06/06/2022

A Lei 11.645/08 e a educação brasileira na contemporaneidade

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João Paulo Santos Neves Mendonça*

*Mestre em Ciências da Educação pela Universidad Columbia del Paraguay. Licenciado em Química e Pedagogia. Servidor da Secretaria de Estado da Educação de Mato Grosso. Professor Titular da Universidade de Cuiabá - Primavera do Leste.

Letícia Lopes Mendonça Neves**

**Graduada em Pedagodia. Servidora da Secretaria Municipal de Educação de Primavera do Leste-MT.

      Ante a polêmica sobre a discussão racial no ambiente escolar, foi sancionada, em janeiro de 2003, a Lei 10.639/03, posteriormente complementada pela Lei 11.645/08, tornando obrigatório o Ensino de História e Cultura Afro-brasileira e Indígena nos estabelecimentos de ensino fundamental e médio de todo o país, sejam eles públicos ou privados.

      Com a aprovação da Lei 10.639/03 e, pressionados por entidades negras e setores da universidade comprometidos com a discussão étnico-racial, os educadores viram-se diante de uma demanda para a qual não estavam preparados, além de submetidos a uma exigência de qualificação (PEREIRA s.d.).

      Segundo Pereira (s.d.) partindo daí,

                                                                  (...) iniciam-se algumas modificações no interior dos cursos superiores de formação

                                                                   de professores, nas licenciaturas e nos cursos de especialização, inserindo as                                                                               disciplinas de História da África, Temas da África, HIstória dos Afrodescendentes nas                                                                     Américas, História do Negro no Brasil e da Cultura Africana, Cultura Brasileira,                                                                                Tópicos da Cultura Brasileira e Africana, enfim, inúmeras nomenclaturas para                                                                                  abordar os conhecimentos necessários à qualificação dos professores quanto aos                                                                           conteúdos sugeridos por lei (PEREIRA, s.d. p. 13).

      No entanto, Cidre e Martins (s.d.) afirmam que as experiências de sala de aula e o convívio com os colegas educadores da mesma área e de outras afins, mostram que na prática nada ou quase nada mudou. Quando a obrigatoriedade da Lei exigiu o ensino sobre História e Cultura Afro-Brasileira, uma das primeiras objeções que se fez por parte dos educadores é de que estes conteúdos já eram trabalhados e de que se mais não se ensinava é porque lhes faltavam subsídios, literatura e formação para tal (CIDRE; MARTINS, s.d.).

      Nos dias atuais tem-se como parte da Constituição a defesa da cultura negra e o combate ao racismo e, para por em prática a Lei 11.645/08 e a Política Nacional de Promoção à Igualdade Racial, foi elaborado o Plano Nacional de Promoção à Igualdade Racial, com o objetivo de "promover a redução das desigualdades sociais por meio do desenvolvimento sustentável, com distribuição de renda, educação de qualidade e foco nos grupos raciais discriminados" (BRASIL, 2009).

      No âmbito da educação, o plano busca,

                                                                  (...) promover o acesso, a permanência e o sucesso das populações negras,                                                                                    quilombolas, indígenas, ciganas e demais grupos discriminados à educação.                                                                                 (...) Promover políticas públicas para reduzir a evasão escolar e o analfabetismo.                                                                           (...) Estimular a adoção do sistema de reserva de vagas para negros e indígenas no                                                                        ingresso às universidades públicas.                                                                                                                                                    (...) Promover a formação de professores e profissionais da educação para a                                                                                   Educação das Relações Étnico-Raciais e para o Ensino de História e                                                                                               Cultura Afro-Brasileira e Africana (BRASIL, 2009).

            Percebe-se então a necessidade de formação dos professores no âmbito da educação das relações étnico-raciais, para que possam intervir de forma positiva diante de atos de preconceito e discriminação racial.

      Lima e Santos (s.d.) levantam uma discussão sobre a atividade docente diante das determinações legais trazidas pela Lei Federal 10.639/03 com professores de anos iniciais do ensino fundamental na cidade de Curitiba e detectaram a existência de iniciativas de formação de professores para o atendimento à lei.

      Pereira (s.d.) chama a atenção para um curso de graduação diferenciado, no qual foi ministrada a disciplina de "Educação e Diversidade", direcionado aos professores da rede municipal de uma cidade do interior de Goiás, através de um convênio com a prefeitura local.

      Entretanto, alguns professores apontam para falta de material didático que aborde a temática e que esteja comprometido com a transformação social embasada no abandono de visões estigmatizadas e preconceituosas construídas ao longo da história quanto às populações africanas e afro-brasileiras, como material de apoio para educadores (LIMA; SANTOS, s.d.). Para tanto, diversos "kits" foram enviados às escolas públicas, compostos tanto de referenciais teóricos para professores quanto por materiais didáticos para o trabalho em sala de aula. No entanto, apesar da presença destes kits, nem sempre eles são acessíveis ao professor, seja pelas dificuldades da própria infraestrutura da escola, jornadas duplas ou triplas de trabalho que impedem um planejamento mais cuidadoso, como dificuldades de acesso impostas pela própria escola.

      Louzada e Ulhoa (s.d.), constataram que a maioria dos professores das escolas públicas desconhecem uma maneira efetiva de aplicar e materializar po que está disposto nas Leis em discussão. O autor ressalta que apesar de fazer parte do Projeto Político Pedagógico das escolas, as atividades escolares contemplam discussões apenas acerca da problemática étnico-racial, reduzindo em momentos de apresentação e muitas vezes estereotipando ainda mais estes povos, traduzindo suas culturas e costumes em meras caricaturas reproduzidas em um contexto pontual na dinâmica escolar.

      O esforço para se efetivar o ensino de História e Cultura Afro-Brasileira e Indígena perpassa pela formação continuada dos professores e professoras, bem como pelo comprometimento do Estado/Nação em efetivar ações que imprimam novos olhares acerca das relações étnico-raciais (MELO, 2010). Segundo o autor, é necessário compreender o que ocorre na escola em que há presença de alunos e alunas negras, e investigar de que forma os conteúdos pertinentes à história e cultura afro-brasileira se articulam no ambiente escolar. Para ele, o caminho estende-se desde a percepção da sua importância no contexto histórico brasileiro ao estudo aprofundado da História e Cultura Afro-Brasileira e Africana e Indígena, até as possibilidades de se trabalhar esses conteúdos no currículo escolar.

 

REFERÊNCIAS

BRASIL. Secretaria Especial de Políticas de Promoção da Igualdade Racial. Plano Nacional de Promoção da Igualdade Racial. Brasília, 2009.

CIDRE, Janete Heppner; MARTINS, Mário de Souza. Racismo em Sala de Aula: Mudanças, Permanências e Resistências. Programa de Desenvolvimento Educacional - PDE - da Secretaria Estadual de Educação do Estado do Paraná.

LOUZADA, Natália do Carmo; ULHOA, Clarice Adjunto. Apontamentos Preliminares sobre a Implementação da Lei 10.639/03 em Escolas Públicas da Cidade de Goiânia, s.d.

MELO, André Magri Ribeiro de. Aplicação da Lei 11.645/08 e as Matrizes Curriculares de Literatura e Cultura Afro-Brasileira na Educação Tecnológica. s.d.

PEREIRA, Maria Cunha. Educação e Diversidade: preconceitos e dificuldades na implementação da Lei 10.639/03 junto aos professores das redes municipais de ensino no Brasil. s.d.

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