RELACIONANDO TEOLOGIA E ESPIRITUALIDADE
RELACIONANDO TEOLOGIA E ESPIRITUALIDADE
(RELATING THEOLOGY AND SPIRITUALITY)
Eder Anelli da Silva
Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção (PUCSP) - São Paulo - SP - Brasil
RESUMO
Relacionando a Teologia e a Espiritualidade, sua importância e co-participação no entendimento e interpretação de seu contexto, o artigo objetiva apresentar aos leitores a essencialidade de cada campo, além de sua funcionalidade na compreensão teológica e cristã dos fatos e ocorrências ao longo do tempo. Utilizando bibliografia referente ao tema apresentado, este se embasa na obra de Philip Sheldrake, “Espiritualidade e Teologia: Vida cristã e fé trinitária”, citando leituras canônicas e menções encíclicas da Dei Verbum, importante para a compreensão. Logo, com o direcionamento enfocado, a metodologia específica da teologia, absorção da espiritualidade e menção ao contexto cristão concreto, ocorrerá de entendimento para o leitor deste.
Palavras - chave: Teologia, Espiritualidade, Fé, cristã, metodologia.
ABSTRACT
Relating Theology and Spirituality, its importance and co- participation in the understanding and interpretation of context, the article presents to readers the essentiality of each field , and its functionality in theological understanding and Christian of facts and events over time . Using literature on the topic presented, this was grounded in the work of Philip Sheldrake, “Spirituality and Theology: Christian Life and Trinitarian faith," citing canonical readings and encyclicals mentions of Dei Verbum, important for understanding. Then, with the focused direction, the specific methodology of theology, spirituality and absorption mention of specific Christian context, there will be understanding of the reader of this pair.
Keywords: Theology, Spirituality, Faith, Christian, Methodology.
Introdução
O distanciamento da teologia e espiritualidade ao longo do tempo, devido ao histórico decorrido, torna-se influenciador da interpretação dos contextos e da Fé cristã.
As determinações teológicas, a existência de um método e ciência específica, sentido teológico, as influências da espiritualidade, necessidade de coexistência da teologia e espiritualidade, serão apresentadas neste artigo.
A teologia e a espiritualidade em uma relação de complementação e atingimento de objetivo comum específico, mesmo em visões comuns na diversidade, serão refletidas ao longo do descritivo.
1. Teologia
A Teologia, quando apresentada em métodos científicos, utilizando de dados históricos para explicar ou interpretar fatos vistos, em sua maioria, pela percepção cristã, tornasse um divisor de águas, quando da opinião de diversas pessoas que dela utilizam ou de imediato “repudiam” seu contexto científico.
Estudar a Teologia, utilizando de seu método próprio de estudo, partindo do pensamento racional sobre os fatos e ocorrências, interpretando seus diversos contextos e identificando seu fundamento, é decorrência de uma análise elaborado e conceituada, daquilo que hoje, na maioria das vezes, entende-se de forma descontextualizada, perdendo seu sentido verdadeiro e comum da época. Para Martorell (2001, p. 15), “a leitura da Bíblia, mas, sobre tudo, o assunto das autoridades ou textos básicos requer uma atitude mais exigente”.
Segundo Philip Sheldrake[1] (2005, p. 38):
[...] a teologia em seu sentido mais rico é essencialmente performativa além de informativa; ela se preocupa com a ação, assim como com ideias. Consequentemente, o título “teólogo” não implica somente alguém que provê análise especializada e informação enquanto fica a uma distância pessoal do objeto de reflexão.
Partindo deste princípio, entende-se que a Teologia, mesmo atuante em um meio científico, ou seja, como uma ciência, necessita de fatores que vão além de concepções históricas ou deduções lógicas de sua intercorrência. Para esta, é fundamental, além da presença de características Racionais, providas de entendimentos filosóficos, as ações e percepções da Fé, pois a ciência, da qual ela faz parte, provém primeiramente de princípios essenciais e evidentes da luz divina, a ciência de Deus.
