29/06/2022

A TERCEIRIZAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Eduardo Dalcin CASTILHA


 

RESUMO

O objetivo deste artigo foi o de analisar conceitual e juridicamente o processo de terceirização, verificando os efeitos quanto à substituição da mão de obra efetiva por prestação de serviços terceirizados. A terceirização surgiu como uma ferramenta de gestão no mercado econômico atual que devido sua alta competitividade faz com que a redução de custos seja o foco contínuo das organizações. É utilizada com o intuito de delegar a terceiros atividades da empresa que não sejam objetivo principal, reduzindo custos e aumentando a agilidade. Há décadas a administração pública vem absorvendo esta prática de gestão não se preocupando com as suas consequências e responsabilidades. Esta troca criou uma forma trilateral de vínculo trabalhista que acarretou de certa forma prejuízos aos trabalhadores, sendo complexa a responsabilidade sobre o tomador de serviço frente a isso quando se envolve a administração pública.


 


 


 

1 INTRODUÇÃO


 

Conforme MARTINS (2009), a terceirização de recursos humanos trata-se de uma modalidade de gestão, mesmo que não inovadora, que se tornou na atualidade um dos mecanismos pelo qual a Administração Pública constitui parcerias com o setor privado para a execução de algumas atividades que não lhe são essenciais, focando à diminuição dos custos e da burocracia estatal, maximizando a eficiência da máquina estatal na realização de serviços públicos essenciais à população.

Entretanto, na Administração Pública Direta e Indireta, o emprego da terceirização para o fornecimento de recursos humanos não tem respaldo no ordenamento jurídico vigente, pois, é indispensável a exigência de concurso público para a investidura em cargos, empregos ou funções, nos termos do inciso II do artigo 37 da Constituição Federal (BRASIL, C.F. 1988, art. 37).

Conforme a Constituição (BRASIL, C.F. 1988, art. 37), a única exceção que dispensa concurso público é a contratação temporária, de excepcional interesse público, versada no inciso IX do artigo 37 da Constituição Federal. Contudo, alheio a esta exigência, habitualmente se encontra sob a denominação de prestação de serviços técnicos especializados, casos de fornecimento de recursos humanos ao Estado sem concurso público. Tal situação predispõe fraude aos direitos trabalhistas, encobre a relação jurídica de emprego própria da atividade estatal, viola o interesse público e favorece o clientelismo político e a corrupção. Todavia, a Administração Pública está atrelada ao princípio da legalidade, portanto, há um dever de conciliar todos os atos da administração ao ordenamento jurídico vigente.

Assim sendo, o aceite pela ordem jurídica é a realização do contrato de terceirização de serviços com a Administração Pública. O artigo 37, inciso XXI, (BRASIL, C.F. 1988, art. 37), engloba a contratação de serviços dentre os contratos subordinados ao processo licitatório, se estendendo inclusive, a entidades da Administração Pública Indireta. Normatizando este dispositivo, obteve-se a Lei n. 8666/1993, que institui normas para licitações e contratos da Administração Pública, cujo artigo 10 permite a execução direta ou indireta de obras e serviços.

Nessa esfera, há de se diferenciar a terceirização lícita da ilícita, e elucidar esse tema relativo à responsabilização na seara trabalhista e indicando soluções para as contradições decorrentes. Este aclaramento demonstra corretamente a relevância do estudo científico do tema, identificando o ambiente sócio-econômico de onde emerge a terceirização, sua aplicação na Administração Pública, os fins pretendidos por meio deste tipo de contratação, a deturpação praticada por alguns órgãos públicos, a depreciação do recurso humano e a consequente repercussão na área do Direito do Trabalho.

Conforme TEIXEIRA (2009), as propostas de mudança na área pública sempre envolveram muita polêmica e diversas perspectivas. São propostas inúmeras soluções de gestão, entre elas as terceirizações, que ganharam força no mundo globalizado e capitalista, propuseram novas divisões mundiais de trabalho, com base na idéia de que cada empresa deve dedicar-se às suas competências centrais.

