20/01/2018

O POTENCIAL TEORICO DA UTILIZAÇÃO DA VINHAÇA PARA PRODUÇÃO DE ENERGIA ELETRICA NOS ESTADOS PRODUTORES DE ETANOL NO BRASIL: UM ESTUDO EPLORATÓRIO

O POTENCIAL TEORICO DA UTILIZAÇÃO DA VINHAÇA PARA PRODUÇÃO DE ENERGIA ELETRICA NOS ESTADOS PRODUTORES DE ETANOL NO BRASIL: UM ESTUDO EPLORATÓRIO

Geraldo Jose Ferraresi de Araujo[1]

Resumo: Dado a atual crise no sistema de energia elétrica no Brasil é necessário que o país pluralize sua matriz energética e que ao mesmo tempo essa esteja em consonância com o desenvolvimento sustentável e próxima dos grandes centros consumidores, para evitar a perda de transmissão. Ante essa realidade, o setor sucroenergetico pode contribuir com a produção de energia elétrica através de resíduos como o bagaço, palha da cana e a vinhaça, sendo essa ultima de elevada carga orgânica e altamente poluidora. Dado, portanto as perdas de transmissão e distribuição de energia elétrica no país, aliado a crise desse setor quanto do setor sucroenergetico e o caráter altamente poluidor da vinhaça, justifica-se a presente pesquisa de como a vinhaça pode contribuir para a produção de energia elétrica em cada estado brasileiro produtor de etanol e como esse potencial teórico de produção de energia elétrica pode atenuar o déficit de energia elétrica nos estados deficitários na relação geração/consumo de energia no período 2004 até 2014, sendo esse o objetivo geral do artigo Como objetivos específicos pretende-se identificar o potencial de geração de energia elétrica através da vinhaça por estado produtor de etanol no período 2004 até 2014 e também identificar o superávit ou déficit em energia elétrica por estado produtor de etanol entre 2004 até 2014. Para a consecução dos objetivos gerais e específicos supracitados, foi identificada a correlação entre a produção de energia elétrica através da vinhaça e produção de etanol e produção de energia elétrica através da vinhaça e área colhida de cana de açúcar, com o objetivo de fundamentar a relação entre as variáveis supracitadas em consonância com a referencia bibliográfica. Para tanto, foi utilizado a relação segundo Cortez et al (1992), para cada litro de etanol, são produzidos entre 10 de vinhaça, Para produção de energia elétrica foi considerada a relação de Van Haadel (2003, apud REGO; HERNANDES, 2006) para cada 1 m 3  de etanol produz cerca de 490 kWh, através dessas relações foi calculado o potencial teórico de geração de energia elétrica através da vinhaça por estado produtor de etanol entre 2004 até 2014, com base nos dados da UNICADATA. O balanço energético dos estados produtores de etanol e a identificação de déficit foi realizada através da base de do Balanço Energético Nacional, onde nos estados identificados como deficitários, foi quantificado o potencial teórico de contribuição de energia elétrica produzida através da vinhaça. A presente pesquisa é considerada como exploratória, tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses. Concluiu-se que os estados produtores de etanol, deficitários em energia elétrica, no período considerado seriam o Acre com a redução de 0,14% no déficit de energia elétrica, Ceara com 0,05%, Espírito Santo com 4,47%, Maranhão com 1%, Paraíba com 5,1%, Pernambuco com 5, 69%, Piauí com 1,22%, Rio Grande do Norte com 1,58%, Rio Grande do Sul com 0,06% e São Paulo com 11,52%. Além disso durante o período considerado haveria: geração de 73.386,32 gWh, Reutilização de  1.497.680.000 M3 de vinhaça; Reutilização de 7.488.400.000 Toneladas de DQO; Reutilização de 1.872.100.000.000 M3 CH4.

 

 

Palavras Chave: Geração e Consumo de Energia Elétrica por Estado. Setor Sucroalcooleiro. Vinhaça.