Obtendo um sentido performativo, o teólogo precisa obter experiências vividas para um melhor entendimento, compreensão e sentido para o que transmite, referindo-se a palavra de Deus. Tudo é fundamentado, mesmo aos “olhos” da Fé, seja por estudos teológicos, pela própria palavra de Deus, a Bíblia, ou dos contextos transmitidos de geração em geração.
“Ser um teólogo” envolve uma qualidade de presença à realidade sobre a qual refletimos, tanto quanto uma preocupação com as técnicas de uma disciplina específica. Isso suscita questões desafiadoras a respeito de uma relação essencial entre as atividades acadêmicas de pesquisa e ensino e “aplicações” práticas como oração, pregação, cuidado pastoral e evangelização (PHILIP SHELDRAKE, 2005, p. 38).
O método teológico é importante para o completo entendimento e compreensão dos fatos e das verdades da Fé, que juntos compõe a complexidade do estudo e dos mistérios religiosos presentes em nosso contexto e essenciais para o desenvolvimento e vivência da vida cristã.
2. Espiritualidade
Ao observar a teologia pela Fé, encontra-se profundamente com os mistérios e graças, que a revelação de Deus traz. Diante de seu infinito amor e eterna misericórdia, Ele é o guia e permite compreender, perante as limitações humanas, seus ensinamentos.
A espiritualidade vai além do que o simples acreditar, mas acontece mediante a contemplação do mistério, que se revela em no meio, em pequenos momentos e detalhes relevantes, que tornam as circunstâncias compreensíveis e entendíveis, quando verdadeiramente encontrar-se em comunhão com a consubstancialidade trinitária e hipostática de Deus Pai, Filho e Espírito Santo, sendo o último detentor e inspirador de todo o conhecimento que se possa obter sobre a Graça de Deus.
A espiritualidade cristã sempre tratará essa percepção sobre Jesus como o ponto de referência básico. Todavia o significativo é que essa crença incorpora um entendimento específico de Deus e da auto-revelação de Deus. Esse entendimento é sustentado em uma comunidade de fé, a Igreja. Assim, nossas histórias e vivências pessoais são continuamente trazidas à conversação com essa história, com essa experiência original da comunidade crente e as muitas tentativas através do tempo de refletir sobre ela (SHELDRAKE, 2005, p. 29).
Partindo desse entendimento específico de Deus, o ser humano passa a ter uma relação mais íntima com Deus, seja de forma ativa, contemplando e conhecendo sua revelação, como de forma passiva, uma espécie de não conhecimento, que se aproxima do mistério, ou seja, o abismo fundamental que é Deus.
Para prestar esta fé, é necessário o prévio auxílio da graça divina e o auxílio interior do Espírito Santo, para mover e converter a Deus os corações, abrir os olhos da alma e dar “a todos a suavidade no assentimento e na adesão à verdade”. Para entendermos a revelação sempre mais profundamente, o mesmo Espírito Santo aperfeiçoa sem cessar a fé mediante seus dons. [2]
Partindo deste principio, a espiritualidade movida pela conversão, pelo aperfeiçoamento e sede da busca pela compreensão da revelação que se dá em Jesus Cristo, o homem passa a aplicar em seus estudos uma visão cristã. Os sentidos verdadeiros, permitidos pela fé, são a esperança e a certeza da misericórdia do Pai e a caridade para com os irmãos.
