11/09/2018

A ética ambiental: Um pensar sobre o mundo e sua sustentabilidade

 

Manoel José Fonseca Rocha[1]

Escola Técnica do Vale do Itajaí/ Universidade Regional de Blumenau- FURB

manoel@furb.br

Manoela Graff Rocha[2]

Universidade Regional de Blumenau-FURB

manoelar@gmail.com

 

A ética ambiental:

Um pensar sobre o mundo e sua sustentabilidade

Onde a chuva caía quase todo dia

Já não chove nada

O sol abrasador rachando o leito dos rios secos

Sem um pingo d'água

Quanto ao futuro inseguro

Será assim de norte a sul

A terra nua semelhante à lua

Vera Lucia

As palavras que seguem, resultam de reflexões concebidas pelo texto La ética ambiental, de Robert Elliot, o qual aqui intitulamos de A ética ambiental: Um pensar sobre o mundo e sua sustentabilidade!

Quando nos propomos a pensar o meio ambiente, ou os problemas que o afetam, na maioria das vezes, tendemos a uma visão e/ou reflexão reducionista e econômica das coisas que nele existem. Dito de outra forma, nos limitamos a dar respostas a problemática dos impactos ambientais que afetam diretamente as satisfações pessoais mais imediatas e egoístas do ser humano. Necessidades nascentes em concepções consumistas, frutos de uma sociedade norteada por um capitalismo desumano, que privilegia o social/material, quando deveria privilegiar a vida, no caso, a mãe de todas as vidas – o meio ambiente. A sustentabilidade do planeta não pode, e não deve, ser pensada à luz das limitações sociais e consumistas que aprisionam parte da população mundial. Para Nascimento (2012), o grande desafio é retirar do desenvolvimento sustentável a centralidade do social em direção ao ambiental. Talvez aqui, resida o maior de todos os desafios. Como conscientizar a humanidade para a sustentabilidade do planeta? Como racionalizar a relação entre degradação e necessidade de preservação? Acreditamos que as respostas a estas perguntas estão nos bancos escolares, sobretudo nos primeiros anos do Ensino Básico, pois é nesse momento de nossa formação escolar que entramos em contato com nós mesmos, descobrindo-nos como seres sociais, despertando curiosidade para compreender as coisas que existem a nossa volta.  É nesse momento que devemos ser despertados para viver em sociedade, respeitando toda e qualquer forma de vida. Nessa fase etária, somos, de certa forma, inocentes, curiosos e abertos ao conhecer. Ainda, é nessa fase, que devemos ser chamados para questionar o ser humano e sua relação com os outros seres humanos, não humanos e o meio ambiente.

 

Para Morin (2003),

 

Em vez de destruir as curiosidades naturais a toda consciência que desperta, seria necessário partir das interrogações primeiras: o que é o ser humano? A vida? A sociedade? O mundo? A verdade? A finalidade da “cabeça bem-feita” seria beneficiada por um programa interrogativo que partisse do ser humano.

Por mais que alguns recursos naturais vitais à vida humana, e não humana, estejam comprometidos, como a água e o ar, ainda concebemos o meio ambiente como um espaço exclusivo a ser explorado materialmente.  Um paradoxo, na verdade! O fato, é que tal concepção compromete a própria manutenção da satisfação humana. É preciso compreender que pensar a preservação do meio ambiente implica numa ação radicalmente comprometida com vida. Com todas as vidas! Com a sustentabilidade do planeta.

Elliot (2010), fonte de nossa reflexão aqui, discute uma problemática ambiental, vivenciada no Parque Nacional de Kakadu. O Parque Nacional australiano, está localizado no território do Norte, a 171 km, ao leste, da cidade de Darwin, capital do território. Foi estabelecido em 1981, e cobre uma área de 19.804 km². A sua gestão é conjuntamente feita pelo governo australiano e pelos aborígenes da área. O parque é reconhecido pela UNESCO como um patrimônio mundial devido às gravuras rupestres aborígenes e ao ecossistema com rica biodiversidade. A área tem sido habitada por mais de vinte mil anos e algumas das gravuras rupestres existentes supõem as manifestações pictóricas mais antigas da humanidade, conservadas até os nossos dias.

A instalação de uma empresa mineradora, no Park, colocou em debate os possíveis perigos ao ecossistema da região, contaminando animais, rios, vegetação e pessoas locais. Ao longo do texto, o autor argumenta que as ações que envolvem a preservação do meio ambiente, devem transgredir os limites da preservação da vida humana. Devem ser levados em consideração todos os seres vivos, incluindo humanos e não humanos, enfim, toda espécie de vida existente na região. Afirma, que quando atuamos e alteramos o curso natural da vida, não consideramos os impactos dessa ação nos outros seres vivos. Impactos materiais, imateriais e espirituais, como os vividos pelos locais de Kakadu.