 

 

 

 

THE POTENTIAL PROBLEMS OF USE OF STILLAGE FOR ELECTRIC ENERGY PRODUCTION IN THE US ETHANOL PRODUCERS IN BRAZIL: AN EXPLORATORY STUDY

 

 

Abstract: Given the current crisis in the system of electric power in Brazil the country your energy matrix pluralize while this is in line with the sustainable development and close to the large consuming centers, to prevent the loss of transmission. Faced with this reality, the sucroenergetico sector can contribute to the production of electric energy through waste as bagasse, sugarcane straw and vinasse, being this last high organic load and highly polluting. Given, so the losses of transmission and distribution of electricity in the country, coupled with the crisis in this sector and the sucroenergetico sector and highly polluting the vineyard's character, the present research of how the wine can contribute to the production of electrical energy in each Brazilian State producer of ethanol and how this theoretical potential of electric power production could mitigate the shortfall of electricity deficit States in relation to energy in the period geraçãoconsumo 2004 until 2014, which is the overall objective of article As specific objectives it is intended to identify the potential for electric power generation through the stillage by State producer of ethanol in the period 2004 to 2014 and also identify the surplus or deficit in electric power by ethanol producer State between 2004 until 2014. For the achievement of the General and specific objectives mentioned above, it was identified the correlation between the production of electricity through the vineyard and production of ethanol and electric power production through the stillage and harvested area of sugar cane, in order to substantiate the relationship among the variables mentioned above in line with the bibliographical reference. To this end, we used the ratio according to Cortez et al (1992), for each liter of ethanol, produced between 10 of vinasse, For electric power production was considered the relationship of Van Haadel (2003, apud REGO; Hernandes, 2006) for every 1 m 3 of ethanol yields about 490 kWh, through these relationships was calculated the theoretical potential of power generation through the stillage by ethanol producer State between 2004 until 2014, based on data from UNICADATA. The energy balance of ethanol-producing States and the identification of deficit was held through the base of the National energy balance, where in the States identified as deficient, was quantified the potential theoretical contribution of electric energy produced through the vineyard. The present research is considered as exploratory, aims to provide greater familiarity with the issue, with a view to make it more explicit or build hypotheses. It was concluded that the ethanol-producing States, deficient in electricity over the period considered would be an Acre with the reduction of 0.14% in electric power deficit, Ceara with 0.05%, Holy Spirit with 4.47%, Maranhão with 1%, Paraíba with 5.1%, Pernambuco with 5, 69%, Piauí with 1.22%, Rio Grande do Norte with 1.58%, Rio Grande do Sul with 0.06% and São Paulo with 11.52%. Also during the period under consideration there would be: 73,386 .32 gWh generation, re-use of 1,497,680,000 M3 of vinasse; Reuse of 7.488.400.000 Tonnes of chermical oxygen demand and Reuse of 1.872.100.000.000 M3 CH4.

 

 

Key words: electric energy generation and Consumption by State. Sugar-Ethanol Sector. Vinasse.

 

 

 

 

 

 

 

 

1.INTRODUÇÃO

Energia elétrica é um requisito fundamental para o desenvolvimento econômico e social das nações, dispor de fontes de energia na extensão demandada e com confiabilidade adequada às necessidades deste desenvolvimento é um fator crítico para progresso. Além disso, essas devem ser economicamente competitivas e ambientalmente corretas.

Para Trigoso (2004) a energia elétrica tanto no Brasil quanto no mundo tem importância fundamental para o desenvolvimento econômico e social. Há uma forte relação entre consumo de energia e desenvolvimento social. Logo, dispor de uma matriz energética diversificada, limpa, de custo baixo e estruturada é de fundamental importância para o desenvolvimento econômico e social de um país em respeito ao meio ambiente. O Brasil, embora tenha uma matriz energética plural relativamente limpa se comparada com outras nações, possui um dos kWh mais caros do mundo.

De acordo com Sugimoto (2014) independente da grave situação causada pela falta de chuvas na região sudeste do país nos verões de 2013/2014 e 2014/2015, houveram uma série de medidas intempestivas que trouxeram insegurança e retração nos investimentos, com incremento excessivo de termoelétrica. Vê se os custos de produção de energia elétrica subir e o parque industrial no Brasil perder competitividade. No setor de petróleo, a produção está estagnada desde 2008 e, na de biocombustível, há 40 usinas paralisadas.

A crise no setor elétrico no Brasil é uma combinação de três grandes problemas: interferência política, falta de chuvas e atrasos em investimentos. De acordo com Rodrigues (2014) o rombo no setor pode chegar a mais de R$ 28 bilhões de reais.