De acordo com SALVINO (2009), no Brasil a terceirização vem sendo amplamente adotada, não somente em instituições privadas como também na administração pública. Tal tendência se deve ao fato da crescente demanda de serviços e necessidade de redução de custos, nos mais diversos ramos como saúde, educação e segurança. Entendida como a contratação de empresas especializadas para a execução de atividades que não constituem o objeto principal da entidade contratante, em outras palavras consiste em transferir para terceiros um serviço ou uma responsabilidade. A partir de outro ponto de vista podemos ainda afirmar que a terceirização é uma ferramenta moderna que concentra esforço nas atividades essenciais delegando as complementares, visando sempre à diminuição dos custos bem como a melhoraria na prestação de serviços essenciais à comunidade.

Todavia, afirma o autor SALVINO (2009) que um problema vem tornado-se evidente neste processo de terceirização, que esta substituição de força de trabalho criou uma forma trilateral de vínculo trabalhista, que acarretou de certa forma prejuízos aos trabalhadores, com diversos casos de baixos salários e inadimplemento de verbas trabalhistas. Ressalta o autor que o Direito do Trabalho surgiu com o fim de atender às reivindicações dos envolvidos na relação de emprego e na organização econômica contemporânea, no conflito capital x trabalho.

O parágrafo 1º do art. 18 da Lei Complementar 101/2000 (BRASIL, Lei 101/2000, art. 18), admite a terceirização no serviço público, entendendo que os valores dos contratos de terceirização que se referem à substituição de servidores e empregados públicos serão registrados como "outras despesas de pessoal".

O artigo 71 da Lei 8.666/93 (BRASIL, Lei 8.666/93, art. 71) buscou regular a responsabilidade, tanto de empresas particulares quanto da administração pública no inadimplemento das remunerações dos trabalhadores terceirizados. Houve certa controvérsia quanto à responsabilidade do estado, que mais tarde veio a ser solucionada pela súmula 331 do Tribunal Superior do Trabalho (TST, Súmula 331/2011).

Assim, no caso de inadimplemento das verbas trabalhistas devidas aos que contribuíram para os fins do estado enquanto tomador de serviços terceirizados, é importante citar a súmula 331 do TST, que, entre outras disposições, prevê a responsabilização subsidiária da administração pública, incluindo todas as verbas decorrentes da condenação referentes ao período da prestação laboral. A base de tal entendimento está no princípio da isonomia, previsto no artigo 5º, caput e inciso I, assim como artigo 7º, Inciso XXXII da Constituição (BRASIL, C.F. 1988, art. 7º).

Portanto, se faz correta a aplicação do salário equitativo ou isonômico, visto que é inadmissível uma discriminação socieconômica, o que fere a própria dignidade do trabalhador. A terceirização não pode ser vista como um mecanismo de aviltamento de salários e do padrão social dos trabalhadores.

Nesta perspectiva, o artigo terá o intuito de analisar conceitual e juridicamente o processo de terceirização, verificando os efeitos quanto à substituição da mão de obra efetiva por prestação de serviços terceirizados, verificando os efeitos quanto à substituição da mão de obra efetiva interna por flexível externa, na prestação de serviços. A pesquisa realizada neste trabalho evidencia-se exploratória e descritiva, ponderando que para, Cervo e Bervian (1996), a pesquisa exploratória não fabrica hipótese para ser testada no trabalho, é necessário apenas definir os objetivos e angariar o máximo de conhecimento necessário sobre o objeto de estudo. Serão discutidas noções de serviço público e de privatização dos serviços. Definindo a base conceitual da terceirização de serviços e analisando sua situação legal no Brasil. Os dados serão levantados de secundárias por meio a Constituição Federal Brasileira de 1988, bem como das demais legislações que regem o tema em estudo.