“Qual é o primeiro de todos os mandamentos?” Jesus respondeu: “ O primeiro é: Ouve, ó Israel, o Senhor nosso Deus é o único Senhor, e amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda tua alma, de todo teu entendimento, e com toda a tua força. O segundo é este: Amarás o teu próximo como a ti mesmo. Não existe outro mandamento maior o que este.[3]
Jesus já apresentava aos presentes de seu tempo, a importância dos mandamentos para estarmos próximos de Deus e contemplarmos sua misericórdia e amor. A Fé em um Deus único e trino, ao mesmo tempo, que se revela em Jesus Cristo, movimentando a todos com o Espírito Santo e sendo consubstancial na Santíssima Trindade, são fatores determinantes para que a espiritualidade possa ser verdadeira e permita-se aplicar em estudos metódicos e que precisam dela em sua maioria, para explicar a particularidade da ciência teológica.
Segundo Charles Foucauld[4]:
“Tão logo acreditei que havia um Deus, compreendi que não poderia ter outra atitude que não fosse a de viver somente para ele: minha vocação religiosa data do mesmo instante que minha fé: Deus é tão grande! Há uma grande diferença entre Deus e tudo o que não é ele”.[5]
Assim, tratar da grandiosidade de Deus, nada mais é que conhecer, viver, praticar e incondicionalmente experimentar da verdadeira Fé que prevalece da existência de Deus. A espiritualidade torna-se um fator fundamental para compreensão cristã da mensagem e teologia dos escritos bíblicos, a palavra de Deus.
3. Teologia e Espiritualidade
Teologia e espiritualidade são dois campos com características específicas que ao relacionar-se completam o sentido e interpretações, dado determinado texto ou contexto bíblico.
A teologia, ao aplicar seu método e apresentar um formato específico de contextualização e análise, necessita de concepções cristãs, para que possa apresentar o resultado de uma leitura bíblica embasada, interpretada e relacionada ao contexto histórico da época. A historicidade é um fator presente e utilizado pela teologia, em suas diversas pesquisas e busca de explicações dos fatos, porém precisam de influências decorrentes da espiritualidade para elementar as decorrências da fé.
Segundo Philip Sheldrake (2005, p. 112):
A teologia precisa realizar mais eficazmente seu próprio núcleo essencial, espiritual. Ela precisa também procurar entrar em diálogo com a espiritualidade de um modo que seja radicalmente diferente de suas conversações mais familiares com a filosofia ou outras disciplinas intelectuais.
Presente a espiritualidade nos estudos teológicos, é possível ultrapassar as diversidades étnico-culturais existentes, além das diversas concepções religiosas existentes no mundo. Assim, sai-se da comodidade de um engessamento de estudos baseados apenas em fatores históricos ou racionais, e engloba-se a cristandade, a consubstancialidade trinitária que justifica todo o ensinamento, todo o contexto e toda a compreensão da Fé. O abstrato tornando-se concreto, mesmo em uma dialética existente entre os dois campos, porém completando-se e determinando a construção de conceitos seguros e concretos da Fé cristã, não apenas doutrinas, como mencionado por Sheldrake:
A espiritualidade não pode ser simplesmente incluída em estruturas determinadas basicamente pela teologia doutrinal. Antes de mais nada, é difícil evitar a evidência histórica de que as tradições espirituais concretas surgem de vivências cristãs ou de realidades concretas da existência humana, em vez de derivar de ideias e doutrinas (2005, p. 112).
A partir das tradições espirituais, os escritos sagrados tornam-se fundamentais para os estudos teológico, aplicado suas tradições e inspirações, tornando-se o centro da teologia.
Segundo Paulo (1965, p. 36):
A Sagrada Teologia apóia-se, como fundamento perene, na Palavra de Deus escrita, juntamente com a Sagrada Tradição, e nela se consolida firmemente e se rejuvenesce cada vez mais, investigando, à luz da fé, toda a verdade contida no mistério de Cristo. As Sagradas Escrituras contêm as Palavras de Deu, e, pelo fato de serem inspiradas, são verdadeiramente a Palavra de Deus; por isso, o estudo destes Sagrados Livros deve ser como que a alma da Sagrada Teologia.
