A PESQUISA COMO PRÁXIS PEDAGÓGICA NA FORMAÇÃO E ATUAÇÃO DOS PROFESSORES NO ENSINO FUNDAMENTAL
A PESQUISA COMO PRÁXIS PEDAGÓGICA NA FORMAÇÃO E ATUAÇÃO DOS PROFESSORES NO ENSINO FUNDAMENTAL
Silmara Helena dos Anjos
RESUMO
O presente trabalho aborda a importância da pesquisa frente ao contexto de formação e atuação de professores nos anos iniciais do ensino fundamental. Seu objetivo é de verificar como ocorre a prática em sala de aula ao usar a pesquisa como instrumento de aprendizagem no ensino fundamental anos iniciais. A metodologia foi ancorada na pesquisa-ação com princípios de natureza qualitativa. A pesquisa foi desenvolvida em uma Escola Municipal de Ensino Fundamental, no município de Comodoro Mt, com dois professores dos Anos Iniciais e coordenadora pedagógica. A priori foi realizada análise documental do projeto político-pedagógico da escola. Após, interagiu-se com os sujeitos envolvidos, por meio de entrevista semi-estruturada. Verificou-se que a prática está desconectada dos pressupostos elencados no PP da escola, bem como dos próprios relatos das professoras. A prática é realizada em torno de temas comemorativos, vinculadas a conteúdos e objetivos de áreas do conhecimento. Percebeu-se, sim, a pesquisa em aula, mas apenas como tarefa de casa, como atividade meio para a introdução ou exercício de conteúdos. A pesquisa é realizada como instrumento pedagógico simplista e desvinculada do seu verdadeiro potencial de reflexão, análise e construção do conhecimento. Pontua-se, sobretudo, que há uma considerável distância entre os pressupostos teóricos, o discurso e a prática que se efetiva em sala de aula. Portanto, é preciso reconhecer que há condições para a realização de pesquisas. Mas também é preciso reconhecer a falta de clareza sobre que pesquisa poderia ser considerada indicada, para responder às necessidades sentidas pelos professores e assim contribuir para o crescimento do seu saber.
Palavras-chaves: Ensino Fundamental. Pesquisa. Formação de professores
GRUPO 7: Pedagógicas e trabalho docente: identidades, territorialidades e mediações na e (com) formação inicial
INTRODUÇÃO
De acordo com Gil-Pérez e Vilches (2005), a forma como a economia Mundial está estruturada atualmente destruirá o sistema físico sobre o qual se sustenta, sendo de extrema necessidade reorientar este crescimento de sustentado a sustentável. Há a necessidade de que a educação ajude a desenvolver sujeitos-cidadãos conscientes dos problemas globais e de que a humanidade esteja preparada para fazer frente a estes problemas.
Seria importante que a educação tivesse como meta primeira e verdadeira o desenvolvimento das competências e habilidades dos jovens, de maneira que se tornem sujeitos conscientes e ativos para uma mudança efetiva na sociedade. Eles devem ser estimulados a pensar, participar, a fim de que possa ser superada a sociedade individualista e consumista. A educação “deve ser despida do caráter ingênuo e ser concebida de maneira crítica para cumprir seu papel de transformação do homem e constituir-se em fator de mobilidade social”. (CHIARELLO, 2000, p. 01).
As teorias pedagógicas tradicionais são baseadas principalmente na informação e memorização. Estudos recentes mostram que aprendizagem propiciada pela aplicação dessas teorias não desenvolve no aluno habilidades cognitivas e criativas, para que seja capaz de analisar e discutir pontos de vista e solucionar problemas, sendo, portanto, ineficiente para atender às necessidades da sociedade moderna, (FONSECA et al, 2005, p. ).
O presente trabalho teve como objetivo verificar como ocorre esta prática em sala de aula ao usar a pesquisa como instrumento de aprendizagem no ensino fundamental anos iniciais levando em consideração os ideais da educação brasileira a partir da Lei de Diretrizes e Bases da Educação (Lei 9.394/96) que visa ao desenvolvimento de um sujeito cidadão, crítico, autônomo, questionador, conhecedor de si e do seu entorno, com capacidade de inferir de maneira produtiva em sua sociedade.