 

2 BREVE HISTÓRICO DA TERCEIRIZAÇÃO


 

Conforme ANTUNES (1999), os modelos do sistema capitalista de produção se renovaram durante o final do século XIX. Implantado por volta de 1875, o novo sistema taylorista, assentava-se na divisão de trabalho em níveis e na eficiência. Brevemente, este sistema de divisão do trabalho foi substituído pelo fordismo, isto a partir do segundo quarto do século XX. Este modelo fundamentava-se, em linhas de produção em série. A partir da diminuição da produtividade e a crise do consumo em massa nos países desenvolvidos em meados da década de 1960, se originou uma nova reestruturação produtiva, com maior racionalização dos maquinários e aumento do controle sobre o trabalho. Tal recomposição do processo produtivo foi conhecida como toyotismo, criada na fábrica automobilística da Toyota, requerendo alta qualificação dos funcionários para a execução de múltiplas funções.

Ainda conforme ANTUNES (1999), essa conjuntura, ampliou a prática da terceirização de recursos humanos, definida como um mecanismo de gestão, por meio do qual são transferidas determinadas atividades não finalísticas da organização a terceiros. Portanto, há uma incorporação da atividade-fim de uma empresa (prestadora de serviços) com a atividade-meio de outra (tomadora de serviços), envolvendo a produção de bens e serviços, prática comum na contração de serviços de limpeza, vigilância ou de serviços temporários. Trata-se de uma parceria objetivando a busca pela eficiência.

MARTINS (2009) afirma que, nos países desenvolvidos, surgiu uma nova terceirização, denominada de quarteirização, ou terceirização gerenciada, por meio da qual uma empresa especializada é contratada com o escopo de gerenciar as empresas ditas terceirizadas, denominadas de parceiras. Ademais, a denominada quarteirização também representa uma parceria entre a empresa que pretende terceirizar e a empresa que vai gerenciar a terceirização, aprimorando os processos de gerenciamento.

O autor descreve que no Brasil, a terceirização surgiu no século XIX, regida pelo direito privado, sob a denominação de locação de serviços. Próximo ao fim do século XX, durante o início do processo de industrialização, iniciado na Revolução de 1930, esta relação jurídica triangular mereceu regulação no governo de Getúlio Vargas, ainda que precária, sob a forma de contratos de subempreitada, conforme artigo 455 do Decreto-Lei n. 5452, de 1º de maio de 1943, que aprovou a Consolidação das Leis do Trabalho. Segundo esta lei, o subcontratado é o terceiro que assume o compromisso de entregar uma obra ou realizar determinado serviço perante um empreiteiro em favor de um empreendedor.

De acordo com NARDES (2010), o processo de terceirização surgiu neste último século, decorrente da necessidade de atender a novas atividades utilizando a força de trabalho de terceiros e se consolidou realmente durante a Segunda Guerra Mundial. Depreende-se que a indústria de armas acabou ampliando extraordinariamente essa terceirização dos trabalhos: os países aliados passaram a trabalhar em conjunto para atender às necessidades da época, criando sistemas de trabalho fragmentados e atuando de forma mais técnica somente em sua área especializada de produção. Exemplo claro foi demonstrado pelas indústrias que focaram somente na produção do produto principal, sendo que todo o restante era repassado para terceiros que então prestavam serviços acessórios.

O Decreto-Lei n. 200/67 foi a primeira lei a regular a terceirização restrita à Administração Pública. O seu artigo 10, § 7o, estabelecia a faculdade da transferência de serviços operacionais a terceiros, sem caráter deliberativo, como uma forma de descentralização administrativa. Esta forma de regulação se originou da reforma administrativa instituída no âmbito da União a partir de 1960. Posteriormente, foi publicada a Lei n. 5645, de 10 de dezembro de 1970, a qual discriminava em seu artigo 3º, parágrafo único, exemplificativamente, as áreas em que a terceirização seria cabível na esfera da União e das autarquias federais, como serviços de transportes, conservação, limpeza, dentre outras.

