17/01/2018

A ABORDAGEM DAS DSTS À LUZ DA TEORIA DA COMPLEXIDADE DE EDGAR MORIN

A ABORDAGEM DAS DSTS À LUZ DA TEORIA DA COMPLEXIDADE DE EDGAR MORIN

 

Peterson Ayres Cabelleira[1]

petersoncabelleira@hotmail.com

1. RESUMO

O processo de globalização trouxe consigo uma acelerada e preocupante questão voltada à saúde pública. Em poucas horas um indivíduo atravessa continentes e com isso também facilita o processo de proliferação de microorganismos hospedeiros. Diante do fato, o que era para ser um recurso facilitador das rotinas do cotidiano, se transforma em uma epidemia de relevância pública. O estudo da microbiologia e sua interação com as espécies são de máxima importância nos currículos escolares, já que envolvem a promoção da saúde. No estudo dos microorganismos a dificuldade maior é despertar no aluno a imaginação, já que os organismos envolvidos não são visíveis a olho nu, o que torna as práticas pedagógicas menos dinâmicas. O relato a seguir apropriou-se da Teoria da Complexidade de Edgar Morin para subsidiar o estudo das Doenças Sexualmente Transmissíveis - DSTS, onde organogramas interdisciplinares mediaram o processo de ensino e aprendizagem. Esta prática foi desenvolvida na Escola Estadual Getúlio Vargas, para turmas do 1º ano do Ensino Médio, na cidade de São Borja, com foco na sexualidade e as Doenças Sexualmente Transmissíveis.

Palavras-Chave: DSTS, ensino, complexidade, Edgar Morin

 

2. CONTEXTUALIZANDO A EXPERIÊNCIA

Ao longo da minha trajetória docente, participei ativamente em projetos de saúde pública e promoção da saúde escolar, o que me aproximou ainda mais deste tema e me fez perceber o quanto existe dificuldades no entendimento do comportamento desses microorganismos e suas relações com o macro mundo. Sabemos o quanto nossos jovens necessitam de orientação quanto aos cuidados com as Doenças Sexualmente Transmissíveis e demais transtornos relacionados com o início da vida sexual, que acompanham a puberdade. Falar sobre vírus, bactérias e demais microorganismos trás a tona não somente as lições biológicas, mas também as relações sociais e suas conjunturas, o que com freqüência sou solicitado a organizar grupos de alunos para abordar a orientação sexual e a responsabilidade social. Para tanto, iniciou-se uma série de encontros no Colégio Estadual Getúlio Vargas, no município de São Borja. Fronteira com a Argentina. A escola fica situada no centro da cidade e abrange alunos das mais diversas classes sociais, onde oferta o ensino básico da pré-escola ao ensino médio. Regiões de fronteira são consideradas de grande importância epidemiológica, visto que o fluxo de indivíduos entre dois países ocorre de forma constante, num processo de hibridização cultural muito forte e indiretamente o envolvimento de políticas públicas com ações diferenciadas. Um exemplo claro ocorreu em 2011 durante a epidemia de Leischmaniose, onde a principal dificuldade no controle e diagnóstico da doença foram as políticas públicas dos dois países que não correlacionavam suas prioridades. A situação fronteiriça e o processo acelerado de globalização coloca nosso município em uma situação de necessidade permanente de ações de saúde preventiva, e o ponto de partida segundo o referido relato são os alunos da educação básica, podendo expandir as ações para as demais escolas não envolvidas no processo.

 

3. DETALHAMENTO DAS ATIVIDADES

Primeiramente foi desenvolvido o organograma interdisciplinar e com o auxílio dos grupos focais, foram integrados os saberes e os conceitos das áreas do conhecimento no processo de ensino e aprendizagem dos microorganismos causadores de Doenças Sexualmente Transmissíveis. No intuito de compreender o mundo, nosso conhecimento e a nós mesmos, Morin defende a tese de um pensamento planetário, argumentando que nenhum problema particular pode ser formulado independentemente de seu contexto, e seu contexto por sua vez está inserido num panorama global. Desta forma é necessário submeter à reflexão das diversas disciplinas científicas, a noção de complexidade, entendida em seu sentido latino (complexus “o que está tecido junto”). Para tanto foi incluído nos dispositivos assuntos das mais diversas áreas do conhecimento, que possam auxiliar no processo de construção do conhecimento. Assim foi organizado esquemas interdisciplinares para dar início aos grupos.