Para a superação dessa situação, que compromete o crescimento econômico do país e a construção do estado de bem estar social é preciso que as políticas energéticas superem os seguintes desafios: eficiência dos sistemas existentes eliminando desperdícios e maximizando o rendimento dos processos de conversão utilizados; processos de planejamento energético integrado; participação dos estados da federação e da sociedade civil nas tomadas de decisão e democratização do processo de formulação e execução das políticas energéticas. Portanto, a superação dos desafios energéticos e a promoção do desenvolvimento do Brasil estão interligadas, devendo ser tratadas num contexto amplo.

No que se refere a particularmente a transmissão, segundo o Relatório “O Setor Elétrico Brasileiro e a Sustentabilidade no Século 21 – Oportunidades e Desafios” (2012) afirmam que um quinto da energia produzida no país é desperdiçada durante a transmissão da energia até os centros de consumo. Para Oliveira (2008) além de demonstrar o cenário de desperdício de energia elétrica no Brasil, tornam questionável a política estratégica de energia elétrica do país que não levam em consideração as sigficativas perdas de energia elétrica nas linhas de transmissão, através da construção de grandes geradores de energia elétrica, de substancial impacto social e ambiental e longe dos centros urbanos. Segundo o Augusto (2011) em 2008 as perdas em transmissão e distribuição no Brasil somaram 16% do total produzido, o sistema de geração. A matriz energética do país baseado em usinas hidrelétricas exige linhas extensas de transmissão para levar a energia até os consumidores. Perdas elevadas implicam em maiores tarifas de energia, que impactam diretamente no crescimento econômico. De acordo com o Balanço Energetico Nacional (2014), a variação de estoque, ajustes e perdas em 2014 foi de 93.174 GWh.

Especialmente no que se refere à eficiência e ao planejamento energético, o uso mais intensivo das fontes renováveis de energia elétrica próximas aos centros de consumo, aparecem como uma das várias opções necessárias para a superação da crise supracitada em consonância com o desenvolvimento sustentável. Para Rego e Hernandez (2006) a cana-de-açúcar, principal expoente das energias renováveis, presente em vinte três estados do país, não pode se restringir a produção de etanol e queima do bagaço, todos os seus subprodutos podem ser aproveitados, como a palha da cana e a vinhaça, para produção de energia elétrica.

Para Dantas e Parente (2010) a produção de energia elétrica a partir da cana de açúcar tem se mostrado de extrema relevância ambiental, econômica e social, dado a venda de excedente para a o sistema elétrico nacional, geração de postos de trabalho, mitigação de emissão de gases efeito estufa, natureza renovável, diminuição de perdas com transmissão, confiabilidade no suprimento de energia, sobretudo nos meses de estiagem e projetos de rápida implantação. A biomassa gerada pelo setor sucroalcooleiro pode contribuir significativamente para o fortalecimento da matriz energética brasileira.

A produção de energia através da biomassa da cana-de-açúcar representa uma fonte de renda importante para o setor e pode auxiliá-lo na recuperação da presente crise e sua utilização não pode se restringir a queima do bagaço, deve ser reaproveitada todos os seus subprodutos, como a palha da cana e a vinhaça, nesse sentido, dado a importância do setor sucro energético para produção de energia elétrica sustentável no país, a mesma é dissertada no capítulo a seguir.

2.SETOR SUCROENERGETICO: INDÚSTRIA, IMPORTANCIA, OPORTUNIDADES E DESAFIOS.

A cana de açúcar foi uma das primeiras atividades econômicas e serem desenvolvidos no país, a partir de 1530, através de Martin Afonso de Souza com o inicio do processo colonial brasileiro, posicionando o Brasil como fornecedor de açúcar na divisão internacional de trabalho.

Mesmo com o desenvolvimento de outras atividades econômicas no país do século XVI até a presente data, de acordo com Garcez (2013) o Brasil é o maior produtor mundial de cana-de-açúcar, o maior produtor e exportador de açúcar e o segundo maior produtor de etanol do mundo. O setor sucroalcooleiro foi responsável por aproximadamente 2% do PIB nacional e por 31% do PIB da agricultura no Brasil em 2012, tendo empregado cerca de 4,5 milhões de pessoas.

O Brasil produziu próximo de 590 milhões de toneladas de cana-de-açúcar, sendo que a região Centro-Sul é responsável por aproximadamente 90% dessa produção (GARCÊZ, 2013).

