão de desenvolvimento superior no norte da Itália (onde prosperavam as relações sociais baseadas em confiança mútua e compartilhamento), em relação ao sul (onde imperavam relações mais hierarquizadas e rígidas). Para o referido autor (1993, p. 25), “as regras de reciprocidade e os sistemas de participação coletiva corporificaram-se, no norte, em confrarias, guildas, sociedades de assistência mútua, cooperativas, sindicatos”. Esses vínculos cívicos horizontais proporcionavam níveis de desempenho econômico e institucional muito mais elevados do que no sul, onde as relações políticas e sociais estruturavam-se verticalmente. O capital social manifesta-se por meio das redes sociais e das normas de confiança que facilitam a coordenação e a cooperação, tornando possível a ação coletiva, de natureza voluntária, para benefício mútuo, no interior dos grupos e das organizações (VALE, AMÂNCIO e LIMA, 2006).

Pode-se destacar a literatura sobre capital social em duas vertentes teóricas. A primeira vertente descreve o capital social acumulado por um determinado indivíduo, sendo que este pode obter vantagem em determinado grupo, relacionando assim o capital social com a questão de poder, como pode ser observado no quadro 2.

Referência

Conceito

Baker (1999) apud Adler e Kwon (2002, p. 20)

Capital social é “um recurso de agentes derivado de estruturas sociais específicas e então usado em função de seus interesses; ele é criado pelas mudanças nas relações entre os agentes”.

Bourdieu (2001, p. 134)

O autor afirma que “o capital representa um poder sobre um campo (num dado momento) e, mais precisamente, sobre o produto acumulado do trabalho passado (...)”. Também destaca que “as espécies de capital, à maneira dos trunfos num jogo, são os poderes que definem as probabilidades de ganho num campo determinado (...)”. Bourdieu define a posição de um determinado agente no espaço social “pela posição que ele ocupa nos diferentes campos, quer dizer, na distribuição de poderes que atuam em cada um deles, seja, sobretudo, o capital econômico – nas suas diferentes espécies - o capital cultural e o capital social e também o capital simbólico, geralmente chamado prestígio, reputação, fama (...)”.

Burt (2000)

Ao apresentar seu estudo sobre a estrutura de rede do capital social como uma metáfora, o autor afirma que a interligação entre pessoas ou grupo de pessoas, baseada em relações de confiança e troca, proporciona vantagens em termos de retornos mais elevados dos esforços

para os envolvidos neste processo.

Granovetter (1985)

Embora não utilize, especificamente, o termo capital social, este autor destaca em seu estudo a importância das redes de relacionamentos (redes sociais), ligadas a elementos como confiança e cooperação, que constituem elementos do capital social.

Lin (2001, p. 12)

Capital social pode ser definido como “os recursos incorporados em uma estrutura social que são acessados e mobilizados em ações intencionais”. De acordo com o autor, este tipo de capital é composto por três elementos: recursos embutidos na estrutura social, acessibilidade aos recursos sociais por indivíduos ou mobilização e utilização desses recursos sociais pelos indivíduos por meio de ações intencionais.

Nahapiet e Ghoshal (1998, p. 243)

“Capital social é a soma dos recursos reais e potenciais envolvidos, avaliados e derivados das redes de relacionamento tidas por um indivíduo ou unidade social”.

Portes (1998, p. 6)

O autor afirma que embora existam diferentes entendimentos sobre o tema, há um consenso crescente de que o capital social “representa a capacidade dos agentes para garantir benefícios por força da adesão em redes sociais ou outras estruturas sociais”.

Silva (2006, p. 352)

Baseado na visão de Bourdieu (1980), o autor diz que “o capital social pode ser definido como um conjunto de relações e redes sociais que um agente - um indivíduo - possui e todos os recursos que ela/ele pode reunir no mercado local utilizando tais relacionamentos”.

Quadro 2 – Conceitos de capital social como “bem individual”

Fonte: Faccin, Genari e Dorion, 2009

Já a segunda vertente que versa sobre capital social o analisa como um elemento pertencente a grupo, comunidade ou sociedade, visto como um bem público, encontrado nas relações entre pessoas ou grupos (MACKE, 2007). O quadro 3 resume a ideia dos principais autores dessa corrente.

Referência

Conceito

Adler e Kwon (2002, p. 18)

Ao contextualizar o capital social nas estruturas sociais, os autores afirmam que o mesmo “é o recurso à disposição dos agentes em função da localização dos mesmos na estrutura de suas relações sociais”.

Coleman (1988, p. 118 - 119) e (1990, p. 302)

Capital social estudado em paralelo com o capital financeiro, físico e humano, sendo identificado em três formas: obrigações e expectativas, que dependem da confiabilidade do ambiente social, capacidade de fluxo de informação da estrutura social e normas acompanhadas por sanções.

“Características da organização social, tais como confiança, normas e redes que podem melhorar a eficiência da sociedade, por facilitarem ações coordenadas.”

Durston (2001, p. 2)

“Capital social é o conteúdo de certas relações e estruturas sociais, aquelas caracterizadas por atitudes de confiança e comportamentos de reciprocidade e cooperação”.