Essa investigação aborda a importância da pesquisa frente ao contexto de formação e atuação de professores nos anos iniciais do ensino fundamental. Nesse sentido, partimos do princípio que a pesquisa é uma ação formativa, científica e educativa que desenvolve saberes que fundamentam a ação-reflexão-ação.
O interesse em realizar essa pesquisa surgiu quando constatamos a necessidade de pesquisar e refletir sobre a importância da pesquisa em sala de aula e a relevância do professor-pesquisador para o processo ensino-aprendizagem, uma vez que a pesquisa deve estar presente tanto na formação de professores quanto no âmbito escolar.
As questões que motivaram este trabalho centraram-se sobre o uso da pesquisa em sala de aula como prática pedagógica para desenvolver as competências e habilidades dos alunos do ensino fundamental dos anos iniciais, uma vez que esta prática vem sendo discutida como uma maneira de conseguir desenvolver no aluno os objetivos previstos nos PCNs (Parâmetros Curriculares Nacionais).
Os problemas que nortearam essa investigação: Quais as concepções que os professores dos anos iniciais têm do ato de pesquisar? Quais as contribuições da
pesquisa à sua formação e atuação profissional. Para tanto, essa pesquisa, buscou verificar como acontecem às práticas de pesquisa nos anos iniciais do ensino fundamental e suas contribuições para a formação e atuação do professor.
1 A PESQUISA NA FORMAÇÃO E ATUAÇÃO DO PROFESSOR
A pesquisa em sala de aula visa, ajuda no desenvolvimento da autonomia do sujeito, assim como instigar e desenvolver o seu ser questionador, pensante, crítico, tornando sujeito consciente. Faz com que o mesmo se enxergue e deixe de ser alienado. Para tanto, uma das peças-chave para esta mudança é o professor, não, como mencionado, transmissor de conteúdo, pois uma máquina pode fazê-lo, mas como guia no desenvolvimento da aprendizagem de seus alunos, já que estes são os futuros cidadãos atuantes nesta sociedade. O professor tem como função auxiliá-los, conduzi-los nessa reconstrução, chegando até o momento em que eles estejam aptos a construir seu conhecimento.
O uso da pesquisa em sala de aula não possui um caminho único, entretanto possui algumas diretrizes. Como exemplo, Demo (1997) acredita que a postura do professor deva envolver, entre outras coisas, a motivação do aluno, sua orientação, e que a pesquisa passe a fazer parte do cotidiano de ambos, e que o aluno precisa participar de sua aprendizagem, desenvolver sua autonomia, espírito crítico, trabalhar com o professor, bem como estar sempre presente e participativo no seu processo de aprendizagem.
A pesquisa, portanto, é um ato político que norteia uma ação investigativa e instigadora na contínua conexão de ensino e aprendizagem.
Não há ensinar sem pesquisa e pesquisa sem ensino. Esses fazeres se encontram um no corpo do outro. Enquanto ensino continuo buscando, reprocurando. Ensino porque busco, porque indaguei, porque indago e me indago. Pesquiso para constatar, constatando, intervindo educo e me educo. Pesquiso para conhecer o que ainda não conheço ou anunciar uma novidade. (FREIRE, 2004, p.28).
Portanto, a pesquisa está presente cotidianamente no ato de ensinar, pois se constitui pelo planejamento, pode e deve conter instrumentos que proporcionem interações de pesquisas entre os professores e os alunos, bem como que envolvam toda a comunidade educativa.
De acordo com Cachapuz, Praia e Jorge (2000), os professores são peças fundamentais no processo do ensino por pesquisa, pois devem ajudar, e não dirigir, compreender, e não resolver as dificuldades, desenvolver estratégias em conjunto com os alunos, estimulá-los a pensar e refletir, valorizando a interdisciplinaridade dos saberes.