A Lei n. 6019, de 03 de janeiro de 1974, foi a que primeiro tratou, explicitamente, da terceirização de serviços no setor privado brasileiro, sob a denominação de trabalho temporário. Os sujeitos são o trabalhador e duas empresas: a tomadora de serviço ou cliente, que pode ser uma pessoa física ou jurídica, e a empresa de trabalho temporário, cuja finalidade é a de colocar pessoal especializado, por tempo determinado, à disposição de outras empresas que dela necessitem. Tal modalidade de contratação de trabalhador por empresa interposta, que consubstancia relações triangulares no Direito do Trabalho, corresponde a uma forma de flexibilização do trabalho, possui limites rígidos, como a transitoriedade da substituição de pessoal permanente e especializado ou o acréscimo temporário e extraordinário de serviços qualificados.

Em decorrência desta nova forma crescente de trabalho, o mercado teve que se adaptar rapidamente para atender esta necessidade, era fato as empresas almejarem retirar cada vez mais proveito desta forma de delegação de funções e de principalmente delegação de responsabilidades até mesmo com relação aos seus empregados.


 

2.1 CONCEITO DE TERCEIRIZAÇÃO


 

Na atualidade a terceirização é tratada como uma forma de reorganização administrativa em que determinadas atividades de uma pessoa jurídica são transferidas para empresa contratada para essa finalidade. A terceirização é ainda chamada por alguns autores como subcontratação, focalização, descentralização, parceria, terceirização.

RAMOS (2001) conceitua a terceirização como:


 

[...] transferência de atividades para fornecedores especializados, detentores de tecnologia própria e moderna, que tenham esta atividade terceirizada como sua atividade-fim, liberando a tomadora para concentrar seus esforços gerenciais em seu negócio principal, preservando e evoluindo em qualidade e produtividade, reduzindo custos e garantindo competitividade. (Ramos, 2001, p.50)


 

Para FLORES (2010), o ato de terceirizar é transferir a terceiros, através de contrato com profissional liberal, autônomo ou empresa prestadora de serviços, atividades que não as atividades fim da organização, ou seja, atividades acessórias, que servem de apoio.

O autor afirma que a terceirização pode ser definida como estratégia empresarial que consiste em uma empresa transferir para outra, e sob o risco desta, a atribuição, parcial ou integral, da produção de uma mercadoria ou realização de um serviço, objetivando isoladamente ou em conjunto a especialização, a diminuição de custos, a descentralização da produção ou substituição temporária de trabalhadores.

A terceirização, segundo MARTINS (2009), representa a contratação de terceiro para realizar atividade que não é o objetivo principal da empresa, enquadrando literalmente na contratação de serviços temporários. A atividade-fim da empresa deve ter um suporte dessa terceirização para que possa agregar valor ao produto final. Tal relação seria mútua e serviria como complementação, podendo colocar no mercado empresas especialistas tanto nos serviços principais como nos serviços que darão suporte. As empresas ficam então mais ágeis e flexíveis, permitindo uma maior competitividade em ambientes contemporâneos, transformando custos fixos em situações que agora podem ser variáveis e ajustadas de acordo com a necessidade.


 

3 TERCEIRIZAÇÃO DE RECURSOS HUMANOS


 

A terceirização de serviços ganhou espaço, principalmente pela redução de custo, uma saída que as empresas encontraram para enfrentarem a competição econômica do mercado, entretanto o que deve ser observado é que esta redução se deu a custa de “flexibilizações” das normas trabalhistas, camuflando a relação de emprego (CAMPOS, 2002, p. 301).

Conforme aponta CAMPOS (2002), o reflexo da modernidade, com sucessivas reestruturações implementadas no sistema produtivo capitalista, não deve servir de pretexto para a precarização das relações de trabalho. Baseada no princípio da aplicabilidade dos direitos fundamentais às relações de trabalho, a utilização deste instrumento deve estabelecer limites à crescente precarização das relações de trabalho, onde se insere a terceirização, fenômeno irreversível gerado pelos novos meios de produção a exigir regulação jurídica, com o intuito de combater fraudes e simulações.

GIOVANELA (2008) expõe que nem sempre a terceirização é feita de forma apropriada, uma vez que muitas empresas vêm contratando prestadores de serviço incapazes de oferecer serviços com qualidade, com único e exclusivo objetivo de preencher postos de trabalho oferecidos por meio de licitações. E que a redução de custos, é obtida com a utilização de mão de obra com menor grau de qualificação, menor padrão de remuneração, ausência de benefícios e sem programas de capacitação.