Elliot sustenta uma ética ambiental que valorize todas as formas de vida e suas estruturas sociais. Dito de outra forma, sustenta a tese de que devemos preservar a vida e as formas como elas se organizam entre si. Propõe uma ética centrada em ações que busquem a preservação de toda vida humana, animal, vegetal, mineral, liquida (água), etc. Enfim, a preservação de todas coisas vivas existentes no planeta.

Dito acima, pensar a preservação do meio ambiente a partir das necessidades exclusivamente humanas, como vem de certa forma ocorrendo, é pensar de forma reducionista, egoísta e perversa. Não considerar as gerações futuras é, igualmente, ou ainda mais perverso. Pensar o meio ambiente, é pensar em todas as formas de vida nele existentes, incluindo vidas não humanas. É refletir sobre a nossa conduta e nossos princípios morais, consolidando uma ética ambiental. Para Florit e Grava (2016), a ética ambiental é o campo de reflexão sobre os fundamentos éticos resultantes de nossa relação com a natureza e os seres não humanos. Como deveria ser a nossa relação com os não humanos? Seria interessante utilizar-se da bioéticca, ou seja, como propôs Jahr (1927 apud ZAGORAC, 2011), relação ética entre aqueles humanos e os não humanos. Considera-se esse olhar essencial, visto que os habitantes deste enorme planeta não se resumem a nós, bípedes humanos, e sim a nós e todas as formas de vida que coexistem conosco. Desta forma, é imprescindível preocupar-se, como já mencionado por Potter (1971), com a sobrevivência de toda a vida na terra claramente ameaçadas pelos desenvolvimentos tecnológicos, os quais se apresentam cada vez mais invasivos à saúde deste ecossistema global.

Wilson (1984 apud FISCHER et al., 2017), já pensava na necessidade da convivência do ser humano com o natural, porém o mais sensato é pensar que essa relação homem-natureza deve ser praticada dentro dos princípios éticos de alteridade, em que todos, inclusive os não humanos, devem ser respeitados por suas características, necessidades e especificidades.  

As discussões que giram em torno do meio ambiente são, ainda, bastante confusas e contraditórias e, de certa forma, carregadas de modismo. Políticos, ambientalistas e intelectuais, em defesa da sustentabilidade, nem sempre atuam de forma homogênea, fruto do sentido polissêmico que a expressão sustentabilidade traz em seu bojo. Para Nascimento (2012), isso resulta na criação de um campo de forças que condiciona posições e medidas de governos, empresários, políticos, movimentos sociais e organismos multilaterais, que nem sempre convergem. Perde o meio ambiente e todos que nele habitam. Pensar um futuro sustentável implica mudarmos a forma de perceber o mundo. Implica percebê-lo, não somente como sendo a fonte de toda vida, mas também como a fonte do fim de toda a forma de vida.

O caso de Kakadu, é apenas um exemplo dentre tantos outros que sofrem com os paradoxos do mundo moderno, mas que, com certeza, retrata parte de uma fotografia planetária de outras Kakadu.

Pensar o meio ambiente de forma a garantir a sua sustentabilidade implica em manifestações radicalmente comprometidas com uma ética a favor da vida. De toda e qualquer forma de vida.

Quando atingirmos esse grau de consciência, deixaremos de ser “cabeças cheias”, e passaremos a ser “cabeças bem-feitas”, vivendo em harmonia com a grande mãe e em prol de sua sustentabilidade.

REFERÊNCIAS

ELLIOT, Robert. “La ética ambiental”. In: SINGER, Peter (Ed.) Compendio de ética. Madrid: Alianza Editorial, 2010. p. 391-403.

FLORIT, Luciano Félix; GRAVA, Diego da Silva. Ética ambiental e desenvolvimento territorial sustentável: uma análise com base na categoria de especismo. Ambiente & Sociedade, São Paulo, v. XIX, n. 4, p. 23-42, out.-dez. 2016.

FISCHER Maria Luciane et al. Os Zoológicos sob a perspectiva da bioética ambiental: uma análise a partir do estudo de caso dos felídeos cativos. Revista Iberoamericana de Bioética, Madri, n. 4, p. 1-17, 2017.

MORIN, Edgar. A cabeça bem-feita: repensar a reforma, reformar o pensamento. 8. ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2003.

NASCIMENTO, Elimar Pinheiro do. Trajetória da sustentabilidade: do ambiental ao social, do social ao econômico. Estudos avançados, v. 26, n. 74, p. 51-64, 2012.

ZAGORAC, Ivana. Fritz Jahr’s Bioethical Imperative. Synthesis Philosophica, Zagreb: v. 51, p. 141–150, 2011.


[1] Licenciado em Estudos Sociais e História pela Universidade Federal de Pelotas. Especialista em Metodologia do Ensino Superior e Mestre em Educação pela Universidade Regional de Blumenau. Doutorando em Desenvolvimento Regional pela Universidade Regional de Blumenau – PPGDR/FURB

[2] Acadêmica do Curso de Medicina Veterinária da Universidade Regional de Blumenau – FURB.

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