Fukuyama (2000, p. 28)

Ao abordar o capital social com enfoque no desenvolvimento de países, afirma que o mesmo pode ser definido como “um conjunto de valores ou normas informais, comuns aos membros de um grupo que permitem a cooperação entre eles”. Estas normas devem incluir virtudes como honestidade, cumprimento de obrigações e reciprocidade.

Harpham (2002, p. 106)

“Capital social refere-se ao grau de ligação e a qualidade e a quantidade das relações sociais em determinada população”.

Milani (2003, p. 28)

“Somatório de recursos inscritos nos modos de organização cultural e política da vida social de uma população”. Para o autor, o capital social é um bem coletivo que garante o respeito de normas de confiança mútua e de compromisso cívico, diretamente ligado às associações horizontais entre pessoas, redes verticais entre pessoas e organizações, ao ambiente social e político em que se situa a estrutura social e ao processo de construção e legitimação do conhecimento social.

Nooteboom  (2007)

O autor propõe uma definição de capital social com foco na contribuição para a consecução das metas de agentes com base nas relações. Neste caso, os agentes são definidos como indivíduos, grupos, bem como empresas e outros tipos de organização.

Conclui que, considerando o capital de forma mais generalizada, o capital social requer investimentos para sua construção.

Putnam (2000, p. 177)

“Características da organização social, como confiança, normas e sistemas, que contribuam para aumentar a eficiência da sociedade, facilitando as ações coordenadas”.

Quadro 3 – Conceitos de capital social como um “bem público”

Fonte: Faccin, Genari e Dorion, 2009

No enfoque de capital social como um bem público, Coleman (1988) afirma que o mesmo é definido pela sua função, não se apresentando como uma entidade única, mas diversas entidades distintas, com dois elementos em comum: consistir em alguns aspectos das estruturas sociais e facilitar certas ações dos agentes dentro destas estruturas. Concluindo, o autor afirma que “o capital social é produtivo, possibilitando a obtenção de determinados objetivos que na sua ausência não seria possível” (COLEMAN, 1988, p. 98).

Além destas vertentes, o capital social pode ser estudado sob o enfoque de duas unidades de análise distintas quanto ao contexto das relações. A primeira unidade está ligada às redes de relacionamento dentro de um grupo (relações intra-grupos) e neste caso o capital social é estudado no contexto de comunidades, associações ou grupos em geral. Já quando o estudo ocorre em redes de empresas, nações, APLs e outras formas organizativas, pode-se destacar o estudo do capital social nas redes de relacionamento entre grupos (inter-grupos) (MACKE, 2007).

3.1 Capital Social e desenvolvimento

            Como explica Higgins (2005), um dos fatos mais demonstrativos do interesse crescente no capital social, enquanto fator de desenvolvimento, é o projeto do Banco Mundial denominado “The initiative on defining, monitoring and mesuring social capital (The World Bank, 1998)”. Em parceria com o governo da Dinamarca, foi formada uma equipe especial de funcionários e consultores externos. A proposta de trabalho faz parte de um movimento, no interior do Banco Mundial, que procura implementar um novo paradigma que “integre fatores sociais, culturais, econômicos e institucionais”. Institucionalmente, o Banco Mundial diz estar interessado em incorporar as considerações sobre capital social dentro de seu projeto de empréstimos e consultoria em políticas públicas. A equipe de trabalho da “Iniciativa Capital Social” identifica três objetivos gerais e cinco específicos com os quais poderia comprometer-se o Banco:

Objetivos gerais:

            -avaliar o impacto de iniciativas que fortalecem o capital social dentro de projetos específicos;

            -demonstrar que a assistência externa pode ajudar nos processos de formação de capital social;

            -contribuir para desenvolver indicadores que monitorem o capital social e metodologias para medir seu impacto no desenvolvimento.

            Objetivos específicos:

            -desenvolver ferramentas conceituais para compreender melhor a natureza das instituições, nos países clientes do Banco, o mesmo que o papel que estas desempenham no desenvolvimento social e econômico;

            -trabalhar com o capital social existente, em especial associações e organizações comunitárias, para desenhar e executar projetos. Isso tem a potencialidade de: (a) melhorar o cumprimento de objetivos nas populações beneficiárias; (b) reduzir os custos do projeto; (c) melhorar a sustentabilidade; e (d) fortalecer a sociedade civil através dessas organizações;

            -melhorar o entorno institucional para o desenvolvimento. Incentivar a interação entre sociedade civil e governos, potencializar as liberdades civis, os mecanismos de transparência governamental, e fortalecer acordos e instituições econômicas;

            -investir diretamente em capital social. Isso pode ser feito através de treinamento e capacitação de organizações locais com aporte financeiro direto;

            -encaminhar pesquisas ulteriores sobre as conseqüências distributivas e de crescimento que se podem gerar pelo fortalecimento do capital social, o mesmo que desenvolver estratégias de trabalho com organizações da sociedade civil.

            O caso do Banco Mundial mostra as novas, e ainda tímidas, tendências da ciência econômica e administrativa por se aproximar dos fatos sociais, numa tentativa de se afastar do paradigma neoclássico comandado pelos preços e os mercados (HIGGINS, 2005).