A cadeia produtiva da cana-de-açúcar movimentou, na safra 2013/2014, em torno de US$ 107 bilhões, contribuindo com cerca de US$ 8,5 bilhões de impostos. Além da comercialização de 14,54 bilhões de litros de etanol, e 11,13 milhões de toneladas de açúcar para o mercado interno, as exportações de etanol somaram US$ 1,67 bilhão, e 26,63 milhões de toneladas de açúcar (NEVES; TROMBIM, 2014).

Embora os Estados Unidos da America liderem a produção mundial de etanol, a vantagem competitiva do Brasil frente aos seus concorrentes, de acordo com Souza, Scur e Souza (2012) é a utilização da cana de açúcar, enquanto os europeus utilizam a beterraba e os norte americanos utilizam o milho. O etanol brasileiro tem relação entre energia renovável produzida e a energia fóssil usada de 8,9, o que torna o balanço energético positivo. Além disso, o país tem capacidade de expansão de cultivo de cana.

Ante aos expressivos números do setor sucroalcooleiro, para Valente et. al. (2012), os investidores formaram expectativas positivas para o futuro do mercado, desencadeando uma série de decisões de investimento entre 2003 e 2008. De acordo com Cardoso et. al. (2009) tecnologia flex, crescente preocupação ambiental, tanto no Brasil quanto no exterior e a volatilidade dos preços do petróleo nos mercados internacionais, estimulam os países a buscarem matrizes energéticas renováveis. Ante esse cenário, a expansão do etanol no Brasil foi marcada por forte aporte de investimento estrangeiro e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social. Sob a perspectiva de que Estados Unidos, Japão e União Européia seriam potenciais consumidores do etanol brasileiro, durante o governo Lula (2003-2010), o financiamento para a indústria sucroalcooleira chegou a R$ 28,2 bilhões. Em 2010, foram destinados R$ 7,4 bilhões para financiar desde o cultivo (R$ 953 milhões) até a produção de açúcar e etanol (R$ 5,6 bilhões) e a cogeração de energia (R$ 665 milhões).

Porém, desde 2009, o setor enfrenta uma das piores crises de sua história, devido: à recessão econômica nos mercados desenvolvidos e à consequente queda dos investimentos estrangeiros no setor; grau de endividamento das usinas; alto custo de produção; atratividade do preço do açúcar nos mercados internacionais, onde as usinas redirecionaram sua produção para esse produto; perda de competitividade do etanol frente à gasolina, devido a manipulação de preços para contenção da pressão inflacionária e à estiagem na região sudeste nos anos de 2014 e 2015. De acordo com Neves e Trombim (2014), a crise acarretou em mais de 64 mil postos de trabalho perdidos, nas usinas de açúcar e mais de 20 mil, nas destilarias de etanol. O setor fechou, desde a crise mundial, na região Centro Sul do país, mais de 80 mil postos de trabalho; acumulando R$ 60 milhões de dívidas, faturando somente R$ 65 bilhões.

Ante ao presente cenário, aliado a importância do setor sucroalcooleiro para o desenvolvimento econômico e social do Brasil, é fundamental que o governo federal crie uma diretriz de longo prazo para a matriz de combustíveis no Brasil; diferenciação tributária entre os combustíveis renováveis; estimulo aos ganhos de eficiência técnica nos veículos para ampliar a competitividade do etanol ante a gasolina.

Encontrar soluções que leve a retomada da econômica do setor sucroalcooleiro através de políticas públicas de regulação, coordenação institucional e fomento a competitividade para direcionar investimentos para dinamizar as capacidades tecnológicas, fomentando a pesquisa, o desenvolvimento e inovação de processos agrícolas e industriais, estimulando, assim, a melhoria da gestão em consonância com ações empresariais voltadas para o aumento da produtividade, diversificação da carteira de investimentos, melhoria de gestão, redução dos impactos ambientais de atividade agrícola e industrial e a exploração da bioeletricidade, através dos subprodutos/resíduos gerados pela produção de etanol, palha, bagaço, torta de filtro e a vinhaça. (ALEM, 2010).

Sendo a vinhaça o pior resíduo da produção de etanol seja em volume ou carga poluidora é discorrido no capítulo a seguir.

3.VINHAÇA: CONCEITO, DESAFIOS E OPORTUNIDADES

Ante a importância da produção de energia elétrica, as matrizes renováveis de energia, sobretudo os subprodutos/resíduos da produção de etanol, aparecem como uma oportunidade a serem exploradas, dentre elas, pode-se destacar a vinhaça.