De acordo com Freire (2004), a educação, como experiência especificamente humana, é uma forma de intervir no mundo, mas principalmente intervir de forma consciente, com responsabilidade sobre suas ações.
Intervenção que além do conhecimento dos conteúdos bem ou mal ensinados e/ou aprendidos implica tanto o esforço de reprodução da ideologia dominante quanto o seu desmascaramento. Dialética e contraditória, não poderia ser a educação só uma ou só a outra dessas coisas. Nem apenas reprodutora nem apenas desmascaradora da ideologia dominante. (p. 98).
Assim, a educação realizada na escola deveria propiciar ambientes para o desenvolvimento de sujeitos cidadãos, conscientes de sua historicidade, ética, importância e responsabilidade social, dificilmente terá sua função como preparadora de cidadãos para a reconstrução do mundo, capazes de inferir com consciência coletiva neste século.
“Pesquisa é processo que deve aparecer em todo trajeto educativo, como princípio educativo que é na base de qualquer proposta emancipatória” (DEMO, 2002, p.75). Acreditamos, como nos diz Demo, que a pesquisa é uma ferramenta importantíssima utilizada para dar continuidade à formação profissional e para desenvolver a criatividade intelectual dos pesquisadores e que o ato de pesquisar deve ser um exercício contínuo, tanto no professor como no aluno.
2 METODOLOGIA DA PESQUISA
O percurso metodológico desta investigação foi de agosto a dezembro de 2008, ancorado na pesquisa-ação, pois se refere a um tipo de pesquisa social associada à ação e resolução de problemas no coletivo, em que os pesquisadores e participantes estão envolvidos do modo cooperativo e participativo. (GIL, 2002).
Foram previstos princípios de natureza qualitativa que, segundo Ludke & André (1986), propõe uma visão de totalidade e pressupõe um avanço significativo no conhecimento dos envolvidos elevando o nível de compreensão do homem como ser
histórico diretamente influenciado por sua época, pelo seu meio histórico-social e profissional. A pesquisa foi desenvolvida na Escola Municipal de Ensino Fundamental Miguel Beltrame, no município de Santa Maria/RS, com dois professores dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental e a coordenadora pedagógica. A priori foi realizada a análise documental do projeto político-pedagógico da escola, para verificar em seus pressupostos a existência e inferências sobre a importância da pesquisa e suas implicações ao processo educativo, bem como à formação de professores.
Após, interagiu-se com os professores e coordenadora pedagógica, por meio de entrevista semi-estruturada, com a finalidade de identificar como conceituam e priorizam a pesquisa e se é caracterizada como uma ação investigativa ou apenas como tarefa escolar; verificar como descrevem a pesquisa nas atividades cotidianas; questionar sobre a importância da pesquisa para o processo de formação de professores e sua repercussão aos próprios processos formativos.
As entrevistas semi-estruturadas foram realizadas com o objetivo de propiciar um diálogo entre pesquisadoras e docentes, em que as questões de pesquisa serviram de roteiro para investigar o conhecimento teórico e prático. O diário de campo foi construído com a finalidade de buscar a descrição dos sujeitos, do ambiente, o registro dos diálogos, das respostas às questões de pesquisa e das atividades e, ainda, as indagações do observador e entrevistador. (MINAYO, 2000).
Outra etapa consistiu nas observações sistemáticas da prática pedagógica nos anos iniciais, onde as pesquisadoras buscaram verificar como os professores articulam as práticas pedagógicas e se priorizam a pesquisa e como isso acontece. Esse momento da pesquisa foi considerado indispensável, pois pôde colocar em pauta a possibilidade de reflexão sobre as inferências das professoras no momento da entrevista, no sentido de conectar suas falas com suas práticas, num processo eminente de ação-reflexão-ação.
Atualmente, estamos articulando momentos de formação com os professores, tendo por base a importância da pesquisa como um processo de formação continuada e como instrumento didático-pedagógico a ser utilizado em sala de aula, onde estamos priorizando a reflexão sobre os dados coletados na pesquisa, problematizando-os no coletivo junto aos pressupostos da pesquisa em educação elencados por Demo (2002), principalmente para contextualizar a pesquisa no professor e no aluno como indispensável ao processo ensino-aprendizagem e à formação do professor, o que repercute em sua atuação.