Conforme NARDES (2010) durante a terceirização de serviços conjuntamente se terceiriza os recursos humanos para sua execução. Cria-se assim, uma relação empregado - empregador - tomador de serviços, sendo esta uma estrutura trilateral diferenciada do modo clássico de trabalho. Este antes apresentava um modelo bilateral que tinha por objetivo fornecer trabalho para a empresa de uma forma geral e usar a forma acessória de prestação de serviços, aperfeiçoando, melhorando e aumentando a produção, mas reduzindo custos. Desta forma os trabalhadores desenvolvem suas funções em órgãos públicos, mas não possuem ligação direta com o mesmo. Se ocasionalmente o trabalhador tem seus direitos violados ou se sente lesado a responsabilidade cabe apenas à empresa contratada e não ao órgão a que ele efetivamente exerce suas atividades.

Segundo SALVINO (2009), considera-se lícito terceirizar nos serviços público atividades profissionais “meio” como, por exemplo, limpeza, transporte e fornecimentos, sendo ilícito terceirizar as atividades “fim”. Entretanto estes serviços quando terceirizados originam a relação trilateral de trabalho. Quando há o envolvimento de empregados nos serviços como os citados quem têm o dever de fiscalizar, controlar e organizar as atividades do empregado, ou seja, quem deve exercer, diretamente, a subordinação jurídica do empregado do serviço terceirizado é a empresa prestadora, e não o ente tomador.

O decreto nº 2271 de 7 de julho de 1997, procurou estabelecer uma política de terceirização para a administração pública federal, permitindo a sua aplicação às atividades materiais acessórias, instrumentais ou complementares aos assuntos que constituam área de competência legal do órgão ou entidade, restringindo a terceirização sempre que as atividades repassadas se confundirem com atribuições de cargos permanentes (TEIXEIRA, 2008).

RAMOS (2001, p. 70), adverte que “a distinção entre atividade-meio e atividade-fim longe está de ser objetiva, não constituindo pilar seguro para alicerçar a diferença entre terceirização lícita e ilícita”. A frágil regulamentação legal sobre o tema acaba proporcionando um satisfatório atendimento às necessidades empresariais e de mercado. A própria jurisprudência apresenta propostas como a Súmula 331/TST, que apresenta algumas situações em que a terceirização é admitida, produzindo regras entre as partes quanto ao entendimento de licitude para contratação de empregados pela prestadora junto à tomadora de serviços. Assim, toda e qualquer atividade acessória pode ser terceirizada, não podendo existir uma relação entre as empresas de pessoalidade e a subordinação direta, com um distanciamento entre as empresas contratadas.

Conforme TEIXEIRA (2008), uma oportunidade de aumento da terceirização dos serviços públicos foi conquistada com a Lei complementar nº 101 de 4 de maio de 2000, conhecida como Lei de Responsabilidade Fiscal que regulamentou o artigo 169 da Constituição Federal e, dentre inúmeros outros pontos, incluiu limites de gastos com o pessoal. Isto pode ser observado pelas inúmeras extinções de cargos e funções públicas, e a não atualização dos planos de carreira dos servidores públicos, o que gera mais demanda para que haja mais contratação de serviços terceirizados.

Conforme SILVA (2011) é possível verificar que existem duas visões da responsabilidade da administração pública sobre o assunto: uma que defende a terceirização e que não há vínculo da tomadora de serviço com o trabalhador; portanto, o mesmo não deverá assumir nenhuma responsabilidade. Já a segunda entende que a tomadora se beneficiou da força de trabalho do empregado, tendo o dever de arcar com as possíveis fraudes dos direitos do trabalhador. Por fim, existem aqueles que pregam a aplicação da Súmula 331, IV, do TST de forma a privilegiar a terceirização atribuindo à Administração Pública a responsabilidade subsidiária sem estabelecer o vínculo direto do trabalhador terceirizado com o Estado, em atenção às disposições contidas no art. 37, II, da CF/88.