A vinhaça, conhecido como vinhoto ou restilo, de acordo com Freire e Cortez (2000), é definida como líquido de cor parda clara, que escurece em razão da oxidação efluente derivado da destilação do vinho, resultante da fermentação do melaço, com alto poder poluente e valor fertilizante, baixo pH e elevada corrosividade e altos índices de demanda bioquímica de oxigênio (DBO) e demanda química de oxigênio (DQO). Ludovice (1997) define a vinhaça como um efluente composto de 93% de água e 7% de sólidos, desses sólidos, cerca de 75% são matéria orgânica, formado de ácidos orgânicos e em menor quantidade, por cátions como o K+, Ca+2 e Mg+2. Autores, como Silva, Griebeler e Borges (2007) e Rossetto (1987) relatam que dos efluentes líquidos da indústria sucroalcooleira, a vinhaça é a que possui maior carga poluidora, apresentando DBO variando de 20.000 a 35.000 mg/L, onde a quantidade despejada pelas usinas varia de 10 a 18 L de vinhaça por litro de etanol produzido, dependendo das condições de produção e  sai dos aparelhos de destilação em média de 85 a 90 °C.

No que se refere a composição da vinhaça, de acordo com a Agencia Nacional de Aguas[2] (2009, apud Diniz 2010) depende de fatores, como: natureza da composição dos vinhos, sistema de fermentação, tipo de levedura utilizada; tipo de tratamento das leveduras, aditivos utilizados na fermentação, aparelhos utilizados na destilação, qualidade da água usada, componentes utilizados para desinfecção e natureza e composição da matéria-prima como pode ser observado na tabela a seguir:

Tabela 2: Características físico-químicas de vinhaça de diferentes matérias primas

Matéria Prima

Produção

(L/LEtOH)

DBO

(g/L)

DQO

(g/L)

Ntotal

Ptotal

K

SO42-

pH

Melaço (beterraba)a

11,6

44,90

91,10

3.569,00

163,00

10.030,00

3.030,00

5,35

Caldo de canaa

16,30

16,70

30,40

628,00

130,00

1.952,00

1.356,00

4,04

Melaço (cana)a

14,00

39,00

84,90

1.229,00

187,00

5.124,00

3.478,00

4,46

Melaço

(cana)b

nd

25,8

48,00

820,00

480,00

nd

nd

nd

Material celulósicoa

11,10

27,60

61,30

2.787,00

28,00

39,00

651,00

5,35

Mandiocaa

16,00

31,40

81,10

650,00

124,00

nd

nd

3,5

Milhoa

nd

26,9

64,50

755,00

1.170,00

nd

nd

3,65

Milhoa

nd

43,10

59,40

546,00

228,00

nd

299,00

nd

Sorgo sacarinob

nd

46,00

79,9

800,00

100,00

nd

nd

4,5

 

Fonte: Wikie et al (2000) e Meneses (1980)

Até o final dos anos 70, volumes crescentes de vinhaça eram lançados nos mananciais superficiais. Os lançamentos eram de caráter sazonal, de acordo com o ciclo da produção de etanol, afetando, conseqüentemente, as funções de auto regulação e auto reprodução dos ecossistemas (CORAZZA, 2006).

Os impactos da aplicação da vinhaça variam de acordo com a composição química da vinhaça, volume e da periodicidade de aplicação. Para Piacente (2005) a alta concentração de vinhaça no solo e no lençol freático pode acarretar alta concentração de metais como; amônia, magnésio, alumínio, ferro, cloreto como também matéria orgânica. De acordo com Ludovice (1997) em canais de escoamento da vinhaça, a contaminação do lençol freático pode chegar a 91,7%, tornando assim poluída à manta freática. Uma vez contaminada, as possibilidades de reversão são pequenas.

Nesse sentido, Almeida (1955) aponta que a vinhaça apresenta nocividade elevada para grandes animais aquáticos, afugenta a fauna marítima da costa brasileira para o fenômeno fisiológico da desova e destrói com microflora, microfauna, plantas aquáticas submersa e flutuante.

Além disso, considerando que o Brasil produziu na safra 2013/2014, de acordo com a UNICA (2014) em torno de 25,04 bilhões de litros de etanol, a produção de vinhaça nessa safra foi de no mínimo 250 bilhões de litros, sendo um volume bastante preocupante.