3 CONSTATAÇÕES E REFLEXÕES
Quanto ao projeto político-pedagógico da escola, encontramos que constam pressupostos acerca da importância da pesquisa como elemento articulador das práticas pedagógicas e da formação do professor. Destaca-se que a referida escola têm em sua proposta um eixo norteador intitulado “formação continuada como produção de saberes e fazeres”. Consta que:
A formação continuada de professores contribui para o redimensionamento da prática educativa, em que é preciso superar a ação fragmentada, onde a relação educador-educando deve ocorrer em pleno êxito centrada na atividade de ação-reflexão-ação como método de trabalho, visando a interação entre conteúdos, valores morais, políticos, éticos e estéticos oriundos da prática social concreta, do saber científico e do saber escolar. (PP da Escola, 2008, p.36).
Portanto, a abordagem desse eixo norteador, representa a preocupação da escola com a formação do educador na sua totalidade e implica, sobretudo, numa dinâmica constante de ação-reflexão-ação, o que depende, eminentemente, da postura de pesquisador do professor.
Também encontramos no PP da escola (2014) a formação continuada como uma investida para a transformação, sendo destacado o tripé apontado por Nóvoa (1995): desenvolvimento pessoal (produzir a vida do professor); desenvolvimento profissional (produzir a profissão docente); desenvolvimento organizacional (produzir a escola). Este é o plano em que move o professor na construção de sua identidade referencial na escola alvo da pesquisa, ou seja, uma formação calcada na dinâmica do aprender continuado, do projeto de vida e da práxis emancipatória pelos processos investigativos alicerçados na formação continuada.
Esta pesquisa, também, está possibilitando conhecer os modos singulares como as professoras vêm [trans] formando sua identidade profissional, o que incide basicamente nos seus processos formativos. Os elementos que constituem sua história vital estão interconectados em seus relatos e em sua prática pedagógica, proporcionando a compreensão da maneira pessoal e diferenciada de como foram e vêm sendo vividas as diferentes etapas de sua vida.
Refletindo sobre o saber profissional, sobre como foram se constituindo, é de fundamental importância levar em conta o próprio espaço de formação do docente e suas variáveis. O profissional também aprende a ensinar ensinando, em um percurso de
construção histórica que ultrapassa a dimensão cognitiva. Seu saber profissional não é exclusivo dele, em seu caráter individual, mas há, certamente, influência do coletivo; com relações multidimensionais. Nesse prisma, os saberes profissionais são saberes em ação, como o próprio Tardif (2000, p. 36) esclarece: são saberes laborados, estão presentes no próprio trabalho docente: “... esse enfoque considera que o profissional, sua prática e seus saberes não são entidades separadas, mas “co-pertencem” a uma situação de trabalho na qual “co-evoluem” e se transformam”.
Ao falar em identidade profissional, é preciso considerar o fator tempo, pois,... “Um elemento presente nesse pensamento é o tempo”. (TARDIF, 2000, p.10). O próprio tempo de formação do docente está carregado de suas experiências e outras variáveis constituídas, como já mencionamos. Os saberes cultivados, nesse tempo, admitem, pelo menos, três momentos:
- 1º Momento: Existe um saber sobre o ensino, sobre o papel do professor, sobre como ensinar extremamente ligando à sua própria história de vida, destacando sua história de formação escolar, pois, como se pode constatar, antes mesmo do professor entrar na sala de aula como docente, seu processo de formação veio se constituindo no seu próprio ambiente.
- 2º Momento: Os primeiros anos de sua atividade profissional estabelecem rotinas de trabalhos, por meio das quais suas práticas vão se efetivando, a partir das experiências adquiridas.
- 3º Momento: Há uma adaptação do profissional ao espaço da escola, até mesmo à sua socialização. O saber como viver em grupo é tão importante como o saber ensinar.
