31/05/2017

A educação e o desenvolvimento da aprendizagem do aluno

Por Claudinei José Martini

Ao observar os processos educativos, em um breve contexto histórico, são notórias as diferenças dos modos e meios utilizados para ensinar que existiram no passado recente da Educação Brasileira e que ainda persistem nos dias atuais, respectivamente uma educação centrada no professor e posteriormente outra com uma metodologia centralizada na real aprendizagem do aluno.

Os resquícios deste sistema educacional se apresentam hoje nas salas de aula, rotineiramente da mesma maneira de um século atrás, o professor ainda reproduz metodologias (centralizadas nele) que víamos quando crianças nos bancos escolares: a colocação do nome e da disciplina na lousa como primeiro passo para o início da aula, o registro de frequência realizada pelo arcaico diário de classe, a resolução de exercícios no livro didático, entre outros.

Por outro lado, as tecnologias digitais que se popularizaram e que se inseriram especialmente na Educação a Distância deveriam proporcionar ao aluno mais autonomia na construção de seu conhecimento pelo fato do ensino estar principalmente centralizado nele, porém ainda reproduz uma metodologia atrelada à transmissão de conteúdos tendo o aluno como um receptáculo de informações desconexas com o mundo.

Desta maneira, a educação se torna um ato de depositar, em que os educandos são os depositários e o educador o depositante. Em lugar de comunicar-se, o educador faz “comunicados” e depósitos que os educandos, meras incidências, recebem pacientemente, memorizam e repetem. Eis aí a concepção “bancária” da educação, em que a única margem de ação que se oferece aos educandos é a de receberem os depósitos, guardá-los e arquivá-los. Margem para serem colecionadores ou fichadores das coisas que arquivam (FREIRE, 1987, p. 33).

Dentro desta concepção freireana, o texto “O menino e a caixa” de autoria de Andrea Ramal (2003), retrata fielmente a educação bancária como depósitos de informações transmitidas, figurados como objetos e espaços localizados dentro da memória do aluno com conteúdos desconectados e descontextualizados com outros conhecimentos que permeiam ausentes de reflexões o mundo real.

No início tentara dividir o espaço em compartimentos, e cada objeto ia para seu lugar, de acordo com seu gênero e sua função. Depois as coisas foram ficando confusas: havia objetos sem função aparente, e era difícil entendê-los ou catalogá-los. Havia também compartimentos totalmente cheios, enquanto outros permaneciam quase vazios, e como os objetos se acumulavam teve que começar a sobrepor os elementos (RAMAL, 2003, p. 23).

Estes conteúdos que se avolumam sobre outros e que dificultam os processos de assimilação de conceitos no ambiente escolar promovem um rápido esquecimento das informações recebidas, ou seja, o aluno executa várias atividades sem compreender seus atos.

Assim, com uns sobre os outros, e sobre estes os novos que chegavam a cada dia, quase não sobrava espaço livre, e os objetos se amassavam e se achatavam no fundo e pelos lados da caixa, inutilizados e esquecidos, deformando-a toda (RAMAL, 2003, p. 23 e 24).

Tal processo educativo contrasta com a teoria histórico-cultural, alicerçada nos pensamentos de Vygotsky, determinando que o desenvolvimento humano dependa das interações do indivíduo com o meio social e cultural ao qual pertence. Desta forma, quando um significado faz sentido para o indivíduo ocorre o processo de internalização, se promovendo o desenvolvimento (FONTANA; CRUZ, 1997).

Leontivev (1903 – 1979) citado por Nuñez (2009) diz que a assimilação ou a apropriação do conhecimento se adquire por meio das experiências humanas, sociais e culturais, em ativas interações colaborativas e comunicativas com outras pessoas através dos tempos na qual é caracterizado como um processo educativo.

Assim, o conhecimento não se adquire instantaneamente, mas ao longo de interações que são produzidas de acordo com o meio ao qual o indivíduo se apresenta, contrário ao ensino bancário, ou seja, o entregador, na figura do professor, ao terminar a aula não reflete sua práxis e vê o aluno exatamente como mero receptor.

Quando o entregador de objetos terminava sua rotineira tarefa, ele então fechava mecanicamente sua caixa, amassava e espremia como podia os objetos sobrepostos, como numa mala em que não cabem as coisas na volta da viagem. Depois saía da sala, esquecendo-se deles até o dia seguinte (RAMAL, 2003, p. 24).

Esta atitude tomada pelo professor espera que, “jogando” simplesmente um determinado conteúdo para a recepção do aluno, este possa produzir sozinho o conhecimento de maneira autônoma, mas não é isso, o docente não atua sozinho, pelo contrário, a sua relação humana se intensifica a partir do aluno, mediadas por discursos e comportamentos que envolvem valores, sentimentos e atitudes, exigindo desse professor uma maior interação com as pessoas (TARDIF, 2013).

É a partir do contato com o outro que o conhecimento se constrói, pois, ensinar exige uma disponibilidade para o diálogo sabendo escutar e o “educador que escuta aprende a difícil lição de transformar o seu discurso, às vezes necessário, ao aluno, em uma fala com ele” (FREIRE, 1996, p. 43).

É neste ponto que o conhecimento se apresenta como representação do mundo, compreendido a partir da realidade interior, fazendo sentido. O aluno ao perceber que todo conhecimento adquirido faz e mostra um sentido de mundo, extravasa em novas formas de conhecimentos por meio de reflexões e ideias próprias.

Portanto, o conhecimento pode ser entendido, sim, como aquilo que adquirimos nos livros, nas aulas e nas conversas, mas com o objetivo de alcançar entendimento da realidade. [...] É preciso utilizar-se das informações de maneira intelectualmente ativa, para que se transformem em efetivo entendimento do mundo exterior (LUCKESI, 2011, p. 154).

Sendo assim, os conteúdos transmitidos que se adquire deve confrontar a realidade de maneira reflexiva, convertendo de algo interrogativo e sem nexo em um conhecimento que se faça compreendido e à luz do entendimento do aluno, transparecendo esse saber em atos e atitudes promotores de uma transformação pessoal e social.

 

REFERÊNCIAS

FONTANA, R. A. C.; CRUZ, M. N. Psicologia e Trabalho Pedagógico. São Paulo: Atual, 1997.

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1987.

FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.

LUCKESI, Cipriano Carlos. Filosofia da educação. 3. ed. São Paulo: Cortez, 2011.

NUÑEZ, Isauro Beltrán. Vygotsky, Leontiev e Galperin: formação de conceitos e princípios didáticos. Brasília: Liber Livro, 2009.

RAMAL, Andrea Cecília. Histórias de Gente que Ensina e Aprende. 2 ed. - São Paulo: Edições Loyola, 2003.

TARDIF, Maurice. Saberes docentes e formação profissional. 15. ed. – Petrópolis, RJ: Vozes, 2013.

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