Ante ao seu impacto poluidor e sua elevada produção, atualmente, os principais instrumentos normativos e legislações referentes a destinação da vinhaça tanto no Brasil quanto nos Estados Unidos da América e na Organização Mundial da Saúde são:

  • Decreto 8468/76: aprovou o regulamento da Lei 997/76 e seu regulamento que dispõe sobre a “Prevenção e o Controle da Poluição do Meio Ambiente”, referente ao lançamento nos cursos d’água foi restringido no Estado de São Paulo (ALESP, 1976);
  • Norma P4.331 – Vinhaça: Critérios e Procedimentos para Aplicação no Solo Agrícola, estabelecer os critérios e procedimentos para o armazenamento, transporte e aplicação da vinhaça, gerada pela atividade sucroalcooleira no processamento de cana-de-açúcar, no solo do Estado de São Paulo; (CETESB, 2006)
  • Resolução CONAMA 430/11: Dispõe sobre as condições e padrões de lançamento de efluentes, complementa e altera a Resolução no 357, de 17 de março de 2005, do Conselho Nacional do Meio Ambiente-CONAMA.  (BRASIL, 2011);
  • Guidelines for the Safe Use of Wastewater, Excreta and Greywater – Volume II – Wastewater Use in Agriculture: que apresenta uma série de considerações a respeito da utilização de águas residuárias na agricultura, buscando a obtenção de benefícios à saúde humana e ao meio ambiente (WHO, 2006);
  • Guidelines for Water Reuse: que também prevê o reuso de águas residuais visando à obtenção de benefícios à saúde humana e ao meio ambiente. (USEPA, 2004);
  • Portaria MINTER nº 323, de 29.11.78: Proíbe lançamento de vinhoto em coleções de água. (ALAGOAS, 1986)

Os instrumentos normativos e legislações publicados tem como objetivo, não somente mitigar o descarte da vinhaça no solo e nas coleções de águas, mas também incentivar novas aplicações para esse resíduo, com o pressuposto de promover o desenvolvimento econômico e social na sua reutilização em consonância com a preservação ambiental.

Nesse sentido, segundo Sheehan e Greenfield (1980), Willington e Marten (1982) e Oliveira (2011), baseando-se nas tecnologias disponíveis para o reaproveitamento da vinhaça, enumeram alternativas em consonância com o desenvolvimento sustentável. Dentre as alternativas, pode-se citar:

  • Biodigestão anaeróbia visando à produção de metano;
  • Fertirrigação;
  • Incineração para reutilização das cinzas na agricultura;
  • Evaporação para produção de ração animal;
  • Produção de biodiesel;
  • Produção de fungos;
  • Uso em materiais de construção.

As possibilidades de reutilização supracitada estão em consonância com Produção mais Limpa pela indústria sucroalcooleira, conforme pode-se destacar no capítulo 3.3 desta dissertação.

No que se refere especificamente a biodigestão anaeróbia da vinhaça, a mesma surge como uma alternativa de produção de energia, esse processo, reduz o potencial poluidor, normalizando a DBO e o pH, e ao mesmo tempo produzir gás metano. A tecnologia utilizada é o reator UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket). O reator UASB, de acordo com Cortes, Freire e Resillo (1998) pode tratar efluentes com mais de 30 kg COD/m3/reator/dia, sendo por este motivo uma boa opção tecnológica para o Brasil.

Quanto sua aplicação para produção de energia elétrica, seu potencial energético, segundo Van Haadel[3] (2003, apud REGO; HERNANDES, 2006),

Para quantificá-lo deve-se avaliar a quantidade de material orgânico, expressa em massa de DQO (demanda química de oxigênio) presente. VAN HANNDEL encontrou aproximadamente 500kg de DQO por m3 de álcool produzido, independente das proporções entre a vazão de álcool e a vazão de vinhaça. Pelo processo de digestão anaeróbica da vinhaça há uma conversão deste material orgânico em gases metano e dióxido de carbono que, juntos, formam o biogás:

 

CH 4 + 2O2  → CO2  + 2H2O

 

(16 g) (64 g)

 

Pela equação acima, estequiometricamente a cada 16 gramas de metano tem-se 64 gramas de oxigênio. Adotando-se uma eficiência de remoção do material orgânico de 80%, que tem sido alcançada com segurança, a cada m3 de álcool há uma remoção de 400kg DQO, o que equivale a uma produção de 100 kg de CH4 (4:1). Considerando-se que o poder calorífico inferior (PCI) do metano é de 12.000 kcal/ kg, 1kg de CH4 é equivalente a 50.400kJ (kWs) ou 14 kWh. Para os 100 kg de metano considerados na produção de 1m3 de álcool, o potencial energético é de 1.400 kWh/ m3 de álcool. Entretanto, supondo-se que a eficiência de um grupo gerador ciclo Otto, que irá queimar este biogás, é de 35%, no máximo, tem-se uma relação de 490 kWh por m3 de álcool (1.400 kWh * 35%).