As dimensões dos saberes profissionais passam por um processo de estruturação das memórias marcantes, e seu desenvolvimento está associado tanto às suas fontes e lugares de aquisição quanto aos seus momentos de construção. Com base nisso, podemos aventar a possibilidade desses saberes se constituam fundamentados em um modelo organizador de pensamento pedagógico, que direciona as práticas docentes. A temporalidade não deve ser aqui compreendida numa única direção da memória histórica, mas também de suas fontes e lugares de aquisição e de seus momentos de construção, o que, segundo Tardif (2002), trata-se de memorização.
Neste enfoque, o caráter de [trans] formação gerencia uma complexa interconexão entre o paradigma da racionalidade técnica e da racionalidade prática, cujo alicerce é construído pelo conjunto permanente de saberes e competências inerentes aos
processos de formativos de cada professora. Assim, muitas vezes, elas põem em ação de forma consciente e racional seus saberes, mas nem sempre escolhem ou controlam sua ação de maneira planejada. Agem movidas por intenções calcadas em hábitos, preferências, automatismos, competências construídas e condicionamentos que servem para impulsionar a sua capacidade de processar e articular ações pedagógicas, porém, a pesquisa que, segundo elas, é entendida como fator importante, indispensável e que contribui para aprendizagens significativas, pouco aparece nas práticas de sala de aula.
A organização curricular da escola pressupõe concepção de currículo integrado, pois entende que centra o aluno como um ser histórico, um ser concreto, situado no tempo e no espaço. A relação educando-sociedade deve ser, assim, de natureza concreta, ou seja, deve ser compreendida a partir das contradições que se estabelecem entre o mundo do educando e o mundo da escola, o mundo educacional e o mundo social.
O currículo integrado acentua a inter-relação entre a estrutura cognitiva e afetiva dos alunos, no sentido de que os mesmos passam a atribuir significados e construir e integrar conhecimentos. O PP está ancorado em um currículo construtivista que está:
[…] alicerçado na Abordagem Sócio-Histórica da Aprendizagem, cujas bases teóricas se apóiam em Vygotsky (1988), pois aqui se parte do social para o individual, uma vez que o homem como sujeito interativo e não simplesmente ativo, constitui sua consciência em forma de ações nas relações sociais, no contato com os outros homens. As interações entre o individuo e o meio natural e sócio-cultural são considerados primeiro no plano interpsicológico (entre as pessoas) e, posterior e imediatamente, no plano intrapsicológico (nível individual). (PP da Escola, 2008, p.36).
Salienta-se que no processo de observação das práticas pedagógicas nos anos iniciais, verificou-se que estão quase desvinculadas dos pressupostos elencados no PPP da escola, bem como dos próprios relatos das professoras. As práticas pedagógicas são realizadas em torno de temas comemorativos, vinculadas a conteúdos e objetivos de áreas do conhecimento, porém a relação teoria-prática que poderia ser evidenciada por momentos de investigação e vivências em pesquisa como aproximação significativa do real com o proximal quase não acontece. Percebeu-se, sim, a pesquisa em aula, mas apenas como tarefa de casa, como atividade meio para a introdução ou exercício de conteúdos, restringindo-se a técnicas de recorte, colagem e pintura, leitura e interpretação. Constitui-se, portanto, como instrumento pedagógico simplista e desvinculado do seu verdadeiro potencial de reflexão, análise e construção do conhecimento.
Pontua-se, sobretudo, que há uma considerável distância entre os pressupostos teóricos, o discurso e a prática que se efetiva em sala de aula. Isso é destacado pela coordenadora pedagógica quando infere que existe a boa vontade dos professores em planejar, realizar atividades que são propostas, mas que acabam reproduzindo as práticas tradicionais de sala de aula, “[...] àquelas que receberam enquanto alunos e que as marcaram tão profundamente que não conseguem apagar de suas mentes e de suas ações de professoras”. (Fala da coordenadora pedagógica).