Composição dos temas interdisciplinares para o esquema:

  1. O processo de globalização e as relações com as epidemias;
  2. As políticas públicas e a promoção da saúde;
  3. O hibridismo cultural e as influências no comportamento social;
  4. Higiene e saúde – costumes e cultura;
  5. Civilizações antigas e os primeiros relatos de DSTS;
  6. O movimento feminista e o advento da pílula. Este item propõe questionamentos de uma cultura de produção de masculinidade que potencializa violências de várias ordens, o que requer a construção de uma cultura de paz, ou o “aprender a ser”, defendido por Morin (1999) e Delors (2001).
  7.  

4. ANÁLISE E DISCUSSÃO DO RELATO

Ações interdisciplinares, aqui entendidos como elementos ou estratégias de ensino aprendizagem que objetivam práticas que superem as dicotomias e isolamentos disciplinares foram utilizadas como ponto de partida dos encontros para a abordagem dos temas propostos. Utilizei grupos focais como instrumento de intervenção, por onde apliquei o organograma interdisciplinar amparados na Teoria da Complexidade, de Edgar Morin.

Acredito que a interdisciplinaridade tem sua culminância no despertar do aluno, na sua disponibilidade, na pesquisa e no resgate das habilidades. Fazenda (2002) descreve que é no interior de projetos de pesquisa que a integração entre as disciplinas pode ser estabelecida. Nesse sentido, foram os alunos, em suas pesquisas, que promoveram a interdisciplinaridade. Como menciona Morin (2005a, 2005b), o pensamento complexo encontra-se inviabilizado na atual conjuntura da educação brasileira, pois o saber científico esta fragmentado em disciplinas e os modelos teóricos hegemônicos advogam a dissociação de umas em relação às outras. Para tanto a inserção desses dispositivos oportunizarão tanto aos alunos como aos docentes uma nova forma de exercitar a interdisciplinaridade, tão discutida nos eventos educacionais.

O exercício do processo de ensino e aprendizagem amplo e interdisciplinar, segundo Gonçalves (2008) estimula vários fatores, tais como: ampliação da capacidade comunicativa devido à troca de idéias, ao intercâmbio cultural e ao relacionamento com outras pessoas, considerando que a linguagem é um poderoso instrumento de organização das idéias; mudanças de hábitos e atitudes, com o desenvolvimento da autoconfiança e da iniciativa, bem como a aquisição de habilidades como abstração, atenção, reflexão, análise, síntese e avaliação; maior envolvimento e interesse e, consequentemente, maior motivação para o estudo de temas relacionados à ciência, e o exercício da criatividade, pois conduz à apresentação de inovações dentro da área de estudo das ciências.

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Muitos dos conceitos em microbiologia são abstratos e por isso são considerados de difícil aprendizagem para os alunos. Desta maneira, atividades práticas utilizando métodos investigativos possibilitaram o entendimento de que microrganismos não são apenas agentes patogênicos, mas que também desenvolvem um importante papel na vida cotidiana, principalmente na flora normal. Neste sentido, esta ação teve por objetivo promover aprendizagem relevante de conteúdos de microbiologia, usando a abordagem do ensino por investigação e complexidade referente às Doenças Sexualmente Transmissíveis.

Acredito que haja a necessidade de mudanças profundas no campo curricular, com configurações mais sensíveis ao contexto social, mais aberta a temas do entorno, a problemas contemporâneos, enfatizando a necessidade de superar configurações expressas unicamente pelas lógicas das disciplinas individualizadas, passando a serem configuradas a partir de fatos e ações relevantes, cuja complexidade não é descrita por uma disciplina.

 

6. REFERÊNCIAS

DELORS, J. (Coord.). Educação: um tesouro a descobrir. Relatório para a UNESCO da Comissão Internacional sobre Educação para o século XXI. Brasília: UNESCO, MEC, Cortez, 2001.

FAZENDA, I. C. A. Construindo aspectos teórico-metodológicos da pesquisa sobre interdisciplinaridade. In: FAZENDA, I. C. A. (Org.). Dicionário em construção: interdisciplinaridade. 2.ed. São Paulo: Cortez, 2002. p. 11-29.

GONÇALVES, T. V. O. Feiras de ciências e formação de professores. In: PAVÃO, A. C.; FREITAS, D. Quanta ciência há no ensino de ciências. São Carlos: EduFSCar, 2008.

MORIN, E. Os sete saberes necessários à educação do futuro. São Paulo: UNESCO, Editora Cortez, 1999.

________. O Método I: natureza da natureza. Porto Alegre: Sulina, 2005a.

________ . O Método II: a vida da vida. Porto Alegre: Sulina, 2005b.

MORIN, Edgar. Educação e complexidade, os sete saberes e outros ensaios. São Paulo: Cortez, 2005.

 

 

 

 

 


[1] Acadêmico do Programa de Mestrado em Ensino de Ciências da Universidade Federal do Pampa – Campus Bagé-RS

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