 

Logo, dado o substancial volume de produção de vinhaça, sua elevada capacidade poluidora, sua utilização para a produção de energia com contribuição para o desenvolvimento econômico e social do país, especialmente com a escassez de energia que ocorre atualmente no Brasil, as usinas podem gerar e suprir própria demanda energética e ao mesmo tempo produzir excessos que poderiam ser repassados a concessionárias, contribuindo para superação da crise tanto no setor sucroalcooleiro quanto do sistema elétrico brasileiro, em consonância com o desenvolvimento sustentável.

Porém, os investimentos em rede de transmissão de energia elétrica, de acordo com Castro e Dantas (2008) cabem as usinas produtoras, onde dependendo da localização das mesmas e da rede de transmissão representa uma barreira de entrada substancial nesse mercado, além disso, soma-se a descapitalização, as dividas das usinas e o aumento nas taxas de juros no Brasil, dificultando o acesso a crédito para investimento.

5.         METODOLOGIA

A metodologia, de acordo com Vitoriano e Garcia (2004), é um processo operacional e lógica de organizar a seqüência de diversas atividades para chegar a um fim almejado, ordenando a própria ação do objeto do estudo e da pesquisa. Por meio de métodos e processos, o investigador começa a intervir na realidade e a partir dela produzir conhecimento científico.

Logo, de acordo com Gil (1996), o processo de pesquisa é definido como o procedimento racional e sistemático que tem como objetivo proporcionar respostas aos problemas que são propostos.

Dado o exposto acima, a natureza da pesquisa utilizado neste artigo é a do tipo quantitativa que de acordo com Richardson (1999) este método caracteriza-se pelo emprego da quantificação, tanto nas modalidades de coleta de informações, quanto no tratamento dessas através de técnicas estatísticas, desde as mais simples até as mais complexas.

Dado o exposto pela revisão bibliográfica, o objetivo geral do presente artigo é identificar quanto a vinhaça poderia contribuir na produção de energia elétrica nos estados produtores de etanol que se encontram em situação de déficit de energia elétrica no período 2004 até 2014.

Como objetivos específicos pretende-se identificar o potencial de geração de energia elétrica através da vinhaça por estado produtor de etanol no período 2004 até 2014 e também identificar o superávit ou déficit em energia elétrica por estado produtor de etanol entre 2004 até 2014.

Para a consecução dos objetivos gerais e específicos supracitados, foi identificada a correlação entre a produção de energia elétrica através da vinhaça e produção de etanol e produção de energia elétrica através da vinhaça e área colhida de cana de açúcar, com o objetivo de fundamentar a relação entre as variáveis supracitadas em consonância com a referencia bibliográfica.

Além disso, foi utilizado a relação segundo Cortez et al (1992), para cada litro de etanol, são produzidos entre 10 à 15 litros de vinhaça, na elaboração dos cálculos foi considerado apenas a proporção para cada litro de etanol são produzidos 10 litros de vinhaça.

Para produção de energia elétrica foi considerada a relação de Van Haadel[4] (2003, apud REGO; HERNANDES, 2006):

1 m 3 de etanol – 400 kg de DQO – 100 kg de CH4 - 490 kWh

Através das relações elaboradas por Cortez et al (1992) e Van Haadel (2003, apud REGO; HERNANDES, 2006) foi calculado o potencial teórico de geração de energia elétrica através da vinhaça por estado produtor de etanol entre 2004 até 2014, com base nos dados da UNICADATA.

A situação do balanço energético dos estados produtores de etanol e a identificação de déficit dos mesmos foi realizada através da base de do Balanço Energético Nacional, onde nos estados identificados como deficitários, foi quantificado o potencial teórico de contribuição de energia elétrica produzida através da vinhaça.