Gauthier (1998, p.133) nos diz que “[...] os professores são atores que recebem o mandato de exercer, na escola, as funções de educar e instruir. Eles ocupam um espaço específico na escola, a sala de aula, onde transmitem um certo número de valores e de conteúdos culturais aos jovens e crianças”, o que corrobora a especificidade do professor docente, que legitima e justifica os processos de criação e implementação de práticas pedagógicas que possibilitam a exploração e construção de conhecimentos de forma reflexiva ou reiterativa. (VÁSQUEZ, 1977).
CONCLUSÃO
A educação pela pesquisa requisita que o professor seja mediador e parceiro no processo educativo; ele deve oportunizar que o aluno seja um ator participante do processo de ensino e aprendizagem como eminente sujeito de aprendizagem. Ao realizar mediações pedagógicas que envolvam pesquisa, o professor oportuniza ao aluno investigar e, sobretudo, desenvolver habilidades e capacidades intelectuais com experiências concretas e significativas à sua formação.
É importante enfatizar que a formação docente é um processo contínuo e inacabado que objetiva a constante reflexão sobre o próprio desenvolvimento profissional. Portanto, o princípio da ação-reflexão-ação deve ser exercitado continuamente na prática pedagógica do professor, pois é por intermédio desse processo que ele poderá estar [re]construindo e concretizando sua formação e atuação de maneira mais significativa.
Verificou-se também ser de extrema importância o apoio para o trabalho do professor, pois sem o amparo, este fica comprometido no seu global, uma vez que nem todos os discentes terão oportunidade de desenvolver suas aprendizagens desta forma. Além de que o ensino que poderia ser potencializado acaba por não ocorrer, exatamente pela falta deste suporte, seja financeiro, educacional, estrutural, pedagógico ou mesmo governamental.
Percebeu-se que a qualidade do ensino é diretamente proporcional à qualidade educacional e de vida do docente. Enquanto estes permanecerem com condições medíocres de trabalho, aprimoramento profissional, educacional e salarial, a mesma mediocridade continuará a se refletir na educação e conseqüentemente no País.
Lembrando que a pesquisa aqui tratada e desenvolvida na escola não é a acadêmica (científica) que visa fazer com que o aluno produza conhecimento novo, embora pelo que se pôde observar, as professoras entendem a importância do desenvolvimento também desse tipo de pesquisa, mas não cabe fazer uso dela para alunos do ensino fundamental. O que se procura levar em conta, ao fazer uso da pesquisa como instrumento de aprendizagem, é desenvolver, principalmente, a autonomia, o raciocínio crítico, a argumentação para que posteriormente este aluno esteja apto a evoluir dentro da área de pesquisa (científica), sendo capaz de produzir conhecimento novo e esse (conhecimento) ser usado para auxiliar na melhoria socioambiental.
A graduação pouco contribuiu para a prática da pesquisa em sala de aula, ao se utilizar dela como instrumento de aprendizagem, mas independente da formação inicial, procuraram trabalhar com seus estudos posteriormente, mas com grande dificuldade, já que o salário, por ser baixo, não é o suficiente para haver dedicação aos estudos ou mesmo para ter condições para custear cursos de aperfeiçoamento. Embora existissem e existam dificuldades, estas professoras procuram se aprimorar, para auxiliar na aprendizagem dos seus alunos, mas é percebido, inclusive por estas, que muito se perde em qualidade por não haver exatamente suporte, estrutura, condições de trabalho e valorização do docente num sentido macro de formação continuada.
Ao analisar a situação dos nossos professores-pesquisadores, pode-se levantar uma série de conjecturas sobre o papel da pesquisa e sua relação com o saber docente. Pelo estudo efetuado, pode-se perceber que convivem na escola estudada vários tipos e até várias concepções de pesquisa. Apesar dos limites constatados e da falta de uma política governamental de valorização do magistério, é preciso reconhecer que há condições para a realização de pesquisas. Mas também é preciso reconhecer a falta de clareza sobre que pesquisa poderia ser considerada indicada, para responder às necessidades sentidas pelos professores e assim contribuir para o crescimento do seu
saber.
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