RAMOS (2001, p. 151), afirma que a jurisprudência trabalhista consagra a responsabilidade do Estado, apesar do disposto na Lei de Licitações e Contratos. Segundo Ramos, “a doutrina igualmente tem entendido que mesmo quando o contratante é o Poder Público, subsiste o dever de indenizar os trabalhadores diretamente envolvidos na execução do contrato, em caso de inadimplemento do devedor principal”. Assim, a autora conclui, que a responsabilização do Estado em caso de inadimplemento da contratada aumenta o potencial de risco aos cofres públicos, em decorrência da terceirização, e que esse risco deve ser ponderado pelo administrador público na decisão de terceirizar.


 

4 TERCEIRIZAÇÃO NA ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA


 

Conforme RAMOS (2001), juridicamente, a terceirização no setor público é um recurso legal e contratual de transferência da responsabilidade de alguns serviços a empresas privadas sendo, necessariamente, precedida por licitação e consequente celebração de contrato, conforme disciplina a Lei 8.666/93 e pelas leis que posteriormente a alteraram. Assim, via licitação, a administração pública pode delegar atividades a uma empresa, não havendo nenhum vínculo de subordinação entre o trabalhador da prestadora de serviços e o órgão/entidade pública.

Afirma também FLORES (2010), no tocante à viabilidade legal de terceirização de serviços pela administração pública, que é lícita apenas no que diz respeito às atividades meio dos entes públicos, não sendo cabível adotá-la para o exercício de atividades pertinentes a atribuições de cargos efetivos próprios do quadro pessoal, nem para funções que impliquem no exercício de poder de polícia ou na prática de atos administrativos, por serem essas funções específicas do Estado.

Quando SILVA (2011) discute a terceirização na esfera pública deixa explícito que há distinção entre a terceirização e as concessões ou permissões de serviços públicos, referente ao seu objeto. É que serviços públicos jamais podem ser integralmente terceirizados, pois a locação de serviços refere-se apenas à execução material de atividades específicas. Nesse contexto, há que se distinguir a terceirização lícita da ilícita, bem como definir o campo de responsabilização na seara trabalhista e apontar soluções para as antinomias decorrentes. Muitos defendem que a privatização dessas funções não representa eficiência, porque remunera mal e induz à conclusão de que também o Estado viola as garantias trabalhistas que defende na esfera privada. Os gestores públicos, em vista da agilidade e informalidade do setor privado, vêm utilizando a terceirização em larga escala, indistintamente, sem se preocupar com os princípios norteadores da função estatal de Administração Pública, muitas vezes utilizando-a como uma forma de flexibilização da legislação.

NARDES (2010) afirma que existem concepções taxativas e errôneas de que o Estado sempre trabalha mal ou pior do que as empresas privadas e, portanto, a terceirização automaticamente elevaria a eficiência. As privatizações já demonstraram que nada funciona bem se não for bem administrado, seja público ou privado; e que monopólios, em ambos os lados complicam as escolhas e o atendimento dos cidadãos.

TEIXEIRA (2009) também deixa claro que nada funciona e muito menos as terceirizações se não forem bem gerenciadas. E defende posições que evitem a modernização da gestão pública, ignorando o crescente descompasso entre demandas sociais e capacidade de resposta do Estado diante de problemas cada vez mais complexos.

Considera que para uma terceirização lícita e moral, faz-se necessário o entendimento da importância do serviço para a Administração. Quanto maior a sua relevância, maior será a importância de ser executada de forma eficaz. Deve ser avaliada a capacidade de a organização desenvolver autonomamente o serviço ou se necessita do apoio de terceiros. A análise não deve se restringir a simples disponibilidade de servidores ou funcionários, mas deve considerar também as competências existentes na organização.

Como a terceirização trata-se de uma parceria de negócios, esta sendo aplicada em uma instituição pública aumenta a complexidade. A terceirização na área pública possui ótima receptividade por seus usuários, devido a ela trazer a expectativa de economia e da eficiência da iniciativa privada para os serviços públicos.