A presente pesquisa é considerada como exploratória, pois o assunto ainda pouco conhecido, pouco explorado. Para Gil (1996) esse tipo de pesquisa tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses.

6.         RESULTADOS

6.1       Produção de etanol e energia elétrica através da vinhaça por estado

A tabela 3 demonstra durante o período considerado (2004 até 2014) o volume da produção de etanol de cada estado produtor, de acordo com Cortez et al (1992), para cada litro de etanol produzido obtém-se de 10 até 15 litros de vinhaça, nesse estudo considerou-se apenas a obtenção de 10 litros de vinhaça, como também a produção potencial teórica de energia elétrica através da vinhaça, através da relação citada na metodologia, de acordo com Van Haadel[5] (2003, apud REGO; HERNANDES, 2006):

  1. m 3 de etanol – 400 kg de DQO – 100 kg de CH4 - 490 kWh

Através de ferramenta estatística de correlação pode-se identificar a relação entre a produção de energia elétrica através da vinhaça e produção de etanol, que é igual a 1 e a produção de energia elétrica através da vinhaça e área colhida de cana de açúcar que é igual a 0,89.

Logo a produção de etanol e produção potencial teórica de energia elétrica por estado se encontram na tabela a seguir:

 

 

 

 

 

Tabela 3: Produção de etanol e energia elétrica através da vinhaça por estado

 
 

2003/2004

2004/2005

2005/2006

2006/2007

2007/2008

2008/2009

 

UF

Etanol (Mil M3)

Produção energia (GWh)

Etanol (Mil M3)

Produção energia (GWh)

Etanol (Mil M3)

Produção energia (GWh)

Etanol (Mil M3)

Produção energia (GWh)

Etanol (Mil M3)

Produção energia (GWh)

Etanol (Mil M3)

Produção energia (GWh)

 

AC

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

0,00

 

AL

703,00

344,47

687,00

336,63

546,00

267,54

637,00

312,13

853,00

417,97

845,00

414,05

 

AM

4,00

1,96

5,00

2,45

6,00

2,94

6,00

2,94

8,00

3,92

8,00

3,92

 

BA

50,00

24,50

63,00

30,87

103,00

50,47

95,00

46,55

141,00

69,09

141,00

69,09

 

CE

0,00

0,00

0,00

0,00

1,00

0,49

1,00

0,49

1,00

0,49

9,00

4,41

 

ES

184,00

90,16

233,00

114,17

235,00

115,15

173,00

84,77

252,00

123,48

275,00

134,75

 

GO

646,00

316,54

717,00

351,33

729,00

357,21

822,00

402,78

1.214,00

594,86

1.726,00

845,74

 

MA

90,00

44,10

96,00

47,04

56,00

27,44

128,00

62,72

170,00

83,30

182,00

89,18

 

MT

792,00

388,08

814,00

398,86

771,00

377,79

757,00

370,93

894,00

438,06

952,00

466,48

 

MS

480,00

235,20

521,00

255,29

496,00

243,04

641,00

314,09

877,00

429,73

1.076,00

527,24

 

MG

772,00

378,28

793,00

388,57

959,00

469,91

1.291,00

632,59

1.775,00

869,75

2.181,00

1.068,69

 

PA

35,00

17,15

48,00

23,52

42,00

20,58

52,00

25,48

36,00

17,64

45,00

22,05

 

PB

278,00

136,22

338,00

165,62

268,00

131,32

313,00

153,37

342,00

167,58

391,00

191,59

 

PR

1.220,00

597,80

1.201,00

588,49

1.040,00

509,60

1.322,00

647,78

1.859,00

910,91

2.049,00

1.004,01

 

PE

382,00

187,18

415,00

203,35

326,00

159,74

343,00

168,07

508,00

248,92

530,00

259,70

 

PI

22,00

10,78

19,00

9,31

35,00

17,15

51,00

24,99

36,00

17,64

45,00

22,05

 

RJ

107,00

52,43

158,00

77,42

136,00

66,64

87,00

42,63

120,00

58,80

128,00

62,72

 

RN

95,00

46,55

89,00

43,61

74,00

36,26

78,00

38,22

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Volume/Edição

Autores

  • ARAUJO, Geraldo Jose Ferraresi

Páginas

  • 1 a 33

Áreas do conhecimento

  • Nenhuma cadastrada

Palavras chave

Dados da publicação

  • Data: 20/01/2018
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