Apoiando-se na Palavra, a teologia aplica seu método específico, apresentando-se como uma ciência específica, a ciência de Deus, com contextos históricos e importantes para o entendimento das passagens canônicas e do período em que os fatos decorreram, usando da espiritualidade para o entendimento cristão, por meio da Fé, interpretando ocorrências presentes no contexto e amplas quando vistas pela insolúvel crença em Deus, em sua criação, sua misericórdia e consubstancialidade trinitária, indo além da compreensão humana, porém revelando-se por meio de um mistério divino a fora de toda e qualquer indagação contrária de sua existência.
Conclusão
A teologia adotando métodos específicos para interpretar e analisar os fatos decorrentes da história, tanto da igreja quanto nos próprios textos bíblicos (canônicos), visa determinar por questões racionais, um entendimento e compreensão da palavra apresentada ao mundo.
Em via dupla, a espiritualidade interpreta estes mesmo fatores em uma visão cristã, movida pela Fé, que é a sustentação da crença e vivência religiosa, mediante a trindade, fonte irrevogável do saber e guia vivencial humano, revelando-se a todos como Pai, Filho e Espírito Santo, perante sua consubstancialidade que fortalece o homem.
Como em uma dialética, influenciada pelas decorrências étnico-culturais, a Teologia e Espiritualidade existem em linha, não só paralela, mas cruzada, onde seu ponto de encontro é exatamente a coexistência e concepção concreta da Fé cristã, mediante estudos teológicos.
O Livro Espiritualidade e Teologia, de Philip Sheldrake, bem como a encíclica Dei Verbum foram importantes fontes para a compreensão desta interrelação, sendo o primeiro determinante para interpretação da relação entre os dois campos e o segundo, determinando a espiritualidade, como fonte fundamental da concepção teológica, demonstrando que a Teologia, por ser uma Ciência de Deus, necessita de uma análise, correlacionada, pela Fé e Razão.
Bibliografia
BÍBLIA DE JERUSALÉM. São Paulo: Paulus, 2015.
CANÇÃO NOVA. Disponível em <http://blog.cancaonova.com/itbentoxvi/vida-e-obra-de-charles-de-foucauld/>. Acesso em 05 de junho de 2016.
MARTINS JUNIOR, JOAQUIM. Como escrever trabalhos de conclusão de curso: instruções para planejar e montar, desenvolver, concluir, redigir e apresentar trabalhos monográficos e artigos.6.ed.Petrópolis: Vozes, 2012.
SHELDRAKE, PHILIP. Espiritualidade e teologia: vida cristã e fé trinitária. São Paulo: Paulinas, 2005.
SUMA TEOLÓGICA. Disponível em <https://sumateologica.files.wordpress.com/2009/09/sumadeteologia1.pdf.> Acesso em 05 de junho de 2016.
WESTCOTT HOUSE. Disponível em <http://www.westcott.cam.ac.uk/professor-philip-sheldrake/>. Acesso em 05 de junho de 2016.
[1] Pesquisador Sênior na Westcott House e da Federação Teológica de Cambridge. Professor e Diretor do Instituto para estudo teológico em Santo Antonio, Texas.
[2] DEI VERBUM, Constituição dogmática sobre a revelação divina proclamada por Paulo Bispo servo dos servos de Deus em união com os padres do Sagrado Concílio para perpétua memória, 1965.
[3] Trecho do diálogo de uma escriba e Jesus, que responde seus questionamentos sobre os mandamentos a seguir. Marcos 12,28b – 31 (cf. Dt 6, 4 - 5)
[4] Beatificado em 13 de novembro de 2005, vivenciou e transmitiu a espiritualidade com base em Nazaré, ou seja, a vida simples de Jesus de Nazaré.
[5] Trecho citado na Semana Teológica da Faculdade de Teologia Nossa Senhora da Assunção – PUCSP, com temática “Charles FocauldÇ Hoje”, ministrada por Dom Éugene (Bispo de Goiás).