            Essa relação capital social e desenvolvimento, juntamente com o interesse do Banco Mundial, se explicam pela teoria das redes principalmente na questão dos clusters e APLs – Arranjos Produtivos Locais; assim como nas cooperativas, associações e organizações do terceiro setor.

4 Redes organizacionais e capital social: convergência de conceitos

Considerando a definição de capital social como sendo “as características da rede social, normas, confiança, solidariedade e reciprocidade que influencia seus participantes a agirem em conjunto de forma mais eficiente em busca de objetivos coletivos” (PUTNAM, 2000; RIGO E OLIVEIRA, 2008), torna-se possível relacioná-lo com o contexto de redes organizacionais, uma vez que o mesmo facilita o empreendimento de ações colaborativas complexas.

As pesquisas sobre capital social nas organizações vêm aumentando nos últimos anos, enfocando as mais diversas áreas: empregabilidade e evolução profissional, intercâmbio de recursos e promoção à inovação, criação de capital intelectual, desenvolvimento de equipes, redução dos índices de rotatividade nas empresas, aprendizagem organizacional, entre outros (ADLER e KWON, 2002). Logo, pode-se verificar a relação do tema com o ambiente interno e externo às organizações (FACCIN, GENARI e DORION, 2009).

O capital social, focado no ambiente externo às organizações, pode estar vinculado, conforme Marti (2004), a algumas relações que empresas mantêm no sentido de criar vantagens competitivas não apenas com base nas suas próprias competências, mas também competências de outras organizações ou instituições localizadas em um mesmo cluster, por exemplo. Simplificando, o autor afirma que, neste sentido, o capital social é considerado a soma dos recursos e capacidades que pertencem a uma rede de organizações, no qual as empresas têm o objetivo de competir com sucesso.

Reforçando esta idéia, Balestrin e Verschoore (2008, p. 124) dizem que o empreendimento de ações colaborativas complexas entre empresas se torna possível através do capital social, uma vez que “a formação de uma rede de cooperação será influenciada pelo grau com que as pessoas de uma comunidade empresarial compartilham normas e valores e são capazes de subordinar os interesses individuais aos coletivos”.

Neste sentido, o capital social, torna-se um recurso importante, funcionando como um potencializador da capacidade individual e coletiva mediante as práticas colaborativas, e que, a exemplo das outras formas de capital, é igualmente produtivo, viabilizando a realização de objetivos que seriam inalcançáveis sem a sua existência, constituindo-se num bem público (PUTNAM, 2000) e igualmente acessível a qualquer pessoa (MACKE, 2007).

Uma decisão de participação num acordo de cooperação está revestida de uma interação social. Assim, se as interações entre os agentes são o elemento chave de um mecanismo de colaboração, as características que estão presentes na interação (capital social) serão cruciais para o sucesso do projeto. Seja qual for a duração e os objetivos do negócio, um bom parceiro se tornou um dos principais ativos empresariais, ou seja, uma vantagem da sociedade colaborativa (KANTER, 1994). Para tanto, atribui-se o sucesso das alianças, como sendo função da qualidade e quantidade do relacionamento entre os parceiros.

As empresas organizadas em rede possuem maior número de alianças e assim, tornam-se mais capazes de permanecer competitivas e introduzir complexo repertório de ações competitivas (ANDREVSKI et al., 2007). O estoque de capital social de uma rede facilita o acesso de empresas e de indivíduos a oportunidades e a iniciativas de ação colaborativa.

7 Considerações Finais

A abordagem do tema redes, no contexto organizacional, vem se destacando na academia nos últimos anos, uma vez que a mesma permite a adequação de organizações a um ambiente cada vez mais competitivo, além de proporcionar vantagens e flexibilidade às organizações envolvidas.

Concomitantemente, as relações e estruturas sociais têm sido enfatizadas como importantes fatores para o desenvolvimento local e para a construção de ambientes sustentáveis. Neste contexto, pode-se destacar o capital social, sendo que o mesmo é caracterizado como as atribuições de uma organização, como a confiança, normas e redes, que facilitam ações coordenadas e melhoram a eficiência da sociedade.

Neste sentido, o capital social, torna-se um recurso importante, funcionando como um potencializador da capacidade individual e coletiva mediante as práticas colaborativas, e que, a exemplo das outras formas de capital, é igualmente produtivo, viabilizando a realização de objetivos que seriam inalcançáveis sem a sua existência, constituindo-se num bem público (PUTNAM, 2000) e igualmente acessível a qualquer pessoa (MACKE, 2007).

As empresas organizadas em rede possuem maior número de alianças e assim, tornam-se mais capazes de permanecer competitivas e introduzir complexo repertório de ações competitivas (ANDREVSKI et al., 2007). O estoque de capital social de uma rede facilita o acesso de empresas e de indivíduos a oportunidades e a iniciativas de ação colaborativa.

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[1] Mestre em Engenharia de Produção pela Universidade Federal de Itajubá (UNIFEI). Professor das Faculdades Integradas de Cacoal (UNESC).

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