Portanto para SALVINO (2009), na Administração Pública, a utilização da terceirização para o fornecimento de mão de obra não tem respaldo específico no ordenamento jurídico vigente, isto porque é inarredável a exigência de concurso público para a investidura em cargos, empregos ou funções, nos termos do inciso II do artigo 37 da Constituição Federal. Hipótese única que prescinde de concurso público é a contratação temporária. A par desta exigência, não é raro encontrar, sob a denominação de prestação de serviços técnicos especializados, casos de fornecimento de mão de obra ao Estado sem concurso público. Portanto, o que é e sempre foi admitido pela ordem jurídica é a celebração do contrato de terceirização de serviços com a Administração Pública.


 


 

4 CONSIDERAÇÕES FINAIS


 

É possível resumir a terceirização como uma forma de parceria traduzida na busca pela eficiência, sendo uma ferramenta administrativa de gestão muito importante para que as empresas possam reduzir seus custos e aumentar sua lucratividade, permanecendo assim no competitivo mercado atual.

Entretanto, deve ser analisada com cautela quando utilizada na Administração pública devido aos vários princípios que a regem. Cabe observarmos que a Administração Pública, diferentemente das organizações jurídicas de direito privado, as quais são lícitas em fazerem tudo aquilo que a lei não proíbe, submete-se aos princípios da Constituição Federal, neste caso em especial, ao princípio da legalidade, obrigando ao gestor público fazer tudo e somente o que a lei determina.

Portanto, é notório que o administrador público enfrenta maiores restrições em sua atuação do que o administrador privado, pois na área pública todos os atos da administração estão sujeitas a limitações das leis e às exigências do bem comum, e obviamente que esse entendimento reflete uma peculiaridade inerente à terceirização no setor público.

Durante a terceirização podemos considerar que outros princípios como o da moralidade também são infringidos visto que em muitos casos terceirizados são submetidos a realizar atividades complexas específicas de servidores com remuneração inferior e muitas vezes sem o treinamento adequado, e a administração pública se torna omissa pelo seu favorecimento.

É responsável também pelo aumento da terceirização à ausência de planejamento pelos órgãos públicos, abrindo caminho para contratações emergenciais e tornando da terceirização um trunfo. Esta mão de obra por custo inferior abre portas para o nepotismo e favorecimento do clientelismo político. Muitos defendem a terceirização dos serviços públicos por considerarem a opção mais vantajosa, por levarem em consideração apenas o menor valor e não a qualidade dos serviços prestados, nem os danos causados aos trabalhadores.

Dessa forma o direito age no cerne da questão da relação jurídica trabalhista pactuada, afastando os nocivos e discriminatórios efeitos que o inadimplemento das verbas de natureza alimentar podem gerar aos trabalhadores.

Denota-se, que a responsabilização do ente público, conforme antiga redação da Súmula 331 do TST, visava garantir unicamente o recebimento de todas as verbas trabalhistas legais e normativas aplicáveis ao trabalhador que cumpriu suas funções junto ao tomador de serviços. Ou seja, unicamente receberá as parcelas a que faz jus, sem qualquer tipo de declaração de vínculo empregatício, vedado pela Constituição.

Dessa forma, se estará garantindo que um ilícito trabalhista, consubstanciado no inadimplemento de verbas de natureza salarial (e portanto alimentar) seja validado pelo Estado, que foi o grande beneficiado com a utilização da mão de obra do trabalhador.

É possível concluir-se que a implicação da terceirização nas relações de trabalho é assunto controverso e carente de normas claras e consistentes. O aumento da terceirização, em grande parte, é fruto da ausência de planejamento por parte dos órgãos públicos.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


 

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CERVO, A. L.; BERVIAN, P. I. Metodologia cientifica. 4a. ed. São Paulo: Makron Books, 1996.

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Autores

  • CASTILHA, Eduardo Dalcin

Áreas do conhecimento

  • Nenhuma cadastrada

Palavras chave

  • Administração Pública, recursos humanos, terceirização

Dados da publicação

  • Data: 29/06/2022
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