27/05/2025

A IMPORTÂNCIA DA ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA PARA A SAÚDE PÚBLICA DA POPULAÇÃO

A IMPORTÂNCIA DA ALFABETIZAÇÃO CIENTÍFICA PARA A SAÚDE PÚBLICA DA POPULAÇÃO

Peterson Ayres Cabelleira
Doutor em Educação em Ciências: Química da Vida e Saúde pela Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA).
São Borja, Rio Grande do Sul, Brasil.
E-mail: petersoncabelleira@hotmail.com

Resumo
Este artigo discute a importância da alfabetização científica como fator estratégico para o fortalecimento da saúde pública. A partir de uma abordagem interdisciplinar, analisa-se como o acesso ao conhecimento científico contribui para a tomada de decisões conscientes, o enfrentamento de crises sanitárias e a construção de uma cidadania ativa. A reflexão fundamenta-se em aportes teóricos da educação em ciências, saúde coletiva e políticas públicas, demonstrando que a alfabetização científica não apenas amplia a compreensão de fenômenos biológicos e sociais, mas também é fundamental para a promoção da equidade em saúde.

Palavras-chave: alfabetização científica; saúde pública; cidadania; educação em ciências; políticas públicas.

1. Introdução

A relação entre ciência, saúde e sociedade tornou-se ainda mais evidente em tempos de crise sanitária global, como a pandemia de COVID-19. A circulação de informações falsas, o negacionismo científico e a desinformação sobre vacinas, medidas preventivas e tratamentos escancararam a urgência de uma população cientificamente alfabetizada. Nesse contexto, a alfabetização científica emerge como um elemento essencial para a promoção da saúde pública, permitindo que indivíduos compreendam conceitos científicos, interpretem dados e tomem decisões embasadas que impactam tanto sua saúde quanto a do coletivo.

2. Alfabetização científica: fundamentos e dimensões

O conceito de alfabetização científica transcende a simples aquisição de conhecimentos conceituais da ciência. De acordo com Hodson (2003), trata-se da capacidade de compreender o funcionamento da ciência, seus métodos, limites, bem como suas implicações sociais, éticas e políticas. Para Santos e Mortimer (2001), a alfabetização científica deve ser compreendida como uma prática educativa que visa à formação de cidadãos críticos e participativos.

Segundo Sasseron e Carvalho (2008), a alfabetização científica compreende três dimensões complementares: a conceitual, que envolve a aprendizagem de conteúdos científicos; a procedimental, relacionada à compreensão de como o conhecimento é produzido; e a atitudinal, ligada ao desenvolvimento de valores, atitudes e disposições críticas diante das questões sociocientíficas. Essas dimensões, articuladas no contexto da saúde pública, possibilitam o empoderamento dos sujeitos frente às informações e às práticas de cuidado de si e do outro.

3. Alfabetização científica e saúde pública: interfaces e desafios

A saúde pública, entendida como o conjunto de ações voltadas à promoção, prevenção e recuperação da saúde coletiva (BRASIL, 2006), depende intrinsecamente da capacidade da população em compreender e agir sobre os determinantes sociais da saúde. Nesse sentido, a alfabetização científica é um eixo articulador entre educação e saúde, pois favorece a leitura crítica dos fatores que influenciam a qualidade de vida, como saneamento, alimentação, vacinação, meio ambiente e desigualdades sociais.

Diversos estudos demonstram que populações com baixos níveis de alfabetização científica apresentam maior vulnerabilidade a desinformações e são menos propensas a adotar comportamentos preventivos (FAPERJ, 2021; SANTOS et al., 2020). O acesso à informação de qualidade, contudo, não é suficiente se a população não dispõe de repertório para compreendê-la e analisá-la criticamente. É nesse ponto que se evidencia o papel das instituições educativas e dos meios de comunicação, que devem atuar na formação continuada de sujeitos aptos a compreender e avaliar discursos científicos em contextos cotidianos.

Além disso, a alfabetização científica contribui diretamente para a equidade em saúde, pois permite que grupos historicamente marginalizados tenham mais autonomia e poder de decisão em relação ao próprio corpo, aos serviços de saúde e às políticas públicas. Nesse aspecto, iniciativas como a educação popular em saúde (VASCONCELOS, 2013) e as campanhas educativas de base comunitária revelam-se estratégias fundamentais para tornar o conhecimento científico acessível e culturalmente relevante.

4. Ações integradas para promoção da alfabetização científica em saúde

Para que a alfabetização científica efetivamente contribua para a saúde pública, é necessário que políticas intersetoriais de educação e saúde caminhem juntas. A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), ao estabelecer competências gerais como o pensamento científico, crítico e criativo (BRASIL, 2017), oferece uma base normativa para integrar saúde e ciência nos currículos escolares. No entanto, é preciso que tais diretrizes se traduzam em práticas pedagógicas concretas, contextualizadas e dialógicas.

Programas como o “Saúde na Escola”, as feiras de ciências com temas de saúde, e os projetos interdisciplinares com enfoque CTS (Ciência-Tecnologia-Sociedade), são exemplos de estratégias que aproximam os estudantes de situações-problema reais e fomentam a articulação entre saberes científicos e cotidianos. A formação de professores também se revela uma dimensão estratégica: docentes comprometidos com a construção de uma cultura científica crítica são agentes fundamentais para a consolidação da saúde como direito social.

5. Considerações finais

A alfabetização científica é uma condição essencial para o fortalecimento da saúde pública e da cidadania. Ao possibilitar a apropriação crítica do conhecimento científico e a sua aplicação em situações do cotidiano, ela contribui para práticas de cuidado mais conscientes, para a valorização das evidências científicas e para o combate às desigualdades em saúde. Assim, defender políticas públicas e práticas pedagógicas que promovam a alfabetização científica é também lutar por justiça social, democracia e bem-estar coletivo.

Referências

BRASIL. Ministério da Saúde. Política Nacional de Promoção da Saúde. Brasília: Ministério da Saúde, 2006.

BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: https://basenacionalcomum.mec.gov.br. Acesso em: 27 maio 2025.

FAPERJ. Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro. População com baixo letramento científico está mais vulnerável às fake news, 2021. Disponível em: https://www.faperj.br. Acesso em: 27 maio 2025.

HODSON, D. Enseñanza de las ciencias y cambio educativo. Madrid: Morata, 2003.

SANTOS, W. L. P.; MORTIMER, E. F. Alfabetização científica no ensino de ciências: elementos para uma política pública educacional. Ciência & Educação, Bauru, v. 7, n. 2, p. 125-136, 2001.

SANTOS, G. B. dos; OLIVEIRA, R. A.; LOPES, R. R. Alfabetização científica e a pandemia: desafios para a educação básica. Revista Brasileira de Educação Básica, n. 13, p. 1-20, 2020.

SASSERON, L. H.; CARVALHO, A. M. P. Alfabetização científica no ensino fundamental: estruturas e dimensões para um ensino por investigação. Investigações em Ensino de Ciências, v. 13, n. 2, p. 333-352, 2008.

VASCONCELOS, E. M. Educação Popular em Saúde: construindo redes e ampliando a participação social. São Paulo: Hucitec, 2013.

 

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